Estou apavorada com o Cyrus.

Qualquer um com o mínimo de inteligência ficaria, mas, considerando que um dos meus pesadelos se tornou verdade na minha frente, então meu nível de terror estava um pouco elevador. Tínhamos voltado para o acampamento logo depois que Arya matou Drogomor e eu ainda não falei com o meu namorado! Eu não tenho a menor condição de falar com ele agora. Minha cabeça doía e nunca sairia da minha mente a sua imagem massacrando os gigantes. Claro que se ele não tivesse feito nada, iria morrer, mas a maneira como ele os matou foi um choque de realidade. Não parecia meu Cyrus! Era outra coisa ali. Um mensageiro da morte. Um assassino de sangue frio. Era aquele cara que meu pai teme e não quer que eu esteja perto dele. E é esse cara que eu tenho medo que meu pai chegue perto. Não temo por mim, mas por minha família. Ainda mais agora, que tenho consciência de que meus pais poderiam estar de fato mortos há dois anos. Eu quase morri pelas mãos dele, caramba!

Emma tinha dado alguns pontos no meu couro cabeludo. Arya estava lá fora dando pontos nos cortes que Stephan sofreu e a todo o momento ele praguejava alguma coisa e ela, como é a Arya, praguejava de volta. Eu estava de frente para a entrada da nossa tenda e tinha visão privilegiada dos dois. Eles eram quase fofos juntos. Arya estava limpando os ferimentos de Stephan com delicadeza e depois começava a dar os pontos. O embaixador de Master Great a observava trabalhar sem ao menos piscar uma única vez. Ele estava encantado por ela! Isso era óbvio na maneira como ele a olhava. Era quase com devoção. No inicio, quando comecei a perceber que ele a olhava dessa maneira, achei que era só atração física. Talvez no inicio fosse mesmo apenas atração. De qualquer modo, eles são completamente opostos: Ela é completamente transparente e ele é o mistério em pessoa.

—Por que você fica me olhando com essa cara?

Pergunta Arya, com o nariz delicado franzido. Não era nojo, talvez um incomodozinho. Stephan levanta uma das sobrancelhas negras, como se não tivesse percebido que olha por de mais para a jovem Raven.

—Essa é a única cara que tenho Arya.

—Quanta grosseria...

—Eu estava pensando em algo!

Responde desistindo de retrucá-la. Arya pareceu um pouco decepcionada com a falta de embate e pergunta:

—Você não vai discutir comigo?

—Odiaria te dar essa satisfação!

—Nojento!

—Já sou velho para ficar discutindo com você!

—Velho quanto?

—Velho.

—Por que você é tão evasivo?

—Como é que seu marido te aguentava?

—Não era ele que me aguentava, fui que o aguentei! Ele era um resmungão mal humorado!

—Mas você o amava!

—O amo! Meu coração ainda não se tocou que ele se foi! Aquele humano egoísta!

—Humano?

—Aspen Raven Scant! Nunca ouviu falar? Ele era egoísta! Orgulhoso! Perfeccionista! E aparentemente eu não valia a pena o suficiente para ele se tornar um Homo Superior!

—É claro que vale! Talvez ele estivesse inseguro! E não tinha um coração muito forte, você sabe...

—Sei... E como você sabe?

—Você fala enquanto dorme!

—E você me observa dormir?

—Talvez.

—Não sei se isso é fofo ou assustador.

Comenta Arya um pouco constrangida, colocando uma gaze em cima de um corte mais profundo, sem fazer o menor contato visual. Stephan dá de ombros casualmente, com um esboço de sorriso.

—Pronto! Você vai sobreviver!

—Obrigado.

—Da próxima vez, não brinque tanto.

—É mais forte do que eu!

Retruca Stephan com um sorrisinho no rosto enquanto Arya se distanciava, voltando para a tenda. Ela para e nos observa. Acho que eu e Emma estamos com aquele olhar de amiga desconfiada dos rolos secretos da outra.

—Nem vou perguntar.

Comenta, deitando na sua rede com os coturnos. Estava começando a amanhecer, e ao invés de seguir caminho iríamos tirar um cochilo. Isso atrasaria um pouco a viajem, mas se você luta contra gigante a noite ou sobreviver ao ataque de um, um cochilo leva preferência sobre continuar o caminho pela Floresta Negra. E eu estou um pouco tonta. Os gigantes não vão nos perturbar, já que Arya, uma baixinha de um e cinquenta e oito é a nova Rainha deles. Afinal, na cultura daquela tribo, se você mata o rei, se torna rei no lugar. Ela deixou um representante governando o local. O irmão mais novo de Drogomor, Domung. Ele parece legal para um gigante.

—Não precisa! Eu pergunto! Então... O que está rolando entre você e o Ladrão?

Pergunta Emma descaradamente, com um sorriso de quem já sabe o que está rolando. Arya fica completamente vermelha antes de responder rápido de mais:

—Nada.

—Nada?

—Nada!

Responde Arya tentando ser enfática, mas ela não estava fazendo contato visual. E a Arya não faz contato visual quando está mentindo. Não sei com certeza, mas shippo Sterya. Eles teriam filhos lindos. Claro que shippei Nirya, mas não deu certo, o Nico já é comprometido.

—Nada?!

—Nada. E quando eu digo nada, quero dizer nada, de absolutamente coisa nenhuma.

—Ah, é?

—Exatamente, ele é só um companheiro de viagem.

—Um companheiro de viagem bem sexy, olha aqueles ombros, aqueles braços, o abdome...

Comento como quem não quer nada. Stephan estava vestindo uma camisa cinza de mangas longas no exato momento, provavelmente ouvindo os papos, mas de qualquer modo não conseguiu pegar a expressão interessada da Arya enquanto dá uma conferida nele, antes dela responder:

—Ele é irritante.

—Mas você conferiu!

—Conferi? Você bateu a cabeça bem forte, Zoey.

—Eu vi também e não bati a cabeça, Arya.

—Quer saber, estou com sono! Boa noite, dia... Sei lá.

Resmunga, com as bochechas rubras, virando para o lado. Emma balança a cabeça e revira os olhos ao comentar:

—E eu achando que ela ia confessar.

—É a Arya.

—Sim, é a Arya. E você?

—Eu o que?

—Não vai falar com o Cyrus?

—O que?

—Vocês não vão conversar sobre o que teve hoje? Por que ele não está entendendo.

—Não tenho nada a conversar!

—Arregona.

Comenta Arya com tom de superioridade, com apenas um dos olhos abertos. Logo ela que não confessa sua atração pelo Stephan. Cruzo os braços impacientemente e pergunto:

—Você não estava dormindo?

—Estou dormindo.

—E falando comigo?

—Sou um ser evoluído, querida.

Responde sinicamente e vira-se novamente para o lado. Ser evoluído nada, ela é um ser sínico, isso sim. Emma estala os dedos em frente ao meu rosto, tentando voltar àquela conversa sobre o Cyrus, e pergunta:

—E você vai adiar até quando?

—Até depois de um merecido descanso, bom sono, Emma.

Digo deitando na minha rede e cobrindo a cabeça par anão ser incomodada. Meu coro cabeludo estava dolorido! Nem vejo quando durmo de exaustão.

**

Voltamos a caminhar de manhã cedo, depois de um dia de sono. Não falei, sorri ou se quer olhei para o Cyrus hoje, contudo logo terei que falar. O Cyrus é como uma sombra me rondando. Não o vejo, mas sei que está lá, me observando, desejando falar comigo, me dando um tempo. O que eu vi não deveria me afastar tanto dele. Era auto defesa, não é? E não foi nem a pior coisa que vi na vida. Arya explodiu a cabeça de Nyx. Centenas de pessoas morreram ano retrasado, devorada por Sauters. Meu pai assassinou Derek Trouble há dez anos para me proteger. Meu tio Alef é um Dark. Até onde sei sou cercada de gente sangue frio o suficiente para matar se for necessário. Pior, eu os amo.

Tinha algo nos olhos dos Cyrus quando ele matou aqueles gigantes. Algo assustador, que está me fazendo pensar duas vezes antes de falar com ele. A pior parte disso tudo era que o “algo” era o nada. Nem um vislumbre de remorso, emoção, se quer medo. Uma frieza extraordinária. Aquilo me assustou. Eu vi pânico em meu pai, vi hesitação na Arya, vi trevas em Alef, mas em Cyrus não vi nada.

— Eu não vou machucar você!

Sussurra Cyrus enquanto caminhávamos, sua respiração em minha nuca. Só de ouvir a voz dele, arrepio completamente. Como se eu não soubesse disso. Como se eu não soubesses que ele faria de tudo para me manter segura. Faria coisas que até eu desaprovasse. Eu vi isso com os meus próprios olhos, apesar da frieza de seus atos.

—Eu sei!

—Então por que não olha para mim?

—Não sei.

Respondo sem se quer sabendo exatamente o que estou temendo. Não, de certo modo eu sabia. Só não queria admitir. Eu tinha medo da frieza. E se um dia ela se voltasse para minha família? Para meu pai? Quem ia pará-lo? Quem ia impedir o Mensageiro da Morte? Ninguém com um mínimo de cérebro. Ninguém que eu conheça. E se eu morrer? Não vão existir esperanças para ele? Vai ser um coração completamente gelado? São tantas perguntas sem respostas, pior, são tantas perguntas que não quero saber da resposta.

Cyrus fica em silêncio. Ouço sua respiração, quase consigo sentir seu calor, mas mesmo assim, ele fica em silencio.

—Você sentiu alguma coisa?

Pergunto por fim, sem olhar para ele. E se eu olhasse e não visse o calor que seus comumente emanam quando me encaram? E se fosse apenas gelo? Não gosto do gelo. Meu pai pode ser um Gélido, mas eu não sou. O gelo é cruel. Silencioso e tão frio que dói.

—Não.

—Nem um pouquinho de remorso?

—Quando você tira uma vida, independente de qual seja, Zoey, ou do por que, um pouquinho da sua alma vai junto. Tenho que viver com minhas escolhas, independente de quais são! Não sairia da cama se sentisse remorso por defender minha vida.

—E o meu irmão! Você sente remorso por tê-lo conduzido a morte?

—Se eu tivesse a mínima ideia do que estava fazendo na época, não teria feito.

—Quantas vezes você fez isso?

—Você não vai querer números sobre isso!

—Na verdade, quero! Você é muito novo para ter um numero tão grande!

—Em questão de vida, Floarea Mea, um é muito! E pelo amor de Deus, Zoey, olhe para mim.

Exige levantando segurando meu queixo e levantando minha cabeça delicadamente. Demoro um pouco até levantar os olhos. A tempestade estava lá, graças a Deus!