Paixões de Ônibus escrita por Eliemo


Capítulo 1
Capítulo Único




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O céu acinzentava cada vez mais, trazendo nuvens carregadas para cada vez mais próximo, até alastrar-se por todo o céu, escurecendo o dia logo na primeira hora daquela tarde de terça-feira...

O barulho do trânsito sendo liberado pela sinaleira fizera com que desviasse seus olhos azuis claros do céu intimidante para a larga e movimentada rua, por onde seu ônibus aproximava-se. Ajeitou sua touca folgada, empurrando a franja para fora de seu campo de visão, escorregando os dedos pelos fios lisos até os ombros os quais desciam do acessório negro de lã.

Pessoas ao seu redor inquietaram-se, se aglomerando próximo da porta assim que o ônibus parou. Avançou calmamente, sem se preocupar em atirar-se na frente dos outros por um lugar privilegiado. Não se importava com aquilo. Seus 1,61 aos 21 anos também não o ajudaria na disputa...

Pacientemente subira em seu tempo, aguardando as pessoas à sua frente passarem pela catraca. Seu olhar vasculhara previamente as pessoas dentro do ônibus. Não estava cheio, apenas pessoas sentadas e uma de pé. Uma figura, porém, lhe chamara a atenção. Bonito seria modéstia para elogiar aquele homem, sentado ao lado do corredor. Ele era absurdamente lindo...

Sem pensar duas vezes parara de pé ao lado do homem sentado, encarando a janela pelos primeiro segundos de movimento. Empurrara o punho de sua camisa xadrez, preta e vermelha, para longe de sua palma, agarrando a barra perante si com uma de suas mãos. Ao menos teria uma boa viagem...

Quando se sentira mais seguro abaixara o olhar. Ao lado do homem havia uma garota pálida, com a metade superior do cabelo castanho claro – em um tom bem semelhante ao seu próprio – enquanto a metade inferior de seu longo cabelo cacheado possuía um tom de rosa puxado para o violeta. Ela fitava a rua do lado de fora fixamente, parecendo perdida em seus pensamentos, logo deduzira que ela era apenas uma estranha sem qualquer ligação com o homem ao lado.

Seu foco descera para o homem sentado. Alto, com uma boa postura, vestindo um casaco tipo sobretudo escuro, cachecol caramelo, cabelo levemente comprido e uma barba por fazer. Ele era lindo, tinha um ar meio estrangeiro, meio inglês...

De repente o olhar voltara-se para si e imediatamente alterara seu foco para a janela à sua frente. Seu coração pulou no peito e um arrepio percorrera seu corpo perante o nervosismo de poder ser pego.

O homem notá-lo simplesmente não era uma opção, primeiramente porque não era, realmente, assumido. Seus amigos e família consideravam-no 100% hétero e, segundo, que absolutamente não era do tipo que encarava estranhos. Não era do tipo que dava encima de pessoas desconhecidas... Nem conhecidas... Nem qualquer tipo de pessoa. Era mais do tipo tímido, fechado e antissocial... Que prefere passar seu tempo livre no quarto, jogando jogos.

Nem ao menos seus jogos, naquele momento, eram capazes de manter sua mente ocupada, longe do homem bonito sentado tão próximo e, ao mesmo tempo, tão longe... Não conseguia manter-se distante de pensamentos impuros e peregrinados, desde coisas bobas, tipo como deveria ser o timbre de sua voz, sua risada... A forma como ele diria seu nome, Ariel, sussurrado ao pé de seu ouvido...

... Ooou a forma como receberia um alegre “bom dia” acompanhado de um beijo estalado em sua bochecha. Este seria o tipo dele...? Ou quem sabe seria mais um sorriso de canto – o qual encaixaria impecavelmente em seus traços –acompanhado de um baixo e rouco “bom dia” e duas xícaras de café atenciosamente preparadas...

Poderia ver, em sua mente, um lugar para este morar. Um apartamento, sozinho... Não, com um animal de estimação, gato ou cachorro. Poderiam tomar vinho em um dia frio e cinzento como aquele, sentados no sofá da sala. Um estofado antigo, visto seus longos anos vividos no mundo, afinal, ele o teria ganhado de presente ao se mudar, ainda sem tempo para se dar ao luxo de preocupar-se em adquirir um novo. Dividindo o mesmo cobertor em tom vermelho escuro, assistindo uma maratona de filmes de zumbis – porque amava zumbis e ele gostava de agradá-lo nos momentos os quais compartilhavam da companhia um do outro.

Teria os clássicos sempre aprazíeis, como Resident Evil e outros nem tão... “Comprometidos com a qualidade e o terror”, poderia colocar. Algo meio tosco, puxado para a comédia, onde algo realmente idiota aconteceria, como uma pessoa viva ser confundida com um zumbi e apanhar. Iria rir – porque estes filmes com comédia sobrenatural sempre o fazem rir – e quando olhasse para ele, para saber sua reação... Sentiria os lábios macios e quentes contra os seus, porque ele adorava ouvir sua risada...

Fitou ao homem sentado próximo de si, o olhar deve voltado para a janela, vendo as ruas passarem pelo outro lado do vidro. Sua atenção vagou pela bela postura que este mantinha, passando para o rosto coberto pela barba rala, que apenas o deixava ainda mais bonito. Os olhos profundos, lábios cheios... Desta vez, porém, voltara seu olhar para frente antes que pudesse ser pego encarando. A imagem do homem servia apenas para deixar seu corpo tremendo e coração em disparada alimentar suas fantasias...

Ele gostaria de chamá-lo de baixinho de um jeito que faria parecer algo bom, embora aporrinhador, como um “você é tão fofo...” que poderia evoluir para um “meu pequeno...”. Irritante, porém ele faria parecer tão gentil e amável que acabaria relevando, embora se demonstrasse aborrecido cada vez que ouvisse.

As mãos dele tinham um toque firme. Ele gostava de abraça-lo cada vez que ficavam em privado. Porque não gostava de demonstrações públicas de afeto e ele compreendia muito bem, porém incomodava-o cada vez que qualquer pessoa lhe tocava, sorria, olhava... Ele é do tipo ciumento, que guardava para si.

Um dia uma amiga sua lhe sorrira exageradamente, evidentemente flertando consigo. Ele nada dissera, apenas manteve-se impassível, com expressão fechada. Ao chegarem ao apartamento dele seu corpo haveria sido posto contra a porta, com as mãos firmes mantendo-o no lugar. Podia até mesmo sentir o hálito quente em seu pescoço, com seu corpo sendo rodeado pelo calor...

Uma curva. Uma maldita e violenta curva. Antes que pudesse se dar conta seu corpo havia sido embalado para frente, desequilibrando-se, caindo no colo da pessoa na sua frente, batendo com a mão na perna da garota adjacente.

Simplesmente não acreditara naquilo que estava acontecendo. Era irreal demais para que sua mente processasse o que havia acabado de acontecer.

Havia... Sido jogado no colo do cara...?!

Erguera um olhar pasmo e chocado para o homem, sentindo seu sangue correr todo para seu rosto. O homem retribuía seu olhar com um próprio de surpresa. Aqueles olhos que estavam presentes em suas mais íntimas fantasias...

Seu coração estava prestes a sair pela garganta.

Recompusera o mais rápido possível, devolvendo o peso de seu corpo para seus próprios pés, sentindo o sangue fervendo por debaixo de sua pele, seu olhar voltando-se rapidamente para tudo, menos o homem logo ali. Deveria se desculpar? Talvez... Entretanto raramente abria a boca e aquele com certeza seria mais um de seus momentos de silêncio absoluto.

Não havia se passado nem ao menos um minuto e já parecia uma eternidade. Percebia, pelo canto de seu olho, a moça com o cabelo bicolor sentada do lado da janela tentando esconder o riso, sem sucesso. Sentiu o olhar do homem sob si e no mesmo instante saíra dali, afastando-se, deixando que duas pessoas mantivessem sua distância do homem.

Humilhado era como se sentia... Devia ser algum castigo do mundo. O universo estava de sacanagem consigo e, porque desgraça pouca é bobagem, seu rosto fervia terrivelmente, destacando-se no seu tom de pele lívido, impossibilitando qualquer tentativa infrutífera de esconder-se com o cabelo.

Manteve seu queixo erguido e olhar fixo no vidro, com o corpo imóvel. Infelizmente notava, pelo canto de seu olho, aquele olhar profundo, fascinador de seus sonhos fixo em si, em questionamentos mudos e dúvidas não sancionadas.

Pelo menos ele não rira da sua cara, como a garota do lado fizera... Também não sorrira ou questionara se havia se machucado. Ele ficara brabo, interpretando seu acidente como uma tentativa desesperada de chamar sua atenção, como ele deveria estar acostumado – afinal, difícil ele não ter pessoas jogando-se em seu colo.

Os segundos arrastaram-se e o sentimento de humilhação mantinha-se ali. Ainda faltavam várias quadras até chegar ao seu campus da faculdade, mas uma caminhada parecia uma excelente e relaxante ideia.

Dera sinal, empurrando os corpos do ônibus razoavelmente cheio na direção da porta traseira. As pessoas, entretanto, sempre muito educadas, pareciam fazer questão de pôr-se em seu caminho, trancando-o, empurrando-o, puxando-o... Até mesmo sua camisa xadrez fora puxada pelo caminho. Olhou para trás brevemente, no intuito de libertar sua camisa, todavia antes que pudesse constatar o que acontecera seu olhar cruzara com aqueles olhos intensos...

Calafrios e um puxão muito mais violento que o necessário e sua camisa estava solta. O ônibus parara, permitindo-o libertar-se daquele ar sufocador, o qual fazia sua garganta trancar e calafrios descerem pela sua espinha.

Pequenas gotas gélidas, distanciadas uma da outra se chocaram contra sua pele. Manteve-se de costas enquanto o ônibus se distanciava, um suspiro aliviado deixando seus lábios ao momento em que seu maxilar relaxava. Provavelmente teria buracos em suas costas por aquele olhar desconcertante.

Ajeitou sua camisa em seu corpo e girou seus pés, voltando-se de volta para a rua vazia no intuito de atravessá-la quando, de repente, seu olhar encontrara um intenso conhecido, de um homem muito mais alto que si, vestindo um sobretudo escuro e cachecol caramelo, exatamente...

Suas mãos e pernas tremeram, bem como suas pupilas dilataram-se enquanto observava atentamente ele, com o olhar fixo em si, avançar os poucos passos que os separavam...

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Inspirado em Fatos Reais

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Notas finais do capítulo

Comentem, mesmo se odiarem. Comentem com sugestões ou elogios, pfvr?