Capítulo I

Svartalfheim

Uma nuvem de melancolia pairava sobre Asgard. A morte da tão amada rainha Frigga ainda enlutava todos os Aesir, principalmente aqueles que haviam sido pessoalmente tocados por sua infindável bondade.

Annika era um deles.

A jovem garota apenas tinha o que agradecer a sua tão adorada rainha. Frigga fora aquela que lhe dera abrigo quando ninguém mais se importou e entregara aos cuidados de Eir, a curandeira-chefe do palácio e aquela que se tornou sua mãe e sua única família em todo o reino.

E agora, quando a dor começou a lentamente diminuir, um novo golpe atingiu a todos.

Príncipe Loki estava morto.

Não era como se o príncipe fosse realmente querido pelos súditos, ainda mais após cair em desgraça e ser mandado para as masmorras após seu ataque contra Midgard, mas a morte repentina de dois membros da família real era uma tragédia pela qual ninguém poderia esperar.

Era Annika quem estava de plantão nas Salas de Cura quando o Allfather adentrou pelas grandes portas. Odin parecia bastante esgotado. A morte da rainha havia realmente afetado o velho rei, ela podia ver a dor do luto em cada movimento dele.

“Allfather, como posso ajudá-lo?” Perguntou Annika fazendo uma breve reverencia.

O rei viúvo soltou um longo suspiro antes de encarar a jovem curandeira com seu único olho bom.

“Meu filho mais novo está morto. Um grupo fora enviado para recuperar seu corpo e assim que eles estiverem de volta, quero que os preparativos do funeral estejam prontos.”

“Sim, meu rei. Irei comunicar Eir imediatamente.” Respondeu Annika.

Dito isso, Odin se virou e deixou a câmara. Annika observou com tristeza o rei ir embora. Mesmo com seus modos duros, ele ainda era um pai que havia perdido seu filho. Não era segredo para ninguém o desgosto que ele tinha por Loki, mas não há mágoa que lhe impeça de lamentar a morte de alguém próximo.

Após comunicar os curandeiros sobre os preparativos do funeral, Odin tomou seu cavalo e se encaminhou para a Bifrost onde Thor e mais dois einherjar aguardavam para serem enviados a Svartalfheim e recuperar o corpo de Loki. O príncipe fora muito insistente em ser parte do grupo. Ele sabia que devia isso ao seu irmão.

Thor não conseguia mais suportar a ideia de que o cadáver de seu Loki havia sido deixado para apodrecer abandonado como um animal naquela terra condenada dos elfos negros. Era cruel e desrespeitoso após tudo que Loki fizera por ele, por Jane e pelos Nove Reinos. Loki merecia ser trazido de volta para casa e ter um funeral digno de um príncipe de Asgard e de um herói que morrera com honra e cuja alma merece ser levada para Valhalla.

Primeiro, sua mãe e agora seu irmão. Ao menos Loki estaria ao lado de Frigga, ele sempre foi mais próximo dela do que Thor e era confortante saber que a morte do jovem príncipe lhe tornou digno de estar ao lado de sua amada mãe.

Ele cumprimentou seu pai breve e friamente antes de se voltar para Heimdall.

O guardião não pode ser realmente punido por sua traição, uma vez que não havia mais ninguém capaz de realizar suas tarefas. Então agora ele apenas era vigiado por guardas durante todo o tempo e havia algemas mágicas em seu pulso que restringiam seu poder a apenas o necessário para cumprir suas funções.

Mesmo que seus atos tenham ajudado a salvar os Nove Reinos, Odin ainda não tolerava traição tão facilmente.

“Quando você quiser, Heimdall.” Disse Thor.

O guardião ativou a ponte com sua espada e o príncipe herdeiro junto com os dois guardas foram sugados pelo feixe de energia e em questão de segundos se viram nas terras inférteis e mortas de Svartalfheim, não muito longe do ponto onde Thor lutara sua última batalha junto com seu irmão.

Ainda havia um desejo, uma esperança mesmo que pequena de que não haveria nada para ser encontrado. Mas tudo isso se desvaneceu no momento em que Thor avistou uma silhueta negra há poucos metros de onde ele estava.

“Loki...” Sussurrou Thor ao sentir todo o peso da realidade cair contra seus ombros.

Oh! Como ele desejava que seu irmão caçula, tão esperto, tão perspicaz... e tão frágil, tivesse arranjado um jeito de enganar a morte.

“Fiquem aqui, por favor.” Pediu Thor para os dois guardas. Ele não queria uma plateia quando toda sua dor fosse externada com a visão do cadáver de Loki. Esse era um momento muito particular.

Lenta, mas continuamente, Thor caminhou até Loki. Nada o havia preparado para aquela visão desoladora.

Loki estava caído na mesma posição que Thor o deixara. Deitado com os olhos fechados em uma expressão de alguém que havia encontrado redenção na morte, suas mãos ainda ao redor da ferida que tomara sua vida, a única coisa diferente era a leve camada de areia em seu rosto, suas vestes e em seu cabelo. Thor havia fugido com Jane para um local seguro quando a tempestade de areia se aproximou, mas Loki havia sido deixado para receber toda a sua fúria.

O Deus do Trovão caiu de joelhos ao lado do corpo de seu irmão menor. Ele não teve vergonha em derramar suas lágrimas, Loki era mais valioso do que seu orgulho. Por um longo momento ele apenas ficou parado tentando se acalmar o suficiente para levar a sua tarefa adiante, nada poderia ser feito, Loki não iria mais acordar e rir de sua cara por ter caído em mais uma de suas peças. O sorriso sarcástico e nem a expressão maliciosa iriam decorar os traços finos do rosto do príncipe caído, ele parecia estar tão em paz que Thor realmente não tinha coragem de toca-lo. Ele parecia tão elegante na morte como sempre fora, exceto por algumas mechas de seu cabelo negro que caiam desordenadamente em seu rosto, provavelmente por causa dos ventos que traziam as tempestades.

Com um suspiro de resignação, ele escovou os fios de cabelo para fora do rosto de Loki. E no momento que sua mão fez contato com a pele dele, Thor a retirou como se estivesse sido queimado.

E realmente fora algo similar a isso. A pele de Loki estava quente, mais quente do que o normal e definitivamente bem mais do que deveria estar a pele de um cadáver morto há dias. Era impossível, simplesmente impossível! Tremulamente, ele tocou o rosto de seu irmão novamente só para confirmar que ele não estava alucinando. Sua pele estava tão quente como se ele estivesse doente com a febre. Ele baixou sua mão e pôs dois dedos no pescoço de Loki, por um momento ele não sentiu nada e quando ele estava prestes a deixar a dor tomar conta dele novamente, ele sentiu.

1...2...3... lá estava! Lenta, mas constante, o pulsar.

Ele engasgou em choque e olhou para o corpo de seu irmão com admiração. Era impossível depois de tanto tempo. Ele deveria estar enlouquecido pela dor e isso era apenas sua mente lhe pregando peças. Ele se afastou em descrença apenas para ter o ar roubado de seus pulmões por uma nova surpresa. Ele viu o peito de Loki subir e descer lentamente de uma forma sofrida como se ele estivesse esgotando a última de suas forças.

Poderia ser? Uma oportunidade tão maravilhosa, um bálsamo para a sua dor. Loki sobrevivera no final de tudo. Agora as lágrimas realmente estavam vertendo sem controle, mas por uma emoção muito mais forte do que qualquer luto ou tristeza.

Esperança.

Ele viu pela sua visão periférica os guardas se aproximando lentamente. Com cuidado ele tomou Loki em seus braços, não resistindo a aperta-lo um pouco próximo a ele, apenas para sentir a sua respiração fazer cócegas contra sua pele. Agora seu mundo apenas se resumia ao fato de que seu irmão estava vivo e respirando em seus braços. Como isso fora possível não era uma preocupação. Ele foi até os guardas e ordenou para que Heimdall abrisse a ponte para leva-los de volta a Asgard.

De volta para casa.