Cheguei perto do lago e desci do cavalo com cuidado, deixando-o livre. Com um pequeno encanto, pedrinhas do tamanho dos meus pés emergiram, criando uma trilha para que eu passasse.

Após chegar à torre, observei com pena os espinheiros, que já dominavam a mini ilha. Um dia eu teria que cortá-los.

— Rapunzel, jogue teus cabelos, minha querida!— Gritei, a cabeça erguida. Como que respondendo ao meu chamado, o cabelo dourado desceu até a base da torre, perigosamente próximo aos espinhos.

Peguei as pontas com cuidado, evitando que sujassem, e escalei com a ajuda dos cabelos dourados. Desde que Rapunzel passou a morar na torre eu usava vestidos mais curtos e sapatos mais firmes para poder escalar sem tantos problemas. Cheguei na pequenina janela e entrei, ajudando Rapunzel a puxar os cabelos de volta.

Ela, como sempre, parecia ter crescido; era alta e magra, os cabelos dourados e os olhos verdes. Puxava o cabelo com maestria, talvez pela longa experiência. Abraçou-me feliz quando terminou.

— Mãe! A quanto tempo!

Sorri e a abracei de volta. Ela me fez sentar em uma das cadeiras de madeira bem cuidadas, e observei ao meu redor. A torre era bem arrumada e perfeitamente limpa, visto que Rapunzel tinha a mesma perfeição que eu. Ou talvez tenha muito tempo livre.

Conversamos sobre como ela passava seu tempo. Rapunzel aprendeu a ler durante o tempo em que estava na torre, quando eu ainda morava com ela, então sempre que podia eu comprava um livro. Claro, eles eram caríssimos e raros, mas isso a manteria na torre, e eu faria qualquer coisa para isto.

— Mãe...Trouxe o que te pedi? - Perguntou ela, esperançosa, olhando para a minha cesta. Sorri e tirei um exemplar que ela desejava a tempos, entregando para ela. O livro tinha uma capa dura e era verde-escuro. Ela o examinava como se fosse uma joia preciosa.

— Não entendo para que tanto interesse em um negócio desses. - Falei, desinteressada - Afinal, é apenas um monte de papel.

— Mãe, é maravilhoso. - Disse a garota, encantada. - Muito obrigada!

Minha mãe ensinou-me a ler quando era mais nova; era necessário para que eu pudesse conhecer novos feitiços. Porém, a leitura nunca interessou-me. Claro que nunca contei à Rapunzel da minha magia.

Continuamos a conversa e passei a noite na torre. Mas logo de manhã cedo, precisei partir. Despedimo-nos e ela soltou os cabelos pela janela para que eu pudesse descer.

Ainda parei para olhar a torre depois de atravessado o lago. Repousei a mão suavemente em meus lábios frios e mandei um beijo para Rapunzel.

— Amo-te.

Ela repetiu o gesto, sorrindo graciosamente:

— Eu também, mãe. Eu também.

Assim, virei-me e segui caminhando pela floresta.

xXx

A semana se arrastou e continuei no trabalho. Ficava irritada quando longe de Rapunzel, e as visitas frequentes me regeneravam.

Ocorria no reino um boato que o príncipe se casaria com a princesa de um reino distante, mas eu nem me importava mais com as fofocas. No fim, nunca cheguei a me importar. Agora que tinha minha felicidade, pouco me importava o que acontecia com o resto do mundo

Devido ao trabalho excessivo, demorei um tempo para voltar e visitar Rapunzel. Ela parecia-me diferente, mais livre, vivendo em um mundo mágico longe de mim. Quando derrubou alguns pratos sem querer e eu perguntei o porquê de tudo aquilo, ela ficou envergonhada e disse que era coisa dela. Imaginava demais.

— Isso que dá ler tanto. -Resmunguei - E isso tende a piorar.

Se eu ao menos soubesse o que se passava...

xXx

Era mais uma das minhas visitas. Chamei por Rapunzel, escalei em seus cabelos dourados e entrei na torre. Porém, a garota estava ainda mais estranha. Recebeu-me e logo entreguei algumas maçãs, colhidas especialmente da macieira, coisa que ela sempre pedia. Ela as pegou e colocou sobre o cesto.

— Como vais por aqui? - Perguntei.

— Muito bem. - Respondeu ela sorridente, o que me estranhou. Fazia um tempo que eu não a via, e sempre que demorava ela ficava triste.

— O que fazes quando estou fora?

— Leio. - Responde ela - Muito. Cuido da torre. Como. Essas coisas. - Ela pegou uma maçã e a mordeu.

A torre, porém, não me parecia tão cuidada assim, para quem ficava o dia todo sem fazer nada muito bom.

— Está uma delícia. - Ela comentou, inocente. Continuei um tanto desconfiada, mas calada. - Como vais teu trabalho?

— Mais atarefada que nunca. - Suspirei - Muitas clientes, loucas por novos vestidos. Nas épocas anteriores ao aniversário do príncipe, as encomendas dobram. É sempre assim, pois o rei não cansa de dar festas. - Gostava de contar um pouco sobre o reino, mas nunca exagerei muito.

— Posso ajudá-la a arrumar tudo, se desejares. - Comentou ela, os olhos brilhando - Em duas, o trabalho fica mais fácil.

— Nem pensar. - Disse de imediato. - Já disse que te quero aqui e pronto.

— Mas mãe-

— Rapunzel, sem mas. - Falo, severa - Ficarás aqui e não tem conversa. - A garota abaixa a cabeça, desapontada. - O que eu disse sobre isso?

— Aqui na torre é seguro. Eu deveria agradecer por ter um lugar para proteger-me dos perigos mundanos. - Suspira ela, desolada.

— Querida... - Começo, erguendo-me e caminhando até ela, para abraçá-la. Não era boa mãe, mas se desejava que Rapunzel ficasse, era preciso fingir. Rapunzel se entregou facilmente em meus braços - Sabes que te quero muito bem, por isto moras aqui.

— Mas me sinto tão sozinha... - Choramingou a garota.

— Prometo vir aqui sempre que puder, certo? - Olhei para ela, que sorriu. Tornei a sentar e continuamos falando sobre coisas tolas e sem tanta importância, até que resolvi passar a noite ali. Era comum, e Rapunzel sempre ficava feliz.

Na manhã seguinte me despedi e parti. De longe, observei Rapunzel puxar os cabelos para dentro da torre novamente, e segui caminho.

xXx

Como prometido, na outra semana eu apareci por lá. Rapunzel atendeu-me contente, e parecia flutuar pelo piso da torre, em outro mundo que não o meu. Isso me deixou irritada, o que era incomum quando perto dela. Mas logo ela pediu para que eu a ajudasse a escovar seus lindos cabelos, e imediatamente me animei.

Ficamos longas horas conversando, principalmente sobre seus livros, quando resolvi partir. Estava caminhando para a janela quando ela chamou-me:

— Mãe, tenho um pedido.

— Diga, querida.

— Poderia fazer novos vestidos para mim?

— Ora, e os que tu tens?

— Eles estão começando a ficar apertados. - Respondeu-me, envergonhada.

As roupas têm ficado muito apertadas ultimamente.

Eu poderia pensar que talvez ela estivesse se alimentando demais, porém o que surgiu em minha mente era outra coisa. A voz de Madalena ecoou em minha cabeça.

Olhei para ela, incrédula. Rapunzel assustou-se.

— Estás esperando um filho?!