O Curioso Caso de Daniel Boone escrita por Lola Cricket, Heitor Lobo


Capítulo 27
Bad Blood


Notas iniciais do capítulo

TAYLOR SWIFT VOLTOU! TAYLOR SWIFT VOLTOU! Pelo menos para os capítulos dessa fic, ela voltou. No mundo musical a gente só teve I Don't Wanna Live Forever mesmo. Mas fazia um bom tempo que eu não usava músicas dela, não é? Felizmente temos "Bad Blood" - versão solo, que combina mais com o capítulo - para quebrar esse grande hiatus.
E o uso dessa música não poderia vir em hora melhor: finalmente DESCOBRIREMOS COMO OCORREU A FACADA E QUEM METEU A FACA! De verdade, sem parágrafos cortados, sem mistério. Na lata. Agora. É tudo ou nada.

Por isso nem vou me pronunciar tanto nestas notas iniciais. Sei que vocês estão desesperados para engolir essas 7 mil palavras e provavelmente não vão dar a mínima pro que eu escrever aqui, então sem mais delongas...
Boa leitura.
E boa recuperação pós-ataque cardíaco ;)



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“Pois, querido, agora temos uma rixa. Você sabe, costumávamos ser um amor louco, mas dá uma olhada no que você fez… Agora temos problemas, e eu não acho que podemos resolvê-los. Você fez um corte profundo, e agora temos uma rixa. Você tinha mesmo que fazer isso? Eu achei que você era confiável. Você tinha que me atingir no meu ponto fraco? Querido, eu mal conseguia respirar. Você achou mesmo que ficaríamos bem? Ainda tenho cicatrizes em minhas costas de suas facadas. Então não pense que ficou no passado; esse tipo de ferida dura e está durando agora. Oh, é tão triste pensar nos bons momentos entre você e eu…”

— Taylor Swift, “Bad Blood”

Washington, D.C.

16 de Abril de 2016

Minutos antes da facada que pode ou não ter me matado

Anteriormente, nessa porra…

Eu não sei de muita coisa sobre o Furler à minha frente. Eu não sei que tipo de comida ele odeia. Eu não sei o que ele gosta de fazer quando ninguém está olhando. Eu não sei qual a sua matéria favorita na escola. Eu não sei de seus medos e suas qualidades. Eu não sei se ele já amou alguém na vida. Mas, no momento, só sei de duas coisas. Coisa número 1: ele não quer machucar a mim ou meus sentimentos, e já deixou isso bem claro duas ou três vezes. Coisa número 2: eu quero conhecê-lo de verdade, quero abraçá-lo, quero sentir seus lábios, seus braços envolvendo meu corpo, sua voz cochichando em meu ouvido… eu o quero perto de mim como nunca quis ninguém antes. Parece ser apenas um desejo carnal? Parece. Mas eu preciso tentar.

Então, sem pensar duas vezes, quebro o espaço entre nós e o beijo. Minhas mãos bobas vão de encontro ao seu pescoço ao passo que as suas se concentram em minha cintura. O gosto de seus lábios nunca me atraíra tanto como agora. Nem mesmo no beijo de horas atrás, a intensidade fora dessa forma. Realmente há uma energia diferente agora enquanto aprecio a extensão de sua boca com a minha língua e… e esse parágrafo é quase erótico de tanto eu tentar descrever um fodendo beijo.

Até que finalmente nos separamos e encostamos nossas testas uma na outra.

Sua felicidade é visível. Eu aqui achando que ele não poderia abrir um sorriso maior que aquele feito lá no apê do meu tio… estava completamente errado. Seus olhos emanam um brilho que eu nunca havia visto antes. Suas mãos, que outrora apertavam minha cintura, agora rodeiam minhas costas.

Isso me lembra da vez que o Peter Zaslavski chegou em mim e perguntou: “Daniel, por que a gente fala “costas” se só temos uma no corpo?” Foi uma pergunta válida. Tão válida que até hoje não consigo respondê-la. Talvez o pai do garoto à minha frente saiba a resposta, já que este acaba de explorar essa região do meu corpo muito bem.

De novo, o que merdas está havendo comigo hoje?

Nosso momento é interrompido por palmas batidas entre espaços de tempo mais longos que o usual. Meu sorriso esmorece ao olhar para o lado esquerdo e ver quem é o autor dos aplausos dramáticos que está a nos observar agora. E ele não está sozinho. Tem duas garotas ao seu lado direito e um menino do lado inverso, que reconheço ser Jared Trevisan.

— Bonito… que bonito, hein — Shawn Graham Hans interrompe o movimento de suas mãos. A ironia estampada em seu rosto poderia ser notada lá do Brasil — que cena mais linda! Será que eu estou atrapalhando o casalzinho aí?

E isso foi o que você perdeu em… Glee! Não, espera. É só a minha vida de merda.

As bochechas de Klaus se encontram avermelhadas e um vinco está presente entre suas sobrancelhas quando finalmente põe os olhos em Shawn Hans. Diferente de todos os outros dias, o moreno com sorriso arrogante parece chateado com a situação e os braços estão cruzados em seu peito que respirava com rapidez.

— Juro que vou... — Klaus faz menção de avançar em direção a Shawn, mas consigo ser rápido o suficiente e agarro o seu braço.

Ele para imediatamente e os olhos que expressaram tanta compreensão segundos atrás agora estão obscuros. Está evidente em seus atos como postura que ele está chateado com a situação. E quer resolver sozinho isso.

Mas, apesar de eu adorá-lo infinitamente e pelas diversas coisas que fez por mim nas últimas horas, Shawn Hans é um assunto meu. Somente eu posso resolver esse caos que começou muito antes de eu conhecer Klaus.

— Me deixa resolver isso, Klaus — seguro suas mãos e faço uma mínima pressão com os dedos. — Por favor.

Dou um passo em direção a Shawn e respiro fundo. Por quanto tempo esperei por aquele momento? Quantas vezes eu fechei os olhos e imaginei enfrentar aquela batalha? Infelizmente — ou não — de todas as maneiras que formei na minha mente aquele momento, nunca esperei que fosse acontecer em uma festa. E justamente com Klaus, um dos grandes amigos de Shawn, me defendendo com unhas e dentes.

O garoto o qual ferrou tanto com meus sentimentos e vida está diante de mim carregando um sorriso arrogante nos lábios e as sobrancelhas balançam em minha direção. Ele estava se divertindo com tudo aquilo.

Que ridículo.

— Essa cena realmente me surpreendeu — Hans debocha, apontando para nós dois com desprezo. — Justamente você, Klaus, um dos meus melhores amigos se metendo com Daniel? Eu confiei em você, amigo. Confiei os meus mais sujos segredos.

Klaus revira os olhos e se controla para não despejar uma coletânea de palavrões os quais eu desconheceria da existência de pelo menos 50%.

— Você é sujo por inteiro, Shawn — ele vocifera e noto como Shawn se encolheu diante da escolha de palavras do amigo. — Não venha por a culpa em mim por seus erros ou por ser um completo babaca.

— Eu? O babaca? — seu tom de cinismo faz uma fagulha de raiva se acender dentro de mim. — Olhe para vocês dois! Olhe para o quão patéticos são juntos!

Desvio o olhar para Klaus que estava agora quase do meu lado. As mãos estão pressionadas em punho e uma pequena ruga está presente entre suas sobrancelhas. Não era somente eu que estava prestes a explodir; o estado de Klaus era tão semelhante ao meu.

— Patético é você usar as pessoas — respondo depois de alguns segundos em silêncio. — Mais patético ainda é você usar as pessoas e depois jogá-las fora apenas para se sentir superior.

— E eu sou! Cacete! — as mãos pressionam a testa suada e ele emite uma risada fraca. — Eu posso acabar com vocês dois. Posso contar para o pai perfeito que o filho mais perfeito ainda é na verdade um fracasso. Eu posso arruinar a sua vida, Klaus.

— Não, você não pode — aponto o dedo para Shawn. — Você não pode arruinar a vida dos outros só porque a sua é uma completa porcaria. Se isso faz você se sentir melhor... Você está sendo ridículo!

Shawn revira os olhos e cospe no chão. Jared Trevisan, que está ao seu lado, faz uma cara de repulsa e volta a fulminar Klaus com o olhar.

— Como se a sua vida também não fosse uma porcaria, Daniel — meu nome sai com tanta repulsa de seus lábios que meu estômago chega a se contrair. — Quantas vezes você lamentou a religião de seus pais? Quantas vezes você lamentou não poder se assumir? Quantas vezes serão necessárias para você perceber que eu posso sim arruinar com o que restou de bom em sua vida?

Sendo o limite para mim, dou mais um passo em sua direção e olho para cima lamentando os poucos centímetros que ele era mais alto que eu e fito aquelas esmeraldas malditas cheias de segredos e repletas de dor.

E é quando percebo.

Apesar de toda a máscara de macho alfa, o inabalável e indestrutível Shawn Hans possuía sentimentos. Mínimos, mas que estavam evidentes naquele momento. Por todas as vezes que passamos juntos, pelas conversas banais e momentos íntimos, Shawn estava magoado com o que vira. Estava magoado com o fim que estava tendo todos aqueles meses que ele me iludiu e também me usou.

Shawn Graham Hans estava magoado porque eu encontrara algo melhor. Algo pelo qual valia a pena lutar.

— Você. Não. Pode. Mais. Me. Arruinar — digo pausadamente batendo com o dedo em seu peito a cada palavra. — Eu arruinei a minha família sem a sua ajuda, Shawn. Eu assumi o que sou. Assumi o que sinto. Só falta você ser maduro o suficiente e assumir o quão ridículo conseguiu ser todos esses meses.

As minhas palavras parecem — finalmente — surtirem efeito e Shawn se cala. Ele está estático em seu lugar e Jared o encara sem saber o que dizer além um sonoro “WOOWW”. Pela primeira vez em meses eu finalmente conseguira desarmar não somente o pior garoto que já conheci, mas também toda a sua matilha.

Nesse exato momento, Charlotte Evans surge de uma das portas e encara a situação com as sobrancelhas grossas franzidas. Ela usa um vestido extremamente justo e uma maquiagem exagerada para um rosto tão jovem.

— O que o boiola do Daniel está fazendo aqui?

Reviro os olhos. Ela era tão patética que dava vontade de vomitar.

— Digo o mesmo de você, Charlotte — Klaus rebate. — Quem foi o idiota que te convidou?

Charlotte fica inquieta e volta a me encarar.

— Achei que tinha deixado o Shawn em paz — ela se aproxima do seu objeto de conquista e massageia os seus ombros tensos. — Ele não te quer, Daniel. Aceite isso.

— Da mesma forma que não vai querer você daqui a alguns anos — aponto sugestivamente para o seu corpo. — Isso é o melhor que você consegue fazer? Se ele me usou, porque não usar você também?

Charlotte se cala, os olhos se contraindo em desconfiança e o lábio pintado de vermelho começa a tremer.

— Você faria isso?

Shawn não responde, apenas desvia o olhar e fulmina Klaus com o olhar.

— Ele não tem nem a decência de confirmar, Charlotte — dizer finalmente seu nome parece errado depois de tanto tempo. — Shawn vai cansar de você. Vai te iludir você até o brinquedinho tornar-se obsoleto.

Charlotte parece precisar de um momento para absorver as minhas palavras e decidir se deve aceitá-las ou não. Ela encara tanto a mim, Klaus e Shawn, os olhos vagando para os três corpos estáticos naquele pequeno espaço com a melodia da música retumbando em nossos ouvidos.

Finalmente ela respira fundo e se volta para o garoto Hans.

— Shawn? — Seu tom de voz é manhoso e tristonho.

Ele sorri e afaga o seu rosto.

— Sim, Charlotte — ele confirma com um balançar de cabeça — Sim para todas as suas perguntas ruins sobre mim.

Foi o que bastou. E segundos depois um estalo seguido de um gemido de dor. Abro os olhos minimamente e vejo a marca dos dedos magros de Charlotte no rosto de Shawn Hans.

Apesar de ela ser pequena e possuir uma expressão ingênua, era uma megera e se comportava como uma cobra.

— Daniel... — Ela se volta para mim e respira fundo, abrindo um pequeno sorriso de canto — Obrigada.

Assim que Charlotte vira as costas e some de vista, Matthew Vaughn abre uma porta das diversas do corredor que estavam fechadas e encara a situação com os olhos semicerrados. Ele tem uma estatura baixa, cabelos médios e um sorriso acolhedor. Ao seu lado está uma garota da minha sala que parece não acreditar na cena diante dos seus olhos.

— Shawn? — Ele chama pelo amigo, mas tudo o que recebe é um dedo do meio como resposta. — Jared, saia daí, cara.

O Trevisan com cabelo cor de mel revira os olhos e segue o casal em direção as escadas, sumindo de vista. Shawn em todo esse momento se manteve quieto, mordendo a cutícula do dedão e provavelmente pensando em alguma resposta que fosse capaz de nos derrubar.

— Tudo bem — ele respira fundo e pousa a mão em meu ombro. — Se eu não posso arruinar mais com a sua vida... Por que não arruinar a sua, Klaus? Meu melhor amigo... Que nunca foi amigo, de fato.

— Você não merece possuir nem um terço dessas amizades que tem — Klaus rebate enquanto agarra o braço de Shawn e o empurra para longe de mim. — Você não merece o sobrenome que carrega, Hans!

Isso é o limite para Shawn e ele bate com força o punho na parede e grita. Grita alto. Grita como se sua vida dependesse disso. Grita para libertar tudo o que estava preso dentro de si.

— Deixa a minha família fora disso, Furler! — Suas mãos passam nervosas pelo cabelo escuro e o bagunça todo. Preciso reprimir ao instinto de me encolher ou sair correndo durante seu momento de raiva. — Esquece tudo o que falei sobre ela. Esquece tudo o que falei sobre o meu meio irmão! Esquece até mesmo que só ando com você para conseguir uma boa nota com o merda do seu pai.

O impacto de suas palavras faz o meu mundo sair de órbita. Eram tantas informações ditas em somente um momento que preciso me apoiar na parede para voltar a respirar normalmente.

Klaus e Shawn ainda estão discutindo, mas só consigo ver os dois como um completo borrão diante de mim e a voz de Shawn se sobressaindo em minha mente. A voz desta vez é diferente de todas as outras vezes.

Repleta de caos. Repleta de dor. Repleta de segredos de um passado doloroso.

— Cala a boca — digo pela segunda vez naquele dia e levanto o olhar para o moreno que estava prestes a desferir um soco em Klaus. — Cala essa sua maldita boca, Hans. Eu estou farto de você. Farto de suas brincadeiras. Farto de sua existência! Pode ameaçar a gente quantas vezes quiser, mas se você já odeia a sua família... A gente vai a fazer desmoronar diante dos seus pés. E você vai se arrepender de ter dito que poderia ser a destruição em pessoa.

— Ah, que engraçado — responde irônico e volta a se aproximar. As mãos firmes agarram o meu rosto e Shawn me encara com desprezo. — E o que você vai fazer, Boone? Vai espalhar cartazes dizendo que sou uma cópia mal feita de Travis Maddox? Vai dizer que eu sou uma pessoa pior que Hardin Scott?

— O que eu vou fazer não lhe diz respeito — agarro o seu punho e empurro para longe. — Só não tenta estragar a vida do Klaus, porque você vai se arrepender.

Shawn respira fundo e encara Klaus do outro lado, com o corpo encostado na parede e respirando com dificuldade. As bochechas ainda estão avermelhadas e os lábios pressionados em uma linha reta.

— E desde quando você liga para esse derrotado? — Aponta para o filho do professor e cospe as palavras com rispidez. — Desde quando você liga para alguém além de mim, Danico?

A cada palavra de Shawn mais o meu desprezo por ele aumentava. O que, de fato, é uma coisa que jamais imaginei que aconteceria. Por meses, semanas e dias eu nutria uma idealização perfeita sobre Shawn Hans. Idealizei uma versão dele que não chega nem perto da qual estou vendo agora. O filho revoltado e cínico era algo que eu não esperava, e para mim ele sempre seria o garoto cafajeste. Nunca o filho derrotado.

— O Klaus que eu conheço é diferente da sua versão dele — minha voz finalmente está calma e encaro o rosto de Shawn enquanto digo cada uma dessas palavras. — Fora que ele fez em uma noite o que você não fez em mais de dois anos, seu babaca.

É nesse momento que o caos nos consome. Que a fúria de Shawn Hans é tão grande que chega a cegar os ingênuos. As mãos batem com força na parede e empurram os objetos de vidro que descansavam em um balcão mais ao longe. Ele chuta a porta. Grita. E grita de novo. Grita até os seus pulmões doerem.

— Eu sou um babaca mesmo, Daniel — Shawn para, respira fundo e olha maleficamente para mim. — Eu o iludi de todas as maneiras possíveis. O fiz criar cenas na cabeça que nunca, e repito, NUNCA, irão acontecer. E por que eu fiz isso? Por qual motivo, eu, um babaca de primeira linha, me envolveria com um fracassado como você? — Reprimo a vontade de gritar quando ele diz isso. — Eu o queria ver quebrar a cara em seu primeiro romance. E comigo ainda! Com um cara que passa cada final de semana enchendo a cara e descobrindo o que as garotas podem lhe oferecer!

— Shawn... — Klaus usa um tom calmo muito estranho para a situação.

— Me deixa falar, cacete! — Shawn finalmente fixa os olhos em mim, caminha em minha direção e diz em um tom suave, mas ameaçador — Eu o quero o mais longe que puder estar de mim. O mais rápido possível.

É esse momento que noto Kian e Raven atrás de Shawn e o pé da loira acertar justamente o meio das pernas do moreno. Ele despenca de joelhos diante de mim e fecha os olhos com força e algumas lágrimas surgindo minimamente.

— Vai embora, Daniel — Raven empurra o meu ombro enquanto Kian sussurra alguma coisa no ouvido de Shawn. — Vai embora antes que isso acabe mal.

Percebendo que não saio do lugar minha amiga respira fundo, abraça rapidamente os meus ombros e sussurra em meu ouvido “Corre. Corre enquanto você ainda tem tempo. E sobreviva”.

E eu faço o que ela pediu. Desço as escadas correndo enquanto tento desviar de todas aquelas pessoas festejando que não tinha um mínimo acontecimento de tudo o que aconteceu. Quando finalmente chego ao jardim bem cuidado da casa, caio de joelhos no chão e tento respirar normalmente.

Não era apenas o meu pulmão que doía, mas o meu coração. Eu ouvira aquilo que nunca imaginei ouvir, e também falei coisas que nunca desejei ter dito. Só que eu também falei coisas que estavam presas dentro de mim por quase dois anos, e também defendi uma pessoa que mal conhecia.

— Daniel — a voz de Klaus surge atrás de mim e olho de relance para trás enquanto o garoto de estatura média caminha em minha direção. — Eu...

— Está tudo bem, Klaus.

Ele concorda e se senta ao meu lado. Vejo por sua expressão que ele estava tão apavorado quanto eu. Não por ter enfrentado Shawn Hans depois de tanto tempo, mas por perder um amigo e ter sido ameaçado de diversas formas.

— Ele não vai contar para o seu pai — afago o seu braço tentando abrir um sorriso solidário. — Ele não teria coragem.

Klaus assente em concordância e deita a cabeça em meu ombro. Sorrio minimamente sabendo que ele jamais viria e encaro as poucas estrelas que eram possíveis ver naquela cidade.

— Precisa de uma carona? — Klaus finalmente pergunta depois de vários minutos em silêncio.

Quando viro meu rosto para respondê-lo, nossos narizes se esbarram delicadamente e deixo um suspiro escapar por meus lábios. Por que eu demorei tanto para percebê-lo?

— É uma proposta tentadora — digo meio envergonhado quando a mão fria toca meu quadril. — Mas acho que devo uma ligação para o meu pai.

— Tudo bem — ele bagunça os meus cabelos enquanto se levanta. — Vou deixá-lo um pouco sozinho e ver como Raven e Kian estão.

Concordo com um aceno e pego o meu celular que esteve no bolso da minha calça jeans esse tempo todo. Disco o número de Aaron que atende na segunda chamada.

— Onde você está, Daniel? — O seu desespero é evidente. — Andrew e eu procuramos você por todo o apartamento e...

— Eu estou bem, pai — fecho os olhos com força engolindo o choro. — Você pode vir me buscar?

Passo para Aaron o endereço e quando finalmente desligo deixo que as lágrimas percorram o meu rosto. Deixo que elas umedeçam a minha pele quente e que se choquem contra a minha camiseta. Deixo toda a dor daquela noite se manifestar naquele momento.

Como eu fora ignorante a ponto de imaginar que Shawn Hans — o babaca egocêntrico — nutriria qualquer sentimento por mim? O fato de saber a resposta não ajuda o meu estado e preciso reprimir ao instinto de correr novamente para dentro da casa e procurar por ele.

Naquele momento, sentado no chão, com gosto de bebida na boca e com o coração perdido, começo a relembrar de todos os momentos que passei ao lado dele. De quantas vezes eu percebera o caos que ele era como pessoa, mas mesmo assim preferi me manter ali.

Eu fui consumido pelo caos. Pela dor. Pelas decepções.

Eu me tornara uma decepção no momento em que me apaixonei por ele.

Olho sob meu ombro para a casa iluminada atrás de mim e todas as pessoas festejando algo banal demais. Talvez Kian e Raven estivessem bem. Talvez Shawn estivesse esquecido tudo o que aconteceu e agora seus lábios estavam juntos ao de outra garota. Talvez Klaus tivesse percebido o erro que cometeu e agora estivesse brindando aos desastres com os seus amigos. E talvez Charlotte tivesse encontrado uma amiga para confortá-la.

Estapeio o meu rosto por estar pensando em todas aquelas pessoas e por ter pensado que Shawn Hans poderia corresponder os meus sentimentos. Claro que não faria, Daniel.

Levanto a cabeça olhando para a Lua e lamento por todas as vezes que acreditei nas promessas e brincadeiras de Shawn, e principalmente por todas as vezes que achei que ele poderia me fazer feliz.

O vibrar do celular é o que me faz desviar o olhar do céu e encarar o visor com o nome do meu pai brilhando na tela. Atendo a ligação procurando falar o mínimo possível.

— Estou na esquina da rua te esperando — avisa sem mais nem menos e desliga novamente sem me dar a oportunidade. Mas foi melhor assim, pois eu não saberia se seria capaz de dizer qualquer palavra naquele momento.

Levanto-me do chão, guardo o celular no bolso da calça jeans, bato a sujeira da grama e rumo a passos lentos em direção à esquina.

— Daniel, espere!

Sinto um gélido vento ricochetear em minhas costas após ouvir aquela voz. Resolvo não me virar para ver quem era, porque já sei o que vou encontrar caso me vire. Pelo contrário, continuo seguindo meu caminho para a entrada do condomínio, na qual meu pai Aaron já me espera para voltarmos ao apartamento de meu tio Andy. Mas antes que eu dê o terceiro de quase cinquenta passos — a casa de Phoebe é quase no fim da rua sem saída — uma mão forte me segura no braço esquerdo e me faz virar a fim de encarar o rosto suado de Shawn Hans.

— Precisamos conversar — ele diz, e seu tom de voz parece urgente.

Mas eu não vou ceder tão fácil assim.

— Não temos nada para conversar, Shawn — tento me desvencilhar de sua mão, mas o esforço é em vão, já que ele criou músculos de uma forma que com certeza não foi academia (eu saberia se fosse assim) e com isso não me soltava de jeito nenhum.

— Olha, me desculpa pelo que houve lá dentro, tá? — Ih, vai começar o draminha — Eu posso até ter bebido todas, mas ainda estou sóbrio o suficiente pra entender agora que eu fiz merdas muito grandes contigo. Desculpa… por favor, eu ficaria muito mal se você não me perdoasse.

— O que te faz pensar que eu te perdoaria agora, Hans?

— Por favor, Daniel, me entenda — bipolaridade é um efeito colateral de se estar bêbado? Porque nada justifica a mudança de mente dele em tão pouco tempo — eu não quis dizer todas aquelas coisas. Foram os ânimos do momento.

— Ah, então você estava animado para esfregar na minha cara o que eu já sabia? Nossa, isso muda muita coisa!

— Eu me importo com você, tá? Só falei aquelas merdas todas lá dentro porque te ver com o Klaus me deu uma agonia bem aqui — apontou para o próprio coração — e foi como se vocês dois tivessem me machucado. E o Jared estava bem do lado, e ele sim não dá a mínima para você. Eu estou fora de mim, Danico, por favor, me perdoa…

— Você não viria até aqui, com álcool até a última gota de sangue, me pedir perdão se a Boa Sorte, Charlie não tivesse terminado com você e se não tivesse levado um chute bem nas suas bolas podres, certo? — Franzo as sobrancelhas. Estou perdendo a paciência e não vou esconder isso — Mas eu já aguentei dois anos aqui. Desde 2014 que eu venho lidando com essa barra que é gostar de um canalha e passador de rodo chamado Shawn Hans, e o que você fez pra melhorar a si mesmo nesse tempo todo? O que você fez?

— Você não tem ideia, não é?

— Do quê?

— Do quanto eu mudei nesse tempo.

— Ah, tá… na verdade, eu até que tenho uma ideia do quanto você mudou nesses anos, Shawn — ele finalmente solta meu braço — antes de eu ter certeza de que gostava de você, eu não fazia ideia de como você era. Só via seus amigos com ego inflado pra cima de você, só via aquelas garotas praticamente esfregando os lábios delas nos seus, só via um cara que reprovou duas vezes por motivos que eu preferi não saber pra não afetar o que sentia — o moreno à minha frente franze as sobrancelhas — no ano seguinte, teve aquela coincidência de trocarmos de escola e de transporte de novo. Aí eu pude te conhecer mais…

— E o que você viu em mim? — Pergunta, mas sei que ele não está me notando tanto pelo fato de que deve haver algo atrás de mim e ele prefere encarar isso a encarar a mim e minhas palavras.

— O mesmo que eu vejo agora — digo, em tom de desprezo — um canalha, que quando não consegue o que quer, desconta essa raiva em bebidas e garotas à parte. Um cara que dá valor à família, mas não valoriza as outras pessoas que se importam contigo — faço uma breve pausa quando noto que ele estava prestando atenção em mim — Shawn, eu sempre estive lá pra você e por você. Tipo, o tempo todo. Você me menosprezava na frente das pessoas, mas no dia seguinte lá estava eu de volta aos seus braços e procurando por mais demonstrações de afeto como aquelas que você fazia quando bem entendia. Eu sempre estive lá e você nunca notou isso.

— Eu notei, está bem? — Ele reage, e seu rosto começa a ficar vermelho muito provavelmente por conta da raiva que causei — Eu sempre via o brilho nos seus olhos quando a gente se encontrava, Daniel — eita, porra, ele não me chamou de Danico e isso significa que o jogo vai ficar sério daqui em diante — mesmo antes de você me mandar aquela mensagem, eu já sabia que você sentia algo por mim. Até porque estava meio na cara só pelo jeito que você me olhava e tentava conversar comigo. Você não sabe disfarçar nada.

Percebo que sua raiva repentinamente passou e ela dá lugar a um sorriso de lado. Daqueles que sempre me fizeram procurar por um hospital onde eu pudesse me colocar em coma. Vai por mim, os sorrisos de lado dados por Shawn Hans são destruidores a esse ponto.

— Se você notou tão cedo, por que não me disse antes? — Me surpreendo com minhas próprias palavras… mas logo em seguida noto que eu preciso soltar o que está preso em minha garganta — Poderia ter me poupado anos de sofrimento, sabia? Por três vezes, eu tentei esquecer o que sentia por você, Shawn. Nessas três vezes eu aprendi a viver só com a metade que pertencia a mim, e quando eu te via de novo, quando você vinha pedir por mais afetos de novo… todo o trabalho que eu tinha pra te esquecer ia direto pro lixo. E agora você está aqui, poucos minutos depois de me humilhar publicamente dizendo que nunca me quis de verdade, e pedindo desculpas pelo que falou. Eu não sei mais em qual versão de Shawn Graham Hans acreditar: aquela que fala sinceridades quando bebe ou aquela que dá uma de Justin Bieber e pede desculpa logo depois das burradas que faz. Quem é você de verdade, Shawn? Qual dessas versões representa o seu verdadeiro estado mental? Qual delas te simplifica?

Sua boca abre e fecha a toda hora, como se ele quisesse dizer alguma coisa, mas não conseguisse encontrar as palavras certas para dizer. Meus punhos já estão cerrados, e não sei o porquê disso. Mas eu crio coragem para levantar a última questão.

— Quem você pensa que é, andando por aí, deixando cicatrizes, colecionando um jarro de corações e despedaçando o amor afora? — Ponho as mãos nos bolsos, pra não deixar claro que eu estava quase dando um soco nele por todos os anos de negligência — Onde você esteve quando eu mais precisei do seu apoio? Por que você não veio atrás de mim deixar claro que ao menos sabia que eu gostava de você, Shawn? Você por acaso tem ideia do quanto eu sofri por te amar em segredo?

— V-você me ama?

Puta merda. Porra. Caralho. Filha da putisse, a minha! Não devia ter dito isso.

Mas agora preciso arcar com as consequências. Falei, tá falado.

— Mais uma coisa que você não notou em mim — lágrimas insistem em sair de meus olhos. A emoção era demais, eu não ia aguentar tanto tempo em pé — eu gosto de você a ponto de te amar, Shawn Hans. E eu não mereço passar por isso.

E começo a andar para trás, fazendo menção de ir embora e deixá-lo ali pensando em toda essa discussão. Mas antes que eu me vire, o cara de elfo grita:

— Eu gosto de você, porra! Eu realmente gosto, tá?

Senti meu rosto congelar diante do que acabara de ouvir. Então isso é real? Por favor, alguém me dá um tapa bem na cara e destrua meu óculos emo gótico depressivo, porque eu preciso de um tapa mesmo. Não consegui mover um músculo sequer. Shawn também não. Na verdade, ficamos absolutamente parados por intermináveis segundos, pensando no que fazer agora que nossas dúvidas foram – cruelmente – sanadas e não há nada que nos impeça de cometer uma atitude que outrora seria uma total loucura.

Fechei os olhos, contei até dez mentalmente e respirei fundo. Era uma mania minha; se eu não fizesse isso, já teria surtado, xingado Deus e o mundo e provavelmente meus pais estariam ligando para uma clínica psiquiátrica. Ou não, minha mãe ao menos não liga pra minha existência desde que a verdade sobre mim fora revelada a ela. E meu pai e tio Andy seriam os únicos que poderiam ligar pra um hospício. Mas eles se importam demais comigo para tal, então esquece.

Meus pensamentos foram interrompidos pela voz dele.

— Eu sei que vou me arrepender bastante disso depois, porque as pessoas vão falar disso eu vou negar porque essa é a natureza de um enrustido. Mas neste momento aqui, eu estou pouco me lixando pra essas pessoas e apenas sinto que preciso fazer isso.

Normalmente, quando esse tipo de coisa é dita, logo pensamos que vai rolar um beijo apaixonado pra depois ambos fugirem da própria responsabilidade de assumirem os sentimentos de uma vez por todas... certo? É o que todos pensam, e foi o que eu também pensei. Mas a vida tem essa Lei Oculta das Decepções: nada, absolutamente nada – nem mesmo os mais perfeitos sonhos sendo realizados – acontece como queremos que aconteça.

E algo que eu nunca pensei que veria tão cedo acabou ocorrendo diante de meus olhos. Shawn Hans, o segundo cara mais durão que eu já conheci – porque ninguém supera meu pai – começou a chorar. Vi uma lágrima teimosa sair de seu olho esquerdo, e não muito tempo depois ele pusera o rosto escondido entre suas mãos unidas, como se tentasse impedir que eu o visse daquela maneira.

— Não precisa esconder seu rosto. Todos choram. — Finalmente tive a coragem de dizer algo.

— Acredite, não é o que você está pensando — ergueu a cabeça para me encarar — não estou chorando por toda essa história... mas por algo que vai acontecer.

— Do que você está falando?

E no segundo seguinte, senti uma pontada forte invadir minhas costas e causar uma dor tão terrível quanto a de ter seu coração quebrado por alguém que não parecia te amar. Mas essa pontada era diferente... não parecia interna.

Só tive tempo de ver uma figura masculina se formar à minha esquerda... e essa figura segurava uma faca ensanguentada numa das mãos. Não consigo focar meus olhos no rosto porque o ser humano está bem à frente do poste que poderia iluminar sua cara, mas tenho duas constatações:

Aquele sangue era meu.

E aquela dor era resultado de uma facada brutal em mim.

A princípio apenas caio de joelhos no chão, urrando de dor — obviamente, seria estranho se eu não gritasse com o impacto daquela facada — e sinto que a mesma faca que entrou em minhas costas acaba de sair na mesma direção. Ainda ajoelhado, consigo erguer a cabeça para encarar Shawn, que apresenta uma expressão meio indecifrável em seu rosto. Ele parecia chocado, mas não tanto quanto poderia estar. Era como se…

— Sabia que isso ia acontecer? — De repente pergunto, com o pouco de forças que me restam.

A brutalidade da dor me atinge de uma vez por todas e caio para meu lado direito. A fraqueza insiste em tomar conta do meu ser e meus olhos começam uma dura batalha contra a vontade de dormir e não acordar mais. Não saber mais o que está havendo. Não lembrar que fui traído pelo crush e que eu já deveria saber que uma hora isso aconteceria, desde a primeira vez que o conheci. Porra, como eu pude ser tão estúpido a esse ponto?

— Eu te odeio! — Ouço o moreno gritar.

Por um instante até penso que é comigo que ele diz isso, mas logo vejo a mesma figura masculina da faca ensanguentada tomar meu campo de visão de vez.

E eu reconheço o rosto como sendo de Kian Gray.

O garoto que até horas atrás eu parabenizei por ter feito Raven Fields se apaixonar por um cara após tantos discursos de empoderamento feminino e “estou melhor sozinha”.

Mas, como assim? Kian Gray me esfaqueou? Por quê? O que eu fiz para ele?

— Você sabe muito bem por que eu fiz isso, então não discuta!

— Quantas vezes vou ter que dizer que jamais concordei com essa história, Kian? — Kian Gray? O quê? — Você simplesmente não tinha esse direito! Só espero que esse gelo dentro de seu coração te dê um resfriado. Agora corra antes que eu mesmo faça justiça com minhas mãos e te mate sem dó nem piedade — Shawn saca um celular de seu bolso esquerdo, enquanto caminha até mim e segura minha cabeça com um de seus braços. Kian Gray? Ele fez isso? — vai ficar tudo bem, Danico, vai ficar tudo bem… — sua voz ecoa em meus ouvidos, e logo depois o ouço ligar para uma ambulância.

Eu ainda não consigo acreditar que Kian meteu uma faca em mim, que Shawn sabia disso o tempo todo e que ele vai chamar uma ambulância para me levar ao hospital mais próximo. E por mais que eu não tenha mais forças nem mesmo para pronunciar uma única palavra, tenho mil pensamentos que eu poderia muito bem transformar em um discurso dito em voz alta. E para não focar no sangue que agora escorre não só na faca como também em minhas mãos, me desligo completamente do mundo externo, fecho os olhos e me imagino voltando à cena antes de cair de joelhos no chão… e completo tudo o que sempre quis dizer. Mentalmente.

Olhe em volta. Está sendo isso? Está vendo esse sangue escorrendo entre meus dedos? Está vendo o quanto é duro amar alguém que não foi feito para você? Está vendo o que amor pode nos causar?

O amor errado... Este amor nos causa problemas. Este simples sentimento que se aloja em um pequeno espaço vazio de nosso coração e quando menos nos damos conta, tomou conta de tudo. De cada célula. De cada pensamento. De cada pedacinho daquele seu coração que já estava repleto de algo que você nem fazia ideia do que era.

Olhe, garoto, olhe como o amor nos causa problemas.

Olhe ao redor e perceba como você é um problema.

Olhe ao redor e perceba que nem mesmo nós meros seres humanos somos capazes de nos manter imunes ao amor.

Ao amor errado. Este amor nos causa problemas. Este amor está consumindo meu coração, minha alma e logo irá possuí-lo também. Não tem saída. Não tem porta dos fundos para correr. Não tem cobertor para se esconder.

Não tem nenhuma forma de se proteger.

Quando o amor errado bate na sua porta você atende, sabe por quê?

Porque ele se chama Shawn Hans.

Meu amor errado se chama Shawn Hans. E meu nome é Daniel Boone. Eu sou o problema. Eu sou o coração cheio de vários nadas. E Shawn é o errado.

O que todo mundo deveria manter – pelo menos uma vez na vida – distância.

Eu poderia dizer que a partir deste momento entrei em coma profundo porque a bendita faca ainda não foi retirada das minhas costas e isso dói pra cacete. Porém, não posso. Porque, mesmo fechando os olhos e tentando reduzir ao máximo meu contato com o mundo externo, eu permaneço acordado. Continuo ouvindo os burburinhos ao redor.

— Daniel! — Sei que é Raven Fields, mesmo sem abrir meus olhos — Filho da puta, o que você fez com ele, Kian?

— Fiz o que tinha de ser feito — sua voz soa tão ríspida que me causa nojo — ele estava desvirtuando o Shawn!

— A única pessoa que poderia desvirtuar o Shawn era ele mesmo, e não o meu melhor amigo. Ele não fez nada; muito pelo contrário, foi o panaca do Hans aí que despedaçou o coração dele desde o início. E você prefere culpar o Daniel? E se você ia fazer isso com ele desde o começo, segundo o que eu acabei de ouvir aqui, como você teve a audácia de vir atrás de mim e me iludir?

— Mas eu realmente gosto de você, Raven…

— Infelizmente você acabou de cometer um crime e eu jamais te perdoarei por isso. Está me ouvindo? Eu nunca vou te perdoar, Kian! — Sinto suas mãos segurarem minha cabeça, enquanto Shawn se desvencilha de meu corpo. Algumas mechas de seu cabelo caem em meu rosto — Mas, espera aí… desde quando o que Shawn faz ou deixa de fazer é da sua conta?

— Eu conto ou você conta? — O destruidor do meu coração (vou usar esse adjetivo sim) pergunta.

— Por ironia do destino, Raven Fields — o Gray toma a frente da discussão — somos meio-irmãos. E já que a gente não tem um pingo de orgulho disso, escondemos do maior número de pessoas possível.

— Daniel? Meu filho?

Ah, santo Deus de Israel. É o meu pai. Ele deve ter visto a discussão e veio ver se eu estava em apuros, como ele sempre faz nessas situações. Fecho meus olhos com a maior força que encontro em mim. Não quero ver seu rosto aflito enquanto ele começa a chorar e muito provavelmente murmurar em voz baixa onde foi que ele errou para eu ter sofrido o que sofri. Eu queria tanto poder dizer alguma coisa, acalmá-lo, dizer que não é culpa dele antes mesmo dele se culpar… infelizmente, nada sai de minha boca. É como se meu cérebro tivesse travado logo depois de eu descobrir que o crime havia sido premeditado.

— Raven, o que houve?

— O filho da puta do Kian Gray meteu uma faca no Dan pelas costas. Desculpa ter que te noticiar isso, senhor Boone, mas é a verdade.

Ouço o som da ambulância ao fundo. Finalmente. Alguém tentará salvar minha vida e não discutir sobre 1) facada, 2) razões da facada, 3) o parentesco secreto de Kian e Shawn e 4) o autor da facada.

— Eu vou ligar para a polícia — Tio Andy exclama num momento de silêncio. O som do carro grande vai aumentando à medida que ele se aproxima daqui — e vocês dois — nem preciso estar de olhos abertos para saber que ele aponta para Shawn e Kian — não saiam daqui ou se verão com a Justiça. E com os seus pais.

Acabo soltando ar pela boca, despertando a atenção de Aaron e Raven para mim.

— Filho? Você está acordado?

— Daniel, pode nos ouvir?

Se eu não consigo formular uma frase para falar, ainda há uma coisa que posso fazer: ver o que está havendo. E então abro minhas órbitas. Meu pai abraça minha cabeça com uma força quase que imensurável, sem mover meu corpo dos ombros para baixo, afinal, tem uma faca na minha coluna vertebral.

— Vai ficar tudo bem, tá? Não se preocupe, vai ficar tudo bem, os médicos vão te ajudar e Deus também.

Meus olhos arregalam quando ele pronuncia as duas últimas palavras. E como se soubesse o que sinto, ele volta a falar.

— Deus ainda te ama, independente do que aconteça — Aaron deposita um beijo em minha testa depois de dizer tais coisas, enquanto ouço passos frenéticos vindo em minha direção.

E é com essas palavras confortantes de Aaron Robbins Boone — o homem que até dois dias atrás me fazia ter medo de assumir minha verdadeira personalidade e hoje me ama mais do que nunca — que meus olhos começam a ficar pesados. Até que se fecham sozinhos. Os sons que eu ouvia com enorme intensidade passam a reduzir seu volume, e sei exatamente o que está prestes a acontecer comigo.

Das duas opções, uma: ou eu apenas fico inconsciente, ou entro em estado de coma profundo.


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Notas finais do capítulo

OK, vamos recapitular o que aconteceu em "Bad Blood" pra vocês se situarem e, quem sabe, comentarem depois:
Shawn esfregou umas verdades decepcionantes na cara do Daniel.
Klaus defendeu Daniel e vice-versa.
Charlotte terminou com o Shawn depois de ver que ele era um idiota.
RAVEN CHUTOU AS BOLAS DO SHAWN.
Daniel jogou mais verdades na cara do Shawn.
Daniel descobriu que Shawn na verdade gosta dele, mas Deus sabe de que jeito.
KIAN GRAY METEU A FACA NO DANIEL.
Kian e Shawn são meio-irmãos.
Aaron ainda ama Daniel do jeito que ele é.
RAVEN DEU UM CHUTE NAS BOLAS DO SHAWN E KIAN GRAY METEU A FACA.

Inspira. Expira. Espero que tenham gostado desse episódio tanto quanto eu, e deixem seus comentários ou favoritos na história - recomendações só se vocês amaram nível hard, mas nós aqui estamos sempre aceitando ;)
Próximo capítulo escrito inteiramente pela Lola Cricket! E COM 'HEATHENS'!



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