Primeiro Amor escrita por Madu Oms


Capítulo 1
Capítulo único - Primeiro Amor


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem. Qualquer erro, por favor, não hesitem em me avisar!



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Ele devia ter um pouco mais de 1,80 de altura, o que já contrastava bastante com meus quase 1,60. Era moreno, tinha olhos cor de mel e era muito mais forte e bronzeado do que eu jamais seria. Seu nariz e suas bochechas eram salpicados com pequenas sardinhas, que denunciavam os 18 anos vivendo no Rio de Janeiro e indo à praia quase todos os dias.

Vítor era primo da minha melhor amiga e nós não tínhamos nos encontrado em mais do que três ocasiões. E, como em todo bom clichê, tínhamos ótimas histórias para contar de todas as três.

Na primeira vez, eu tinha 10 e ele tinha 12. Estávamos os dois no sítio da Ana – minha amiga –, brincando com os cachorros e contando piadas de algum livro ruim de piadinhas infantis. Na época, Vítor usava cabelo estilo Justin Bieber e passava quase a tarde toda lendo Naruto e reclamando de estar naquele fim de mundo – como todo bom pré-adolescente classifica qualquer lugar que não tenha wi-fi ou canais fechados. Tinha sido um milagre tirá-lo de dentro da casa.

Mas, quando saiu, me deu o melhor dia daquela viagem toda.

A família da Ana vivia dizendo que eu e ele namoraríamos. A própria Ana, que sempre tivera uma quedinha por ele, estava toda animada planejando nosso casamento. Só nós dois não achávamos que algum dia nossa amizade viraria algo a mais.

Na segunda vez, eu tinha 12 e ele 14. Era minha primeira viagem para fora do estado sem meus pais, e eu estava um pouco insegura. Ana Letícia fez questão de segurar minha mão durante todo o vôo até o Rio – que ficava a menos de duas horas de Curitiba quando íamos de avião.

Ficamos num hotel pertinho da casa dos tios da Ana. Vítor – que agora não deixava o cabelo crescer o suficiente nem para cobrir a testa e fazia cara feia quando o chamávamos de Vitinho – foi com os pais nos recepcionar, e me deu um abraço demorado assim que me viu. Ouso dizer que demorou mais do que o da Ana.

Ela disse que isso se devia ao fato de eu ser a namorada dele, enquanto que ela era só a prima.

Por algum motivo, a ideia de ser namorada de Vítor me fez sentir coisas estranhas na barriga. Uma mistura de friozinho com enjoo. E eu não posso dizer que não gostei.

Naquela vez, Vítor nos levou para tomar sorvete e nos apresentou a alguns amigos – que não queriam papo conosco, aliás. Eles nos chamavam de “pirralhas”. Vitinho fazia careta para o apelido nada carinhoso e nos dizia que seus amigos eram muito infantis.

Em algum ponto da semana, Ana ficou doente e me disse para ir passear com o primo dela sozinha. Claro que aos 12, com toda a inocência que eu tinha, não imaginei que aquilo era só um plano para me juntar com Vítor. Mas obedeci minha amiga e fui passar a tarde no prédio dele.

Brincamos de vários jogos estranhos que meninos de 14 anos gostam e que eu não curti tanto assim – nem quando fiz 14. Ele me ensinou músicas engraçadas, mostrou vídeos de pessoas se assustando e confessou que meu nome, Raquel, o lembrava raquete. Em pouco tempo, aquilo virou um apelido.

No final da tarde, a mãe de Ana me ligou para avisar que ela já estava se sentindo melhor – dona Célia mais tarde confessou que tinha ajudado minha melhor amiga a arquitetar aquele plano absurdo – e que jantaríamos numa pizzaria. Me disse para convidar Vitinho e esperar com ele na frente do prédio.

Desliguei o telefone e passei o recado.

— A dona Célia e a Ana tão vindo me buscar pra gente ir jantar numa pizzaria e elas disseram para eu te levar.

Vítor fez uma careta engraçada.

— Não vai perguntar se eu quero?

Dei de ombros. A fala de dona Célia não parecia um pedido, e sim uma ordem.

— Ok, Raquete. Então vamos.

Ele me pegou pela mão e começou a marchar em direção ao elevador, enquanto discava o número de casa e avisava que ia sair conosco. Por algum motivo, o toque dele fez meu coração parar e depois voltar a bater com toda a força.

Vítor só soltou minha mão quando já estávamos no elevador.

— Acho que a minha mãe vai pra lá, também – e então fez uma carinha confusa. – Ué, por que você tá vermelha?

— Nada não.

— Tem certeza?

— Tenho sim.

— Ok.

E a conversa foi encerrada. Mas hoje, lembrando do olhar dele, eu tenho certeza de que meu amigo sabia exatamente o motivo de eu ter ficado tão vermelha com seu toque. E ele se divertia com o pensamento.

Depois que Vitinho entrou no Ensino Médio, nós não nos vimos mais. Ele não veio mais para o sítio, e eu também não fui mais para o Rio.

Na terceira vez, Vitinho não tinha mais nada de inho. Cabelo curto, músculos trabalhados pelo surfe, sorriso encantador que mostrava que ele sabia o homem no qual tinha se tornado.

E eu, Raquete, não tinha mais nada daquela menina que ficava vermelha quando segurava na mão do amiguinho. Portanto, na terceira vez em que eu e Vítor dos Santos nos encontramos, ele não precisou tomar iniciativa nenhuma. Fiz tudo por conta própria.

Ele estava debruçado no bar, pedindo algo para o barista que provavelmente seria muito mais forte do que a capirinha que eu tomava – Vítor já era maior de idade e, diferentemente de mim, não precisava se esconder quando chegava bêbado em casa.

— Oi, estranho.

O moreno não precisou se virar para saber que era eu. Mesmo depois de tanto tempo, nós ainda tínhamos aquela ligação bizarra de quando éramos menores.

— Olha quem tá aqui... – sorriu, pegando o copo com um líquido escuro dentro da mão do barista. – Você não é meio nova pra estar numa balada bebendo?

— E não é um pouco hipócrita da sua parte me julgar por isso? – devolvi o sorriso, aproveitando para me aproximar um pouco mais. – Você sumiu. Como tá a vida?

— Massa, até que. To curtindo bastante agora que saí do Ensino Médio e meus pais não podem me obrigar a nada – uma sombra de ironia passou pelo rosto dele. – Não fique com inveja, Raquete. Sua hora vai chegar.

Dei um soco leve em seu braço, sentindo que seus músculos não deixariam que ele sentisse dor alguma. Mesmo assim, Vítor fez uma careta de dor e esfregou o lugar.

— Quanta agressividade – ele se fez de ofendido. – Desde quando você sabe socar?

— Eu aprendi várias coisas desde a última vez em que nos vimos – respondi, deixando a malícia explícita no meu sorriso e na minha voz. Céus, os lábios dele sempre foram tão bonitos?

Vítor se aproximou um pouco mais e passou o braço pela minha cintura, me puxando mais para perto. Seu toque fez com que minhas pernas vacilassem, mas eu consegui disfarçar bem. Acho.

— Se importa de me mostrar algumas?

E a próxima coisa que eu me lembro é de me encontrar no apartamento em que ele estava dormindo – dando graças a Deus pelo dono não estar em casa. Talvez pela quantidade de álcool em minhas veias, talvez pelo beijo de Vítor ser tão viciante, talvez por seu toque me fazer virar outra pessoa. Não sei ao certo o motivo, mas por algum talvez eu não me importei em ter saído sem avisar, em estar sem saia sentada no balcão frio da cozinha do amigo dele, em não saber como faria para voltar para a casa de Ana, em não ter certeza do que fazer na minha primeira vez. Por algum talvez, eu deixei toda a racionalidade de lado e me entreguei ao momento pelo qual esperava desde os 10 anos de idade.

Exceto que, naquela época, eu não imaginava exatamente como seria.

Vítor desceu sua boca quente para meu pescoço, clávicula, seios. Eu deixava gemidos ruidosos escaparem, mas tentei me policiar o máximo possível. Só era tão difícil me controlar com ele tão perto...

— Raquel... – ele me levantou do balcão e me colocou no chão novamente. Eu não esperava por aquilo, e minhas pernas quase cedera. Teria caído se não fosse pelo aperto de Vítor na minha cintura. – Escuta, eu sou louco em você. De verdade. Mas se você só estiver aqui pela bebida e pelo momento, me diz, tá? A gente espera mais, não tem problema...

— Vítor – consegui arranjar forças suficientes para organizar meus pensamentos e formular frases que não se limitassem a suspiros. – Eu tomei três caipirinhas e meio copo de cerveja. Não é a bebida. Agora cala a boca e me beija.

Ele sorriu e me obedeceu.

Vítor era primo da minha melhor amiga e nós não tínhamos nos encontrado em mais do que três ocasiões até aquele dia. No mês seguinte, descobrimos que ele tinha conseguido transferência para uma faculdade de Curitiba. A justificativa que ele deu foi de que já não aguentava mais o calor do Rio de Janeiro.

Mas nós dois sabemos que aquele não foi o único fator. Teve um segundo motivo, que envolvia uma noite em que eu cheguei às três da manhã, toda sorridente, na casa da minha melhor amiga que quase me bateu por ter sido tão inconsequente e deixado uma mensagem uma hora e meia depois de ter desaparecido com o primo dela. No entanto, como toda boa melhor amiga, eu não precisei explicar nada. Ela entendeu. E ficou feliz por mim.

Nós ficamos mais umas três vezes. Talvez quatro. Vítor confessou que eu havia sido sua paixão de infância, e eu finalmente percebi que ele foi a minha. Nesse mesmo dia, ele me pediu em namoro. Eu disse sim.

Seis anos depois, nós nos mudamos para um apartamento perto do trabalho dele e cerca de quinze minutos do meu. Ele perguntou se eu queria um cachorro. Eu disse sim.

Na verdade, minha resposta não faria diferença. Ele já tinha comprado uma pequena chihuahua de pelo claro chamada Hermione.

Seis meses depois de começarmos a morar juntos, ele me pediu em casamento. Eu, obviamente, disse sim.

Trinta e uma semanas depois da nossa lua de mel, nasceu nossa primeira filha. Ele perguntou se podíamos chamá-la de Rafaela – nome de sua avó que havia falecido recentemente. Eu disse sim.

No segundo filho, no entanto, eu parei de dizer sim. Era minha vez de escolher o nome. Escolhi Leandro, mesmo contra os protestos de Vítor – que, aliás, passaram assim que o menino nasceu. Ele me disse sim.

Ele, atualmente, quase não chega aos 1,80 por conta das costas curvas. As sardinhas causadas pelo sol diminuiram de intensidade com o tempo – porque não tem tanto sol em Curitiba, e nós paramos de frequentar o Rio com tanta frequência. O cabelo marrom deu lugar a um branco-acizentado, e nós passamos a ter a mesma força.

E mesmo depois de tanto tempo, eu continuei dizendo sim. Se eu queria açúcar no chá, se eu queria sair para jantar, se eu estava com vontade de visitar Leandro e nossos netos recém-nascidos – porque ele continuou morando em Curitiba, ao contrário de Rafaela, que foi fazer uma segunda faculdade nos Estados Unidos e só voltou para os feriados.

Eu continuei dizendo sim.

Eu continuo dizendo sim.

E direi sim pelo o resto da minha vida.


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Notas finais do capítulo

Um beijo ♥



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