Prenúncio escrita por Makimoto


Capítulo 1
CAPÍTULO I — “ESTOU VENDO VOCÊ AÍ.” 》


Notas iniciais do capítulo

Essa história é /parcialmente/ real e baseada em minha pessoa. Realmente, houve um dia em que eu estava no quarto e rolou uma coisa parecida (na história eu fantasiei mais, claro, para dar um ar mais aterrorizante~) e sempre tive um medo absurdo de olhar para a janela e ver essas coisas...



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Quando cheguei em casa e atirei meu corpo exausto na cama, senti, finalmente, uma excruciante sensação de prazer. Fechei os olhos, me desfazendo das interações sociais que tanto me sufocavam, embora eu sempre tenha dado a impressão, tanto para mim mesma quando para os outros, que as adorava, e me concentrei em desfrutar do silêncio reconfortante que o meu quarto possuía. Eu nunca tinha aprendido a diferenciar arrumação de bagunça, e havia passado a vida sendo repreendida pela minha mãe a respeito disso, mas, como das outras vezes, além de uma ou outra peça de roupa no chão, um prato com restos de comida sobre a escrivaninha e uma toalha pendurada na porta aberta do armário, eu não via nada de errado.

Despi-me, como costumava fazer, e fiquei só de roupa íntima. Peguei o celular, desenhei o padrão de desbloqueio e esperei pacientemente até que a tela se iluminasse e o sinal da internet fosse captado. Verifiquei minhas mensagens, respondendo as mais curtas e ignorando as que não eram diretamente para mim, e logo atirei o aparelho de lado porque tinha me cansado dele. Fechei os olhos novamente, permitindo que meus músculos relaxassem, e comecei a pensar em todas as coisas que eu faria durante a madrugada — que era a hora em que eu ficava mais ativa — que se seguiria.

Sentei-me na mesa e levantei a tampa do computador para tirá-lo do modo de suspensão. Chequei o Facebook rapidamente, sem encontrar, porém, nada que me prendesse a atenção, e cliquei no ícone do jogo no qual eu pretendia gastar minhas próximas horas. Coloquei o headfone e, enquanto o jogo carregava, ergui o olhar para a janela à minha frente e me perdi na vista do lado de fora por segundos que pareceram anos.

A praça de frente para o meu prédio estava vazia, silenciosa, e estaria na completa escuridão se não fossem os postes de luz que a iluminavam em alguns pontos. Já passava da meia-noite, mas, durante o dia, costumava ser sempre cheia de gente. Reparei em um gato preto atravessando a luz da lâmpada, mas rapidamente sumiu debaixo de um carro qualquer. Corri os olhos pelas árvores, dispostas assimetricamente pela área, até que minha visão foi se voltando para a janela do apartamento de frente para o meu.

A janela em questão era de um quarto que, geometricamente, era equivalente ao meu: o último do corredor. Eu conhecia os moradores do apartamento desde que o dia em que me mudei, com doze anos, e já tinha sido muito amiga da garota da minha idade que morava lá, mas já não trocávamos nada além de cumprimentos há muito tempo. Uma cortina branca ocultava parcialmente o interior do cômodo, possível de ser visto apenas através de uma brecha estreita, e havia um varal improvisado — onde um sutiã e uma camisa branca estavam bem presos e estendidos — na parte de baixo da janela.

Um som no fone de ouvido despertou-me para o jogo que já estava pronto para começar. Minha atenção voltou-se para as animações na tela e eu esqueci completamente do mundo exterior. Organizei um time, jogamos em conjunto, eu discuti algumas vezes no chat e, como de praxe, ostentei vitórias e derrotas.

Parei quando senti meu estômago doer de fome. Tirei o fone, retornando ao mundo real, e avisei aos meus colegas virtuais que voltaria depois de comer. No momento em que levantei da cadeira, no entanto, e depois de sair do local apertado onde eu estava, meu coração disparou dentro do peito quando eu visualizei uma silhueta escura através da cortina branca do outro apartamento apontando para mim.

Foi rápido, a sensação poderosa e imperativa de susto que se apossou de mim, mas bastou eu piscar algumas vezes, e uma brisa suave sacudir as cortinas do meu próprio quarto, ocultando assim a minha visão de fora, para que a imagem desaparecesse. Eu franzi o cenho, aproximando-me da janela, embora não sem certo receio, para me certificar de que eu tinha visto o que achava que tinha visto, mas não havia nada lá; não havia ninguém lá.

Sabendo que, imaginativa como eu era, meu cérebro já havia me pregado peças no passado, decidi afastar da minha mente aqueles pensamentos incômodos e, depois que eu me recompus, fui até a cozinha. Abri a geladeira, em busca de qualquer coisa para forrar o estômago, e belisquei algumas fatias de queijo que estavam lá dentro e apanhei uma caixinha de achocolatado. Enfiei o canudinho no local indicado, coloquei o queijo na boca e voltei caminhando tranquilamente para o meu quarto.

Àquela hora, tanto minha mãe como minha irmã já estavam dormindo cada qual em seu aposento íntimo. Eu estava habituada a ser a única acordada durante a madrugada, e até gostava, pois assim não precisava conversar com ninguém e tinha toda a liberdade do mundo de ir e vir sem ter ninguém para me importunar.

Após passar pela porta, no entanto, ouvi um barulho vindo da cozinha. Virei a cabeça de volta, mas não vi nada além de um corredor iluminado. Esperei alguns segundos para ver se o ruído voltava a soar, mas nada aconteceu e, deduzindo que se tratava da janela que, por causa do material, sempre emitia barulhos altos, deixei para lá e sentei-me na cama para comer.

Devorei o queijo e o chocolate rapidamente, ávida por voltar para o jogo o mais rápido possível, porém quando tornei a me aproximar da escrivaninha onde o computador estava, meus olhos foram novamente tragados pela janela porque a figura que outrora me assustara estava lá novamente.

Naquele momento, em que fiquei paralisada de medo e não conseguia desviar o olhar, podia ver mais claramente quem quer que estivesse à minha frente. Parecia uma mulher esguia, de cabelos longos e pretos, com uma pele tão pálida que por pouco não se misturava à cortina que a envolvia. Haviam marcas negras e profundas ao redor dos olhos que me encaravam pavorosamente arregalados. Eu quis gritar, mas minha voz sufocou na garganta, e quando eu finalmente consegui que minhas pernas me obedecessem, saí correndo do correndo sem olhar para trás.

Parei no fim do corredor e liguei fiquei encarando de longe a porta do meu quarto. Tentei chamar pela minha mãe, sem fazer escarcéu, mas nem ela nem minha irmã despertaram. Eu tremia, respirava ofegante e piscava freneticamente. Tentava esquecer a imagem que tinha grudado em minha mente feito chiclete e me perguntava se teria coragem de descer as escadas do bloco, aos berros e prantos, se alguma coisa inumana irrompesse atrás de mim.

Decidi voltar depois de quase dois minutos inteiros. Caminhava em passos vacilantes, porém cuidadosos, e enfiei a cabeça pela porta para verificar se a figura havia sumido antes de propriamente voltar para o aposento. Ainda não tinha total confiança na segurança do local, mas reuni toda a coragem que ainda me restava e me restabeleci no local que devia ser meu porto seguro.

Olhei para a janela, mas não vi ninguém. Respirei pausadamente para recuperar o fôlego e segui repetindo para mim mesma que não passava da minha imaginação — embora eu tivesse uma certeza inapropriada de que parecia real demais para ser só um delírio fantasioso — brincando com a minha sanidade. O fato de eu assistir muitos filmes de terror devia estar afetando a minha mente, eu pensava, e eu iria rir, junto da minha família, daquela situação no dia seguinte.

O assovio do vento por entre as fibras da cortina da minha janela obrigou-me, por reflexo, a olhar para o lado, e eu a vi mais uma vez. Com a cara no vidro do apartamento da frente, apontando para mim, exibindo seus olhos esbugalhados e vazios enquanto sua boca se abria como em um grito sufocado.

Meu coração retumbou mais uma vez, mas meu corpo, sobrecarregado de adrenalina, sequer se moveu. Eu encarei a pessoa — o espírito, a entidade, o que quer que fosse — e simplesmente não fiz nada. Ela agiu da mesma forma. Continuou apontando o dedo em minha direção sem emitir som algum.

Eu me dei conta, no entanto, em dado instante, que ela não estava apontando para a minha pessoa, mas para a coisa que agora respirava atrás de mim.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado; não tô muito segura se ficou bom, mas... enfim, espero que tenham gostado. ♡