Crise 05 - Mensagem Subliminar

O dia seguiu de maneira bastante tranquila. Estrela manteve sua postura quieta e silenciosa, não trocando palavras com ninguém da sala. Eu, como de costume, também apenas segui com minha vida escolar de copiar a matéria do quadro e me preocupar com o que irá cair na prova. Ao toque do sinal do intervalo, Estrela saiu rapidamente da sala, novamente, sem dizer uma única palavra. Ela realmente tinha um jeito bem peculiar. De qualquer maneira, ao descer para o pátio acabo me encontrando com ela, encostada em uma parede e olhando atentamente para o próprio celular (na verdade, era uma arma capaz de abrir buracos de minhoca para outros pontos do espaço-tempo, mas ninguém precisa saber disso).

– Ei. Está tudo bem? - perguntei, me aproximando dela.

Ela colocou o dedo indicador no meu rosto pedindo para que eu ficasse quieto. Parecia concentrada com alguma coisa.

– Espere - disse ela em tom sério, sem tirar os olhos da tela - Por um momento achei que o Portal Gun havia detectado alguma coisa. Ele piscou...por um segundo, mas piscou.

– Será que tem algum alienígena escondido nessa escola? - perguntei.

– É provável. Mas é como eu disse. Nada impede que eles tenham alguma tecnologia capaz de burlar a minha detecção. Precisamos ficar bem espertos.

– Precisamos? Quer dizer...eu também? - perguntei, já meio receoso com o que o futuro me reservava.

– Você é a única pessoa que sabe da minha missão. Se não quer perder a memória, então vai ter que me ajudar sim.

– Mas como eu posso ajudar?

– Hmm...não sei ainda - ela respondeu sem muita segurança - Você entende da cultura da Terra mais do que eu, talvez seja mais fácil de passar disfarçado em certas situações.

– Disfarce? Chega a esse ponto?

– Claro. Nada impede que os alienígenas tenham assumido o controle de grandes corporações. Talvez uma pessoa que você considere importante nessa cidade seja apenas um extraterrestre disfarçado. E normalmente quando alienígenas fogem para outro lugar é porque estão com o rabo preso com alguma coisa em seu planeta de origem.

Ou seja, são criminosos procurados. Que coisa. Pelo visto, ter me envolvido com a Estrela seria mais agitado do que pensei. Apesar disso ter me deixado mais preocupado, pelo menos estava feliz de ter mais alguém para conversar no intervalo. Eu normalmente conversaria com a Mabi, mas desde que ela começou a namorar, fica mais difícil fazer isso (principalmente quando o Edu, o namorado dela começa a falar. E aquelas conversas são algo que quero evitar ao máximo...não tenho paciência o suficiente para isso).

De qualquer modo, o dia foi bem sossegado, por mais que Estrela fosse extremamente silenciosa em sala de aula. Tudo parecia bem dentro dos padrões, até a última aula, Educação Fisica. Bem, essa não é uma das melhores matérias. Não sou bom em nenhum esporte, embora eu me esforce para pelo menos ajudar o time em que caio, mas nem sempre isso dá muito certo. Jéssica, nossa professora, provavelmente uma recém-formada, já que era bem jovem, gostava mais de nos fazer correr e pagar flexões do que nos colocar em competições. E, de vez em quando, ela tinha umas ideias diferentes. Esse certamente era um desses dias. Ela já chegou na sala assoprando seu apito extremamente agudo. Até mesmo Estrela tapou os ouvidos, embora sem mudar muito sua expressão.

– Muito bem, seus preguiçosos! Hoje vou dar uma colher de chá para vocês! - disse a professora, puxando um carrinho com uma televisão de tela plana em cima e um aparelho de DVD no compartimento de baixo - Vou mostrar o quanto vocês deviam levar essa matéria mais a sério!

Não entendi muito bem, mas para mim, toda aula com vídeo é bem-vinda. Adoro situações que mudam a rotina de giz e lousa (mesmo que o vídeo, às vezes, possa ser até mais complicado do que a aula). De qualquer modo, a professora tinha suas razões para isso.

– Sobre o que é esse vídeo, prof? - perguntou um garoto da frente.

– Sobre a importância de cuidar bem da saúde, principalmente da saúde física - respondeu a professora Jéssica, em um tom mais tranquilo que não durou muito tempo - Mas também serve para outras áreas, como alimentação e quem sabe assim...VOCÊ PARE DE MASCAR CHICLETE NO MEIO DA MINHA AULA!

O pobre garoto assustado jogou o chiclete no lixo e deu um sorriso amarelo. Sim, ela odiava chicletes e deixou isso bem claro logo no primeiro dia de aula. Bem, eu nunca fui muito disso mesmo, mas sempre pensei umas dez vezes antes de sequer abrir uma bala na aula da professora Jéssica.

Bem, o vídeo falava mesmo de dedicarmos mais horas aos exercícios físicos e ensinava como poderíamos fazer isso em nosso dia-a-dia. Enfim, coisar que todo mundo sabe, mas não cumpre. O vídeo não foi muito longo e assim que terminou, a professora abriu para perguntas. Qual não foi a minha surpresa quando Estrela levantou a mão.

– Aluna nova - disse a professora, passando a palavra para Estrela.

– Professora. Onde você encontrou esse vídeo?

Por que ela estaria interessada na origem do vídeo? Talvez quisesse saber mais sobre os hábitos de saúde da Terra. Ou talvez...talvez tivesse algo a ver com os alienígenas! De qualquer modo, a professora forneceu o endereço da locadora onde alugou o vídeo. Estrela parece ter anotado a localização mentalmente (não devia ser difícil para alguém genial como ela) e, pouco tempo depois, o sinal tocou. Por sorte, a professora não pediu nenhum relatório ou algo do gênero para nós. Apesar disso, Estrela parecia preocupada com alguma coisa.

– O que foi, Estrela? - perguntei.

– Venha comigo - disse ela, me puxando - Vamos até essa locadora.

– Na locadora? Mas o que tem de estranho numa locadora?

– Além do fato de vocês pagarem para ter acesso a um arquivo de vídeo - disse ela em claro tom de deboche - Esse filme passado pela professora é extremamente perigoso.

Tinha que concordar com ela na primeira parte, em tempos de acesso facilitado à Internet e Netflix o estranho mesmo é que ainda existam locadoras. Mas eu estava mesmo curioso para saber o motivo do vídeo ser perigoso.

– O que tinha naquele vídeo?

– Masque chiclete - disse ela, secamente.

Chiclete? O que aquilo tinha a ver? Mas, no momento que ela proferiu aquela frase eu fiquei com uma vontade incontrolável de comprar chiclete. Era como se eu precisasse de algum.

– Chiclete? Caraca, de repente estou com muita vontade de mascar um. Você tem aí?

– Não tenho.

Aquela resposta me deixou com uma certa ansiedade, mas a solução era simples.

– Então vamos comprar alguns. São baratos. Hehe. Ei, espere...eu não devia fazer isso. Já estamos quase na hora do almoço e acabamos de sair da aula da professora Jéssica que odeia chicletes. E eu nem gosto tanto assim de chiclete. Isso é tão estranho!

Estava bem confuso, mas Estrela colocou a mão na minha cabeça com a tranquilidade de sempre.

– Eu sei - disse Estrela - Isso não é exatamente culpa sua. Culpe o vídeo.

– Mas por quê?

– Talvez seja uma coincidência. Talvez todos os vídeos dessa locadora causem esse efeito - ela parecia pensativa.

– Que efeito?

– Mensagens subliminares.

– Mensagem sub o quê?

Estrela suspirou e iniciou uma paciente explicação. Naquela altura todo mundo já tinha saído e só nós estávamos na classe, então ela poderia falar com mais tranquilidade.

– Você não percebe, mas o seu cérebro consegue detectar mais coisas do que imagina. Um vídeo nada mais é do que várias imagens passadas em sequência de maneira muito rápida. Em um segundo, mais do que dez quadros podem passar diante dos seus olhos. Uma dessas imagens pode ser diferente do restante do vídeo e embora você não perceba, o seu cérebro percebe e coloca no seu subconsciente.

– Ah, então tinha uma mensagens dessa nesse vídeo?

– Sim. Dizia "Masque Chiclete". A frase era exatamente essa.

– Uau! E você conseguiu perceber isso? Não sabia que a mente dos W-anos fosse tão avançada!

– Não, nosso sistema nervoso não é tão diferente do de vocês. Mas eu tive alguns treinamentos e sempre assisto qualquer vídeo com atenção redobrada para qualquer mensagem oculta. E esse era o caso. Por isso perguntei à professora onde ela conseguiu aquele vídeo.

– Por que alguém colocaria uma mensagem subliminar desse tipo?

– É o que pretendo descobrir - falou Estrela, com um ar bastante pensativo - Mas certamente os chicletes tem algo a ver com isso. Vamos. A professora me passou o endereço, vamos investigar essa locadora agora.

– E-Espera. Preciso pelo menos avisar que vou chegar mais tarde em casa - reclamei.

– Você sabe que o mundo todo pode estar em perigo se demorarmos muito, não sabe?

– Mas..

– Apenas venha - disse ela, me agarrando pela camiseta e me puxando para fora da sala. Devo lembrar o quanto aquela garota era forte? Mas depois que eu me acalmei ela soltou um pouco e eu pude perceber que várias pessoas da minha sala estavam na cantina da escola comprando...chicletes?

– Que coisa. A minha dentista falou para evitar essas coisas, mas fiquei com muita vontade de mascar chiclete - comentou uma menina, colocando várias gomas de mascar na boca.

– Eu também. Vou comprar uns dez, não, uns vinte - respondeu a colega.

– Isso é muito estranho. Todos estão comprando chicletes absurdamente - comentei - Deve ser mesmo efeito da mensagem subliminar.

– Claro que é - respondeu Estrela - Para ter um efeito tão forte, o jogo de frequências da imagem deve ter sido bem específico. Com o conhecimento dos terráqueos é muito difícil fazer algo assim, sem dúvida, deve ser uma obra alienígena!

Meu segundo dia desde que conheci a Estrela e já tinha problemas para enfrentar. Acho que minha rotina nunca mais será a mesma...