A filha de Gaia escrita por Goth-Lady


Capítulo 12
A flauta mágica


Notas iniciais do capítulo

Finalmente voltei ao Inferno de Janeiro (não só pelo calor que faz, mas pela cidade como ela é) e voltei com capítulo novo.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/649803/chapter/12

Enquanto o dia para os campistas amanheceu o mesmo com as mesmas atividades no acampamento, para os vanir residentes de Asgard amanheceu agitado.

— Você acha que ela prefere azul ou verde?

— Não vai pintar as minhas lindas paredes de mármore branco com tinta.

— Tem razão. Eu posso usar na colcha, o que acha?

— Pai, qualquer coisa que você fizer, ela vai adorar e o quarto já está pronto.

— Mas só tem uma cama de casal, um armário, um banheiro, uma mesa e uma cadeira, Freya! Parece como qualquer outro quarto de hóspedes.

— Vamos pensar em algo. Já resolveu as contas com o orfanato em que ela morava?

— Já sim. Foi duro, mas resolvi.

— E...?

— E não adotei nenhuma outra criança além dela, como você exigiu.

— Bom dia, mana, pai.

— Frey, que bom que você chegou! Você acha que devemos trocar as cortinas? Devemos pendurar um tapete de pele?

— Pai, eu acho que não é necessário.

— Tem razão. Devemos comprar um computador? Não, uma estante é melhor! Quais livros comprar?! AAAAAAAHH! É muita coisa!

— O pai surtou de novo.

— Ele sempre fica assim quando sabe que vai ganhar um filho. Ainda bem que o fiz desistir da ideia do berço.

— Ele queria dar um berço para uma garota de 16 anos?

— Ele não queria que Nicolas ficasse no berço até completar 10 anos? Sorte a dele de ter irmãos como nós, Frey.

— Como será que ele reagiu quando soube que a mãe estava esperando a gente?

— Provavelmente do mesmo modo que reage quando sabe que vai ganhar um filho.

— Mas fomos os primeiros, Freya. Quer perguntar à mãe e descobrir?

— Não, obrigada. Podemos ganhar alguns traumas desnecessários. Já basta o trauma que o pai nos deu quando soube que ia ganhar um neto.

— Está falando do meu filho Fjölnir? Ele parecia mais pai dele do que eu!

— Esse é o pai. Ele fica tão feliz quando um filho nasce, mas fica duas vezes mais triste quando morre.

— E com os netos também e ai da gente se escondermos um neto dele. Você viu o meu javali?

— Deve estar correndo em algum lugar.

Enquanto isso, o acampamento fazia sua rotina, embora houvesse obras, mas dessa vez nada de morto carregando coisas. Raven continuava como intérprete da garota francesa e cuidava nos projetos, Diana ajudava na construção com os materiais pesados ao mesmo tempo em que vigiava Lena, Tyler e Eliot conheceram os gêmeos Stoll e pareciam se dar bem, Angus dormia em algum canto, Helena e Sienna não deixaram a Embaixada, Nicolas estava com os dois filhos de Dionísio, Frísio ajudava no estábulo e Jasmine meditava na floresta.

A castanha sentia cada árvore, cada pedra e planta e agora tentava se estender até o rio, sentindo um pouco da magia que a natureza exalava. Uma leve brisa passava por entre as árvores e acariciava seu cabelo.

Jasmine...

— Quem está aí? – Perguntou parando a meditação, mas como não encontrou ninguém, se conectou novamente com a natureza.

Jasmine...

É apenas a natureza. — Pensou. – As árvores sempre falaram comigo, devem ser elas.

 

— As árvores não são a natureza por inteiro, apenas parte dela.

 

­A garota abriu os olhos, mas não havia nada. Decidindo que estava bom por enquanto, ela se levantou e respirou fundo, não querendo sair dali. Sem avisar, algo a jogou para trás e ela, desesperada se agarrou na primeira coisa que achou. Era um pescoço, um pescoço de cavalo e a juba tingida de castanho não deixava dúvidas.

— Árion?!

— Surpresa, garota?

— Mas o que...?

— Chegamos! – Anunciou parando.

— Mas não saímos da floresta.

— Não mesmo? Eu sou bem rápido.

Ele está certo.

— Quem disse isso?

— Disse o que?

— Você não ouviu?

— Só estamos nós dois aqui.

— Ah. Onde estamos?

— Eu tenho cara de filho da Gaia por acaso? Se vira!

Com isso, Árion saiu correndo. Jasmine se encontrava sozinha no meio de árvores estranhas a ela, até mesmo o ar era estranho. Não sabia onde estava, mas ficar sem fazer nada não iria adiantar. Se concentrou, fechou os olhos e abriu a mente para a floresta. Bastou um segundo para perceber que não estava mais no acampamento, a árvores sequer a conheciam.

— Como faço para chegar ao acampamento?

Acampamento?Que acampamento?— Responderam as árvores em sua língua antiga, mas que Jasmine entendia. – Não há acampamento. Pobre menina, está perdida.

— O Acampamento Meio-Sangue. Sabem onde fica?

Ela escuta o que a gente fala? Escuta. Nunca ninguém conversou conosco antes. Será filha de Áine? Não seja tola, a rainha das fadas não tem filhos. Mesmo se tivesse, não seria capaz de nos ouvir.— Murmuraram as árvores entre si.

— Sim, eu posso ouvi-las. Vocês sabem para que lado fica o acampamento que falei?

Não há acampamento por aqui.

­

— Sabem onde fica a cidade mais próxima?

Reims é por ali. Podemos mostrar o caminho.

— Obrigada. Eu nunca ouvi falar dessa cidade, em que estado fica?

Departamento de Marna, região de Champanha-Ardenas.

— Mas não existe nenhum estado americano com esse nome!

América? THIS IS FRAAAAAAAAAAAANCE!

A garota piscou os olhos sem acreditar. Árion a tinha levado para o outro lado do oceano e agora estava perdida em outro país em uma região que não conhecia. Ela sentiu suas pernas falharem e no segundo seguinte, estava no chão, totalmente perplexa.

No acampamento, o trabalho seguia. Fiáin correu até o estábulo comum. Ele deu um coice na porta e depois fez uma entrada digna de filme de drama.

Mestre, o senhor precisa vir comigo! A filha de Gaia sumiu!

— Como assim?

Estava na floresta, sabe que nós unicórnios gostamos de paz e tranquilidade, ela estava lá e de repente, sumiu!

— Fiáin, calma. O que realmente aconteceu? O que viu?

Eu não vi nada, as fadas que me falaram. Sabe que até aqui tem fadas.

— Chame Gaoithe e Árion. Quero vocês passando um pente fino nesse acampamento.

Após dar a ordem, Fiáin saiu do estábulo, deixando murmúrios entre os pegasus. Frísio também saiu, mas iria falar com os outros. Raven e Diana tinham tarefas importantes demais para serem incomodadas e se largassem, atrasariam o trabalho do acampamento. Não confiava muito nos gregos e com Nicolas fazendo amizade com o Chalé de Dionísio e Eliot e Tyler com os gêmeos de Hermes, não queria arriscar. Não sabia onde Angus estava, então retornou ao prédio.

Ao entrar na Embaixada, bateu à porta do quarto de Helena. A morena albina apareceu com seu rosto impassível, como de costume. Frísio se perguntava se alguma vez aquele rosto tinha sorrido.

— Jasmine sumiu.

— Deve estar meditando.

— Não está. Fiáin acabou de me dizer que a presença dela sumiu da floresta. Mandei ele chamar Gaoithe e Árion e passar o pente fino no acampamento.

— E Diana e Raven?

— Ocupadas, não queria incomodá-las. Pelo pouco que sei, Diana largaria os materiais para procurá-la.

— Ela viraria as construções de cabeça para baixo se fosse preciso. Raven também largaria tudo para o alto. Onde estão os outros?

— Com os gregos, mas não confio muito neles. Sabe, nos gregos. Os pais deles têm contrapartes romanas.

— Entendo.

Helena bateu à porta de Sienna e explicou a situação. A azulada sugeriu para que fossem à sala no térreo. Os três desceram e Sienna retirou algo da Chain. Era um espelho de prata muito bonito e limpo, a lente reluzia como diamante.

— Como isso vai nos ajudar? – Perguntou o celta.

— Este é o espelho das ilusões. Irá nos mostrar onde ela está.

— O famoso espelho das ilusões. – Comentou a nórdica. – Está apta para usá-lo?

— Mais do que imagina.

De volta à floresta perto da cidade de Reims, Jasmine caminhava por ela. Apesar da indicação de onde ficava a cidade, não sabia o que faria se fosse até ela. Enquanto caminhava, escutou uma suave melodia preencher o ar. A floresta ficou em absoluto silêncio, mas não era um silêncio mortal e sim um silêncio agradável para escutar a suave melodia propagada pelo vento.

Curiosa, Jasmine seguiu até a sua origem. Após uns cinco minutos de caminhada, ela chegou a uma clareira cheia de flores e com tronco deitado no centro. Sentado no tronco estava uma criatura que nunca tinha visto. Parecia humana com longos cabelos loiros e algumas tranças de enfeite, mas tinha orelhas de cervo, enormes chifres e pelos por toda a região nas cores caramelo e branco, suas unhas das mãos eram cascos. Usava uma longa túnica cor de areia com uma capa escarlate e por debaixo da túnica, ela pôde ver que as pernas eram grandes patas de veado.

Apesar da aparência nada convencional, a criatura tocava uma simples flauta doce esculpida em madeira com habilidade, proporcionando a melodia agradável que ouvira. Os animais se amontoavam na clareira para escutar, até os pássaros paravam de cantar para apreciar a música. A melodia acabou da mesma forma que começou.

— Sei que está aí. – Disse o ser com a voz macia, mas que dava para perceber que era macho. – Aproxime-se.

Hesitante, ela se aproximou. Os animais abriram caminho para ela, mas mesmo assim se sentia desconfortável.

— Está perdida, criança?

— Como sabe?

— Eu sei muitas coisas. Como se chama?

— Jasmine, senhor.

— De onde você é, Jasmine? Posso mandar te guiarem até em casa.

— Creio que não será possível, senhor. Eu sou do outro lado do oceano.

— O que alguém do outro lado do oceano faz perdida nessa floresta?

— É complicado. Árion me trouxe até aqui.

— Uma semideusa grega.

— Como sabe?

— Ele só se aproxima de gregos e romanos, tinha 50% de chance de acertar.

— Mas ele se aproximou do Frísio e ele...

— É filho de Epona, sim. Os cavalos a amam, talvez mais que Macha ou Rhiannon. Epona é da minha mitologia.

— Você é um deus celta?

— Sou mais antigo que os celtas, mas fui designado para a mitologia celta gaulesa. Cernunnos, um dos três líderes da mitologia celta gaulesa, o senhor dos animais, deus da fertilidade, da natureza e da abundância, ao seu dispor.

Ela piscou os olhos várias vezes sem acreditar.

— Achava que só os egípcios tinham cabeças de animais.

— Não só os egípcios, alguns deuses são misturas entre humanos e animais e alguns só possuem cabeças de animais, já alguns são animais. Deve ser bem instruída para conhecer os egípcios.

— Meus amigos são egípcios, quer dizer, três deles, os outros são nórdicos, exceto pelo Frísio, ele é celta como você, e pela Sienna, que é inuit, e o Tyler é maori...

— É um grupo bem eclético. – Sorriu amistosamente. – Não esperava que conhecesse Frísio. Se é amiga dele, é amiga minha também. Diga-me, gosta de animais?

— Amo.

— E da natureza?

— Também. Me sinto bem entre as árvores.

— Então devo concluir que é filha da Gaia. – A menina arregalou os olhos.

— Conhece a minha mãe?!

— E quem não conhece, principalmente se tratando de uma deusa-mãe?

— Deusa-mãe?

— Mãe Terra, geradora da vida e da natureza, geralmente uma personificação da Terra. Temos várias. Gaia, Jord, Ernmas, Dôn, Akna, Papa, Tiamat... Se bem que Geb é o único homem que conheço nessa categoria.

— Tem tantas assim?

— Claro. Diga-me, o que achou da minha música?

— Achei reconfortante, tranquila e doce.

— Sabe tocar flauta?

— Não, nunca segurei em uma.

— Gostaria de aprender?

— Sim, mas não acho que tocarei tão bem quanto o senhor.

— Bobagem, só precisa de um pouco de prática. Aqui, pode usar a minha.

Após limpar o bocal nas vestes, Cernunnos entregou à garota. Ele deu instruções de como segurar e tocar. Após os primeiros passos, Jasmine se viu tocando desafinadamente ou só soprando por entre o bocal com o senhor dos animais ora rindo e ora ensinando e tentando não rir, até acertar as notas. Quando conseguiu, Cernunnos ensinou canções fáceis a ela e novamente, Jasmine se viu em uma briga com as notas.

Enquanto ela brigava com as notas, o deus retirou da túnica um cajado de madeira e começou a fazer deu trabalho. Fez a grama crescer onde devia, curou as árvores das pragas e cortes feitos pelos humanos, não entendia e nem queria entender o porquê dos humanos marcarem árvores com seus nomes, corações e palavras sem sentido, fez flores desabrocharem e fortaleceu ninhos. Jasmine, em uma de suas pausas para respirar e realizar uma nova tentativa quando viu o que o deus estava fazendo.

— Como você fez isso?

— Isso o que?

— Isso, com o cajado.

— Cajados são feitos para usar magia, diferente de uma espada e um arco, não é preciso muito treino para usar um cajado, apenas saber usar magia.

— Mestre Nijord tentou me ensinar, mas como ele é um deus do mar, ele fez o seu melhor para que eu pudesse aprender.

— Um deus do mar não é um deus da natureza, é parte dela. Te ensinarei de forma correta agora. Você sabe o que é natureza?

— Árvores, plantas e animais, em outras palavras, vida.

— E se eu disser que natureza também é morte?

— Como...?

— A natureza é o conjunto de ecossistemas, desde os desertos mais quentes e arenosos até as montanhas mais geladas e cavernosas; é terra, céu, mar e lava; vida e morte em um ciclo sem fim; é o indivíduo em si e ao mesmo tempo tudo que o rodeia, tudo aquilo para o qual ele foi programado e seu entorno. É da natureza de um predador caçar e da presa se esconder, assim como é da natureza o vento soprar e a terra se mexer. Tudo está conectado, desde a menor das células até a Yggdrasil.

— Então é isso, mas eu não entendi a parte da vida e da morte.

— Os seres vivos cuidam da manutenção dos ecossistemas, quando morrem, seu corpo é decomposto e transformado em nutrientes para os ecossistemas. Já as almas vão para os submundos de acordo com cada mitologia, sendo que elas podem reencarnar ou não, mas isso é uma conversa muito mais profunda. Vamos voltar ao foco principal.

Enquanto isso, a porta da Embaixada se abriu com violência entrando Diana, Raven e Nicolas esbaforidos.

— Por que não me avisou que a Jasmine sumiu?! – Interrogou a ruiva.

— Você estava ocupada e eu não quis atrapalhar.

— Minha irmã sumiu do nada e nem me avisou?!

— Bem, é que...

— Isso é desnecessário. – Disse Helena. – Ela está bem.

— Como pode dizer isso?!

— Olhem vocês mesmos.

Helena deu espaço e Sienna mostrou a garota com Cernunnos.

— Que magia usaram? – Perguntou a morena.

— Nenhuma, este é o espelho das ilusões.

— O espelho das ilusões?

— Que espelho é esse? – Perguntou o loiro esverdeado.

— É um espelho que mostra acontecimentos, porém deve tomar cuidado, pois ele também poderá mostrar ilusões.

— Parcialmente correto. – Respondeu a morena albina. – As ilusões mostradas partem daquilo que você quer. Mesmo que queira a verdade, uma parte de você desejará por algo mais ou algo menos e é aí que a ilusão se forma.

— Para usá-lo, é preciso eliminar toda e qualquer esperança antes de usá-lo e toda e qualquer eventual esperança que surgir em seu uso, assim como os seus desejos. – Dessa vez foi a azulada que respondeu. – Caso contrário cairá nas ilusões do espelho.

— E consequentemente, na loucura.

— Resumindo, é algo que só os filhos de Hel e Sedna podem usar sem ter danos.

— É melhor eu mandar os equinos pararem as buscas.

De volta à floresta perto de Reims, Cernunnos tinha acabado de explicar a Jasmine como usar magia e o cajado. A grega tinha tirado o seu próprio da Chain e sempre que tentava usar magia, acabava se mostrando despreparada, mas ela era melhor com o cajado do que com a flauta.

— Viu, não é difícil. Só precisa de um pouco mais de treino.

— Obrigada.

— Podemos voltar às lições de flauta, agora? Sinto falta de uma boa música.

— Mas eu não toco bem.

— Música também está associada à magia, sabia? Você aprendeu a canalizar a magia em um cajado, com uma flauta de madeira não é diferente. Tente.

Jasmine pegou a flauta, se concentrou e canalizou suas forças para ela. Quando achou que estava pronta, tocou. O som se fazia diferente dessa vez. Ao invés de notas arranhadas, um suave som saiu do objeto. Quando parou, notou alguns animais na clareira.

— Mas, como foi que...?

— Acho que esqueci de mencionar que essa é uma flauta especial.

— Especial?

— Geralmente eu toco uma comum, mas hoje acabei pegando essa por engano. É uma flauta com um poder incrível.

— O que ela faz?

— Além de acalmar animais e criaturas mitológicas? Pode consertar corações quebrados. Os animais vieram para cá por causa de sua música, não que não viessem pela minha, afinal, eu posso tocar qualquer flauta que eles virão até mim para escutar, mas se não fosse por você, nem notaria que estava com essa flauta.

— Hei, oh cabeça de terra. – Chamou o cavalo de crina pintada. – Quer carona para casa ou não?

— Árion!

— Se quer ir para casa, suba logo, que estou de saída.

— Obrigada, senhor Cernunnos. – Disse devolvendo a flauta, mas o deus recusou.

— Pode ficar, é um presente.

— Mas...

— Se ficar comigo será mais uma flauta para mim, o senhor dos animais não precisa de uma flauta mágica para acalmá-los. Terá um uso melhor para você do que para mim.

— Vamos logo que eu ainda tenho que irritar os meus primos.

— Obrigada, senhor...

— Apenas Cernunnos, por favor. Eu posso ser mais velho que os celtas, mas não sou tão velho assim. E lembre-se sempre, a magia vem daqui. – Ele apontou para o próprio coração.

Jasmine sorriu, guardou a flauta e o cajado na Chain, se despediu o deus, subiu em Árion e ambos retornaram ao acampamento. Assim que chegaram, ela viu os outros em frente à Embaixada. Viu que Sienna segurava um espelho de prata e Frísio parecia furioso com o cavalo.

— Árion, pode me explicar que armação foi essa?

— Armação, que armação? – Olhou bem para o filho de Epona. – Se o jovem mestre insiste, fui persuadido a levá-la até lá.

— Quem te persuadiu?

— Um hippie de cabelo verde. Era Mijou o nome dele?

— Nijord. – Disse Nicolas. – Mas por que meu pai faria algo assim.

— Precisava da ajuda de Cernunnos para ajudá-la em seu treinamento. – Concluiu Helena com o óbvio. – É o que os deuses fazem, e quem melhor que um deus da natureza?

— Só não contava com uma coisa: as aulas de flauta. – Disse Frísio.

— Espere, como vocês sabem disso?

— É uma longa história, mas para Cernunnos te deixar ficar com essa flauta é porque realmente viu algo em você.

— O que ele viu?

— Eu não sei, mas é algo bom. Sabe, ele não dá nada além de danos a pessoas maldosas ou corrompidas. Ele é uma espécie de guardião, se eu posso assim dizer. Os animais, domésticos e selvagens, são sua responsabilidade e o meio ambiente a casa deles, ele odeia quem destrói a casa deles e odeia mais ainda quem maltrata animais. As punições dele são severas e temíveis.

Enquanto os membros da Embaixada conversavam, Njord estava no Godcel com Cernunnos.

— O que achou da minha menina?

— Só conviveu com ela quatro dias e já a adotou? Njord, você não tem jeito.

— O que eu posso dizer? Ela é apaixonante, não acha?

— Você diz isso para todo filho seu que nasce.

— Sou um pai coruja, mas me diga, foi tudo bem?

— Foi sim. Ela é uma boa menina. Conversamos depois, tenho mais algumas áreas para restaurar, caro amigo.

— Boa sorte nisso.

— E quero aquele bolo de frutas da sua filha e não se esqueça do ouro do cavalo.

— O ouro, eu já paguei, só falta o bolo. Depois te ligo quando estiver pronto, tenho que dar a notícia da adoção para a minha menina.

— Está bem. Até logo.

— Valeu por tudo. – Desligou. – Sei que está aí.

— Sou tão previsível assim?

A dona da voz era uma mulher de longos cabelos verdes amarrados de qualquer maneira e uma trança rústica de enfeite, seus olhos eram azuis como águas límpidas. Ela vestia um vestido marrom no busto, verde do abdômen e azul na canela, ombreiras de bronze com pequenos véus cor de areia, botas marrons, cinto de bronze e branco e outro de bronze com pedras azuis e verdes, braceletes de madeira e dois colares de madeira, um cobria o pescoço e a clavícula e tinha detalhes brancos e cor de areia e o outro era pendurado com pingentes verdes e azuis, além de uma tiara de madeira com uma pedra verde e uma azul e uma flor rosa no cabelo.

— A presença de uma deusa-mãe não é estranha para mim. Eu sou o senhor dos animais e guardião da natureza, lembra-se?

— Sim e um dos meus mais estimados amigos. Ouvi algo sobre uma adoção?

— Sim, Njord adotou uma menina.

— Fico feliz em ouvir isso. Njord é um grande amigo.

— Eu sei. Fico surpreso que os olimpianos ainda não saibam sobre ela.

— Eu a escondi muito bem. Estava preocupada com este dia, mas Njord me fez um grande favor. Eu não sei como retribuir.

— Continuar escondida é o melhor a se fazer, assim como esperar.

— Estou farta de esperar, Cernunnos! Cada ano que passa a poluição aumenta, mais animais morrem e a vida se condena. Se eu soubesse que isso aconteceria, tratava de destruir os primeiros seres humanos.

— Todos nós, mas isso é responsabilidade dos humanos. Nossa parte nós cumprimos.

— Mas não é o suficiente! Eu juro que um dia...!

— É mais efetivo aprender a cuidar do que destruir o mundo e começar do zero. Afinal para que destruir o mundo? Os humanos já o fazem por si mesmos, a nós só nos resta preservar para que as espécies não acabem, restaurar o corrompido, criar vida onde há morte. Não importa como o mundo acabe, não podemos permitir com ele perca a capacidade de regenerar.

— Sempre com o mesmo discurso, Cernunnos! Não sei por que ainda te dou ouvidos!

— Porque sabe que estou certo. Podemos usar as cinzas e o sangue derramado da última batalha para manter o equilíbrio. Uma luta a mais ou a menos, que diferença faz? Sangue de deus ou mortal, a terra se alimentará do mesmo jeito. Não importa quantas rebeliões aconteçam, sangue e morte se transformarão em vida e no fim é isso que importa.

— Vocês celtas são sempre tão sombrios e tão poéticos?

— A natureza é o nosso lar e o nosso ser. Vida e morte são o seu ciclo, por isso uma deusa-mãe não pode ser morta, apenas adormecida.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Frey e Freya, os gêmeos de Skadi e Njord que moram em Asgard com o pai. Só para relembrar.
#
Frey tem um javali de ouro chamado Gulinbursti, que conduz seu carro e reluz à noite. Ele também pode servir de montaria sozinho, além do fucking navio voador que pode ser dobrado no bolso.
#
Reims é uma cidade francesa que foi um dos palcos da 1ª Guerra Mundial onde ocorreu a Batalha de Reims de 1918, sendo a última ofensiva dos alemães na Frente Ocidental sendo massacrados pelos Aliados. Foi a primeira de uma série de vitórias dos Aliados.
#
A frase "THIS IS FRAAAAAAAAAAAANCE!" é uma brincadeira e referência à frase "This Is Sparta" do filme 300.
#
A desconfiança de Frísio em relação aos gregos por causa dos deuses terem contraparte romana é uma referência ao Império Romano que invadiu e conquistou o mundo, inclusive a Gália, a Ibéria e a Britânia (atual Inglaterra e País de Gales). Uma das poucas regiões que os romanos não conquistaram foi a Caledônia (atual Escócia), que resistiu aos romanos e os próprios romanos construíram a Muralha de Adriano para "mantê-los fora" (hoje, patrimônio cultural da humanidade). Todas essas eram regiões celtas que tiveram que sucumbir ao panteão romano, tanto é que as obras de Asterix e Obelix são uma sátira de um povo remanescente gaulês que resiste ao Império Romano.
#
O espelho das ilusões é um artefato criado por mim. Ele pode lembrar o espelho da Branca de Neve, a feitiçaria que a Úrsula usou para espionar o progresso da Ariel ou a janela do mapa de jogos de estratégia, principalmente do Age of Mythology, já que ele faz ambas as funções.
#
Apesar de poder ver o que está se passando com seus amigos ou o mapa da região para espionar a base inimiga, não é qualquer um que pode usar esse espelho. Como o nome sugere, ele pode maquiar realidade com ilusões, por isso, deve sempre tentar ver a realidade como ela é não importa o que aconteça. um único fio de esperança é o suficiente para ativar a ilusão do espelho, que irá enganá-lo, por exemplo, você vê um amigo cair e tudo o que quer é que ele esteja bem e vivo, o espelho irá mostrar o que você quer, ele vivo, bem e vencendo a dificuldade, mas quando na verdade seu amigo morreu da forma mais brutal possível. Quando descobrir a verdade cruel, você não acredita porque o viu bem e jura por isso até que confronta a verdade.
#
Atenção: nunca deseje algo além da verdade nua e crua quando usar o espelho, pois poderá cair em suas ilusões e até perder toda a sua sanidade e sucumbir à loucura.
#
Filhos de Hel e Sedna são os mais aptos para utilizar o espelho porque Hel é justa e impassível e passa essas características para seus filhos, além de ensiná-los sobre justiça, a procurar sempre pela verdade e a deixar de lado seus sentimentos e ressentimentos pessoais na hora de julgar alguém. Já Sedna pode ter rancor dos homens por tudo que passou, mas ela ensina a seus filhos a ver a realidade como ela é e não como uma fantasia. O mundo é cruel e a vida não tem pena de ninguém.
#
Cernunnos é descrito como uma figura humanoide com cabeça ou só chifres que lembram os de alce ou veado/cervo (é tudo da mesma família). Ele é mais antigo que os deuses celtas e foi incorporado à mitologia celta quando a religião céltica se espalhou pelo continente.
#
Cernunnos é o senhor dos animais, representando tanto os selvagens como os domésticos, sendo também deus da fertilidade, da abundância e da natureza. A igreja católica associou sua imagem com Satanás. Construí sua aparência com base nessas imagens:
https://osquatropilares.files.wordpress.com/2012/09/cernunnos.jpg
http://2.bp.blogspot.com/-uPYlsVPb4yI/UHQoDU7eySI/AAAAAAAAEHE/mQ8VeYwiBI8/s1600/323063.jpg
#
De novo: Macha, Rhiannon e Epona são deusas dos cavalos, sendo que Macha é irlandesa, Rhiannon galesa e Epona gaulesa. Epona é exclusivamente dos equinos (cavalos, burros e mulas) e não tem qualquer outra associação. Rhiannon é tando deusa dos cavalos como deusa das aves (todo tipo de ave). Já Macha além de ser patrona dos cavalos, tem a guerra.
#
Deusa-mãe ou Mãe-Terra são títulos que se referem a deusa da Terra e geradora da vida e da natureza. Geralmente é uma mulher, porém Geb, que tem esse papel entre os egípcios, não possui título de Pai-Terra.
#
Geb é marido de Nut e pai de Osíris, Seth, Ísis e Néftis e o "Pai-Terra", sendo um deus da terra.
#
Jord é a deusa da Terra na mitologia nórdica e mãe de Thor e Meili.
#
Ermas, Dôn e/ou Danu são deusas celtas, mas deixemos para falar delas mais adiante.
#
Papa é maori e mama de Tane, Tangaroa, Tawiri e da cambada de irmãos que eles têm (Papa, the mama, perdoem o trocadilho besta). Seu nome é Papatūānuku, mas geralmente é chamada de Papa.
#
As outras, deixarei para mais tarde.
#
Assim como os animais, Cernunnos cuida da manutenção da natureza. Um dos hobbies que dei para ele foi de tocar flauta, já que música é vida para os celtas.
#
É um costume nosso e idiota de ferir árvores com um canivete ou algo cortante para marcar nossos nomes em uma declaração de amor eterno ou só marcar por marcar. Atualmente é mais comum escrever na porta de um banheiro público do que marcar uma árvore, mas não deixa de ser idiota.
#
Cajados serviam de bengalas nos tempos antigos e depois foram associados a magia, assim como os cetros. Repare que em todo jogo de RPG, o mago sempre usa um cajado e mesmo o Gandalf usava um cajado além da espada.
#
Natureza não é só florestas, grama e coisas verdes não, natureza também pode ser deserto, gelo, mar, caverna, pois ela é feita de todos os ecossistemas. Ecossistema não é só Amazônia, é também o Saara (o deserto, não as lojas do RJ), o ártico e até mesmo o fundo do mar e as cavernas, pois eles são locais onde residem seres vivos que interagem com o ambiente ao seu redor e são adaptados para viver naquele ambiente.
#
Ser vivo também é designado a bactérias, fungos, protozoários e há quem diga que até os vírus são seres vivos. E sim, existem bactérias sulfurosas que produzem enxofre, que é encontrado em regiões vulcânicas, fontes termais naturais e até minas, além de bactérias vulcânicas.
#
A lava, quando resfriada e endurecida, torna o solo fértil e próprio para plantio. Por isso, a maioria das regiões vulcânicas tendem a ser alvo de plantios, mesmo com um vulcão ativo prestes a explodir.
#
Natureza também tende a ser a morte, pois nada se desperdiça, tudo se transforma. A morte de um ser vivo não é o fim, pois o corpo irá alimentar bactérias e dando nutrientes ao solo. E mesmo com desastre naturais, a natureza dá um jeito de se reerguer, um exemplo disso, áreas de acidente nuclear (Chernobil e Fukushima) que foram afetadas, hoje as plantas tomaram essas áreas.
#
A natureza também é o que somos e o que podemos fazer. Pode parecer confuso, mas não é, basta ler a fábula do médico e do escorpião (ou do monge e dos escorpião). A natureza do escorpião é picar, já a natureza humana é imprevisível. Amor, bondade, hipocrisia e ambição fazem parte da natureza humana, uns são mais e outros menos, por isso, estamos em constante evolução ao longo da vida e tendemos a ser imprevisíveis.
#
Entenda ambição no último tópico como uma coisa necessária para nós e não como uma coisa meramente ruim. Nós podemos ambicionar coisas diferentes, uns ambicionam dinheiro, outros uma vida pacífica, outros mudar o mundo, outros ter fama, outros construir uma família, outros ser bem sucedido... O que nos diferencia são as formas que utilizamos para atingir nossos objetivos e alcançar nossa ambição. Ex: ganhar dinheiro, tem gente que trabalha a vida toda, dá duro, está sempre se reinventando e consegue ficar rico e tem gente que mente, que rouba e passa a perna nos outros para isso. A ambição está tão entranhada em nosso ser que nunca estamos satisfeitos com o que temos e nunca vamos estar.
#
Na natureza, tudo se conecta. Desde o clássico exemplo da cadeia alimentar até o mutualismo, a competição, o comensalismo...
#
Música e magia também estão associadas. A música tem um grande poder sobre nós. Seja nos deixar alegres, para reflexão ou até nos momentos tristes da vida, para cada etapa das nossas vidas, para cada momento há uma música que combine. Ela também pode combinar com nossa personalidade e ser usada para acalmar (por isso que recomendam música clássica ou Enya para bebês quando estão nascendo ou quando vão ser postos para dormir) ou simplesmente para dançar.
#
A magia também vem de nossos corações. Se hesitarmos, as chances de um feitiço dar errado são imensas, se tivermos medo, danou-se. Não precisamos ser magos de RPG para sentir a magia, basta fazermos o bem, pegue uma cartinha ao Papai Noel no correio e faça o natal de uma criança feliz, ajude aos necessitados, verá que apesar dos momentos de frustração, haverá momentos em que o trabalho é gratificante e desses momentos, é muito difícil esquecer. Também pode ser vista na inocência e pureza de uma criança, na imaginação, no mundo como uma criança vê.
#
Poluição, caçadas descontroladas e no período de reprodução, assim como a filhotes, e destruição dos ecossistemas são um assunto ultrapassado, mas que precisa ser comentado. Recentemente, nós tivemos aquela lama em Mariana que matou o Rio Doce. Nosso planeta está morrendo, e se morrer, nós iremos morrer também. A menos que encontremos outro para colonizar nos próximos anos, teremos que cuidar deste e das nossas mães-terras (e pai-terra também). É um assunto que precisa sempre estar na pauta de discussão porque estamos esgotando nossos recursos e nos matando. Não há recursos para manter 7 bilhões de pessoas e se esse número chegar a 8 bilhões será mais difícil ainda.
#
Uma deusa-mãe não pode ser morta, apenas adormecida, pois se ela morrer, o planeta morre e nós também.
#
#
#
Ufa, finalmente acabei! Caramba, não entro na parte de biologia desde o colégio, mas está uma boa oportunidade para refletirem com o capítulo.
Se gostaram ou não, não se esqueçam de comentar, me avisem se esqueci alguma coisa ou se eu bebi demais ou se fumei camomila.
Um grande abraço e até o próximo capítulo.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A filha de Gaia" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.