Primaveras escrita por Melli


Capítulo 14
Capítulo 14




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/673903/chapter/14

— Nós vamos nos esconder, você “bate cara” tá, Melli? – Dizia Bany.

 Sempre depois da escola, ao entardecer, eu adorava me juntar com minhas amiguinhas para brincar no pátio do edifício onde eu morava. Geralmente mamãe não me deixava ficar pra fora depois das 9 horas da noite, pois além de todo mundo ir pra casa, dizia ela que não era hora de criança ficar fora de casa, e aquela que ousasse fazer isso, era pega pelo homem do saco.

— Vai Melli, é aí na árvore que você tem que bater cara. – Disse a menina de cabelos platinados, cujo nome era Gabriela.

— Então tá. Conto até quanto?

— Conte até 40! – Grazi, a de cabelos verdes respondeu.

— Vou começar. 1,2,3...

Ao mesmo tempo em que eu “batia cara”, ouvi as meninas cochicharem e rir. Atentamente eu ouvia cada som que elas faziam, e quando não ouvi mais nada, sabia que já tinham se escondido, mas resolvi contar até 40.

— 37, 38, 39, 40, LÁ VOU EU, QUEM SE ESCONDEU, SE ESCONDEU, QUEM NÃO SE ESCONDEU NÃO ESCONDE MAIS!

No momento em que eu estava indo procurar as meninas, papai apareceu.

— Filha, hora de subir. Está ficando frio, vamos. – Papai me segurava pela mão.

— Pera aí, pai. Tenho que achar as meninas.

— Vai então ache bem rápido. Sua mãe disse que quer falar com você sobre uma coisa que está na sua agenda.

Na hora gelei, mas não me lembrava de nenhum bilhete por lições incompletas ou não feitas. Continuei a “caça” incansável  á minhas amigas que durou por volta de 3 minutos.

— Puxa, demorou para nos achar, hein! –Brincou Grazi.

— Hahaha Olha que esconde-esconde é uma das brincadeiras que ela mais gosta! Vamos Melli, diga tchau á elas. – Papai cruzava os braços, parecendo estar com frio.

— Tchau! Até amanhã. – sorri.

Quinze andares acima, mamãe me esperava em casa com uma cara nada bonita. Minha bolsa aberta em cima da mesa da sala, minha agenda aberta do no dia de hoje... Ela costumava a fazer isso, mas eu ainda não via porque de ela estar brava.

— Filha, vem aqui... precisamos conversar. – Mamãe me sentou junto a ela no sofá.

— Não me bate mãe... Eu não fiz nada... – Abaixei a cabeça e a protegi com os braços.

— Fique tranquila, não vou te bater... – Ela parecia estar calma.

— Mas eu não fiz nada...

— Aqui na sua agenda tem um bilhete da sua professora, que diz que você não tem se comportado direito na escola.

— Mas eu não faço nada, mãe...

— Sim, é exatamente por isso que estou intrigada. Você nunca teve problemas com comportamento, até mesmo a diretora já disse isso. Eu não vejo motivo pra ela te dar bilhete... “A aluna não possui boa educação, e sempre chora quando possui dificuldades em alguns exercícios.”

O primeiro bilhete já foi o suficiente pra me fazer chorar.

— Ei Melli, não precisa chorar. Você não é uma criança sem educação... E esse problema com os exercícios, podemos resolver! Tudo tem solução, iremos conversar com ela pra saber sobre tudo isso, não se preocupe. – Mamãe acariciava meu cabelo.

— Pai... Eu não quero ficar burra...- Não parava de chorar um minuto sequer.

Minha mãe tentava se conter para não chorar juntamente comigo, enquanto meu pai tentava me acalmar explicando a situação.

— Vai lá tomar banho, tá? Seu piajama do piu-piu está em cima da cama, pode colocar ele porque hoje a  noite vai ser fria. – Dizia mamãe, enquanto continuava a folear minha agenda.

Para uma criança de 7 anos, eu já estava tendo problemas demais com a escola. Tentei esquecer tudo aquilo, e só me concentrava no meu pijama preferido, o qual eu usava em dias de frio. Era um pijama de mangas compridas, em que a blusa continha vários piu-pius e a calça era amarelo claro. Havia alguns meses que eu havia ganhado ele da minha tia Amy, e desde então não parei mais de usa-lo. Depois do banho, fui para a sala ligar a TV a fim de assistir algo até que a janta ficasse pronta. Novamente mamãe veio em minha direção.

— Então você foi convidada para um aniversário?

— Ah! Eu tinha esquecido. É da Sagi e do Sage, posso ir? – Fiz cara de cachorrinho pidão, querendo que o pedido não fosse recusado.

— Hmm... Papai, ela deve ir ao aniversário dos gêmeos? Você é bem amiga da Sagi, não é?

— Ela é minha amigona! A gente brinca junta todo dia lá na escola e todo dia a gente troca lanche.

— Mas é claro que pode! Eu não vejo problemas... - Papai respondeu.

— Que legal, hein! A mãe dela também é minha amiga. Nós nos falamos mui... AI! ESQUECI A COMIDA NO FOGO! – mamãe saiu “voando” igualzinho um foguete em direção a cozinha.

No outro dia... Na hora do recreio...

— Minha mãe disse que eu posso ir na sua festa, Sagi!

— ÊÊÊ! Que legal! Vai ter muita comida, você vai ver só!

— Eu não vou deixar você ir na minha casa, porque você é chata! – Sage apareceu.

— Ó pra você! – mostrei a língua pra ele.

— Sage, sai daqui seu feio! – Sagi empurrava o irmão.

— Não saio.

— Eu vou contar pra mãe que você tá enchendo o saco da gente.

— Conta...

— Sai daqui, vai... Vai brincar com o Paul. Ai, eu vou no banheiro, eu já volto! – Sagi se retirou dali.

Fiquei sozinha sentada no banco. Momento perfeito para o Sage dar uma amostra do quanto ele não gostava de mim.

— Oi feia! – Chegou jogando meus cabelos pra cima.

—Eu não sou feia, tá?- respondi.

— É sim!

— Não...

— Você não vai na minha festa, lalalalalala

— Eu vou...

— Olha que tiara feiosa!- Ele arrancou com força do meu cabelo

— AI! Me devolve.

— Vem pegar então. – Ele saiu correndo com a minha tiara nas mãos.

— Eu vou pegar! – Saí correndo atrás dele.

— Você é uma molenga, hahaha!

— Ai... Cansei. SAGE, ME DEVOLVE!

— Você quer?

— Quero!

— Então... Está aqui sua tiara. – Ele a quebrou em duas e me deu.

— Minha... Tiarinha vermelha...- comecei a chorar.

Ao quebra-la, Sage saiu correndo. Rapidamente, saí a procura de Sagi, que disse estar no banheiro. Cheguei lá tarde demais, ela já não estava mais lá. Quando estava quase desistindo, a encontrei junto de Alessa e Roxy no refeitório.

— SAGI, SAGI!

— Que foi Melli? Não grita sua doida. – Dizia enquanto embrulhava um pedaço de pão.

—Seu irmão quebrou... – mostrei a tiara em pedaços.

— Filho da mããããããããe!

Sagi avistou o irmão passando do lado de fora do refeitório ,e antes que pudesse correr, sua irmã o agarrou pelos cabelos e deu-lhe alguns cascudos. Sagi poderia ser uma menina alegre e de aparência meiga, mas era tão forte quanto um menino de sua idade. A guerra estava declarada! Após cair no chão, Sage levantou-se e pulou em cima da irmã que estava de costas. Era tapa pra cá, puxão de cabelo pra lá, arranhões... Eu ficava ali, imóvel assistindo a tudo aquilo, quando de repente, um tênis voou em direção á minha cabeça.

— É CULPA SUA, MELLI! – Sage gritava, enquanto sua irmã o puxava pela camiseta.

— Vem Melli, vamos sair daqui... Estou com medo. – Alessa me puxou.

Dado o sinal, todos entraram para a sala, menos Sagi e Sage.

— Eles foram pra diretoria! Ainda bem que você saiu de lá, voou comida pra todo lado! – Roxy contava tudo.

— Coisa feia... Eu quero minha tiara... - Choraminguei.

— Todos em seus lugares, ordem... ORDEM!- A professora chegou na sala, quebrando a conversa paralela.

Os alunos que estavam de pé, se sentaram e os que conversavam, cessaram.

— Amellie, a diretora quer te ver na sala dela.

Mais uma vez, estremeci. Desci as escadas, percorri o pátio todo até chegar ao prédio onde se encontrava a diretoria. O vento frio parecia fazer aumentar minha sensação de medo.  Cheguei até lá, bati três vezes na grande porta, e logo escutei uma voz assustadora dizendo “entre”.

— Licença Irmã Ernestina. - Disse timidamente.

— Ernestine. - Levantou-se de sua cadeira e fechou a porta.

Ao entrar, deparei-me com Sagi e Sage sentados de frente a mesa da diretora, a qual haviam alguns porta-lápis, porta retratos com emblemas da escola entre outras coisas. Logo atrás da mesa, certificados de algum tipo de curso, fotos e algumas medalhas. Ao lado, uma enorme estante estava cheia de livros. Era uma sala grande, que realmente me espantava a cada hora que olhava para um de seus cantos. Os gêmeos estavam cabisbaixos, cheios de manchas de geleia e resto de comida. Era uma cena lamentável. Eram tão pequenos a ponto de sentados naquelas cadeiras, não alcançarem os pés no chão, mas eram grandes o suficiente para causarem confusões.

— Amellie, pedi que te chamassem aqui para que me contasse o que houve. Então... Sou toda ouvidos.  - Irmã Ernestine dizia, ajeitando os óculos no nariz.

— É que o Sage falou que eu não ia na festa dele, ele falou que não vai me deixar entrar e aí ele me chamou de feia, e ele pegou minha tiara, saiu correndo e depois pá! Quebrou ela e eu contei pra Sagi e a Sagi bateu nele.

— Foi isso mesmo que aconteceu, Sage?

Ele abaixou a cabeça e olhou para o chão. Puxa, momentos atrás ele parecia ser tão durão, e agora parecia um cachorrinho com as orelhas baixas.

— Foi ou não?- A diretora insistia.

— Sim...-Disse com a voz e o olhar baixo.

— Amellie, pode voltar pra sala. E enquanto a vocês dois, saibam que a mãe de vocês vai ficar sabendo sobre o que aconteceu...

Saí de la, encostei a porta e ainda pude escutar a diretora conversando com os dois em um tom alto. Ela parecia estar mesmo furiosa. Voltei para a sala e timidamente abri a porta e coloquei a cabeça para dentro da sala.

— Venha Amellie, entre... – A professora dizia de sua mesa.

Entrei na sala com o tênis desamarrado, mas não percebi isso, e muito menos a professora. O resultado não poderia ser outro: tropecei nos cadarços e acabei caindo.

— Você não tem jeito mesmo, hein menina!- A professora me puxava pelo braço, enquanto me levava para a minha carteira.

— Doeu...

— Como eu estava dizendo, os animais carnívoros são aqueles que se alimentam de carne... - A professora continuava a aula, não se importando com a minha situação.

No final do dia, meu joelho continuava doendo e logo minha mãe notou que havia algo diferente em mim.

— Filha, o que é isso no seu joelho?

— É machucado...

— Onde você fez?

— Na escola... Eu tropecei no cadarço do meu sapato e caí.

— Não te levaram pra enfermaria? Quer dizer, sua professora viu que você se machucou?

— Ela só falou “você não tem jeito, menina...”

— Ela deveria ter feito algo. Cada vez mais tenho vontade de conversar com essa professora e cada vez gosto menos dela...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Primaveras" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.