Catherine se revirou na cama para tentar ver as horas no relógio da mesa de Anne. Eram exatamente três horas da manhã.


Três horas. Esse havia sido o combinado entre Cath e Nathan. Depois que todos terminaram de tomar banho e foram assistir filme, não houve nenhum momento em que os dois puderam realmente ficar sozinhos. Por isso, quando estavam indo dormir, o garoto a puxara para um canto e combinara aquele horário. Eles deveriam ir se encontrar na piscina.



A loira respirou fundo e fechou o livro que lia enquanto esperava Anne dormir e o tempo passar. Com apenas um rápido olhar de esgueira, percebeu que a melhor amiga estava dormindo de costas para ela. Melhor, pensou ao caminhar para a porta.


Porém, antes mesmo dela colocar a mão na maçaneta, Anne abruptamente se virou.


—Você está indo se encontrar com Nathan, não está? -perguntou, com uma sobrancelha erguida, visivelmente ressentida.


Por uns longos segundos, Cath não conseguiu fazer nada além de abrir e fechar a boca. Ela estava tão certa que Anne dormia, que nem por um segundo considerou a possibilidade daquilo acontecer. E então, quando a noção de que estava naquela situação finalmente caiu, a loira não pôde fazer nada além de ficar calada. Se a amiga estivesse mesmo com raiva, não havia nada que ela pudesse dizer naquele momento que amenizasse a dura verdade.


-Vocês me magoam, sabia?- Anne perguntou, enquanto tirava o grosso edredom de cima de si e se levantava para se aproximar de Cath -Desde quando você passou a esconder segredos de mim?

Cath se manteve calada, tentara balbuciar qualquer palavra, mas nenhum som queria escapar de sua garganta. 


—Você e Nathan agem como se eu fosse cega, ou tivesse algum tipo de demência. Vocês realmente acreditaram que eu não estava percebendo o que acontecia entre vocês? Realmente acreditavam que eu não percebia nada? Que eu não sei, por exemplo, que papai e mamãe estão se separando? Vocês realmente acham que eu sou cega a esse ponto? -questionou, erguendo o tom de voz algumas oitavas e abrindo os braços em um gesto expansivo. Catherine não pôde se impedir de encolher minimamente.


-Você… -Começou, antes de engolir em seco, percebendo apenas naquele momento que sua garganta quase poderia lembrar um deserto- Você sabia sobre os seus pais?


—Eu descobri após alguns dias que eu cheguei na praia e, como eu sabia que Nathan sabia, esperei para que ele me contasse, mas, surpresa, ele não me contou, assim como você escondeu o fato que você e meu irmão estavam tendo um caso!


—Anne, calma ai, não é bem assim. Nós não estamos tendo um caso, nós nem sabíamos o que estava acontecendo até voltarmos da praia. Ainda está tudo confuso, apenas queríamos contar no tempo certo. Tanto isso, quanto o caso com o seu pai. Sabemos o quanto você o ama e não queríamos te ver machucada.
-Sim, porque vocês me acham uma pobre garota fraca e indefesa que não consegue lidar com uma porra de separação.


—Mas não é apenas uma separação! -Cath disse um tanto exaltada- É o fim de uma era de idolatria. Você acreditava até o começo do verão que seu pai era um dos seres mais perfeitos desse universo e descobrir o contrário é doloroso.


—Sim, é! Mas eu sobrevivi! -Gritou, a face ficando rapidamente vermelha por ela ser branca. Anne se forçou a respirar fundo quando viu Cath dar um passo para trás. A morena não queria que aquilo se tornasse em um grande discussão, queria apenas falar tudo o que prendera na garganta por tanto tempo -Eu sobrevivi. -Repetiu, mais suavemente- E queria que vocês parassem de me tratar como se eu fosse uma das mocinhas dos livros que você tanto ama. Eu sou Anne Tanner e decido o que vai me derrubar ou não, uma decepção não vai fazer com que eu corte os pulsos. Você, mais do que ninguém, deveria saber disso. Somos irmãs antes de tudo, Cath.
Catherine sentiu o gosto do sangue ao passar a língua pela bochecha interna. Ela realmente deveria parar com a mania de morder sua boca a cada vez que ficasse nervosa.


—Sim…Somos irmãs, é claro que somos. Como poderíamos não ser? -Perguntou abrindo um pequeno sorriso triste, enquanto se aproximava de Anne e procurava pelas palavras certas para dizer. Porém, naquele caso não havia certo nem errado. Cath sabia que só precisava dizer o que viesse na sua mente, porque elas iriam se entender dessa maneira. Sempre se entendiam.


—Ann, me desculpa, tudo bem? Acho que deve ter sido o excesso de sol na minha cabeça para eu pensar assim. Eu sei que você é forte, não teria lhe escolhido para ser minha melhor amigo se não fosse. -Brincou, dando uma rápida piscada para Anne- Apenas pensei que não lhe contar fosse o melhor para você. Não aguentaria lhe ver com um coração partido ou me odiando eternamente por roubar o seu irmão. Nathan e eu foi algo que foi acontecendo nas férias. Tudo bem, quando eu era menor, costumava ter uma pequena -bem pequena mesmo- queda pelo seu irmão, e quando cresci, esqueci de tudo isso. Eu estava vivendo perfeitamente sem a presença dele na minha vida até o dia da exposição em que nos beijamos! Foi terrível, Anne! -Falou, novamente com um curto sorriso, se jogando de vez na cama, desistindo de alcançar a porta- Foi terrível porque eu amei. Anne, eu devia estar ficando louca, porque não conseguia parar de pensar naquilo. Eu tomava banho pensando naquilo, comia pensando no beijo, dormia pensando no beijo e eu queria mais. Puta merda. Eu queria… -Cortou a frase, percebendo que estava falando mais do que devia- Eu queria mais do que poderia ter. Nathan é seu irmão e, de certa forma, também é meu irmão. Fomos criados juntos. Não era certo. O que as pessoas iriam pensar? Não. Foda-se. A opinião das pessoas não importa. O que você iria pensar? -perguntou, os olhos evidenciavam todo o desespero que Catherine sentia percorrer seu corpo- Eu não queria perder minha melhor amiga, mas eu não sabia o que fazer. Anne, sério, eu nunca me senti tão feliz na vida, até porque seu irmão sente o mesmo por mim! Você conhece Nathan, sabe como ele nunca se interessou realmente por ninguém, mas acho que ele se interessou por mim, acredita?


Catherine, por fim, fechou a boca. Percebendo que Anne se mantera calada por todo o tempo que ela falara.


—Por favor -A loira pediu- Fala alguma coisa, se não eu vou ter um ataque de nervos.


O rosto de Anne estava sério. Deixara uma sobrancelha erguida para mostrar que observava todos os movimentos de Cath. Porém, quando viu sua melhor amiga quase aos prantos, suavizou a expressão. Ela não estava com raiva.


—Escute bem, Cathernie Brooke, que eu só irei falar isso uma vez. Se você esconder algo de mim novamente ou quebrar o coração do meu irmão, não precisa nem mesmo olhar para minha cara, está ouvindo? -Perguntou com a expressão mais séria que conseguia, embora um doce sorriso brincasse em seus lábios. No mesmo momento Cath soltou o ar que estava preso em seus pulmões, deu uma pequena risada e se inclinou para dar um abraço na amiga.


—Eu prometo, eu prometo que não haverá mais segredos entre a gente. Muito obrigada, Anne. Você é a melhor amiga do mundo.


—Certo, certo. -Anne disse rindo, dando leves batidas nas costas de Cath, retribuindo o abraço- Agora saia já daqui, você tem um homem lindo lhe esperando. Não perca tempo comigo.


—Está tudo bem mesmo para você? 


—Claro que está. Eu sempre quis vocês dois juntos. Realmente são um casal que combina. Queria apenas que tivesse confiado em mim o bastante para contar, mas com o tempo superarei isso.


—Oh…Ann, me desculpa.


A Tanner balançou a cabeça rindo com o jeito de Cath.


—Está tudo bem, irei sobreviver a isso. Agora vá antes que em lhe empurre para você daqui.


—Tudo bem, senhorita. -Catherine respondeu rindo e visivelmente aliviada por um peso ter saído de suas costas.


Ao sair do quarto, passou a caminhar a passos largos em direção da piscina, onde Nathan e ela combinaram de se encontrar. Agora eles tinham a benção de Anne.

Quando ela chegou, quase saltitando, na área da piscina, viu Nathan de costas para ela, sentado na borda da piscina, com os pés dentro da água. Enquanto Cath o observava distraído, percebia que, daquela forma, ele parecia ter a idade que tinha. Muitas vezes as pessoas acrescentavam dois ou três anos para ele, porém, vê-lo com alguns fios de cabelo castanhos tocando sua nuca, a pele vermelha e bronzeada pelo sol, conseguia perceber a verdadeira idade dele. Ainda era apenas um garoto, pensou. Um garoto com uma brilhante vida pela frente.

—Nathan...- Cath murmurou, sorrindo ao vê-lo se virar assustado.

—Eu pensava que você já não vinha mais. -Murmurou em resposta, um largo sorriso aparecendo em seu rosto tomando lugar do cenho franzido que antes ele apresentava. O Tanner fez menção se se levantar, mas antes que pudesse tirar os pés da água, Cath se adiantou e sentou ao lado dele -O que aconteceu, afinal?

—Anne. Ela sabe sobre nós.

—O que? -Nathan perguntou, confuso, buscando as íris azuis de Cath para descobrir mais do que a curta alegação dela.

—Sim. Ela sabia desde o começo, assim como sabia da separação dos seus pais. Anne queria que nós contássemos para ela e quando eu me levantei para vir me encontrar com você, acabamos conversando sobre isso.

—Como ela esta? Esta tudo bem? Ela chorou?
Nathan enchia Cath com perguntas que ela já esperava dele, por isso, a garota não fez nada além de se aproximar e colocar uma de suas mãos entre os fios castanhos da nuca do garoto. Aquilo sempre o acalmava.

—Nathan. Esta tudo bem. Ela está bem. Eu entendo a sua preocupação com ela, mas acho que deveríamos parar de agir como se Ann ainda fosse aquela criança indefesa da nossa infância. Ela não é. E você precisa ver isso da mesma forma como eu vi. Anne se tornou talvez até mais forte que você, Nate.

—Estou me sentindo vazio agora. -Murmurou, mexendo os pés sobre a água, manchando o reflexo distorcido dos dois. O vento frio da madrugada encontrava uma barreira nos dois e bagunçava tudo o que fosse leve o bastante para se mover. Nathan se aninhou ainda mais contra a mão de Cath e, quando a garota se aproximou, ambos puderam sentir o calor que emanava de seus corpos devido às longas horas expostos ao sol. O garoto podia ver as pequenas sardas de Cath mais evidentes em seu rosto, a pele mais avermelhada na região do nariz e das bochechas. Naquele instante, ele desejou que o momento congelasse e que ele pudesse viver uma vida dentro daquela casualidade, dentro da melancolia que tomava conta de seu corpo e, além de tudo, do amor que sentia transbordar de seus olhos. Ele queria aquilo para a vida.

—Você vai sobreviver. -Cath respondeu em um sussurro, embora tivesse piscado um olho e permitido um pequeno sorriso escapar de seus lábios.

—Contanto que você esteja ao meu lado. -Nathan adicionou, colocando um braço sobre o ombro da loira e se inclinando para beija-la.

—Sempre. -a garota murmurou, antes de acabar com a distância que havia entre eles e experimentar um dos melhores beijos da sua vida.

Ali, sobre a proteção das estrelas e das constelações do céu, Tanner e Brooke fizeram uma promessa que não necessitava palavras. Era aquilo e apenas aquilo. Eles se entendiam, se conheciam como se fossem um só e, para eles, aquilo bastava.

Fim.