Seguindo Caminhos escrita por Anne Ribeiro


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Leiam com a mente aberta e relaxem!



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Minhas novas botas estão apertando meus pés ao caminhar de volta para casa com Amanda e Bruno. Acabamos de sair da aula do intercâmbio e aprendi algumas coisas novas, portanto já posso dizer que meu inglês deu uma melhoradinha. As ruas estão cheias, pois é sexta-feira e pedestres passam por nós apressados, enquanto andamos lentamente, aproveitando o clima e a visão que temos ao durante do caminho.

Amanda anda ao meu lado ao mesmo tempo em que Bruno está há alguns passos de distância para trás. Conversamos baixinho em meio às buzinas e os barulhos dos carros, quando de repente o ruído de um motor se aproxima. Olho nervosamente para ela e num aceno de cabeça e num olhar compreensivo, começamos a caminhar mais rápido e ele aperta o passo conosco, acompanhando nosso ritmo.

O carro se aproxima ainda mais e ficamos ainda mais apreensivas e, quando vamos atravessar, ele nos fecha ao parar bem na nossa frente. É um jeep amarelo. O vidro lateral desce lentamente, revelando o passageiro que ali se encontra. A luz interna do carro não está acesa, portanto o enigma não é decifrado, por isso nós três resolvemos dar a volta pelo carro, mas somos interrompidos mais uma vez quando uma voz fala mais alto do que os ruídos do trânsito.

– Você aqui, de novo! - ouço a porta bater atrás de nós.

– Acho que conheço aquela voz, Amanda - digo alto o suficiente para ela, que está a dois passos à frente.

– Você tem certeza? - ela para de andar, vira-se para mim com as mãos na sua jaqueta, quando Bruno quase bate em minhas costas porque paramos do nada.

– O que aconteceu? - percebo que seu celular está em suas mãos ainda aceso. Provavelmente, ele estava jogando aquele bendito joguinho viciante.

Falo rápido e baixo, para que todos entendam antes que Elliot se aproxime. - Eu parei porque quem está vindo aí é ele, gente.

– Ah. - Amanda inclina sua cabeça para o lado ao compreender de quem estou falando.

– Ele quem? - Bruno olha para nós duas, sem entender.

– Já já você vai saber.

Não demora muito e os passos que ouvimos se aproximam, entretanto quando chegam até nós não é só Elliot, mas também o tatuado Alan.

– O que vocês fazer por aqui? - Elliot pergunta e acrescenta. - Esse aqui ser o Alan - ele aponta pro seu amigo ao lado.

– Olá - dissemos em uníssono e Amanda fica olhando para Alan enquanto as luzes dos faróis dançam pelas tatuagens em seu pescoço.

– Estamos voltando para casa somente e decidimos caminhar um pouco.

– Certo - ele dá de ombros. - Querer ride?

– Ride? - Porque a Amanda não traduz para mim, ao invés de ficar olhando para Alan?

– É, ride - ele aponta para trás, mostrando seu carro amarelo.

– Ah, eu acho que entendi. Você está oferecendo carona - imito pateticamente um volante e ele assente. - Preciso ver com eles - olho de novo para Amanda, que está conversando - quem diria - com Alan e Bruno fala ao celular.

Enquanto resolvo esperar a ligação terminar, puxo assunto - E vocês? O que estão fazendo por aqui? - passo a mão pelos cabelos e enrolo-os na ponta dos dedos.

– Aproveitando o day off - ele diz simplesmente e eu finjo que entendo.

– Claro, claro. Tem que aproveitar mesmo - sorrio sem jeito por não entender o que isso significa.

– Pessoal, vou ter que ir embora. Se vocês não se importarem, eu vou andando porque minha casa é logo ali. Depois a gente se fala - Bruno dá um beijo em minha bochecha e na de Amanda.

– A gente se vê - fico observando enquanto ele se afasta de nós, deixando-me sozinha com o sujeito com quem mal consigo falar. Poxa, valeu mesmo, Bruno! Que amigão você! Se bem que, meus pés doem por conta das botas, portanto até que a ideia não é de todo ruim.

– Vamos aceitar a carona, Lícia - Amanda resolve voltar a falar comigo e eu assinto afirmativamente. Seu olhar esconde alguma intenção por trás disso, tenho certeza.

– Ah, sim - digo, ao caminharmos em direção ao carro de Elliot. Ele abre a porta do passageiro para nós e puxa o banco, para que possamos entrar. Porém, quando faço menção de ir pra trás, Alan já está bem no caminho e impede isso. Portanto, só me resta sentar na frente.

Após a instrução rápida de Amanda em explicar nosso endereço, chegamos sã e salvas. Sou uma pessoa que fala em situações que não deve, porém essa foi uma das que não consegui falar nada direito. Primeiro porque parece que as palavras sumiram e também não sei inglês direito. Enquanto Elliot dirigia até aqui, tentei ouvir e entender o que eles falavam no banco traseiro, mas nada entendi. Portanto, pra não pagar uma de sabe tudo, resolvi me calar e concordar com o que Elliot falava vez ou outra.

– Vamos entrar? - ela diz, quando coloca sua cabeça entre nossos bancos e olha para Elliot, que coça a cabeça em dúvida. Ele olha para o retrovisor dianteiro e busca algum sinal de aprovação do seu amigo que está sentado no banco traseiro. Parece que poucos segundos são o suficiente para que ele receba uma resposta positiva.

– Eles vão, Lícia! Abre a porta do carro aí, porque estou morrendo de frio - ela esfrega os braços para se aquecer.

Reviro os olhos e abro a porta mal humorada. Desço e passo na frente do carro, enquanto busco minha chave dentro da bolsa, ao caminhar até a porta do nosso apartamento. Vasculho dentro dela , mas não consigo encontrar a chave facilmente, por isso volto até o carro e reviro seu conteúdo em cima do capô do carro, espalhando perfume, celular, maquiagem, absorvente - o que me deixa sem graça -, prendedor de cabelo, guarda-chuva e o bendito objeto que tanto queria brilha em meio à bagunça que minha bolsa guardara, iluminado por uma lanterna que Elliot segura na altura de sua cabeça.

– Obrigada - digo sem graça, enfiando primeiro o absorvente dentro da bolsa, o que o faz rir.

– De nada. Não vai perder a chave de novo - ele sorri e eu me irrito com sua piadinha sem graça.

Com a chave na mão, caminho de novo até a porta do apartamento e abro-a rapidamente, seguida por eles. Entramos os quatro no elevador espelhado e os três conversam sem parar, portanto aproveito para pegar meu celular. Acabei procrastinando a ligação para meus pais; o que deveria ter feito há dias, mas não o fiz. Já que eles estão ocupados rindo e se divertindo, disco o número tão familiar para mim que conseguiria até digitar de olhos fechados. O telefone chama uma, duas, três e, no quarto toque, alguém atende. A voz que atende eu reconheceria em qualquer lugar que estivesse, em meio à dezenas, quem sabe milhares.

– Alô - minha mãe diz e meu peito se enche de um sentimento que nunca havia sentido antes; acho que se chama saudade. É um tipo diferente de quando você os tem ali na quarto ao lado, quando você pode sair e voltar, porque eles estarão lá para me receber de braços abertos, com uma bebida quente e um colo acolhedor e me ajudarão a enfrentar todos os meus medos e preocupações. Dessa vez, quando passarmos pela porta da frente eu não os verei atrás dela, mas sim um apartamento vazio que eu chamo de lar temporário. Essa saudade é pela distância que nos impede de estarmos juntos, no entanto não será duradoura.

– Oi, mãe! - meus olhos começam a encher de lágrimas, contudo as contenho. Entrego a chave para que Amanda abra a porta para nós e, no instante que a vejo aberta, corro pelo curto corredor do nosso apartamento e entro no banheiro, fechando a porta atrás de mim. Escorrego minhas costas por sua superfície, até chegar ao chão ao ouvir a voz da minha mãe.

– Você está bem, Lili? - sua voz, que antes era feliz ao atender meu telefone, começa a mostrar sinais de preocupação por me ouvir chorar.

– Peraí, mãe - digo rapidamente para ela, ao afastar meu celular do ouvido, deixando-o no chão. Levanto e vou até a pia para lavar o rosto e respirar fundo algumas vezes, até não mostrar nenhum sinal de tristeza em minha voz, apesar dela já ter me ouvido antes e reconhecer muito bem quando começo a chorar.

Seco meu rosto com uma toalha, volto a sentar no chão e volto a encostar o celular no ouvido. - Desculpe a demora, mãe. É que acabamos de sair do cinema e o filme foi muito emocionante, me fazendo lembrar de vocês. - É uma mentira, mas não uma completa.

– Sei - ela diz, mas muda de assunto. - Eu ouvi vozes de uns rapazes. Quem são eles, querida?

– Mãe, você não vai acreditar - decido participar do assunto e diminuo o tom de voz, até virar quase um sussurro. - Eu estou com dois cantores famosos na sala - emito um gritinho agudo, mas baixo.

– Jura, filha? - o interesse surge em sua voz e tenho certeza que ela está dando um enorme sorriso. - Me conta mais sobre isso!

– Lícia, está tudo bem aí dentro? - Amanda dá duas batidas na porta, interrompendo nossa conversa. Roo a unha do indicador e reviro os olhos, antes de responder - Está tudo sim, já saio.

– Ok, não demore. Vamos comprar comida e queremos que você escolha o que quer comer.

– Tá bom - digo e fico esperando que ela se afaste. - Mãe, preciso ir. Depois eu te conto tudo, tudo bem?

– Sem problemas, filha. Vai lá! - e desliga.

Passo mais uma vez na frente do espelho e verifico se meu rosto vai entregar que estava chorando há pouco. Meu nariz está um pouco vermelho e meus olhos também, todavia não devo dar satisfação a ninguém mesmo e tenho certeza que não vão fazer perguntas indiscretas.

Abro a porta do banheiro e percorro o estreito corredor, encontrando Elliot sentado em minha cama enquanto lê um menu em suas mãos e Alan que conversa animadamente com Amanda, encostado no balcão da cozinha. Pelo jeito, está rolando um clima ali, portanto não quero atrapalhar e decido sentar em minha cama.

– Isso aqui ser muiiiito bom! - ele diz, se demorando nos "i"s ao apontar para um prato bem colorido.

– O que é isso? - aproximo meu rosto do papel e tento ler, no entanto não reconheço nada do cardápio. - Que tipo de comida é essa? - franzo o cenho.

– Thai food.

– Thai food?

– É! Nunca comer?

– Não, nunca - dou de ombros.

– Se querer, poder escolher por você - ele sorri.

– Você quem sabe. Não vá escolher nada ruim pra mim, hein. Estou confiando em você! - sorrio e ele sorri de volta.

Levanta do sofá e aproxima-se de Amanda e Alan, que conversam baixo ainda mais perto um do outro. Ah, bem que eu entendi quando ela aceitou rapidamente a carona deles, eu só não sabia que iria se interessar tão rápido por ele. Elliot faz os pedidos e, vinte minutos depois, o entregador chega com nossas comidas. Na hora de pagar, me aproximo e puxo uma nota de vinte, mas nenhum deles aceita que eu pague, nem que ela também. Até insisti em fazê-lo, porque a casa é nossa e nós convidamos - eu não, Amanda -, convidou para que subisse, mas Elliot disse num português mais embolado ainda que na próxima ele não se oporia. Se eu entendi direito, ele está mesmo marcando uma saída para uma próxima vez? E por que cargas d'água ele está na casa de duas mulheres, numa sexta-feira à noite? Era para estar com sua namorada, certo? Se estivéssemos em um relacionamento, iria ficar revoltada se o meu namorado estivesse nessa mesma situação, no entanto eu não tenho um.

Amanda e Al sentam nos banquinhos da bancada e, percebendo o clima que está rolando ali, Elliot senta comigo no chão da sala, apoiando sua comida na mesa de centro. Abro minha embalagem e retiro a tampa com todo o cuidado para evitar que amasse. Faço isso até com presentes embrulhados em papel, quando ganho algum. Não gosto de rasgá-los porque acabo usando depois em alguma coisa, porém nunca uso para nada e só amontoo diversas folhas coloridas no armário da minha casa, no Brasil.

– Olha, o cheiro está bom, viu - digo ao sentir o vapor vindo na minha direção, preenchendo minhas narinas com o cheiro característico de curry. - Huuum...- gemo baixinho e fecho os olhos. - O que você escolheu para mim, afinal de contas? - volto a abrir meus olhos e Elliot está me encarando com seus olhos azuis-celeste, enquanto segura o garfo no ar.

Pigarreia e volta a colocar o garfo em sua comida, de maneira educada - Eu achar que ser um robalo...conhecer robalo? - ele dá uma garfada e o leva à sua boca, mastigando silenciosamente.

– Sim, conheço sim - imito seu gesto e ao sentir a comida em minha língua e a forma como ela passeia por sua superfície, espalhando o gosto forte de curry no processo, permito que meus pré-conceitos sejam quebrados por medo do desconhecido. Ao terminar de saboreá-la, dou outra garfada e assim eu o faço, até comer tudo. - Estava muito bom! - sorrio.

– Eu perceber! - Elliot sorri satisfeito.

Ao terminarmos nossa refeição: eu terminei antes dele, juntamos o lixo e jogamos fora.

– Temos que ir agora - Alan diz e olha para Amanda, que sorri misteriosamente. E eu fico sem entender, como sempre.

– Claro, vamos sim - Elliot responde de uma forma não muito animada e se vira pra mim, passando a mão pelos cabelos curtos, quase negros. - Nós precisamos ir - ele me encara e eu engulo em seco, com a intensidade com que seus olhos me fitam.

Engulo em seco e limpo um pouco a garganta antes de falar. - Certo. Vamos acompanhá-los até a porta - olho para Amanda, que assente positivamente já andando em direção à porta.

– Bem, até depois - me aproximo dele para dar-lhe um beijo na bochecha, no entanto ele endurece no lugar. - Desculpe, eu ainda não me acostumei - digo ao me retrair.

– Ok - ele diz, mas dessa vez ele retribui o beijo na bochecha. - Bye bye - ele acena e sai para o corredor em direção aos elevadores, enquanto Alan o espera com a porta aberta. Juntos, eles entram e nos deixam sozinhas: Amanda suspirando e eu com a certeza de que o verei mais vezes.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham relaxado e se divertido tanto quanto eu!



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