Uma Missão De Vida escrita por Joice Santos, Joice Reed Kardashian


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Olá meninas. Quero agradecer mais uma vez pelos comentários. Nem acredito que estão curtindo tanto minha história.
Infelizmente, esse é o último capítulo. Entretanto, como me pediram, vai ter um bônus sim. Já estou escrevendo o epílogo.
Espero que curtam. Ah, Feliz Natal atrasado.



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Jasper estava sentado na cama, as costas contra a parede fria. Tinha um bloquinho de notas nas mãos e um lápis já pela metade. Acabara de ter mais uma sessão com a psiquiatra e odiava ouvir as mesmas palavras de sempre.

Ele não estava evoluindo no tratamento porque não havia nada para evoluir. Não estava melhorando porque não tinha nada que melhorar. Odiava aquela doutora metida a besta.

Piscou algumas vezes, a luz fluorescente incomodava seus olhos. Queria ir lá e fora e ver o sol, sentir os raios quentes contra sua pele esbranquiçada. Mas a enfermeira que ficava de olho nele agora estava com outro paciente e Jasper sabia que seu horário de caminhar no jardim era apenas depois do almoço.

Rabiscou algumas vezes a última folha do bloquinho, depois voltou a se concentrar no texto que iniciara.

“Querida Sarah,”

Era só o que tinha saído até agora.

Jasper rabiscou aquilo. Era ridículo, sua mãe odiaria receber uma carta sua assim. Começou de novo.

“Mãe,”

Passou vários minutos pensando em como continuar. Sorte dele que sua irmã tivesse trazido mais papel e um apontador para ele em sua última visita. Jasper mantinha tudo escondido debaixo do colchão. Esse tipo de coisa era proibido ali. Coloca em risco a sua própria segurança e dos outros pacientes – foram as palavras da psiquiatra quando ele perguntou se podiam lhe dar papel e caneta. Como se ele fosse furar os olhos de alguém!

Voltou a se concentrar no bloquinho e escrita fluiu. Contou a mãe dos sonhos que teve durante essa semana com ela. Das vezes que viu borboletas no jardim e se lembrou de que costumava caçá-las com Rosalie quando eram pequenos. Escreveu também que mal podia esperar para poder visita-la.

Rosalie, sua irmã caçula de 17, o visitava todos finais de semana. Da última visita deixou escapar que a mãe estava internada com problemas nos pulmões. Jasper quis pular a cerca elétrica daquele lugar e correr até Sarah. A irmã tratou de acalmá-lo e pedir que ficasse bem para que pudesse sair dali logo e ir ajudá-la a cuidar da mãe. O pai estava cada dia mais insuportável e ranzinza.

Quando terminou de escrever, retirou a folha e dobrou o pequeno pedaço de papel. Assinou seu nome e escreveu “Para Sarah, com amor”. Tornou a guardar tudo debaixo do colchão e enquanto arrumava o lençol para que não ficasse nada fora do lugar, pôde ouvir os gritos vindos do corredor.

– Estava lá! O buraco estava lá! – alguém gritava desesperado e parecia estar a ponto de chorar.

Jasper endireitou o corpo de pé e afastou a persiana da janela, olhando pela fresta o que acontecia. Um homem careca estava sendo carregado por dois enfermeiros altos e fortes. Uma enfermeira gordinha e baixinha seguia na frente, guiando o caminho deles. Ela tinha caixa de primeiros socorros nas mãos.

– O buraco estava lá! Ele me chamou. Vocês ouviram, não ouviram? Eu ouvi, eu ouvi. – o cara não parava de gritar a respeito de um suposto buraco que lhe chamava. Isso talvez explicasse o corte em sua cabeça que escorria sangue pelo rosto. Ele devia ter socado a cabeça na parede achando mesmo que alguém tinha o chamado. – Vocês ouviram também. Ele me chamou! – o homem gritou outra vez, sendo arrastado para dentro de uma sala pelos caras grandalhões vestidos de branco.

A enfermeira gorducha fechou a porta revirando os olhos e Jasper tornou a se sentar na cama. Suspirou profundamente.

Que lugar era aquele? Já fazia três meses que estava ali e não se acostumava de maneira alguma. Não era louco, sabia disso. Entretanto, aprendera tarde demais a se manter calado sobre o que via e ouvia. Seu pai não teve dó nem piedade ao mandar uma ambulância para lhe dar uma carona diretamente para o inferno quando completou 18 anos.

O garoto loiro se deitou, evitando escutar os gritos desesperados do cara que acabara de passar. Tinha certeza que em qualquer canto daquele hospital psiquiátrico era possível escutá-lo. Também tinha certeza que estavam tentando prendê-lo numa camisa de força.

As horas se arrastaram naquele dia e quando Kate, sua enfermeira loira e muito bonita, veio lhe trazer o almoço a primeira coisa que ele pediu foi para dar uma volta lá fora.

– Claro, Jasper. Está um dia incrível lá fora, você vai adorar. – ela sorriu e passou a mão pelo cabelo bagunçado dele.

Kate era extremamente doce com seus pacientes e Jasper achava que ela era a única que não o considerava mesmo louco. Ela, sua mãe e sua irmã.

Quando colocou os pés na calçada que separava o gramado e a entrada para os quartos, Jasper respirou fundo. Sentiu o calor entrar em seus pulmões e aquecer sua pele quase albina. Havia outros pacientes por ali, cada um com um enfermeiro atrás enquanto falavam sozinhos ou corriam em círculos.

Kate deixou Jasper fazer o que quisesse e não ficou em sua cola nem o seguiu quando ele foi se sentar num banco de concreto perto do canteiro de margaridas amarelas. Lá, ele fechou os olhos e apreciou o bom tempo.

– Com licença, posso me sentar aqui? – Jasper abriu os olhos, colocando a mão sobre eles para fazer sombra. Contra a luz do sol estava parada uma garota com longos cabelos vermelhos alaranjados. Ela usava uma daquelas camisolas de hospitais e chinelos de dormir.

– Claro. – respondeu vendo a garota se sentar ao seu lado e mexer nos cabelos ruivos. Ela tinha sardas sobre o nariz e nas bochechas. Era adorável.

– Meu nome é Anne. Qual é o seu? – pediu ela.

– Jasper. – ele assentiu ao ver que ela sorria. Anne desviou o olhar no mesmo instante e corou.

– Está um dia admirável, não é mesmo senhor Jasper? – Anne comentou e Jasper olhou confuso para ela. Devia mesmo estar horrível para parecer tão velho a ponto de lhe chamarem de senhor.

– É, o dia está lindo. – respondeu ele e riu de leve quando Anne deu uma pequena gargalhada.

Uma brisa quente bateu contra seu rosto, balançando seus cabelos desgrenhados. As flores balançaram e Jasper se esticou, pegando uma pequena margarida e entregando a Anne.

– É muita gentileza sua, senhor Jasper. Não há mais cavalheiros hoje em dia. – ela agradeceu, admirando a florzinha entre os dedos.

Outra vez ele achou graça da maneira que ela o falou. Anne era muito bonita e parecia não ter mais que 19 ou 20 anos. Não parecia louca. Como será que havia parado ali?

– Este século está uma loucura. Não há mais pessoas gentis. – Anne reclamou gesticulando a mão direita como faziam as damas de filmes antigos.

– Este século? – perguntou ele, arqueando uma sobrancelha.

– Sim, século 19. Em que século acha que estamos, senhor Jasper? – Anne respondeu o encarando como se ele fosse maluco e soltou uma risadinha.

Enganara-se. Ela era mesmo maluca.

Um homem bastante sorridente, alto e de cabelos pretos, se aproximou do banco onde eles estavam e Anne exclamou um “Oh!” quando o viu.

– Senhorita Anne, vamos nos recolher? Está na hora do chá. – o homem falou. Ele vestia calça e jaleco branco, por dentro uma camisa azul-marinho. Jasper imaginou que ele fosse o médico de Anne.

– Veja só como as horas voam. Foi um prazer conhecê-lo, senhor Jasper. – a garota fez uma reverência puxando minimamente as laterais da camisola e enganchou o braço no do médico.

Jasper observou os dois irem embora. Era muito normal que os médicos ali não contrariassem seus pacientes em tudo, por isso não estranhou quando aquele homem entrou na brincadeira de século 19 com Anne. Será que hora do chá era a hora da garota tomar os remédios?

Mais tarde, em seu quarto, Kate veio trazer os remédios de Jasper. Ele fingiu tomar cada uma dos três cumpridos na frente dela, mas foi só mulher loira sair que ele os tirou de debaixo da língua e os jogou no vaso sanitário, dando descarga. O Hale sabia que se os tomasse aí sim perderia o juízo.

Então voltou para cama e colocou um travesseiro sobre a cabeça quando os gritos de algum outro paciente ecoaram pelos corredores.

[...]

Jasper Hale corria para fora do hospital como se alguém lá dentro quisesse amarrá-lo e roubar seus órgãos. Somente quando chegou lá fora, atravessou a rua e apoiou as mãos nos joelhos enquanto buscava por ar, foi quando percebeu a burrada que estava fazendo.

Estava sendo cruel e egoísta. Seria responsável pela morte de Alice, em partes, já que poderia impedir. Mas estava ocupado demais se escondendo atrás do escudo de medo que criara para jamais ser lançado novamente numa clínica de doentes mentais.

Quando sua mãe morreu, fazia oito meses que ele estava naquele lugar terrível. Sequer pode se despedir de Sarah, mas conseguiu ir ao velório com a ajuda da enfermeira Kate, que jurou que ele estava em ótimas condições para não fazer nada de errado.

Mas Jasper fez.

O loiro esperou o enterro acabar, abraçou a irmã e a mandou ir para casa com a melhor amiga que a acompanhava. Seguiu o pai até o estacionamento quase vazio e deu o mais forte soco que conseguira empunhar. A boca e o nariz do senhor Hale sangraram.

– Isso foi por você não ter cuidado dela como merecia. Todos esses anos. E isso, - outro soco, agora no estômago – isso foi por mim.

Depois daquele dia, Jasper nunca mais voltou ao manicômio. Sabia que causaria problemas a Kate e ao enfermeiro que o acompanhava, mas ela mesma tratou de despistá-lo. Kate era maravilhosa e havia colocado seu emprego em risco para que Jasper pudesse acertar as contas com o pai. Entretanto, sabia que não poderia voltar para agradecê-la.

Com uma mochila nas costas, o garoto de quase 19 anos pegou um ônibus e foi para casa de um amigo. Ficou por lá até que conseguisse fazer contato escondido com a irmã. Foram 2 anos até que o pai de Jasper morresse. Então ele vendeu a casa e guardou o dinheiro numa poupança para ele e Rosalie. Ela já estava na faculdade de psicologia e ele decidiu que era sua vez de estudar também.

Morando nos dormitórios da Universidade de Manhattan e com uma bolsa integral por sua extrema inteligência, Jasper começou o curso de engenharia de produção, mas não concluiu. Aquela cidade era barulhenta demais, carregava lembranças demais. Foi assim que decidiu deixar a metrópole e seguir para um lugar onde nenhuma alma perdida ou memória dolorida pudesse atormentá-lo.

Sua irmã ficaria bem. Aos 22 anos, Rosalie estava prestes a se formar e já estava noiva de um cara simpático e bastante protetor. Jasper já o tinha visto algumas vezes. Emmett cuidaria bem de sua irmãzinha.

Quando chegou a Forks, recebido por verde por todo lado, chuva e ventos gelados, sentiu-se finalmente em casa. Em paz. Aquela deveria ser uma das cidades mais pacatas do estado.

Mas aí apareceu Alice Cullen em sua vida e tudo estremeceu. Feito um furacão, em poucos dias, a baixinha fantasmagórica bagunçou a vida do Hale. Jasper não queria admitir, mas gostava dela. Tinha aprendido a gostar.

Ela era extremamente folgada e irritantemente animada. Sentava nos móveis e se espalhava neles como se fossem seus. Dava ordens de como mexer nas coisas como já fizesse aquilo há muito tempo. Jasper concluiu que o apartamento era dela. Tinha que ser, ela se sentia completamente a vontade lá.

E agora ela jamais poderia voltar para casa. Não acordaria, faria as malas e o expulsaria de seu canto velho, gasto e com cheiro de gato. Não poderia mais abraçar a mulher bonita que chorava grudada a seu corpo inerte. E tudo porque ele tinha medo de fazer um simples favor.

Jasper respirou fundo e ajeitou a postura.

Não carregaria consigo essa dor e culpa. Alice poderia ser um pé no saco, mas merecia viver. Mais do que ninguém, ela merecia.

Apressado e com medo de ter tomado a decisão tarde demais, Jasper correu de volta ao hospital. Teve que desviar da bicicleta quando atravessava a rua e da enfermeira que empurrava uma cadeira de rodas próxima à porta de entrada.

Ignorando os médicos que conversavam no corredor e a enfermeira mais velha que disse que era proibido correr por ali, ameaçando chamar a segurança, Jasper encontrou o corredor do quarto de Alice.

O doutor Eleazar estava na porta, junto com enfermeira morena, Isabella.

– Vamos esperar a mãe dela se acalmar. É uma situação difícil. Deixem que se despeçam e depois me chame para concluir tudo. – o médico alto com traços latinos falou. A moça assentiu e ele se foi.

– Ei espera! – Jasper a chamou - Esse é o quarto da Alice Cullen, certo?

– O senhor é algum parente ou amigo da família? – Isabella perguntou olhando desconfiada para o rapaz a sua frente. Os cabelos estavam bagunçados, as bochechas bastante coradas e o casaco parecia ter sido arrastado no asfalto.

– Mais ou menos. Sou amigo dela, a família não me conhece, mas eu preciso falar com eles.

– Sinto muito. Ninguém está autorizado entrar no quarto agora, eles estão num momento íntimo e triste.

– Ela morreu? – os olhos de Jasper se arregalaram.

– Não, não. Os pais e o irmão estão dizendo adeus, vão desligar os aparelhos. – contou Bella, mas se arrependeu de ter dito aquilo. Sequer conhecia aquele estranho, ele poderia nem ser amigo da paciente. – Sinto muito, mas você precisa ir agora. Se quiser, eu aviso aos pais da Alice que você esteve aqui.

– O que? Não, eu preciso entrar aí agora mesmo. – ele deu um passo à frente, mas a morena bloqueou a porta. – Moça, você não está entendendo. Eles não podem desligar os aparelhos dela.

– Essa não é uma decisão que cabe ao senhor. Agora se puder fazer o favor de se retirar, eu...

Isabella não teve a chance de concluir a frase. Jasper bateu na porta por cima da cabeça dela até chamar a atenção de todos lá dentro. Carlisle foi quem abriu.

– Algum problema? – pediu ele. Estava com uma expressão série, porém os olhos eram tristes.

– Senhor, eu sei que isso vai parecer maluco, mas vocês não podem desligar os aparelhos da Alice.

– E quem é você?

– Jasper. – a resposta foi dada por Alice, mesmo que ninguém pudesse ouvi-la. Tinha os olhos emocionados e agora estava ao lado do pai. O Hale a achou o espírito mais bonito que já vira. O mais frágil também.

– Sou Jasper, amigo da sua filha.

– Alice nunca nos falou de você. – Carlisle disse com a voz dura. Estava ficando sem paciência, queria voltar e aproveitar os últimos minutos com sua garotinha.

– Nos conhecemos há pouco tempo. – ele bufou frustrado quando viu a cara do pai de Alice. – Sua filha está aí do seu lado agora mesmo e me pedindo para não deixar que vocês cometam a besteira de desligar os aparelhos. Ela tem certeza que vai acordar.

Dito isso, Carlisle soltou uma risada baixa e dolorida. Irônica. Quem aquele moleque pensava que era pra dizer uma coisa dessas? Pra brincar num momento tão doloroso?

– Ouça bem, garoto. Eu e minha família estamos passando pelo pior momento de nossas vidas. É inaceitável que alguém brinque com esse assunto. Agora saia daqui. – Carlisle foi duro e decidido e seu olhar azul, gélido e cortante.

– Eu não estou brincando, senhor. Eu aluguei o apartamento dela. Ela apareceu lá há alguns dias e assim nos conhecemos. Eu não sou louco, mas vejo esse tipo de coisa. Alice está mesmo do seu lado agora. – ele tentou mais uma vez e foi surpreendido quando o homem loiro segurou a gola de sua camisa. Estava prestes a apanhar.

– Carl, querido, o que está acontecendo aqui? – Esme apareceu.

– Mamãe... – Alice falou, indo para o lado de Esme.

– Senhora, por favor, não desligue os aparelhos que mantém Alice viva. – ele apelou para mãe da garota, olhando diretamente em seus olhos.

Por alguns instantes ela não conseguiu desviar, mas quando foi capaz, olhou para o marido como se buscasse ajuda para entender quem era aquele estranho. O marido soltou Jasper.

– Esse garoto está dizendo que é amigo da nossa filha e que ela está aqui, agora, pedindo para não desligarmos os aparelhos. – Carlisle explicou e sua expressão impassível não saia do rosto.

Esme olhou para o marido tentando absorver as palavras. Buscava no rosto dele algum sinal que ele acreditava no jovem loiro a sua frente. Não encontrou, mas ele sempre foi descrente para coisas extraordinárias. Já ela acreditava que sempre poderia haver um milagre.

– Meu nome é Jasper Hale. Por favor, estou falando a verdade. Sei que isso tudo é muito estranho, parece loucura, mas não é. Vocês não podem desligar os aparelhos, ela vai acordar. – Jasper tentou outra vez, não sabendo mais o que fazer para convencê-los.

Esme o encarava querendo ceder. Algo nele parecia que aquilo era a coisa mais séria do mundo, mas tinha medo de ser algum maluco brincando com sua dor de mãe. Ela conhecia a maioria dos amigos da filha ou já ouvira ao menos comentar sobre eles. Nunca Alice mencionara qualquer Jasper Hale.

– De onde você conhece minha filha? Como sabia que estávamos aqui agora? – Esme quis saber.

– Alice apareceu há alguns dias no meu apartamento. No apartamento dela, fui eu quem alugou. Ela me pediu esse favor, eu vim parar aqui quando ela me salvou de um acidente hoje mais cedo. Mas isso não vem ao caso. Vocês não... – Jasper estava se enrolando nas palavras, não sabendo mais argumentar, quando foi interrompido.

– Prove. – a voz pediu. O rapaz alto de cabelos bronze com traços perfeitos que lembravam Alice apareceu atrás da mãe.

– O que? – Jasper pediu, sem compreender.

– Prove que Alice está mesmo aqui. Prove que a conhece. – Edward exigiu.

Esme encarou o filho com uma centelha de esperança, como se Edward estivesse do lado dela e não achasse aquilo tudo uma loucura ou brincadeira como o marido acreditava. Carlisle bufou nervoso, não aguentando mais aquilo. Ele sentia-se desrespeitado. Sentia que estavam desrespeitando os últimos minutos de sua garotinha.

O Hale olhou para Alice, ainda ao lado da mãe. Buscava nos olhos dela alguma reposta para fazer o que o irmão da garota exigia.

– Fale da Petchs. – ela disse.

– Petchs? – repetiu Jasper, confuso. Esme olhou para Edward, como se aquilo pudesse ser um sinal, mas o filho ainda parecia duro em sua expressão.

– É minha gata.

– Ela tem uma gata chamada Petchs. – contou Jasper.

– Isso é fácil, Alice falava da gata para todos. – refutou Edward.

– Fala que eu tenho cócegas nos pés, só minha família sabe disso. – tentou Alice e Jasper a encarou como se aquilo fosse ridículo.

– Cócegas nos pés, Alice? – tentou resmungar só para ela, olhando para o espaço vazio ao lado de Esme. A mulher seguiu seu olhar, não encontrando nada, mas desejando que a filha estivesse mesmo ali.

– Qualquer um tem cócegas nos pés. Você não está nos convencendo. – Edward tentava continuar impassível como o pai, mas já estava amolecendo por dentro. Qualquer sinal de que sua irmãzinha voltaria para ele já valia a pena, mas não queria dar falas esperanças à mãe.

– Ora, já chega. Vamos voltar e você vai embora antes que eu chame a segurança. Ou melhor, Bella pode fazer isso, por favor? – Carlisle pediu à enfermeira que olhava assustada a cena a sua frente.

– Ah claro. – então ela saiu, não sabendo de fato se deveria obedecer ao pai de sua paciente. Às vezes ela acreditava em coisas sobrenaturais, ainda mais quando já vira diversos milagres naquele hospital.

– Oh merda. – Jasper resmungou baixo, agarrando os cabelos e sentindo-se impotente. Viu Carlisle conduzir Esme pelos ombros de volta ao quarto, a mulher voltando a chorar.

– Já sei! Fale da palheta! – disse Alice, enquanto o irmão olhava feio para o loiro.

– Palheta? – sussurrou Jasper. Edward já lhe dava as costas para seguir os pais, balançando a cabeça como se tudo aquilo tivesse sido em vão.

– Meu irmão foi a um show aos 14 anos escondidos do meu pai e ganhou sua primeira palheta lá. Ela é preta com o símbolo do Ramones, está escondida em uma latinha no fundo do guarda-roupa. – Alice contou tudo rapidamente, quase engasgando. Edward já estava com a mão na maçaneta. – Diga logo, Jasper! – berrou ela.

– Você tem uma palheta que ganhou aos 14 anos num show que foi escondido dos seus pais. Está numa lata no fundo do guarda-roupa. – disse Jasper, segurando o braço de Edward.

O Cullen paralisou. Pela primeira vez uma real esperança de que aquele cara não fosse um maluco ou engraçadinho. Só Edward e Alice sabiam daquilo.

– Diga o nome da banda, é a favorita dele. – pediu Alice, empurrando Jasper e suas mãos passando direto pelo casaco acabado dele.

– É preta, dos Ramones. Alice disse que é sua banda favorita.

Edward encarou o loiro no mesmo instante. Jasper suspirou. Dava para ver nos olhos do irmão de Alice que ele acreditava. Edward deixou uma lágrima escorrer, soltando a maçaneta e dando um passo a frente.

– Alice está mesmo aqui?

Jasper assentiu.

– É maninho, eu to aqui. – Alice falou emocionada, se aproximando do irmão. Queria poder abraçá-lo agora.

– Você precisa falar com seus pais. Alice não sabe como, mas tem certeza que vai acordar. – Jasper assumiu uma expressão séria ao falar, olhando para Edward, que assentiu.

– Vou fazer de tudo para que eles acreditem em você. Tudo que mais quero, que minha família quer, é nossa baixinha de volta. – confessou Edward e apesar de emocionada, a garota fez careta.

– Eu também quero voltar, topetudo. – disse ela e Jasper riu.

– Ela disse que também quer voltar e te chamou de topetudo. – contou o loiro refazendo o outro rapaz rir.

– É bem dela mesmo. – Edward deu um sorriso torto que a irmã sabia que fazia as pernas de várias garotas bambearem. – Obrigado Jasper. Obrigado por vir até aqui salvar minha irmã. – agradeceu sinceramente. Queria poder expressar melhor a gratidão que sentia, mas precisava voltar para o lado do leito da irmã.

– Eu devia isso a ela. – respondeu Jasper e viu Edward assentir.

Então o Cullen deu as costas à alma da irmã que não conseguia ver e ao loiro que estava salvando a vida da família, e entrou no quarto, fechando a porta atrás de si.

[...]

Os setes meses seguintes foram terrivelmente tranquilos para Jasper. Alice nunca mais apareceu depois do dia em que ele foi ao hospital e tentou convencer os pais dela a não desligarem os aparelhos. E se não fosse pelo velhinho sentado sobre o vagão de trem que vira acenando para ele semana passada, poderia dizer que mais nenhum espírito perdido tinha aparecido por Forks.

Ficou completamente aliviado quando, no dia seguinte, foi ao hospital e encontrou Alice adormecida em seu quarto cinzento. Não que fosse bom vê-la em coma, mas era bem melhor que vê-la num caixão. Encontrou Edward algumas vezes enquanto visitava Alice e eles tiveram breves conversas. O Cullen sempre o agradecia.

– Minha irmã ainda tem te atormentado? – perguntou o Cullen em uma das visitas, fazendo Jasper rir e negar com a cabeça.

– Não, depois daquele dia maluco ela nunca mais apareceu.

– Ah. – Edward pareceu triste.

– Ela deve estar se preparando pra voltar. – Jasper tentou animá-lo e viu Edward assentir.

Depois de toda aquela cena com a família de Alice, Jasper achou que tinha passado a bola para Edward ao convencê-lo. Não entendia ainda porque vinha visitá-la. Por que se sentia sozinho no apartamento e até mesmo um invasor do espaço dela. Por que se lembrava dela sempre que ligava aquele chuveiro confuso e se arrepiava com a água gelada demais.

Era para ele estar irritado com Alice. Ela o fez pagar de louco na frente de um bando de desconhecidos. Por sorte Bella não tinha realmente chamado os seguranças, ou a alguém da ala psiquiátrica. Entretanto, por alguma razão, sentia que Alice o ajudara. Não o contrário, como parecia.

Alice Cullen havia ajudado Jasper Hale a dar o primeiro passo para superar os traumas do passado.

Hoje pela manhã, os pais de Alice estavam a visitando. Sequer eram 7 da manhã, mas vieram correndo ao hospital quando o doutor Eleazar ligou dizendo ter percebido uma alteração no quadro da paciente.

– Minha filha está bem? Não me diga que ela está morrendo, por favor... – Esme estava prestes a chorar.

– Pode se acalmar, senhora Cullen. Eu tenho boas notícias. – disse o neurologista e ela suspirou aliviada, recebendo um aperto nos ombros do marido. – Identifiquei uma melhora na atividade cerebral da sua filha. E quando nossa enfermeira Bella veio olhá-la hoje mais cedo afirmou ter visto Alice mexer alguns dedos da mão direita.

Os olhos de Esme se arregalaram e ela parecia ter ganhado o melhor presente de Natal do mundo.

– Isso não pode ter sido apenas um espasmo? Você já disse que isso poderia acontecer. – Carlisle perguntou. Não queria perecer descrente diante da possível melhora da filha, mas sua esposa já dava sinais de que um milagre havia acontecido e não queria que ela se decepcionasse.

– Sim, senhor Cullen. Mas tendo em vista a melhora neurológica de Alice, me faz acreditar que haja uma grande possibilidade dela estar retomando os movimentos. Não estou afirmando que ela está nos ouvindo agora, consciente, ou que vá acordar no próximo instante, mas as coisas realmente mudaram. Há mais chances, senhor Cullen.

O discurso do médico não deixou que mais dúvidas ou descrenças tomassem o patriarca da família. Carlisle finalmente sorriu aliviado, abraçando a esposa. Quando Edward entrou, sorridente e acompanhado de Isabella, Esme contou a boa notícia ao filho.

O coração da família Cullen batia no mesmo compasso, aquecido e cheio de esperanças.

Nas duas semanas seguintes as coisas pareciam estar na mesma. Vez ou outra Isabella, Eleazar e a família de Alice presenciava algum movimento sutil dela. Infelizmente ainda não se podia precisar se a garota os escutava, mas Esme sempre acreditou que sim. Por isso estava ali agora, contando a mais nova de Petchs.

– Sua gatinha está muito folgada, querida. Ela destruiu mais uma das minhas almofadas. Como você consegue viver com ela naquele apartamento minúsculo? – Esme riu, acariciando o braço imóvel da filha.

O corredor estava silencioso, um dia nublado, típico de Forks, se passava lá fora. Edward estava na aula de música, ensinando seus pequenos alunos a tocarem violão. Carlisle havia ido à cantina do hospital.

– Quando você acordar, nós vamos ter uma conversinha sobre aquele lugar. Te conheço muito bem para saber que vai querer expulsar o rapaz que o alugou. Não quero mais você se espremendo naquela lata de sardinha, docinho. – Esme fez careta.

Já sei onde Alice aprendeu a fazer esse bico adorável, querida. Carlisle disse uma vez a esposa. Alice era totalmente Esme. As duas se comunicavam até quando estavam em silêncio.

– Bom, acho que seu pai encontrou alguma enfermeira bonita pelo caminho, já que está demorando tanto. – a mulher riu, virando-se para pegar a bolsa. – Vou pra casa antes que Petchs destrua mais alguma coisa lá.

Esme ficou de pé, ajeitando a bolsa marrom no ombro. Curvou-se para beijar a testa da filha e ajeitar o lençol debaixo dos braços dela. Estava quase na porta, quando ouviu um murmúrio baixinho e respiração agitada. No instante que se virou viu a filha tentando falar. O peito de Alice subia e descia rapidamente e olhos remexiam como se ela quisesse abri-los, mas não conseguisse.

– Filha, filha. – Esme correu para junto da cama dela, a mão voando para os cabelos mais cumpridos e depois para bochechas sem cor. – Alice, meu bem, sou eu. A mamãe. Abra os olhos, docinho. – pediu com a voz embargada pelo choro que viria.

– Mãe... – a voz de Alice não passou de um sussurro quase inaudível.

– Oh meu Deus! Eu estou aqui, Alice. – respondeu a mãe, chorando copiosamente sobre a filha.

O peito de Esme estava inflando de tanta alegria e emoção. Sua filha, sua garotinha, tinha voltado para ela. Deixar que desistisse de Alice, aceitar que a condição em que ela se encontrava era irreversível, fora seu pior erro e não sabia se seria capaz de se perdoar.

Alice conseguiu abrir os olhos, mas teve que fechá-los imediatamente. Era claro demais. Estava confusa e a mãe chorava em cima dela. Queria dizer para Esme que estava tudo bem, que seja lá o motivo da tristeza, iria passar. Mas só conseguia pensar em como sua boca estava seca.

– Pode... Água? – Pode me dar um pouco de água? Foi o que ela quis dizer, mas as palavras não saíam de jeito nenhum. Mesmo assim, Esme pareceu entender seu sussurro.

– Água? Claro, claro docinho. Só um minuto. – ela soltou a filha e foi procurar por um copo.

Estava desnorteada ainda, sorrindo e chorando. Enquanto enchia um copo com a jarra de vidro que ficava ao lado da cama de Alice, as mãos tremendo, Carlisle entrou no quarto.

– Querida, me desculpe pela demora. Eu... – ele nem pode terminar a frase.

– Pai... – Alice murmurou baixinho, fechando os olhos e sorrindo de leve.

O copo descartável com café quase caiu das mãos dele. O homem loiro se aproximou da cama de hospital, com um sorriso enorme no rosto confuso. Os olhos azuis arregalados.

– Alice, você acordou, minha filha. – disse ele, ajoelhando ao lado da cama dela. Viu a garota assentir e tentar falar, mas seu rosto delicado e pálido e retorceu numa careta.

– Aqui docinho, beba. – Esme chegou com o copo de água na frente dela e a ajudou beber.

O processo foi lento. Alice bebia pequenos goles e cada um deles parecia arranhar sua garganta. Ela queria perguntar pelo irmão. Carlisle não soltava sua mão direita e Esme na parava de sorrir e chorar enquanto a ajudava.

Quando a “ficha caiu”, Carlisle foi buscar o doutor Eleazar. Isabella, assim que soube, terminou com um de seus pacientes e foi ver a garota. Mal podia acreditar que tinha presenciado outro milagre no Hospital de Forks.

Nos dias que se passaram Alice foi examinada diversas vezes. Sua voz começava a voltar e logo ela começaria a fazer fisioterapia para recuperação total de sua coordenação. Era difícil segurar os talheres para comer quando suas mãos pareciam estar com câimbras eternas e seus dedos não obedeciam. Às vezes ela tinha flashes do acidente, mas nada muito claro.

– A Petchs deu muito trabalho a mamãe? – ela quis saber.

Edward estava sentado na beirada de sua cama, contando com foram os últimos cinco anos. Ela sequer acreditou que dormiu por tanto tempo. Apesar de achar que não teria sono nunca mais, ainda não conseguia passar o dia todo acordada como desejava. Sabia que a mãe ficava com o coração apertado quando ela dormia por uma tarde toda, mas não conseguia evitar. Esme ainda tinha medo que que ela voltasse a dormir por dias.

– Tirando alguns chinelos e almofadas que foram destruídas, nada demais. – Edward falou e os dois riram.

Ele queria perguntar se ela se lembrava do cara que salvou sua vida. O loiro que a visitou todas as semanas nos últimos 7 meses, menos nesses últimos dias, justamente quando ela acordara. Edward não sabia, mas Jasper viajara para casa da irmã, na Califórnia. O bebê de Rosalie tinha nascido e ele queria conhecer o sobrinho.

– Mal posso... – ela bocejou. – Mal posso esperar para abraça-la. – disse Alice.

– E eu para que você a leve embora. Quase perdi um cabo da guitarra porque ela queria mordê-lo. Aquela gata é maluca. – disse ele e os dois tornaram a rir. Edward não conseguia imaginar um som do qual mais sentira falta que a risada da irmã.

Eles continuaram conversando. Alice não queria dormir, então a todo o momento fazia perguntas a respeito das coisas que havia perdido. Algumas delas Edward não sabia responder, como sobre quem era a nova Miss Universo ou se seu reality show favorito havia sido cancelado.

Em frente ao hospital, um homem apressado corria para entrar. Só pela manhã havia conseguido recuperar seu numero antigo de celular. Tinha perdido o aparelho no aeroporto da Califórnia. Assim que voltou a Forks, ontem a noite, quis comprar um novo, mas já era tarde. Conseguiu fazer isto essa manhã e recuperar o número antigo. Quase teve um ataque cardíaco quando viu a mensagem enviada por Edward há poucos dias atrás.

Alice acordou, venha visitá-la.

Ele saiu voando da loja de aparelhos telefônicos em direção ao hospital. Atravessou a rua assim que encontrou uma brecha entre os carros não muito rápidos e se embrenhou pelos corredores brancos e frios. Outra vez uma enfermeira velha e resmungona ameaçou chamar a segurança se ele não parasse de correr. Jasper não deu importância, ele queria ver Alice. Nada mais importava.

Alcançou o corredor dela e ouviu a conversa baixa entre duas pessoas assim que se aproximou da janela dela. Ele estacou no lugar. Será que ela se lembrava dele?

– Oh, você apareceu. – Isabella, segurando uma bandeja metálica e usando luvas de borrachas apareceu, saindo de um quarto. – Alice acordou. Veio visitá-la? – perguntou sorridente.

Jasper assentiu, mas não estava mais certo disso. Tinha medo de ela o achar maluco. Edward não disse nada na mensagem sobre a irmã querer vê-lo ou que se lembrava dele.

– Edward está com ela. Tenho certeza que ela vai gostar de te conhecer de verdade. – disse Isabella, o encorajando. Outra vez ele assentiu e ela piscou. Então o deixou sozinho, sumindo na curva a direita.

Jasper precisou respirar fundo várias vezes. Estava sendo um covarde, como Alice mesma o chamara uma vez. Deu um passo a frente, imaginando que explicação convincente daria a ela se não o reconhecesse. Entretanto, nenhum desculpa ou explicação foram necessárias.

O loiro girou a maçaneta e entrou. Os olhos dos dois se encontraram e Alice sorriu. Não estivera sonhando esse tempo todo então. Imagens de sua experiência fora do corpo, vira e mexe, vinham em sua cabeça, mas ela jurava que devia estar louca ou que sonhara demais enquanto dormia por cinco anos. O caro loiro e gato de sua cabeça, o único que a via, não podia ser real. Sua família não o havia mencionado ainda, então achou mesmo que tinha delirado no coma.

Agora ele estava ali. Em sua frente a encarando com aqueles olhos cor mel completamente irresistíveis. Seu coração esmurrou forte no peito, parecia cavalgar apressado. O do homem na porta estava da mesma forma quando ela abriu a boca para falar.

– Jasper.

E os dois sorriram um para o outro como se tivessem feito isso a vida toda.


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Notas finais do capítulo

Bom, vocês entenderam a vida do Jasper, tudo que ele passou. Não foi nada fácil ficar longe da mãe, numa clínica psiquiátrica, sendo perfeitamente normal, apenas com um dom incompreendido. Mesmo assim, pela Alice, ele superou esse medo de falar e a ajudou.
Nossa fadinha acordou! E ela se lembrava dele, só não tinha tanta certeza. Mas olha só, se reencontraram no final e foi lindo.
Obrigada a todas que acompanharam. Deixem um comentário, me façam feliz.
Beijinhos!