O Grito da Banshee escrita por Petr0va


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olá! Bem-vindos e espero que gostem. O único aviso que eu queria deixar é: Layla significa noite, escura como a noite ou bela como a noite.
Aproveitem!



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Ser a mensageira da morte não era algo para se orgulhar, não era algo que os adolescentes poderiam considerar “legal”. Era algo que fazia Layla sentir-se culpada, algo que a fazia se odiar por ser incapaz de fazer alguma coisa para impedir que a morte acontecesse.

A incapacidade e a culpa a matavam, por mais que ela soubesse que não fora ela quem os matara, ela sentia o sangue em suas mãos, como se tudo aquilo fosse sua responsabilidade.

O pior de tudo era quando trabalhava-se com adolescentes fluindo hormônios em sua volta, conversando sobre criaturas sobrenaturais que eram consideradas o máximo – quando na verdade deveriam temê-las. O vampiro que sugava sangue quente de suas vítimas era considerado o novo príncipe de armadura reluzente; o lobisomem que antes era considerado cria do diabo, agora era um garoto de dezessete anos.

Layla nem deveria dar a mínima para isso, contudo, quando se descobre que pode prever a morte de pessoas desconhecidas, quando você descobre que é uma criatura sobrenatural desconhecida, tudo muda.

As coisas sempre começam com algo, essa é a lei da vida, porém a história de Layla começou com algo diferente: um grito. Um instinto automático quando você se assusta, quando está feliz, quando está prestes à morrer. Bastou um grito e a vida da garota-mulher começou a ter um sentido.

Ela não tinha ideia de até onde essa “responsabilidade” ia. Começava com sussurros em seu ouvido, uma dor na garganta e, por último, o grito que escapava. Muitas vezes os nomes não vinham, mas nas outras...

Seu raciocínio não era mais o mesmo, devido a todo peso morto em suas costas, ela passou a pensar de forma melancólica, pessimista, como se de alguma forma isso a ajudasse a ser mais infeliz ainda. Por mais que ela tentasse viver uma vida normal, não conseguia. Por enquanto, tudo que estava nos eixos era o trabalho de professora de história e a moradia com a sua mãe. Vinte e cinco anos e ainda morar com sua mãe é um sinônimo para fracasso.

Como a alegria de uma mensageira da morte dura pouco – pequena ironia, já que a alegria não se estabelecia em sua vida –, sentiu uma bola dura de folhas de caderno. Alunos do último ano do ensino fundamental sabiam ser bem infantis quando queriam.

Layla levantou o seu olhar e encarou toda a pequena sala de aula, ninguém notara que a bola havia caído em seu ombro esquerdo. Ninguém prestava atenção.

Arrastou a cadeira, que causou um ruído desconfortável ao ser friccionada no chão, chamando a atenção de todos.

— Desculpe-me, acho que interrompi a brincadeira de vocês. — olhou-os com impaciência, a morte a ensinara que ter paciência não significava nada. — Tem exercício no quadro, copiem agora ou todos sem intervalo.

O típico aluno que não faz nada deu um sorriso de escarnio. Layla suspirou e não se importou mais, se não passassem de ano não iria ser por falta de insistência sua.

Talvez fossem os seus olhos castanhos que não dessem medo. Talvez os cabelos negros, curtos e ondulados não passassem autoridade.

Deu de ombros e prosseguiu encarando a mesa de madeira, aquela que o professor sempre se sentava e tentava passar o seu papel de autoridade. Pena que ela não conseguia fazer isso.

Ela ouvia a folha de caderno sendo amassada, pronta para servir como uma outra bolinha de papel; ouvia os ruídos que os lápis pressionados às folhas causavam; os sussurros direcionados um ao ouvido do outro. Estava vindo, estava preso em sua garganta.

Você ouviu?”

“Alguém irá morrer hoje!”

“Você ouviu?”

“Você ouviu?”

“Alguém.”

“Irá.”

“Morrer.”

Layla nunca conseguia distingui-los, não eram sussurros femininos, masculinos, infantis. Eram diversas vozes diferenciadas juntas, informando-a que alguém realmente iria morrer, causando-a arrepios em sua coluna. Eram sussurros dos mortos.

Sentiu aquele nó na garganta de quando você está tentando conter o choro, gritou.

Gritou com todo o fôlego que tinha.

O grito atravessou as paredes de concreto e causou ecos no corredor vazio.

Seus olhos arregalaram-se – a única coisa que conseguia fazer no momento –, sua boca ficou entreaberta, como se mais um grito estivesse prestes a sair, no entanto, não havia nenhum.

Em todas as vezes, após o grito estridente, seu corpo ficava em um estado catatônico por segundos, absorvendo toda aquela informação, dessa vez não foi diferente.

Os alunos, confusos, encaravam a professora sem entender a situação toda. Dois deles, segurando as rédeas, foram até Layla, preparando-a para levá-la a enfermaria. Era um ser humano, afinal, e não apenas a professora desagradável de história. Olharam para o rosto com traços fortes, preocupados com o estado da mulher.

Layla sentiu seus braços sendo pegos, o estado em que não conseguia se movimentar passara, porém ela não queria fazer nada. Não tinha nada para fazer.

Dessa vez o nome não veio, a culpa a atingiu em cheio mesmo sem a pessoa ter parado de respirar... ainda.

Seus olhos piscavam lentamente, não tendo coragem de abri-los completamente e fitar os alunos que olhavam-na perturbados.

Os dois garotos que passaram a segurar cada um dos seus braços a arrastaram, tirando-a da cadeira para ir até a enfermaria. Mal sabiam eles que nenhuma dor causara aquilo.

Piscou pela última vez e respirou fundo, recuperando todos os seus movimentos.

— Vocês... vocês podem me deixar agora. Eu estou bem. — mentiu.

E com relutância, os meninos a largaram, analisando-a minunciosamente, como se a professora fosse surtar a qualquer momento.

Layla tentou passar um olhar de confiança à todos, ela tinha certeza que havia sido em vão. Um olhar de confiança não poderia ser passado quando você estava de joelhos no chão.

Limpou as mãos em sua calça jeans e levantou, apesar de querer ficar ali para sempre e lamentar mais uma morte no qual não poderia fazer nada.

— Eu vou para a enfermaria. — avisou-os. — Por favor, se comportem, logo um professor substituto estará aqui. — E devido a cena anterior, ela duvidava que alguém ao menos abriria a boca.

Em questão de segundos, as pernas de Layla moveram-se sozinhas, sem o seu consentimento. Não poder movimentar seus próprios membros era desesperador, entretanto não havia nada que poderia ser feito. E por mais que ela se sentisse fraca por se permitir chorar, era isso que estava fazendo. As lágrimas escorriam em sua face, e quando saiu da escola sem nem mesmo passar pela enfermaria, Layla continuava chorando.

A única coisa que ela mesma conseguia movimentar eram suas hábeis mãos, que iam parar em seu rosto para limpar as lágrimas que insistiam em cair; e sempre que precisasse, paravam em sua boca para conter os soluços, deixando-os abafados.

Ela não estava com medo por suas pernas mexerem-se sem sua autorização, não estava com medo. Era assim sempre após as previsões, elas a levavam até a vítima, e sempre quando Layla chegava elas estavam sem vida.

Um soluço não conseguiu ser abafado pela sua mão, foi alto, fazendo as pessoas da rua a olharem, como se chorar fosse uma fraqueza. Mas não era.

Layla já sentia a culpa corroendo-a, e a mesma sabia que no próximo grito ela não iria aguentar mais essa vida.

Prestou atenção no caminho que estava indo, era perto da escola, o caminho que fazia para ir para casa e encontrar sua mãe cozinhando algo novo.

Sua mãe.

Saiu correndo, e sua perna, ingrata, permitiu. Isso era uma denúncia que talvez – talvez, pedia – ela estivesse correta.

Toda a adrenalina correndo pelas suas veias não a permitiu chorar mais, tudo que ela fazia era movimentar suas pernas, correndo para chegar até sua casa e provar a si mesma que estava errada.

Chegou até a porta da frente, e com uma completa dificuldade, colocou a chave na fechadura, suas mãos tremiam, impedindo-a de acertar o mais rápido possível.

Entrou correndo, deixando a porta aberta e nem ligando pra isso.

— Mãe! — gritou. Ninguém respondia. — Mãe!!!

Entrou na cozinha, despreparada para qualquer coisa que pudesse encontrar. Ela não queria aceitar, e não aceitaria. Era tudo um engano. Era tudo um pesadelo.

— Mamãe? — Layla olhou à sua frente, bem onde sua mãe estava, com seus últimos suspiros e deitada no chão. Uma pontada surgiu em seu coração. A mulher estava com um grande círculo de sangue em sua camisa, com suas mãos sobre o ferimento. — Oh, mãe. — choramingou, indo na direção da mulher que dera sua vida.

Layla jogou-se no chão, ficando de joelhos e logo colocou a cabeça de Regina – sua mãe – no colo, tentando ao menos acariciar seus cabelos. Não conseguia de jeito nenhum.

Suas mãos pequenas foram parar no ferimento, e mesmo não sendo tão bem visto, dava para ver que era um ferimento de bala. Um assalto, possivelmente. Layla suspirou.

— Eu sempre disse pra você manter a porta fechada. — suspirou, com a dor ainda em seu peito, quente.

Regina, querendo poupar suas palavras, acariciou o maxilar da sua filha, olhando através dela, não tinha coragem de se mostrar tão debilitada, de mostrar a dor em seus olhos, o medo de morrer que nunca fora mostrado. Contudo, era tarde demais.

— É tudo minha culpa... é tudo minha culpa. — debruçou-se sobre sua mãe, deitando a cabeça em seu peito. Sabia que nada poderia ser feito. — Eu poderia ter impedido, sabe?

Ver a vida escapando por suas mãos era horrível, vida de pessoas que você não conhecia. Imagine a vida de sua mãe. A mulher que ajudou-o a ser como é, que o ajudou a criar opiniões e ser independente, responsável. Era uma dor lancinante, de rasgar o coração em pedaços, pedaços tão pequenos que não poderiam ser colados nem com a cola mais potente. Era dor, muita dor.

— Não, não podia. — sussurrou Regina, suas últimas forças estavam se esvaindo. — Quando uma banshee tem uma previsão, não há como impedi-la.

Banshee? — perguntou Layla. E por mais que fosse um esforço enorme e causasse dor, Regina estendeu sua mão direita e secou as lágrimas de sua filha.

Enfim o nome tão esperado, o nome do que ela era, porém se para tê-lo custasse a vida de sua mãe, Layla faria de tudo para que ele nunca fosse tocado.

Banshee. — afirmou com um mínimo sorriso, o único que a dor permitia. E de repente, o sorriso que apareceu tão rapidamente... foi embora do mesmo jeito.




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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler até aqui!
Não se esqueça de expressar sua opinião aí embaixo, ela é muito importante.