Simple Man escrita por leituradascinco


Capítulo 3
Estranhos


Notas iniciais do capítulo

Fico feliz que tenham gostado, espero superar as expectativas de vocês.



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Já faziam duas semanas desde a minha briga com a Summer, não estávamos nos falando muito além do básico. Talvez fosse culpa dos nossos horários que ficavam cada vez mais corridos, enquanto eu estudava de manhã; cuidava de minha avó durante a tarde e estagiava no período da noite Summer tinha aulas comigo no período da manhã, trabalhava durante a tarde e ficava com naná durante a noite. Mas eu também me sentia envergonhada por reconhecer que tudo o que ela dissera naquela noite era verdade.

Todos os dias vamos a faculdade juntas e, no caminho o único assunto é a grade curricular ou algum trabalho acadêmico que precisamos organizar. Summer já está me chamando apressada no andar de baixo, já alimentamos naná e a deixamos confortável para ler os jornais. Ando de lá para cá pelo quarto, revirando tudo para encontrar a chave da moto que não consigo me lembrar onde deixei.

– Não consigo encontrar as chaves! - Grito para Summer.

– Estou com elas, ande logo ou vamos perder o primeiro tempo! - Ela responde.

Desço as escadas correndo e pego as chaves na sua mão, quando ela me repreende com o olhar. Veste calças jeans coladas ao corpo e uma blusa cinza tão sofisticada e moderna quanto sua mochila e eu me sinto intimada vestindo apenas jeans e o primeiro suéter de gatinhos que achei no guarda-roupa. Coloco o capacete já abrindo a porta e espero que ela me siga. Minha moto é uma Ducati Streetfighter 848 vermelha a qual meu pai se estivesse vivo jamais me deixaria dirigir, mas me sinto confortável com ela.

Summer já está na garupa quando ligo a moto e parto a faculdade. O caminho não é longo, porém cheio de curvas, nós duas já nos acostumamos. Ao chegar Sum vai direto ao seu grupo de amigos, os populares e eu apenas aceno, não costumo fazer parte de grupo nenhum, mas me interajo com todos. Saio distribuindo "bom dia" para todos os rostos todos os dias, mas vou direto ao meu lugar preferido: a biblioteca.

– Bom dia Anne, tudo bem? - Pergunta Andrew o bibliotecário de olhos azuis.

– Bom dia Andrew, tudo ótimo e contigo? - Sorrio despejando a mochila em seu balcão - Vim devolver alguns exemplares hoje.

Ao folhear cada um dos três livros para verificar se está tudo correto, Andrew acha um cartão de memória e devolve para mim. Reconheço de imediato, é da minha Nikon para uso doméstico, para fotografar coisas do dia a dia e que são importantes apenas para mim. Eu sou apaixonada pelo lado simples da fotografia, como coisas do cotidiano, já Summer gosta de fotografar o luxo da fama e qualquer coisa que tenha relação com celebridades. Quer fotografar modelos quando se formar.

Pego o cartão na mão e volto depressa para a sala de aula, vejo Summer já sentada ao lado do meu lugar vago e me dirijo à ele. Corro os dedos pelo cartão pelos dedos imaginando quantas fotografias sem sentido armazenei ali sem revelá-las até que o professor me interrompe dos devaneios para falar de um último trabalho acadêmico antes das férias.

– O que eu quero avaliar, pessoal, nada mais é que o estilo fotográfico de vocês - Ele anunciou - Por isso o trabalho vai ser individual... - Foi interrompido pela discordância da turma que tentava argumentar.

– Que saco! - Summer exclamou - Mal tempos tempo de fazer em dupla, quanto mais sozinhas! - Virou-se para mim. Não me manifestei.

– Por isso pessoal... - Sr. Gerard aumentou sua voz e continuou - Vocês vão ter de aprender a trabalhar sozinhos e organizarem uma exposição com no mínimo dez fotos de pessoas estranhas - Pausou - Mas o importante é que sejam fiéis aos seus estilos de fotografias enquanto colocam em prática tudo o que eu já ensinei à vocês! - Finalizou.

– Eu acho bacana - Comentei com Summer e o grupo de amigos à sua volta - Cada um pode fotografar livremente e do seu jeito, é uma ótima maneira de se expressar - E sorri enquanto todos me encaravam perdidos.

Peguei a mochila e saí da sala como a maioria dos alunos, mas Summer me puxou pelo braço discretamente e eu me virei.

– Anne, só pra te avisar que eu não vou voltar com você hoje pra casa - Dizia ela agarrada aos cadernos e apostilas - Combinei de passar os outros tempos com o pessoal na biblioteca, pesquisando algumas referências.

– Ah, ok então! - Respondi e saí.

Não me incomodava o fato de Summer ter outros amigos porque eu também tinha vários, mas nós sempre pesquisávamos juntas mesmo que não fossemos dupla em um trabalho. Sempre íamos com o almoço para a biblioteca ficar estudando ou fotografando pelo campus para treinarmos técnicas diferentes. Mas naquele dia o fato de ela ir ao meu lugar preferido de toda Universidade com outras pessoas e não comigo machucou um pouco o meu ego.

Decidi também a não assistir as outras aulas e fui até o estúdio no qual estagiava antes de voltar para casa. Queria revelar as fotos daquele cartão de memória e saber se alguma coisa poderia ser útil para o trabalho, uma vez que eu adorava fotografar pessoas desconhecidas. Deixei o cartão nas mãos de Daniel, o assistente gato do meu chefe e me despedi.

– Até mais tarde Dan! - Acenei antes de montar na moto.

Daniel não trabalhava no mesmo horário que eu, aliás, eu trabalhava sozinha no período da noite. Ele estava sempre com Summer e até desconfio que gostasse dela, mas sempre nos víamos na troca de turno e ele era bem legal comigo.

Cheguei em casa mais cedo e naná já me esperava para almoçar e tomar banho. Apesar de muita dificuldade para falar e lembrar da pronúncia das palavras, eu a entendia muito bem. Sabia lidar com ela e respeitava muito sua reclusão após a morte de meu avô. Coloquei sua cadeira de rodas ao lado do sofá para vermos TV enquanto esperávamos por Summer quando minha avó me surpreendeu:

– Está pensando em algum garoto, Annabeth? - Perguntou.

– Eu... Qu- Quê? - Gaguejei - De onde tirou isso vovó? - Disse rindo.

– Conheço você minha menina - Disse ela ainda sem tirar os olhos da tela - Sei que tem alguém ocupando a sua cabeça.

Apenas mexi a cabeça em sinal negativo sem saber o que responder. Permanecemos em silêncio até Summer entrar pela porta.

Dei um beijo na testa de naná, peguei minhas coisas e fui para o trabalho. Toda noite era a mesma coisa: corrigir cores de fotos; revelá-las; separá-las; montar os álbuns de festas e deixar os compromissos de Christian - meu patrão - todos anotados no quadro de cortiça do corredor. Fotografar era o trabalho dele e, às vezes, de Summer. Afinal, o estúdio só recebia modelos e mais modelos. Daniel cuidava da revelação de fotos emergenciais e para documentos como três por quatro durante o dia, mas fora isso o laboratório era função minha e eu adorava.

Peguei o pacote que Dan havia deixado encima da minha mesa e me sentei. A primeira foto era de um casal de turistas, uma moça loira de cabelos até os ombros que segurava o chapéu na cabeça, se protegendo do vento e o rapaz com os lábios grudados nos dela estava de olhos abertos, fitando de soslaio a lente da câmera. Estavam felizes, passando a lua de mel em Londres. Pensei que esta foto se fosse exposta daria muito orgulho a eles. Fui passando mais outras quarenta e três fotos quando uma delas caiu no meu colo. Era ele.

Nem me lembrava do retrato que tinha feito de Dean aquele dia no parque até ele cair de repente sob minhas coxas. Deixei o restante das fotos sobre a mesa e segurei aquela outra por entre os dedos. Passei longos minutos observando-o, me lembrava perfeitamente daquele dia, o céu estava cinza e garoava. Dean estava com uma camisa verde olive por baixo de sua jaqueta de couro preta; as mãos nos bolsos; jeans e botas. Parecia perdido não como quem não sabe o rumo de casa, mas como alguém que queria esquecer de onde veio. Sorria levemente na foto, com a cabeça pendendo para o lado e os olhos semicerrados. Segundos de charme que eu não me lembrava de ter visto ao vivo.

Passei uma noite toda ao seu lado e por conta das raras vezes em que este sorria eu não me lembrava como era exatamente seu sorriso, agora eu sabia. Tinha uma recordação em mãos. Respirei fundo e por milésimos de segundos senti falta de estar em seus braços. Depois pensei em um provável amigo ou irmão que pudesse estar procurando por ele e imaginei que ter a foto exposta fosse ajudar em algum tipo de busca.

Minha primeira atitude foi procurar anúncios com o sobrenome Winchester, mas não achei absolutamente nada que fosse ligado a Dean. Depois resolvi buscar o que era aquele símbolo marcado em vermelho que ele tinha no antebraço, muito diferente da tatuagem no lado esquerdo do peito. Aquela era comum, feita com tinta preta e desenhava um sol, com uma estrela dentro já a outra era muito estranha. Não obtive sucesso e depois de horas pesquisando eu dormi com a cara no teclado do computador. Foi só quando ouvi o telefone tocar que percebi que já havia passado da hora de voltar para casa.

Imprimi todos os símbolos em vermelho que encontrei, na esperança de que algum deles fosse parecido com aquele que eu vi em Dean. Recolhi todas as minhas coisas e fui para casa.

Duas semanas depois.

Summer parou entre a porta do meu quarto aberta e encostou no batente. Eram 02:40 da manhã mas eu não conseguia simplesmente dormir. Tinha sido assim nos últimos dias. Faltavam duas fotos para a exposição, precisava ainda corrigir alguns detalhes nas fotos já escolhidas e o evento já era no sábado, ou seja, restavam dois dias para eu concluir um dos projetos mais importantes da faculdade e entrar de férias. Então só faltaria mais um ano para eu me formar, às vezes ainda acho que recebi uma carta da Universidade ontem.

– Falta muita coisa ainda? - Perguntou.

– Ah não muito - Sorri largando o mouse de lado - Estou na reta final, bastante orgulhosa do que consegui até agora e você?

– Mandei as fotos para impressão hoje - Ela disse animada e se sentou na cama de frente para mim - Deu tanto trabalho! - Pausou - UAU! Este é o garoto misterioso do parque?

– Tá mais para "homem" Sum - Cocei a nuca - E ele não é mais tão misterioso, tem um nome, você sabe...

– E você vai expor essa foto? Está maravilhosa - Disse.

– Eu ainda não sei, mas como não consegui muitas outras imagens, talvez eu use esta sim - Disse enquanto salvava o projeto antes de desligar o computador - E você? Conseguiu descobrir alguma coisa do símbolo que mencionei?

– Consegui sim, mas... - Pausou e me fitou séria nos olhos - Eu não entendo por quê você de repente ficou tão interessada nessa marca, você não é religiosa nem nada ou é?

– Não eu... - Bufei - Marca religiosa?

– Aparentemente o que você desenhou é a Marca de Caim - Ela me entregou uma foto do símbolo idêntico ao que eu tinha visto - Segundo a Bíblia é uma maldição dada por Deus a Caim depois de este matar seu irmão Abel. Caim não poderia morrer, seria como um "fugitivo e vagabundo" sobre a terra, como um andarilho e carregaria uma marca para que nada que o encontrasse fosse capaz de o matar.

– Então Caim nunca morre? - Perguntei aflita.

– Eu não sei, na Bíblia não diz se ele morre ou não, mas por quê você quer tanto saber? - Indagou.

Tentei digerir toda a informação que havia recebido e percebendo que nada daquilo faria sentido apenas neguei com a cabeça e disse:

– Nada eu... Só vi o símbolo em algum lugar e não conseguia descobrir o que era. Bobagem. - Respondi nervosa.

Summer deixou o quarto e eu desabei na cama, toda aquela agitação devido a exposição, a correria do trabalho e as últimas provas do ano me deixavam esgotada cada dia em um nível pior. Eu imaginava se alguém já havia se sentido tão cansado que pudesse morrer, pois era como eu me sentia. Mal tinha tempo de me alimentar e o resultado de tudo isso eram olheiras enormes e uma cara péssima. Dormir era a única coisa que fazia com que eu me sentisse um pouco melhor.

O resto da semana se arrastou. Só percebi o passar dos dias quando já era sábado e eu não fazia a menor ideia de como me portar ou me vestir no tal evento. Naná iria de táxi com Summer, mas eu fazia questão de ir de moto então descartei toda e qualquer possibilidade de usar algum vestido. Sum e eu estávamos nos falando mais nos últimos dias e era ótimo ter minha amiga de volta. Ela me ajudou com o cabelo e a maquiagem, mas insistia para eu ir junto delas no táxi.

Faltavam quarenta minutos para a abertura do museu, as duas já tinham ido e eu ainda estava ali encarando meu corpo esguio e magro diante do espelho. Mas no rosto não havia qualquer sinal de cansaço visível a olho nu por causa da maquiagem bem feita e do cabelo arrumado. Com os ombros curvados para baixo me sentia péssima por ter de escolher algo bom pra vestir e não apenas jeans e qualquer outra peça que eu encontrasse primeiro.

Optei por uma calça de couro preta, uma bota de salto da mesma cor e passei os dedos por todo guarda-roupa até achar lá uma blusa frente única vermelha que costumava ser da minha mãe. Eu não fazia ideia de como ela havia parado ali, mas imaginei num súbito que só podia ser coisa da minha avó e fiquei feliz por tê-la. Cheirei a blusa e senti o perfume inconfundível de sândalo que lembrava minha amada mãe, mas não me permiti chorar. Vesti-a e saí correndo para a moto determinada a orgulhá-la naquela noite.

O capacete não estragou o cabelo como Summer pensava, mas deu aos cachos modelados uma aparência mais bagunçada e leve como eu gostava. Desciam como cascatas até minha cintura, arrumei a franja com os dedos, dei o capacete ao recepcionista do museu e entrei afim de encontrar meus amigos e minha avó. No caminho esbarrei com um rapaz alto e de cabelos longos até o queixo de vestes simples e com uma feição abatida, pedi desculpas e segui pelo corredor até a exposição das minhas fotos. Podia jurar que ele me seguia, mas toda vez que eu olhava para trás estava com o olhar penetrado em alguma outra foto exposta.

– Oi Anne, como você vai? - Andrew me surpreendeu com um abraço - Suas fotos estão maravilhosas, adorei o seu trabalho!

Abracei-o e agradeci. Haviam muitas pessoas da faculdade por lá, como eu esperava que fosse ser. Alguns rostos que eu desconhecia, outros que eu conhecia demais. Não demorou muito para encontrar naná, que estava sozinha em frente a fotografia que eu fiz de Dean. Segurei em sua cadeira e expliquei um pouco de como fiz cada uma das dez fotografias, não demorou muito para o Sr. Gerard vir me cumprimentar, ele prestava atenção em tudo o que eu dizia sobre as fotos e tomava algumas notas em um bloco pequeno de papel.

– Anne, aí está você! - Summer me abraçou - Está maravilhosa, adorei como ficou o seu cabelo - Ela sorria maravilhada - Tem um cara estranho por aí que parecia muito interessado naquela foto do rapaz do parque, por quê não dá uma palavra com ele? Talvez consiga vender algum dos quadros.

– Ah, Summer, eu não tenho o menor interesse em vendê-los - Olhei para o quadro com a foto de Dean - Mas, afinal, quem era esse cara?

– Ele me disse o nome dele, era algo como S... - Pausou - Ai como era mesmo? Sam! Era Sam!

Senti um leve toque em meus ombros e novamente vi o rapaz alto com quem esbarrei no corredor. Parecia demasiado preocupado, olhei em volta e segui para um lado vazio do saguão, agora era certo de que ele me seguia. Parei esperando que ele dissesse algo, mas fui eu quem interrompeu o silêncio.

– Então, em que eu posso te ajudar? - Perguntei.

– Annabeth, certo? - Ele começou - Eu sou Sam... Winchester. Escuta, eu sei que isso vai soar estranho para você, mas eu preciso da sua ajuda.

– Desculpe? Minha ajuda? - Indaguei incrédula - Ajuda com o quê exatamente? Espere... Seu sobrenome, eu já o ouvi antes...

– Dean! - Exclamou ele - Meu irmão, ele está "desaparecido" e o último lugar em que eu soube que estava foi em Londres, estou procurando por ele e, não pude deixar de notar a fotografia que você expôs.

– Certo - Pausei olhando em volta - Olha... Eu não sei como posso te ajudar em algo, mas, me encontre amanhã está bem? Na cafeteria em frente ao Battersea Park. Podemos conversar com mais calma por lá.

Quando me virei para voltar as minhas fotos expostas Sam segurou o meu braço com o olhar desesperado, mas encontrando minha expressão confusa ele o soltou e me deixou ir. Quem era esse cara e como será que ele esperava a minha ajuda? Estaria Dean em perigo? Agarrei o pingente de lua cheia no meu colar e estremeci. Algo estava errado, mas o quê?


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