Quando Cascão deixou a namorada em casa, já passava das oito da noite.

—  Tem alguma coisa te incomodando? – perguntou ele. Maria estava calada desde que eles tinham deixado Magali em casa.

—  Não estou incomodada. Estou bem – respondeu ela, rispidamente.

—  Tem certeza? – ele insistiu.

—  Foi lindo o que você fez pela sua amiguinha... E ver você caidinho daquele jeito por ela foi mais bonito ainda – ela desabafou, incapaz de se conter.

—  Pensei que tivesse se preocupado também, queria que ela levasse uma surra? – respondeu ele, espantado e com muita raiva. – Aliás, ela não é sua amiga também?

—  Claro que é, mas agora parece mais sua do que minha. Além do mais, você exagerou. Não foi tudo isso. Era uma luta, ela perdeu, acontece.

—  Claro, um rapaz de gigantesco bater numa menininha acontece. E eu tenho que assistir calado. Está certo.

—  Está certo? Levantar ela no colo está certo? ABRAÇA- LA ESTÁ CERTO? FICAR BABANDO POR ELA ESTÁ CERTO?

—  Por favor... Você nunca se importa com ninguém?

— Claro que me importo. Acha que não detestei vê-la apanhar? É só que você nunca olhou pra mim daquele jeito que olha pra ela!

Ele não soube o que dizer. Então ela continuou:

—  Acha que não sei que ela é o centro dos seus pensamentos, que você fala dela o tempo inteiro e fica diferente quando ela tá por perto?! Como acha que eu me sinto vendo isso? – para sua surpresa, ela começou a chorar, embora o tom de voz continuasse o mesmo. – Você é o meu namorado, mas se preocupa com sua melhor amiga mais do que jamais se preocupou comigo! Você toma conta dela, compra briga por causa dela, mas e eu, que estive sempre aqui do seu lado? Você se importa menos com a sua namorada do que com uma magricela esquisita que não está nem aí pra você, porque se estivesse teria lutado por você quando teve a chance, e não voltado pra aquele namorado bocó dela! Ele não tem atitude pra nada, e a Maga foi burra de não ter percebido que mais cedo ou mais tarde ia ser traída de qualquer jeito! E você quer que eu finja que não tô notando você todo caidinho por aquela sonsa? Eu tô! E se você tivesse o mínimo de consideração por mim, devia assumir logo que tá afim dela e se mandar, porque eu não sou obrigada a ficar assistindo isso!

—  Maria, por favor, me escuta...

—  E você ainda disse que ia ser um namorado melhor! – ela riu, amarga. – Sabe o que é pior? Eu acreditei! Acreditei que você estava sendo bacana comigo porque gostava de mim, porque tava arrependido, mas é só ela aparecer e então é como se eu não existisse...

—  Você sabe que não é verdade.

—  CALA A BOCA! O único que não sabe de nada aqui é você! Você gosta dela, e se não sabe disso ainda é porque é um idiota! Tá na sua cara!

Ele não disse nada por um longo tempo, embora não desviasse os olhos da namorada, que, por sua vez, percebeu que aquela explosão a tinha deixado muito, muito cansada, então também ficou em silêncio.

—  E então? – Maria quebrou o gelo. – Vai ficar aí me olhando com essa cara? Vai, diz alguma coisa!

Ele respirou fundo, sabendo que as palavras que diria a seguir eram decisivas. E então, falou:

—  Você está certa. Eu estou apaixonado por ela. Eu... Eu não sei o que fazer, Maria. Não queria te magoar, mas não sei se posso estar mais com você.

Cascuda esperava tudo, menos isso.

—  O quê? – disse ela, enxugando os olhos.

—  Maria, quando isso aconteceu com você eu fui compreensivo não fui? Você sabe que eu te amo, porém eu estou apaixonado pela Magali sim. Você pode aprender a conviver com a ideia, e desse modo eu tentarei esquecer tudo isso ou... – Ele estava quase chorando, mas conseguiu segurar.

—  Eu... – Maria gaguejou. Ela não sabia o que dizer, nem o que pensar. – Eu acho melhor para nós três que eu seja homem o suficiente para terminar aqui. – A raiva da moça era gigantesca–  Eu não acredito que você a prefere – acrescentou, por fim.

—  Você ainda se pergunta o porquê? Maria, seja justa. Você não tem sido uma boa namorada. Eu às vezes te deixo na mão por que sou um bocó, sou esquecido mesmo, desleixado. Mas você não. Tem vergonha de mim, me deixa de lado quando lhe é conveniente e é claro teve também aquela vez que você...

— Para! Tem que jogar na minha cara aquilo toda vez? Eu te larguei por causa do Lucas. Pronto. Mas eu não te enganei, não te trai! Eu pelo menos fui macho o suficiente pra dizer na tua cara que estava gostando de outro e por isso ia te deixar! Você não me retribui o favor. Preferiu me fazer de trouxa na cara de todo mundo.

Um silêncio constrangedor pairou entre os dois.

—  Acho melhor eu entrar – falou Maria, que não suportava mais aquele clima esquisito.

—  Tá – disse um Cas encabulado. – Boa noite, então.

—  Boa noite.

Cas se sentia confuso. Havia um lado dele que estava em jubilo devido ao termino, por outro lado se entristecia visto que amava Maria. Ela era uma boa amiga, mas uma péssima namorada no geral. Ainda se lembrava de quando ela o havia  deixado por Lucas, ou no dia -a- dia que ela tinha vergonha dele, de suas escolhas e de seu jeito. Magali não era assim, ele sabia muito bem que ela não aprovava tudo o que ele fazia, mas também não desaprovava. A Magrela tinha uma filosofia de vida simples, onde se intrometer e abusar da boa vontade alheia não estavam incluídos. Mas e agora? E se a morena não o quisesse o que ele faria?

Cas não era do tipo de rapaz que tinha um alto conceito sobre si mesmo, mas podia ver que Maga gostava dele. Talvez não estivesse apaixonada, era verdade. Mas isso poderia ser tratado e arranjado. Ela muitas vezes preterira Luke por sua causa, e ele poderia usar tudo isso ao seu favor agora que não estava mais com Maria. Ele não poderia se sentir mal pela namorada. A conhecia há tempo suficiente para saber que Cascuda tinha um coraçãozinho pequeno, que só cabia uma emoção por vez (o que explicava facilmente o modo como o havia deixado quando sentira algo por outro alguém) a impressão passaria rápido para a moça, talvez até rápido demais.

Ele deveria agora ter coragem e assumir um sentimento que a muito o atormentava. Seu  amor por Magali.