Preciosa escrita por Na2000


Capítulo 3
Capítulo 3




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Depois da conversa que tive com Emily, saí da cozinha e peguei um elevador para o andar subterrâneo do prédio, onde ficava a mina. Esse foi o meu único emprego desde sempre e o consegui quando tinha apenas 9 anos e idade, e eu era extremamente agradecida por isso, afinal, o pequeno salário que eu recebia já tinha salvado a pele dos meus pais em diversas situações. E hoje salva a minha pele para criar os meus irmãos. Mesmo gostando daquele lugar, haviam muitas memórias tristes que se arrastavam por aquelas paredes. Há 3 anos houve um deslizamento de terra ocasionado por um tremor inesperado em nossa região, e infelizmente meus pais estavam trabalhando naquele momento. Meu pai foi atingido por uma pedra enorme na cabeça e acabou não resistindo aos ferimentos, já minha mãe conseguiu se salvar sem grandes machucados, mas depois de uma semana, Enarya a encontrou morta no banheiro com os pulsos cortados. Ela não conseguiu superar a morte do meu pai, e tudo o que deixou foi uma carta de despedida.
   A partir daquele momento as coisas jamais foram as mesmas. Loha  era recém - nascido, Enarya tinha apenas 10 anos e eu tive que assumir a responsabilidade e cuidar dos meus irmãos. Algo muito difícil para uma garota de 15 anos, vivendo em condições precárias e seguindo o ritmo de uma sociedade injusta e cruel.
   Hoje com 18 anos eu olho para trás e lembro de tudo o que passei e me orgulho da pessoa que me tornei: Forte, Independente e capaz de fazer qualquer coisa pela família. Sinto que meus pais estariam orgulhosos de mim e me apoiariam na decisão de querer participar da Missão. É a única perspectiva de uma vida melhor que posso dar para Enarya e Loha.
   Quando cheguei na mina, fui direto para o meu posto e comecei a trabalhar imediatamente, eu tinha gastado tempo demais conversando com Emily e precisava cumprir minhas 18 horas diárias de trabalho, o que era uma tortura ter que trabalhar das 5h da manhã até às 23:00 da noite sem pausas, com apenas 10 minutos para o almoço. Como eu passava praticamente um dia trabalhando, era Enarya que cuidava de Loah, mas isso vinha me preocupando nas últimas semanas, de tal maneira que eu comecei a pedir para Jay ir verificar se estava tudo bem em casa, afinal ele saía do trabalho antes de mim (benefícios de trabalhar na colheita, quando escurece você pode ir para casa), Enarya estava distante, fria e revoltada com a vida que estávamos levando, e eu entendia o seu ponto de vista, eu também não aguentava viver daquela maneira. Mas era a nossa única escolha. O mais estranho era que ela estava muito agressiva e não tinha mais paciência com Loah ( que vinha aparecendo com alguns hematomas nos bracinhos, e a desculpa que ela dava era sempre a mesma: ele se machucou sozinho) e não falava direito comigo, sempre desviava o olhar. Tudo isso começou quando eu a peguei em flagrante torturando um gato de rua da vizinha ao lado, o que me deixou horrorizada e sem chão, pois eu não reconhecia mais a minha irmãzinha doce e sensível que sempre me apoiou nos momentos difíceis. Era triste ver o que uma vida de marda era capaz de fazer com as pessoas.
   Quando deu a hora de ir embora, eu só pensava em ir pra casa e dormir. Dormir. Era disso que eu precisava, fazia tempo que eu não dormia direito e meu corpo estava começando a demonstrar alguns sinais de cansaço extremo. Desci a rua escura e fui para casa em silêncio. Ainda bem que eu morava a menos de 10 minutos da mina e não precisava pegar trem, isso economizava um dinheiro e tanto. Segui meu caminho é decidi colocar uma música no meu "Radinho de Guerra", afinal eu tinha ele à tantos anos. Decidi ouvir Muddy Waters:

https://youtu.be/Ss8t7a8n0U4

Muddy Waters

We are kneeling at the rivers edge and tempting
All the steps to follow closer right behind
Is it only when you feel a part is empty
That it’s gnawing at the corners of your mind

I will ask you for mercy
I will come to you blind
What you’ll see is the worst me
Not the last of my kind

Oooh
In the muddy water we’re falling
Ooooh
In the muddy water we’re crawling

Hold me down
Hold me now
Sold me out
In the muddy waters we’re falling

It is not clear why we choose the fire pathway
Where we end is not the way that we had planned
All the spirits gather round like its our last day
To get across you know we’ll have to raise the sand

Oooh
I will ask you for mercy
I will come to you blind
What you’ll see is the worst me
Not the last of my kind

Oooh
In the muddy water we’re falling
Ooooh
In the muddy water we’re crawling

Hold me down
Hold me now
Sold me out
In the muddy waters we’re falling

Ooooh
Don’t fail me now
Put your arms around me and pull me out
Ooooh
I know I’m found
With your arms around me, oh save me now

Oooh
In the muddy water we’re falling
Ooooh
In the muddy water we’re crawling

Hold me down
Hold me now
Sold me out
In the muddy waters we’re falling

We are kneeling at the rivers edge and tempting
All the steps to follow closer right behind
Is it only when you feel a part is empty
That it's gnawing at the corners of your mind

I will ask you for mercy
I will come to you blind
What you'll see is the worst me
Not the last of my kind

In the muddy water we're falling
In the muddy water we're crawling

Hold me down
Hold me now
Sold me out
In the muddy waters we're falling

It is not clear why we choose the fire pathway
Where we end is not the way that we had planned
All the spirits gather round like its our last day
To get across you know we'll have to raise the sand

I will ask you for mercy
I will come to you blind
What you'll see is the worst me
Not the last of my kind

In the muddy water we're falling
In the muddy water we're crawling

Hold me down
Hold me now
Sold me out
In the muddy waters we're falling

Don't fail me now
Put your arms around me and pull me out
I know I'm found
With your arms around me, oh save me now

In the muddy water we're falling
In the muddy water we're crawling

Hose me down
Hold me now
Sold me out
In the muddy waters we're falling

Águas turvas

Águas turvas
Estamos ajoelhado na beira dos rios e tentador
Todos os passos a seguir mais de perto logo atrás
É apenas quando você se sentir uma parte está vazia
Que está roendo os cantos de sua mente

Vou pedir-lhe para a mercê
Eu virei a você cego
O que você verá é o pior me
Não o último da minha espécie

Na água barrenta que estamos caindo
Na água barrenta estamos rastreando

Me segure
Me segure agora
Me vendeu
Nas águas lamacentas que estamos caindo

Não está claro por que escolher o caminho do fogo
Onde vamos acabar não é a maneira que nós tínhamos planejado
Todos os espíritos se reúnem em volta, como é o nosso último dia
Para atravessar você sabe que vai ter que levantar a areia

Vou pedir-lhe para a mercê
Eu virei a você cego
O que você verá é o pior me
Não o último da minha espécie

Na água barrenta que estamos caindo
Na água barrenta estamos rastreando

Me segure
Me segure agora
Me vendeu
Nas águas lamacentas que estamos caindo

Não me falhar agora
Coloque seus braços em volta de mim e puxar-me para fora
Eu sei que estou encontrados
Com seus braços em volta de mim, oh me salvar agora

Na água barrenta que estamos caindo
Na água barrenta estamos rastreando

Hose me abaixo
Me segure agora
Me vendeu
Nas águas lamacentas que estamos caindo.

Enquanto eu ouvia a música, só conseguia pensar na proposta que Emily tinha feito. Era arriscado demais assumir a personalidade de outra pessoa, se me descobrissem eu seria morta sem pensar duas vezes, mas era muito tentador ter a chance de participar da Missão. Meus irmãos estariam seguros e alimentados em uma base militar. Isso era um sonho comparado a miséria em que vivíamos. Decidi que aquilo era a única alternativa para mim e resolvi aceitar, no outro dia falaria com Emily e daria os primeiros passos para ser aceita na missão.
   A rua estava muito escura e eu tinha um pouco de receio de andar a essa hora na rua. As coisas estavam mais difíceis e as pessoas mais desesperadas, ninguém era mais amigo de ninguém, as pessoas só queriam cuidar de suas famílias e não ligavam para os meios que iam usar para fazer isso.
   Continuei andando e avistei um homem sentado na calçada com um cigarro na boca, mesmo na miséria as pessoas arrumavam um jeito e sustentar os seus vícios. Ele começou a me encarar fixamente e eu apertei o passo, quando virei a esquina percebi que o homem tinha sumido da calçada. Faltavam alguns metros para chegar em casa quando senti que alguém agarrou o meu braço e tapou  a minha boca. Entrei em desespero e comecei a me debater e gritar inutilmente. Percebi que era um homem e comecei a pensar em mil coisas que poderiam acontecer comigo, eu estava prestes a chorar quando ele me preensou contra a parede e pude ver seu rosto:
   - Oi linda
  - Seu desgraçado!!! Puta que pariu, seu filho da mãe!!! - era Jay, ele não conseguia parar de rir e eu ainda estava em estado de choque.
 -Posso saber o que você ainda está fazendo na rua a essa hora - ele tinha razão já tinha passado da meia-noite, e ninguém mais ficava na rua a partir desse horário, era quando os roubos e assassinatos aconteciam frequentemente.
  - Eu me atrasei no serviço, tinha muito o que fazer hoje, decidi ficar um tempinho a mais para compensar - eu não ia falar pra ele sobre a proposta da Emily, eu queria resolver com ela primeiro.
  - Vem, eu te levo pra casa - ele me deu um beijo caloroso e depois me deixou sair da parede. Eu gostava de Jay, não o amava, mas ele era muito bom pra mim e me ajudava muito. Era bem provável que eu ia acabar me casando com ele.
   Seguimos para casa em silêncio, eu sabia que Jay estava abatido com a notícia de que não poderia participar da Missão, mas ele não queria falar sobre isso. Jay foi preso quando tinha sete anos, por roubar uma lata de ervilhas para alimentar a sua família, uma injustiça que só pode ser revertida porque a mãe dele sucumbiu à cantada do Delegado e acabou entregando o seu corpo em troca da liberdade do filho.
   Quando chegamos em casa, a porta estava escancarada e os meus irmãos não estavam na cama.
   -Cadê eles Raíra?
 -E-eu não sei, era pra eles estarem dormindo. - comecei a me desesperar, Jay começou a revistar a casa e eu saí, comecei a bater nas portas do vizinhos, mas ninguém me atendia. Provavelmente por medo de ser alguém com má intenção.
  -ENARYA!!! LOAH!!! POR FAVOR ALGUÉM ME AJUDA!!! - comecei a correr pelas ruas e gritar desesperadamente, mas não recebi  nenhum sinal dos dois. Bem distante, eu conseguia ouvir os gritos de Jay chamando pelos dois também.
   Comecei a andar sem rumo e as lágrimas desciam incontroláveis, quando percebi, eu já estava bem longe da minha casa, em uma região desconhecida e perigosa. Foi quando ouvi um grito de uma criança:
   - Socorrrooo!!!
Comecei a correr em direção ao grito que ecoava cada vez mais alto.
  - Loah!!! É você? Por favor me responde!!! - cheguei em um beco imundo e vi a silhueta de um menininho no escuro chorando e tinha um homem atrás dele. Eu estava em choque, não conseguia respirar direito e as lágrimas rolavam sem parar.
 - LOAH, querido, vem, vem comigo!!! Por favor amor, vem comigo!
  O homem pegou no braço do menino com brutalidade e veio até mim, na direção da luz. O homem era enorme, barbudo e estava muito sujo, a criança era mais magra que Loah e tinha o cabelo enrolado.

— O que você quer? - perguntou o homem.
         - Quem é ele? - apontei para o garotinho. Eu estava receosa, eu sabia que aquele garotinho não era Loah, mas eu só conseguia pensar no que aquele homem estava fazendo com aquele garotinho no escuro.
                  - Ele é meu filho.
   O homem me deu as costas e saiu andando com o menino relutantemente.
   Eu não sabia o que fazer, não existia polícia, apenas para o governo e prováveis criminosos como aquele homem poderia m fazer o que quisessem na escuridão de um beco que jamais seriam punidos.
    Eu fiquei mais alguns minutos olhando os dois sumiram na escuridão da rua até retornar para a minha busca implacável. Depois de alguns minutos, Jay se juntou a mim e continuamos procurando por horas, até o Sol aparecer e avisar que era hora de trabalhar. Sem os meus irmãos.

 


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Notas finais do capítulo

Comentem e favoritem =)



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