Avião de Papel escrita por Hachimenroppi


Capítulo 2
Avião de papel


Notas iniciais do capítulo

Eu realmente achei que eu tinha postado o cap passado ontem à meia noite, então estou postando hoje, atrasada. Mas, enfim. Espero que goste.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/642021/chapter/2

Em um dia, em um lugar deste mundo de mágoas e tristezas, houveram uma menina e um menino, com mundos diferentes, unidos apenas por aviões de papel.

Eu vi uma folha dobrada em um avião voar para fora daquele cerco. Eu a peguei e desdobrei. Li rapidamente suas palavras, e procurei o dono da letra levemente trêmula e desalinhada, e vi um garoto pouca coisa mais alto que eu, tinha os cabelos loiros bagunçados e presos em um rabo de cavalo muito curto, ele estava com a pele encardida de poeira e sujeira, suas roupas eram apenas uma calça e uma blusa pretas e amarrotadas. A única coisa que podia se dizer “pura” em seu corpo, seria o azul de seus olhos.

Ele sorriu para mim, e eu sorri de volta. Acenei e fui embora, voltando para o hospital antes que meu pai chegasse, já que eu nunca devia ter saído da maca. Ele ficaria furioso se me visse fora de segurança, ainda mais com um garoto além da cerca do campo onde ele trabalhava.

Li aquela carta mais uma vez. Ele era o meu primeiro contato, além de meu pai e médicos, em um ano inteiro. Com aquele garoto lá, eu notei o quanto aquele hospital era chato e entediante. Queria pessoas com quem conversar. Ele se arriscara a falar comigo, então, arriscarei-me por ele também. Respondi à sua carta, mesmo sabendo que ambos podíamos morrer por isso.

Passaram-se meses, e eu comecei a fugir do hospital com mais frequência. Quase todos os dias, eu estava lá para ele, assim como ele estava para mim. Vê-lo se tornou o mundo para mim, suas cartas sempre faziam meu coração bater forte e faziam meu rosto corar, e então tive noção do que as pessoas costumavam chamar de amor. Tudo o que eu queria era poder ser feliz ao lado dele, que pudéssemos trocar palavras.

Com as minhas saídas do hospital, meu estado piorou. De certa forma, não conseguia acreditar que o motivo era eu ter saído, e sim porque eu simplesmente não tinha cura. Mas, meu pai descobriu, de algum modo, que eu saía para ver o pequeno menino judeu. Por isso, pegou minhas cartas e as amassou todas, dizendo que eu estava proibida de ir vê-lo e que isso nunca deveria ter começado. Conseguia entender que era errado, mas não como. Como podia ser errado a vontade de amar? Como podia ser errado amar? A janela que me permitia a visão do campo, do nosso ponto de encontro, deixava uma luz entrar, uma luz na qual eu conseguia ver um futuro brilhante junto dele. O problema era ele ser doloroso e falso.

Dia após dia, os tubos aumentavam de quantidade em meu corpo. Já não era capaz de andar como costumava. E eu apenas pensava nele. Não pude sair desde que fui proibida pelo meu pai. Pensei em quantas vezes ele foi ao nosso ponto de encontro e eu não estava lá. Pensei se ele estava com um avião de papel ou se estava esperando um vindo de mim.

Provavelmente, não conseguirei sair daqui com vida, então preciso vê-lo só mais uma vez. Enviar-te um último aviãozinho de papel, despedir-me do jeito certo. Para afastar qualquer preocupação que ele tenha ao meu respeito. Então escrevi a minha última carta.

Tirei os tubos presos em meu corpo, e desci da cama. Vesti-me rapidamente com meu vestido branco, chale cor-de-rosa, sandálias e chapéu. Agarrei-me ao papel dobrado em um avião e andei pelo hospital, apoiando-me nas paredes, tendo cuidado para manter-me de pé.

Ao chegar ao nosso ponto de encontro, ele estava lá, na hora certa. O nó em minha garganta apertou ao ver que ele sorria ao me ver. E pensar que essa era a última vez que eu veria esse sorriso.

Meu rosto estava suado, estava cansada, nem sequer devia ter levantado da cama. Sem mais cerimônias, arremessei um infeliz aviãozinho de papel. Ele leu, e eu vi seu sorriso desaparecer e sua sobrancelha se erguer em confusão. Virei-me para voltar ao hospital, pois iria desabar em lágrimas, e não queria mostrá-las ao garoto.

“Eu estarei esperando por você!”, ele gritou, era a primeira vez que eu ouvia a sua voz, estava chorosa e trêmula, queria ter tido a oportunidade de ouví-la enquanto estava em um momento de felicidade. “Não quero desistir de você, nem que desista de mim. Guardarei suas cartas como tesouro, até que eu possa vê-la novamente!”, eu parei. Tentei me virar para ele, mas não pude, as lágrimas estavam rolando pelas minhas bochechas. Aquilo doía. Fiz uma força a mais para correr e me afastar de lá o mais rápido possível, como se fosse adiantar algo.

No dia seguinte, eu não podia respirar. Os médicos se apressaram para colocarem a máscara em mim, e ainda assim era difícil. Eu podia ouvir os gritos de meu pai, exigindo entrar no quarto onde eles cuidavam de mim. Comecei a chorar por tê-lo feito sofrer desde que nasci, por desobedecer, porque não queria morrer, e principalmente, porque sabia que ele culparia o pequeno judeu, que não tinha defesa, nem culpa.

Semanas depois, eu não podia respirar sozinha, precisava de ajuda de aparelhos. Também já não podia me mover. Sentia que meu momento final estava cada vez mais próximo, como se as portas do outro lado estivessem se abrindo para mim cada vez mais.

Meu pai havia me prendido à cama, para que eu não saísse mais, como se eu pudesse sair. Eu já não via mais o garoto pela área do nosso ponto de encontro, acho que ele realmente entendeu que eu não poderia mais voltar. E mesmo após nossa triste e forçada despedida, continuei agarrada às cartas de letras desalinhadas que ele me dera.

Veio-me arrependimentos: de ter fingido ser forte para você quando tive de me despedir, também não devia ter-lhe roubado o sorriso na última vez que nos vimos. Mas já era tão tarde. Eu ainda quero te ver sorrir por aí.

Em um de seus aviões de papel, me chamara de flor de coloração viva que nasce no meio do campo de ervas cobertas de escuridão. Mas, eu perdi a luz do sol, flores sem a luz do sol estão destinadas a morrer. Suas cartas me davam a luz que eu precisava para continuar florescendo, mas não mais as tenho, e minha visão turva me impede de ler as antigas.

Então, Deus, se este for o último momento, por favor, deixe-me ir para onde ele vai.

As portas do outro lado se abriram completamente e antes, tive a chance de olhar para trás e ver várias memórias doces que compartilhamos. Então, eu sorri antes que a máquina apitasse, dizendo que meu coração já não mais funcionava.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

O final está programado para amanhã (dessa vez, amanhã certinho) de manhã (ou eu pelo menos espero que sim, já que é a primeira vez que programo postagem no Nyah, espero que funcione).
Essa foi a segunda música/ponto de vista. Espero que tenham gostado. Se não for incomodar, podia deixar um review para moi



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Avião de Papel" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.