Regno Est In Sanguine escrita por Zedkiel Moor


Capítulo 1
Prólogo




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As ruas escusas de Londres ganharam um aspecto singular naquela noite de março de 1785. Era a Lua-de-Sangue que estava tingindo o infinito profundo de vermelho.

Nos becos e nas vielas, gatos e ratazanas travavam sua costumeira luta por comida, sujando os paralelepípedos cobertos de musgo do calçamento. Nas calçadas, mulheres de má fama, com suas roupas justas e extravagantes, e homens boas-vidas traçavam o curso natural das madrugadas londrinas e escreviam, em suas linhas tortas, seus destinos incertos e seus fins desonrosos.

No centro da cidade, cães ladravam e uivavam odes à lua vermelha enquanto os eternos cantores noturnos: os incômodos gatos pardos que atormentam o sono das famílias, faziam sua serenata habitual.

O grande relógio estalava em um estridente tic-tac e, assim que viu chegando a meia noite, badalou doze vezes, anunciando a hora.

O Tâmisa seguia seu lento e modorrento curso, tingido pela lua escarlate.

Num casarão vitoriano do início do século – com uma fachada branca de cal onde, bem no centro, havia uma grande porta de madeira negra com maçaneta de bronze fino, bem adornado e entalhado com sutileza hábil –, uma luz amarela de candelabros acesos escapava pelo vidro das janelas do hall de entrada, que era um magnífico pórtico, de teto côncavo e ovalado (no qual havia pintadas faces de santos e cenas belas com motivos sacros), e seis colunas de sustentação de mármore, que desciam do teto ao chão coladas às paredes. Uma escada de carvalho-negro vinha do fim do ventrículo até o meio deste (onde encontrava o chão de madeira de lei bem clara – contrastando com o escuro do assalto), coberta por um tapete comprido e escarlate, tão escarlate quanto os cabelos da ruiva que jazia deitada sobre o piso.

A madeira nívea do chão agora estava rubra, manchada do sangue que escorria do rasgo no vestido vermelho, logo acima do corpete negro com bordados em fios de ouro, preso no corpo da ruiva por um cordão vermelho-sangue amarrado num belo laço logo abaixo dos seios.

Os espasmos causados pela respiração ofegante dos últimos suspiros da moça eram bem visíveis sob o feitio. A renda branca da gola estava agora tingida de vermelho, assim como a corrente de metal atro com um pingente brilhante e rubro.

As pernas e os braços se contorciam e se mexiam de um lado para outro em busca de uma posição confortável. O talho no peito ardia e sangrava a cada vez que o ar penetrava os pulmões quase inertes.

Eu não posso morrer aqui... Não agora... Eu sei quem foi! Eu sei quem me matou! Preciso contar a alguém...” balbuciou em certo momento, trazendo para si a certeza de que era isto que precisava fazer. Queria dizer em voz mais audível, mas as forças escassas não permitiram que o fizesse.

E assim, lentamente, numa agonia incessante, sentindo dores absurdas no peito e com as pinturas do teto ovalado sobre sua cabeça, deu seu último suspiro. Um corpo pálido, quase completamente cinza, com olhos negros, veias azuis-violeta bem aparentes sob a pele fina, que perdera o brilho, assim como o pingente em sua corrente.


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