Depois que tomamos o café da manhã, Sasuke foi para o escritório trabalhar. Assim que ele saiu eu fui arrumar a mesa do café. Rapidinho juntei e lavei todas as vasilhas. Como ainda era cedo, decide dar uma volta pela casa, quem sabe conhecer o quintal?

Fui até o quarto a fim de procurar alguma coisa para colocar nos pés pois, desde que cheguei aqui nessa casa eu ando descalça e uso as roupas do Sasuke. Fico sem graça, nem roupa para vestir eu tenho. Entro no closet e fico literalmente perdida. São tantas gavetas e cabides que chego até a ficar tonta. Quem no mundo inteiro precisa de tanta roupa assim? Timidamente, ando pelo closet, passando as mãos pelas camisas que, pelos Deuses, são extremamente macias. Abro uma gaveta e me deparo com uma coleção de cintos. Abro outra dou de cara com as cuecas de Sasuke. Meu rosto queima de vergonha, são milhares de cuecas e todas organizadas por cores, não que ele tenha das mais diversas colorações diferentes, apenas preto, cinza e branco. Aliás, todas as roupas que vejo aqui são brancas e pretas. Estranho.

Após abrir mais umas 5 gavetas, encontro os chinelos. Pego e os coloco no pé, eles ficam um pouco grandes mas vão servir. Saio do quarto e decido dar uma volta pelo jardim. Devagar e com todo cuidado do mundo, abro a porta que dá acesso ao quintal e em seguida a fecho. O sol quente incendeia contra minha pele, fecho os olhos e fico alguns minutos absorvendo o calor. Ao abrir os olhos, me deparo com uma trilha de cascalhos, sendo protegida pela vegetação rasteira e algumas arvores majestosas, de raízes impressionantemente grossas, revelando que elas estão ali a milhares de anos. Caminho pela trilha, maravilhada pela beleza não só do jardim, mas também da encosta da montanha, que a cada passo, parece ficar cada vez mais perto. Caminho por mais ou menos meia hora e ao chegar ao fim do caminho, fico maravilhada.

A trilha leva a um deque de madeira, que dá para um pequeno lago. Milhares de cerejeiras rodeiam o lago, dando ao lugar um toque magico. Ao fundo, uma floresta densa de pinheiros se faz presente, junto com a encosta imponente da montanha logo atrás do lago. Totalmente encantada, subo no deque e inclino o corpo para frente, e vejo que a agua é cristalina, tão cristalina que é possível enxergar as carpas, nadando em volta do outro. Fixo meu olhar nas carpas e sem perceber, mergulho em memorias, nos acontecimentos do dia anterior.

Minha vida era normal, estudava, estudava e estudava. Vivia sozinha, e não me importava com isso, pois a solidão a muito tempo virou minha amiga. Então de uma hora para outra, conheci Sasuke e também Sasori, o que fez com que minha vida mudasse completamente. Não que eu esteja lamentando ter conhecido Sasuke, longe disso, mas ao conhece-lo, desencadearam tantas coisas que minha vida virou de cabeça para baixo. Eu comecei a sentir algo novo, algo que faz meu coração bater mais rápido sempre que o vejo, que faz com que eu queira ficar perto dele, fazer parte da vida dele. Eu não sei o quão forte é sentimento que tenho por ele, só sei que é algo aterrador, arrebatador e que me faz me sentir viva. Eu me sinto viva ao lado de Sasuke.

Eu não sei o que Sasori viu em mim, o que ele quer de mim para fazer o que ele fez. As marcas em minha pele estão quase desaparecendo, já não sinto mais dor, mas as marcas deixadas na minha alma, sempre que lembro dos acontecimentos da noite passada fazem com que elas se abrem e a dor vem, vem me matando por dentro. Não posso envolver Sasuke nessa história, não posso. Só de lembrar do ódio de Sasori quando ele falou sobre Sasuke, a fúria estampada no seu olhar, me causa arrepios. Não serei capaz de suportar se algo acontecer a Sasuke por mina causa. Meu Deus, o que eu faço?

— O que faz aqui sozinha?

Sou despertada dos meus devaneios, e me viro rapidamente para ver quem é. Atrás de mim, Deidara me observa com olhos atentos e seus lábios se curvam numa linha fina.  

— Nada. Só quis caminhar um pouco.

Ele suspira e pega o rádio comunicador do bolso da calça.

— Eu a encontrei. Não se preocupem, ela está bem cambio.

O radio faz um ruído e outra voz preenche o silencio.

— Tudo bem Deidara, onde vocês estão cambio?

— No lago, ela quis caminhar um pouco cambio.

Um sorriso cumplice surge nos lábios, enquanto ele fala, olhando para mim.

— Traga ela de volta cambio.

— Sim senhor Shino, cambio desligo.

Deidara guarda o radio no bolso da calça, e me fico envergonhada, pois estou apenas com uma blusa e a cueca de Sasuke. O lago me pareceu tentador em dar um mergulho.

— Bem, parece que temos que voltar senhorita Haruno. – diz com empatia.

— Parece que sim. – olho para a montanha e vejo que o sol está quase se pondo. Não pode ser, eu cheguei aqui de manhã, não pode estar entardecendo.

— A senhorita nos colocou de cabelo em pé hoje. – diz enquanto caminhamos de volta para a casa.

— Só por que eu sai um pouco? – indago.

— Porque saiu sem avisar e ficou praticamente o dia todo sumida. – sua voz sai cansada

— Mas apenas dei uma volta.

— Mas nós não sabíamos senhorita. O Uchiha ficou irado com seu sumiço, pensamos que o Akasuma tinha voltado para terminar o serviço.

Meu coração falha uma batida. Eu não avisei e por conta disso, coloquei todos em estado de alerta. Sasuke deve estar uma pilha de nervos. Mas Sasori não pode me encontrar aqui ou pode?

— Eu sinto muito. – digo envergonhada.

— Tudo bem, só não se esqueça de avisar da próxima vez ok.

Assinto com a cabeça. O sol do fim de tarde pinta as folhas de dourado das arvores, revelando o charme do outono.

— Não percebi que fiquei esse tempo todo fora.

— Quando mergulhamos nas nossas memorias mais profundas, quando conversamos com nosso eu interior, tudo em volta – ele movimenta os braços no ar – se torna irrelevante.

Não respondo e sinto seu olhar sobre mim.

— Às vezes é bom sabia?

Prendo meu olhar no seu e vejo uma calmaria absurda. Me sinto como se eu estivesse numa praia deserta, apenas ouvindo o barulho do mar, sentido a brisa balançar meus cabelos e o sol, relaxar minha alma.

— O que é bom? – pergunto ainda olhando em seus olhos.

— Sair por ai, encontrar um lugar calmo e se desligar, mesmo que seja por alguns segundos, do mundo.

Pisco sem entender e ele sorri.

— Quando entrei para a força policial de elite, bem – ele passa as mãos pelo cabelo loiro – eu não sabia o que esperar. Ficava apavorado e simplesmente travava.

— Então, quando fui designado para uma missão, onde teria que matar uma pessoa, eu não sabia o que fazer e o medo me dominou. Por causa desse medo, eu vi meu amigo morrer e eu não fiz nada para salva-lo.

Ouço com atenção, sem fazer comentário algum, afinal são as memorias dele. Vejo um lampejo de dor passar por seu rosto, e sei que ele está revivendo aquele dia agora.

— Você não teve culpa. – é tudo o que consigo dizer.

Ela me dá um sorriso fraco, e se volta para mim.

— Foi minha culpa sim. Pois se eu não tivesse deixado o medo me dominar, meu amigo estaria vivo agora.

— Eu sinto muito.

— É, eu também.

Caminhamos em silencio o resto do caminho, cada um de nós mergulhados em seu próprio sofrimento e percebo nesse momento que todos nós temos cicatrizes, e que algumas são mais profundas que outras fazendo com que nem mesmo o tempo, as cure.

— Está entregue senhorita.

— Obrigada e me desculpe pelo trabalho que dei a vocês.

— Não se preocupe com isso. Se preocupe em não sucumbir, em não perder a guerra na qual você se encontra.

Olho pasma para ele, as palavras me atingindo com força.

— E quando você sentir medo, se desligue do mundo, organize sua mente e volte a viver. Até mais.

Ele me dá as costas e vai embora e eu fico parada, absorvendo o que ele me disse. Sim, o medo me assombra, me sufoca, mas não posso deixar que ele me domine, não como ele me dominou na minha casa, na presença de Sasori. Eu tenho que lutar, eu tenho que viver.