O ano em que eu me apaixonei pelo Paulo Guerra escrita por Jel Cavalcante


Capítulo 5
Carly, Sam e Freddie


Notas iniciais do capítulo

"A Laura tinha razão. Brigar com a sorveteria lotada daquele jeito iria fazer com que a fofoca se espalhasse até os ouvidos da minha mãe. Respirei fundo e segui com elas até a parada de ônibus. Estávamos indo fazer a minha inscrição no tal campeonato de skate."



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Quinta-feira, 14 de Janeiro


1 nova Alícia Gusman (a segunda só esse ano), 1 Nimbus Street 3000 à vista, 0 vontade de fazer qualquer outra coisa que não seja andar de skate

10h00. Antes de mais nada eu preciso dizer que a Alícia trouxa e apaixonada morreu, sumiu, desapareceu, acabou, foi destruída, aniquilada, neutralizada, enterrada e não existe mais! Quem está escrevendo esse diário agora é uma garota de onze anos muito ajuizada, responsável, segura e que sabe muito bem ser indelicada, cruel, azeda e cara de pau quando tem que ser.

– Alícia, volte já pra sala arrumar a bagunça que você fez! - era a voz da minha mãe berrando lá da cozinha.

Hahahaha! A "bagunça" em questão foi um ato de protesto contra o capeta do meu irmão. Na noite passada eu fiquei de castigo por ter enfiado a cara dele em um prato de macarrão - bastante merecido, por sinal - e eu jurei que iria me vingar. Hoje cedo, peguei a caixa de brinquedos dele e espalhei pela sala aos chutes. A melhor parte foi quando a cabeça do Max Steel favorito dele voou pra debaixo do sofá. Eu devo ter passado uns dez minutos rindo disso. Hahahaha. Como eu ia dizendo, agora eu sei ser cruel quado é preciso. E ai de quem me encher o saco daqui pra frente.

14h30. Depois do almoço, marquei um encontro com a Valéria e a Laura - a Marcelina tava doente - na sorveteria pra contarmos as novidades dos últimos dias. Óbvio que eu não falei nada sobre aquele-que-não-deve-ser-nomeado.

– O Davi andou me importunando todos esses dias esperando que eu perdoasse ele por cansaço. Lógico que eu deixei bem claro que isso jamais vai acontecer.

Enquanto a Valéria perpetuava o ódio pra cima dos garotos, sobretudo pro cabeludo, falso e hipócrita do Davi, eu tentei enxergar o que estava escrito em um cartaz pregado na parede, bem em cima da cabeça dela.

– O que foi, Alícia, você não desgruda os olhos desse cartaz. O que ta escrito aí? - a Laura perguntou, com uma tonelada de sorvete escorrendo pelo queixo.

Era o anúncio de um campeonato de skate, o mais importante do bairro, e eu estava tentando descobrir qual era a data do evento.

– Nossa, Alícia, você nem sequer ouviu a minha história sobre o Davi? - a Valéria fez uma cara tão feia que eu resolvi esquecer o campeonato e voltar pra conversa.

– Claro que ouvi, amiga. Não se preocupa que, quando as aulas voltarem, a gente vai destruir todos os meninos, um por um. Já tô até vendo a cara do Davi quando a gente cobrir o cabelo dele de chiclete e dizer que é vômito de ET. Hahahahaha!

– Nossa, como você é cruel! - dessa vez foi a Laura quem falou, ainda com a boca toda suja de sorvete.

– Tem razão. Eu não sei se teria coragem de… - não acredito que a Valéria tava dando pra trás!

– TODOS OS GAROTOS MERECEM SOFRER! - ops, acho que me exaltei um pouco. - Quer dizer, a gente precisa mostrar pra eles quem é que manda no pedaço.

Depois de ter deixado as duas sem palavras, me inclinei pra frente e arranquei o cartaz da parede. Percorri a folha em busca da data e vi que o campeonato vai acontecer no domingo. Será que eu tô em forma pra competir? Faz tanto tempo que eu não ando de skate. Seja como for, vale a pena tentar. Anotei o endereço do local onde é feito a inscrição e convenci as meninas a irem comigo até lá.

Ah, já ia esquecendo. Antes da gente sair da sorveteria, entraram três sujeitinhos que eu nunca tinha visto antes. Duas meninas e um menino, aparentemente com a nossa idade. Uma delas, a mais baixinha e com cara de cavalo, passou perto da nossa mesa e enfiou o dedo no sorvete da Laura.

– Vai com calma, gordinha. Assim não sobra nada pra hora do jantar - ao falar isso, olhou pra onde estavam os seus amigos e os três soltaram uma gargalhada nojenta.

Nessa hora eu levantei da mesa, furiosa, e, se não fosse pela Valéria, eu teria enchido a cara dela de hematoma.

– Escuta aqui sua imbecil, quem é você pra falar assim com a minha amiga? - falei, ou melhor, berrei pra que todo mundo ouvisse.

– Ui ui ui. Temos uma barraqueira no recinto. Ai que medinha que eu tô de você.

Ai que ódio daquela garota! Eu juro que teria deixado a cara dela toda roxa mas aí a Valéria segurou o meu braço e me levou lá pra fora bem rápido. A Laura pagou os sorvetes e saiu em seguida. Enquanto se aproximava, eu vi que tinha uma gosma marrom escorrendo no cabelo dela.

– O que é isso no seu cabelo, Laura - a Valéria perguntou enquanto tentava limpar com um guardanapo que havia guardado na bolsa.

– Parece sorvete de chocolate… - a Laura disse depois de ter colocado o dedo no cabelo e provado um pouco. Que nojo!

– Eu não acredito que aquela garota teve a coragem de… - tentei voltar pra dentro da sorveteria e quebrar a cara da lambisgoia, mas novamente fui impedida pelas minhas queridas amigas covardes.

– Esquece isso, amiga. Não vale a pena brigar com uma louca dessas no meio de todo mundo.

A Laura tinha razão. Brigar com a sorveteria lotada daquele jeito iria fazer com que a fofoca se espalhasse até os ouvidos da minha mãe. Respirei fundo e segui com elas até a parada de ônibus. Estávamos indo fazer a minha inscrição no tal campeonato de skate.

_

16h15. Quando a gente chegou no lugar da inscrição, tinha cerca de quinze pessoas na fila. Pelo visto seria um campeonato bastante disputado. Foi então que eu me dei conta de que não tinha checado se havia alguma premiação.

– Gente, olha só isso!

Na parede, do lado da fila, tinha um poster gigante com todos os detalhes da competição. Descobri que existiam diferentes baterias (disputas) e que eu me encaixava na décima sexta: garotas entre 12 e 16 anos + manobras livres. Além disso, vi que os vencedores de cada bateria iria ganhar um Nimbus Street 3000, o skate mais lindo que eu já vi em toda a minha vida. Sério, aquilo era mais lindo que todos os caras gatos que eu já tive uma crush - incluindo celebridades e vocalistas de bandas de rock.

Passados vintes minutos de espera, todos eles admirando o Nimbus Street 3000 na parede e fingindo estar prestando atenção nas reclamações da Valéria sobre a demora e da Laura sobre o sorvete no cabelo, chegou a minha vez de entrar no cubículo minúsculo onde eram feitas as inscrições. Porém, antes que eu conseguisse abrir a porta, alguma coisa me jogou pro lado, fazendo com que eu caísse e machucasse o cotovelo - já estava até sentindo falta de uma feridinha naquele lugar.

– Sai da frente sua retardada!

Aquilo não podia ser sério. Ai que raivaaaa! A cara de cavalo tinha acabado de me derrubar e ainda por cima tomou a minha frente e entrou na sala de inscrições.

– Eu vou matar essa garota, eu juro! - gritei enquanto abria a porta pra tentar tirar ela de lá à força.

Infelizmente fui impedida por dois seguranças grandalhões - ok, melhor ficar quieta e esperar, pensei. A Valéria tentou me acalmar dizendo que eu seria a próxima e que não iria demorar nem dois minutos - veja só que ironia, justo a mais apressada de nós. Já a Laura puxou o meu braço e começou a soprar na ferida, que vista de longe parecia pior do que realmente era.

Enquanto tentava me acalmar, percebi duas criaturas rindo do outro lado. Eram os dois comparsas idiotas que riram da Laura na sorveteria. Respirei fundo e fiz o possível pra não arrumar um escândalo. Depois um deles, o garoto, chegou perto de mim com um sorriso cínico.

– Não liga pra ela não. A Sam é assim mesmo. Ela vive me batendo, me derrubando, me chutando… é só o jeito dela. Prazer, eu sou o Freddie.

Ele estendeu a mão pra me cumprimentar mas tudo o que fiz foi mandá-lo sair correndo antes que eu resolvesse arrebentar a cara dele. A única parte engraçada dessa história toda foi que ele realmente saiu correndo e se escondeu atrás da outra menina, que parecia um robô enferrujado.

– Nossa, meninas, vocês viram que gatinho. Por que você não apertou a mão dele, Alícia? - a Laura perguntou com cara de boba.

– Como assim, Laura? Você já esqueceu do juramento que a gente fez outro dia? Meninos são imprestáveis e ridículos. E quanto mais longe ficam de nós, melhor.

– Você tem razão, Alícia - a Valéria assentiu com a cabeça - mas não se pode negar que ele é perf… quer dizer, bonitinho.

Ai não, até a Valéria, que até agora há pouco estava decretando guerra a todos os seres do sexo masculino existentes na galáxia, tinha se rendido a carinha de bebê do… como era mesmo o nome dele? Até me esqueci de tão insignificante.

Minutos depois a loira aguada saiu da sala com uma ficha de inscrição na mão. Notei que havia o número dezesseis no canto da folha, ou seja, ela tinha se inscrito na mesma bateria que eu. A gente ficou se encarando por alguns instantes mas logo o segurança me mandou entrar. Mais alguns segundos ali parada e eu teria mostrado pra ela quem é a verdadeira Alícia Gusman. Mas pode deixar que no domingo ela vai saber direitinho com quem está lidando.

17h45. No final das contas, deu tudo certo. Saí dali com a certeza de que o skate dos meus sonhos estava cada vez mais perto de mim e aquilo até me fez esquecer dos três patetas que tiraram o dia pra encher o meu saco. Na hora da despedida, notei que tanto a Valéria quanto a Laura estavam quietas, com caras de boba. Provavelmente pensando naquele tal de Freddie. Dei um abraço rápido em cada uma e corri pra casa. Tudo em que conseguia pensar era em treinar o máximo de manobras possíveis até domingo, onde iria humilhar a cara de cavalo na frente de todo mundo.

_

Domingo, 17 de Janeiro


1 campeonato de skate, 1 doida varrida com cara de cavalo (argh), um garoto tonto com cara de bebê (own), uma menina robô fantasma (bleh), 200.000 confusões pra tudo quanto é lado (ai meu deus, por que justo comigo?)

9h00. É incrível como a minha mãe faz de tudo pra atrapalhar a minha vida. Quando eu já tava de saída pro campeonato, ela inventou de me mandar lavar a louça e deixou o Caio de vigia. Passei uns poucos minutos lavando a pilha gigantesca de pratos, copos, bandejas e sei lá mais o quê até ver que ela tinha entrado no quarto e comecei a colocar o meu plano de fuga em prática. Os passos eram muito simples:

1 - fazer o caio sentar numa cadeira enquanto me vigiava, com a desculpa de que era pra ele não se cansar;

2 - pegar a corda e a fita adesiva que ficavam dentro do armário, sem ele perceber;

3 - colocar uma música de rock bem alta no celular para que a minha mãe não escutasse os gritos que ele iria dar quando os passos seguintes estivessem sendo executados;

4 - amarrá-lo na cadeira, enquanto ele gritava loucamente;

5 - tapar a boca dele com a fita adesiva;

6 - desligar a música, guardar o celular na bolsa, pegar o skate e sair divando como se nada tivesse acontecido.

Não demorou nem dois minutos direito e já estava na rua, correndo feito uma louca pra chegar a tempo no evento.

10h30. Ai meu deus. A escola mundial inteira veio assistir o campeonato! Culpa da tonta da Laura que postou no facebook que eu ia competir. Eu não reclamei porque jurava que ninguém ia aparecer. Affe… Era só o que me faltava, ter o Paulo Guerra na plateia me assistindo. Mas, como agora eu sou uma nova pessoa, cem por cento nem aí pro idiota do Paulo, deixei tudo de lado e fui pro stand onde as competidoras da décima sexta bateria estavam.

A nossa disputa ia começar em menos de uma hora e eu já tava ficando meio nervosa. Chegando lá, vi que tinha umas meninas muito marrentas participando, inclusive a vencedora de todos os concursos de skate da cidade, Bia Chaddad. Aquela menina me botava medo só com os olhos mas no fundo eu sabia que era plenamente capaz de vencer qualquer uma delas. O mais importante era me manter concentrada na vitória. O resto não importa.

Não demorou muito pra cara de cavalo aparecer com os dois capangas dela. Eu virei o rosto e fingi que não a reconheci - a última coisa que eu queria era criar confusão minutos antes de começar a bateria. Sem querer, acabei ouvindo uma parte da conversa deles.

– Eu tenho certeza que você é melhor que qualquer uma dessas tapadas. Não se preocupa, você com certeza vai vencer esse prêmio - disse a menina que sorria feito uma boneca assassina de filme de terror.

– Se fosse uma competição de quem é mais mal encarada, eu não teria a menor dúvida que você seria a melhor de todas. Hahahah - falou o garoto com cara de neném cujo o nome eu voltei a esquecer.

– Cala a boca seu pedaço de lixo! - ai que ódio que eu tinha dessa menina mesmo quando ela xingava alguém sem a menor importância pra mim.

– Ei, olha só quem tá aqui, Sam! Lembra daquela menina que você derrubou no dia da inscrição? - ai não, o cara de neném me reconheceu. E agora? Ele ta vindo pra cá, socorro!!!

– O que você quer, garoto? - a minha voz soou tão grosseira quanto a da tal da Sam.

– Ta lembrada de mim? Eu sou o Freddie. A gente se conheceu no dia da inscrição…

– E daí? O que eu tenho a ver com isso?

Ele baixou a cabeça envergonhado me fazendo sentir um pinguinho de remorso por ter falado daquele jeito. Talvez a Laura e a Valéria tivessem razão, ele até que era bonitinho mesmo.

– Eu só queria te desejar boa sorte na competição. Você me parece uma pessoa legal.

Qual era o problema daquele menino? Além de andar com uma garota que o tratava mal pra caramba ainda vinha desejar boa sorte pra mim, que ele nem conhecia e que tinha sido mega grosseira com ele do nada. Só pode ser masoquista!

Levantei da cadeira onde estava sentada e olhei nos olhos dele. Parecia realmente que ele estava sendo sincero comigo. Será que ele preferia que eu vencesse a amiga dele ou só tava sendo educado? Seja como for, agradeci e estendi a mão. Já tava na hora da gente quebrar o gelo - mesmo eu tendo em mente que os garotos não prestavam nem um pouco e deviam ser mantidos à distância.

Enquanto a gente se cumprimentava, uma voz veio por trás e me arrepiou dos pés à cabeça.

– Será que eu poderia falar com você um instante?

Era o Paulo Guerra, por fora do stand, com um olhar frio de alguém que acaba de descobrir uma traição. Ficou um clima super tenso entre ele e o Freddie e por um segundo achei que ia dar briga. Mas nada aconteceu e eu resolvi passar por debaixo da corda que me separava dele. Nós ficamos um tempo em silêncio até que o segura-vela do Freddie deixou a gente à sós. Será que eu fui rude com o garoto? Bem, seja como for eu não me importava nem com ele e nem com o Paulo, então tanto faz.

– Por que você veio até aqui? A plateia fica pro outro lado - fazia tanto tempo que eu queria tratar ele mal que até deixei escapar um sorrisinho no canto da boca.

– Calma, estranha. Eu só queria te entregar isso… - ele tirou do bolso um pinguim feito com restos de caixas de leite. - É pra dar sorte.

Hã?? O que ele tava tentando fazer? Se desculpar por tudo que tinha feito comigo nos últimos dias? Ou tentar me deixar caidinha por ele outra vez? Senti vontade de jogar aquele pedaço de papelão inútil no chão mas antes que eu pudesse reagir, uma presença bastante indesejada surgiu de repente.

– Nossa, até que o seu namoradinho dá pro gasto, hein. - era a Sam, cara de cavalo, tentando me destruir outra vez.

– Ele não é meu namorado! - eu sabia que as minhas bochechas estavam vermelhas de tanto que ardiam.

– Ah, não? Então você não se importaria se eu ficasse com esse bichinho fofo que ele tá te entregando, não é mesmo? - ela tirou o pinguim das mãos do Paulo e olhou na minha cara como se quisesse ver o desespero nos meus olhos.

– Ei, garota! Devolve já isso pra ela antes que eu pule aí dentro e tire de você à força!

Ai minha nossa! Eu tô ficando doida ou o Paulo acabou de me defender? - pensei. Na verdade eu não fazia mais a mínima ideia do que tava acontecendo.

– Olha lá como você fala com a minha amiga! - Agora era o Freddie que se metia na confusão.

– Cala a boca, Freddie, eu não preciso de ninguém pra me defender - nessa hora, a Sam foi se aproximando do Paulo até encostar na corda que separava os dois. Definitivamente havia um clima entre eles. Ai, droga, isso não podia tá acontecendo comigo. E justo em um dia tão importante como aquele! Ainda bem que a amiga dela, a que parece uma boneca assassina, chegou e acabou com o momento.

– Pronto, terminei de fazer o que você me pediu - falou com uma voz fantasmagórica. Sério, ela me dava mais medo que a própria Sam.

– Ok - a Sam virou pra mim com cara de satisfeita - pode ficar com essa coisa horrorosa - jogou o pinguim no chão e foi embora com os dois patetas.

O Paulo parecia ter se segurado bastante pra não avançar em cima dela - ou será que estava admirando ela secretamente? - Seja como for, ele apanhou o objeto, limpou com a barra da camisa e me devolveu com um sorriso.

– Toma... E vê se acaba com ela - foi tudo o que ele disse antes de me dar as costas e sair.

11h15. Concentração é a chave. Ou pelo menos era a frase que eu repetia sem parar na tentativa de esquecer a confusão no stand. O sinal foi dado e todas as meninas desceram pelas rampas, cada uma com um estilo próprio. A Bia Chaddah, por exemplo, deslizava feito uma rainha, levemente inclinada pra frente e mantendo a elegância até na hora de dropar - eu tenho que confessar que nunca tinha visto um drop tão perfeito quanto o dela. A Sam mandava uns flipfinger - quando você gira o skate com os dedos - bem malucos, mas só sabia fazer isso e nada mais.

Já eu, com toda aquela pressão em cima de mim, comecei muito mal. De vez em quando olhava pra onde estavam os meus amigos e via que estavam todos vibrando de pé berrando alguma coisa que eu não conseguia ouvir. Tinha até um cartaz escrito: "Alícia Campeã!". Só podia ser coisa da Valéria. Com o tempo, fui ficando mais à vontade na pista e esperei a hora certa pra mandar as manobras mais radicais. Fiz um oldschool kickflip na barra e senti que os jurados tinham se animado com a minha ousadia. Depois fui pro meio da pista e arrisquei um double kickflip pra impressionar ainda mais.

Estávamos todas indo muito bem mas as melhores, sem dúvida alguma, éramos eu, a Bia e a Sam. A disputa estava ficando cada vez mais acirrada quando, de uma hora pra outra, a Bia pareceu escorregar do skate e caiu de joelhos na rampa. Todo mundo ficou hiper chocado, menos a Sam que começou a gargalhar como se ninguém estivesse vendo. Depois eu comecei a sentir uma coisa estranha no meu skate, como se tivesse algo solto nele. Os meus pés balançavam, quase sem coordenação alguma, e quando eu tentei dropar , uma das rodas de trás arrebentou.

Eu caí de cabeça no chão e, se não fosse pelo capacete, certamente teria ido parar no hospital. O sinal sonoro declarou o fim da bateria e eu, ainda incrédula e sem saber como aquilo foi acontecer justo no meio da competição, permaneci deitada na pista. De repente surgiram dois rostos no meu campo de visão. Paulo e Freddie, a dupla de palhaços.

– Você ta precisando de ajuda? - perguntou Freddie estendendo a mão pra me levantar.

– Sai daí seu babaca! Pode deixar que eu cuido dela - o Paulo empurrou a mão do Freddie com violência e uma nova discussão se iniciou entre os dois, me fazendo perder a paciência de vez. Levantei sozinha e me dirigi até onde estava o pessoal da escola.

– Amiga, tá tudo bem com você? - a Carmen foi a primeira a ter coragem de falar alguma coisa.

– Não se preocupem, não foi nada - tive que me conter pra não descontar toda a raiva que estava sentindo em cima deles.

– O que o Paulo queria indo até onde você tava? - perguntou a Valéria sem entender o motivo do Paulo ter ido até a pista. Pra ser sincera, nem eu sabia, mas era melhor evitar que algum boato se espalhasse.

– Lógico que ele foi até lá só pra me zoar. Aquele cretino… - menti pra acabar de vez com qualquer suspeita.

– Olha só gente, os meninos tão arrumando alguma confusão! - o braço da Marcelina apontava exatamente para o lugar onde eu tinha caído.

Eu, a Marcelina, a Valéria, a Carmen e a Laura saímos correndo na direção dos meninos. De longe dava pra ver o ogro do Jaime segurando o pobre coitado do Freddie por trás enquanto o Paulo, o Koki e o Mário ameaçavam bater nele. Antes de nós conseguirmos chegar lá, a Sam voou em cima do Jaime e o forçou a largar o seu amigo indefeso. Depois ela derrubou o gorducho no chão, para espanto de todos, e deu um soco no rosto dele.

– Caramba, essa menina é boa de briga mesmo! - falou o Koki completamente admirado com as habilidades da Sam.

O Paulo foi pra cima dela e acabou levando uma rasteira. Eu confesso que senti vontade de rir na hora mas a minha raiva era maior que qualquer outra coisa. Eu e a Valéria nos adiantamos pra enfrentar ela quando dois seguranças apareceram juntos da amiga robô fantasma.

– Foram eles que arrumaram toda a confusão - a garota parecia o Jorge Cavalieri quando dedurava a classe inteira pra diretora Olívia.

– Ufa, Carly, ainda bem que você trouxe os seguranças com você. Esses meninos malvados estavam prestes a me bater também! - HÃ? QUE MENINA CÍNICA! Se ela pensa que vai sair dessa ilesa, está completamente enganada.

– Se eles iam te bater, por que têm dois no chão e outros dois com as pernas tremendo de medo? Foi você que começou a briga, sua fingida! - eu apontei o dedo bem na cara dela enquanto as meninas me davam apoio.

– Mentirosa! Você tá dizendo isso só porque sabe que eu vou ganhar o prêmio, já que as únicas competidoras capazes de me vencer caíram feito duas principiantes.

Naquele momento tudo começou a fazer sentido na minha cabeça. Quando eu e o Paulo estávamos discutindo com ela mais cedo no stand, a tal da Carly chegou dizendo que tinha terminado de fazer o que ela havia pedido e depois disso elas saíram do nada. Era óbvio! Aquela discussão toda por causa do pinguim era apenas uma distração pra que a Carly sabotasse o meu skate. E provavelmente ela também fez isso com o da Bia Chaddad. Bem que eu desconfiei que tinha alguma coisa errada!

– Você sabotou o meu skate sua cínica maluca! - sem nem ao menos pensar, parti pra cima dela e consegui dar um murro naquela cara de cavalo inchado antes dos seguranças me segurarem e expulsarem todo mundo do evento.

Na saída, ouvimos a locutora do evento anunciar que nós duas tínhamos sido desqualificadas. Deixamos o local exaustas e sem disposição alguma pra continuar a briga. Lá na frente, os meninos andavam apressados, provavelmente com medo de apanharem de novo. As meninas cochichavam sem parar, obviamente falando do Freddie, enquanto a Carly andava abraçada com ele logo atrás da gente.

– Onde você aprendeu a bater daquele jeito? - perguntei pra ela ainda chocada com a forma como havia conseguido derrubar o Jaime e o Paulo.

– Por aí… Você também bate muito bem - ela passou a mão na mancha avermelhada que eu tinha deixado no meio do rosto dela.

– Você bem que mereceu - falei sem parecer arrependida.

– Pra falar a verdade, eu achei tudo isso muito engraçado. Mesmo tendo ganho um soco na cara ao invés de um Nimbus Street 3000– uma coisa era fato: a gente se parecia bastante.

– É, eu também achei. Mesmo você tendo sabotado o meu skate e ter me feito ser desqualificada de uma competição tão importante pra mim - nesse momento, estávamos na calçada que dividia o nosso caminho.

– Então tá… A gente se esbarra por aí…

– Espero que não - falei com um sorriso forçado.

– É, eu também espero que não.

Depois disso, eu e as meninas dobramos a rua. O assunto entre elas era quem teria mais chances com o Freddie. Aparentemente a Valéria estava interessadíssima nele mas a Laura jurava que ele tinha piscado pra ela, então... É… Parece que aquela história toda de juramento só valia pros meninos da nossa turma.

_

19h00. Estou a poucas páginas de terminar o segundo livro dos Jogos Vorazes. Passei a noite toda lendo e, quando resolvi fazer uma pequena pausa pra pensar na vida, percebi que já era hora do jantar. Tive de comer no quarto porque tinha ganho a semana inteira de castigo por ter amarrado o Caio na cozinha. Tanto faz, tudo o que eu preciso agora é ficar longe de confusão, pelo menos até as aulas começarem. Falando nisso, restava apenas uma semana de férias. Como o tempo passa rápido, não é mesmo?

Guardei o livro na minha estante e aproveitei o momento pra pôr o pinguim do Paulo na gaveta. Por que será que ele me deu aquilo? E como uma pessoa tão… sei lá… tão desprezível pode ter feito um negócio tão fofinho?Seja de que jeito fosse, preferi deixar na gaveta, afinal aquilo tinha me dado tudo menos sorte.

E falando em fofura, outra pessoa que me chamou atenção hoje foi o Freddie. Ele é meigo, bobo e de alguma forma parece gostar de mim. Pena que é amigo daquelas duas bruxas. Affe, chega, eu já tô ficando com dor de cabeça de tanto pensar bobagem.

19h20. Resolvi procurar algum jogo pra baixar no celular e me desligar do mundo.

19h22. Legal, acabei de achar um jogo onde o objetivo principal é atirar em pinguins com metralhadoras.

20h00. Matar pinguim é a coisa mais legal do mundo, uhuuu!


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Notas finais do capítulo

essa foi a minha surpresinha de natal (que saiu meio atrasada). espero que tenham gostado!!!!

ah, e obrigada pelos comentários fofos! bjs e até o próximo capítulo!



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