Twilight - a Magia do Amor escrita por Sol Swan Cullen


Capítulo 9
8º Capítulo – Histórias Assustadoras




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/64105/chapter/9

(Bella POV)

 

Enquanto permanecia sentada no meu quarto, tentando concentrar-me no terceiro acto de Macbeth, estava, na verdade, a tentar ouvir a minha pick-up. Pensava que, apesar do ruído da chuva fustigante, poderia ouvir o roncar do motor, mas, quando, mais uma vez, fui espreitar pela cortina, de repente já lá estava.

Não estava ansiosa por que chegasse a sexta-feira e esta superou a minha ausência de expectativas (por algum motivo, o meu corpo e mente pareciam desligar-se de quaisquer emoções ou pensamentos na ausência de Edward). Como é evidente, ouvi comentários a respeito do meu desmaio. Era sobretudo Jessica quem parecia entusiasmar-se mais com aquela história (motivo que fez o meu sangue ferver-me nas veias de uma maneira que eu não julgava ser possível). Felizmente, Mike mantivera a boca fechada e ninguém parecia ter conhecimento do envolvimento de Edward, sim era só o que me faltava que alguém ficasse a saber disso e começasse a fazer comentários e rumores falsos sobre nós os dois. Ela tinha, porém, muitas questões a colocar relativamente ao almoço.

- Então, que é que o Edward Cullen te queria ontem? – Perguntou Jessica na aula de Trigonometria. Era nestas alturas em que eu desejava mesmo muito poder responder aquelas simples palavras: Não é nada que te diga respeito.

- Não sei. – Respondi, mordendo a língua para evitar dizer os meus pensamentos e sendo fiel à verdade. – Não chegou ao cerne da questão.

- Parecias algo furiosa. – Afirmou, tentando obter informações. Na minha mente, ambos os meus lados gritavam o mesmo. Cusca! Cusca! Cusca!

- Parecia?

Eu mantinha o rosto inexpressivo. Era difícil fazer esse feito quando, na verdade, eu estava a ferver de irritação perante o interesse demasiado que ela tinha na minha vida e o tom de despeite que lhe era pouco notável na voz.

- Sabes, eu nunca o vi sentar-se à mesa com alguém que não fosse da sua família. Foi esquisito.

- Esquisito. – Concordei. Embora tivesse para mim que as palavras dele de ser perigoso fossem o real aviso de tudo o que ele era, nesse caso, o correcto era o que ele fazia e não eu. Sentar-me entre os meus e deixar os humanos em segurança longe de mim.

Ela parecia aborrecida; remexia impacientemente nos seus caracóis negros com os dedos. Supus que esperava ouvir algo que constituísse uma boa história para divulgar.

Azar, amiga! Daqui não levas nada, disse a minha consciência de maneira amarga. Obrigando-me a segurar o sorriso que se queria abrir no meu rosto.

O pior da sexta-feira foi o facto de eu, apesar de saber que ele estaria ausente, ainda esperar encontrá-lo. Quando entrei na cantina com Jessica e Mike, não consegui evitar olhar para a mesa dele, onde Rosalie, Alice e Jasper se encontravam sentados, a conversar, com as cabeças bem próximas umas das outras. Não consegui igualmente evitar a melancolia que me invadiu ao aperceber-me de que não sabia quanto tempo teria de esperar para voltar a vê-lo.

Exactamente no momento em que eu lancei um último olhar à mesa dos Cullen, os seus três ocupantes levantaram as suas cabeças e olharam-me. No rosto de Alice estava o mesmo sorriso que ela me lançara no dia anterior, mas o que mais me espantou foi o sorriso que surgiu no rosto de Rosalie e o leve vislumbre de um sorriso na face de Jasper. Vi Rosalie inclinar-se na direcção dos outros dois e dizer-lhes algo, embora não conseguisse perceber que palavras passavam pelos seus lábios da loira, consegui perceber que ela pedia a opinião de Alice e Jasper sobre alguma coisa. Alice olhou para Jasper com olhos pedintes mas o loiro respondeu às duas com um acenar de cabeça negativo, fazendo com que o sorriso que iluminava o rosto das duas mulheres desaparecesse cruelmente. Ambas me lançaram um último olhar e voltaram a conversar os três de cabeças juntas.

Na minha mesa do costume, todos se referiam com entusiasmo aos nossos planos para o dia seguinte. Mike estava novamente animado, depositando uma grande confiança no apresentador do boletim meteorológico local, que garantia que o tempo iria estar soalheiro. Eu teria de ver para crer, ou melhor, teria de ligar a Ana para conferir o estado de tempo para o fim-de-semana e fazer-lhe o up date dos acontecimentos da semana. No entanto, no dia em que nos encontrávamos, o tempo estava mais quente, atingindo uma temperatura de quase quinze graus. Talvez a excursão não viesse a ser um fracasso completo.

Interceptei alguns olhares pouco amigáveis por parte de Lauren durante o almoço, que não compreendi até sairmos da cantina. Eu seguia mesmo atrás dela, a apenas trinta centímetros dos seus lisos cabelos louros prateados, e ela não se dera conta.

- … não sei porque é que a Bella – proferiu o meu nome com escárnio, fazendo o monstro em mim revelar-se momentaneamente e rosnar para com as palavras da rapariga – não se senta simplesmente à mesa dos Cullen de agora em diante. – Ouvi-a segredar a Mike. Nunca reparara na sua desagradável voz nasalada e fiquei admirada com a maldade nela patente. Não a conhecia muito bem seguramente, não o suficiente para que ela não gostasse de mim – ou assim pensava eu.

Ultrapassando o meu lado chocado, havia o outro lado que estava furioso com a rapariga na minha frente e eu senti mesmo vontade de lhe dizer que não era uma má ideia, mas que se calhar a família de quem ela aparentava não ser grande fã não gostaria muito da minha invasão à sua mesa. E também tive vontade de lhe dizer que era uma extrema falta de educação falar das pessoas nas costas e que se ela tinha alguma coisa para me dizer que bastava dizer-mo na cara.

- Ela é minha amiga; senta-se à nossa mesa. – Sussurrou Mike de forma leal, mas também um pouco territorial.

Senti grande vontade de me rir perante aquele tom possessivo de Mike em relação a mim, era deveras cómico como ele reagia à simples menção do meu nome na mesma frase que o nome dos Cullen.

Detive-me para deixar Jess e Angela passarem por mim. Não queria ouvir mais nada. E talvez pela expressão no meu rosto, recebi um olhar preocupado de Angela.

 

Nessa noite, ao jantar, Charlie parecia entusiasmado com a minha viagem a La Push na manhã seguinte. Embora eu lhe conseguisse ver algum outro sentimento nos seus olhos. Julgo que se sentia culpado por me deixar sozinha em casa durante os fins-de-semana, mas ele passara demasiados anos a criar as suas rotinas para quebrá-las agora. Evidentemente, sabia o nome de todos os miúdos que iam, dos pais e, provavelmente, também dos avós. Parecia aprovar. Perguntei-me se ele aprovaria a minha intenção de ir até Salem com Edward Cullen. Não que eu fosse revelar-lha.

- Pai, conheces um lugar chamado Goat Rocks ou algo do género? Acho que fica a Sul do Monte Rainier. – Perguntei de forma desinteressada.

- Conheço. Quando tinha mais ou menos a tua idade, eu e os teus tios costumávamos ir lá caçar. Porquê?

Encolhi os ombros.

- Alguns miúdos estavam a falar em ir acampar para lá.

- Não é um lugar muito bom para acampar. – Afirmou ele, parecendo admirado. – Há demasiados ursos. A maioria das pessoas frequenta essa região na época de caça. E sabes bem que outras espécies para além dos humanos também poderão achar esse lugar um bom sítio para se fazer uma boa alimentação.

- Ah. – Murmurei. – Talvez tenha ouvido mal o nome.

Nessa noite, treinámos os meus poderes e Charlie ensinou-me novos feitiços. Mas, no entanto, isso não foi o suficiente para me tirar da mente a informação sobre o parque onde Edward dissera que ia.

Eu pretendia dormir até mais tarde, mas uma claridade invulgar despertou-me. Abri os olhos e vi uma límpida luz amarela que atravessava as janelas do meu quarto. Não conseguia acreditar. Precipitei-me para a janela para averiguar e, de facto, lá estava o Sol. Encontrava-se na posição errada no céu, estando demasiado baixo, e não parecia estar tão próximo como deveria, mas tratava-se, sem dúvida, do Sol. As nuvens cingiam o horizonte, mas, no meio, era visível uma mancha azul. Permaneci junto da janela enquanto consegui, receando que, se me fosse embora, o azul voltasse a desaparecer.

Um magnífico raio de Sol tocou-me na pele fazendo-a tomar um leve brilho, como se tivesse posto brilhantes pequeníssimos por toda a extensão de pele em que o Sol tocava. Olhei para o brilho um pouco admirada, até algum tempo atrás eu não tinha aquele efeito ao Sol, mas isto era apenas a minha evolução genética. Considerei normal e fui-me vestir.

Quando desci encontrei a casa vazia, pelos vistos o meu pai não tinha saído e muito provavelmente ainda estava a dormir. Então reparei num novo recado na porta do frigorífico.

Bells,

Como vês hoje está Sol, o que significa que não vou poder andar por aí tão à vontade como costumo.

Espero que tenhas um óptimo dia na praia, não te esqueças de ter cuidado com a luz na tua pele, lembra-te que ninguém deve aperceber-se do efeito que tens ao sol.

Beijos com muito amor,

Pai.

P.S: Esqueci-me de escrever mais acima, o Angel vai fazer-nos uma visita este fim-de-semana. Ele vem sozinho.

Sorri, o tio Angel vinha a Forks? Isso era um máximo! Esta pequena notícia alegrou-me mais um pouco.

Os Armazéns Olímpicos Newton ficavam precisamente na zona Norte da cidade. Eu já vira a loja, mas nunca lá entrara – já que não tinha grande necessidade de quaisquer provisões necessárias à permanência ao ar livre por um período de tempo alargado. No parque de estacionamento, reconheci o Suburban de Mike e o Sentra de Tyler. Ao estacionar ao lado dos veículos de ambos, vi o grupo que se encontrava em frente do Suburban. Eric estava presente, juntamente com dois outros rapazes com quem eu tinha aulas; estava bastante certa de que os seus nomes eram Ben e Conner. Jess também lá estava, ladeada por Angela e Lauren. Três outras raparigas encontravam-se na sua companhia, incluindo aquela sobre a qual me lembrava de ter caído na aula de Educação Física na sexta-feira. Esta lançou-me um olhar de desagrado quando saí da pick-up e sussurrou algo ao ouvido de Lauren. Lauren sacudiu o seu cabelo semelhante a barbas de milho e olhou-me com desdém. Ter-lhe-ia respondido do mesmo modo, mas a BOA EDUCAÇÃO impedia-me de tal acto.

Seria, então, um daqueles dias.

Pelo menos, Mike e Angela estavam contentes por me ver.

- Vieste! – Exclamou, encantado. Sorri-lhe ajeitando a minha camisola de manga comprida para me tapar os pulsos. – E eu bem disse que o tempo hoje estaria soalheiro, não disse?

- Eu disse-te que vinha. – Relembrei-lhe.

- Estamos só à espera do Lee e da Samantha… a não ser que tenhas convidado alguém. – Acrescentou Mike, olhando-me com visível desconfiança. Tive mesmo vontade de revirar os olhos.

- Não convidei. – Menti sem dificuldade, esperando que a minha mentira não fosse denunciada, mas também desejando que se desse um milagre e Edward aparecesse.

Mike parecia satisfeito. E definitivamente mais aliviado.

- Vais no meu carro? Ou isso ou no monovolume da mãe do Lee.

- Claro. – Respondi pensando na minha rica carrinha.

Ele sorriu com um ar de felicidade. Mike era tão fácil de contentar.

- Podes sentar-te no lugar do pendura. – Prometeu ele.

Claro, porque não? Pensou a minha consciência com MUITO sarcasmo. Se tivermos um acidente e eu, de facto, for no lugar do morto é muito provável que vocês fiquem todos passadinhos dos carretes ao ver-me sair totalmente inteira e sem nenhum arranhão do carro.

Ocultei o meu enfado. Não era fácil contentar Mike e Jessica ao mesmo tempo. Conseguia ver Jessica fitar-nos agora com um ar zangado. Ora aqui estava aquele velho ditado: Não se pode agradar a Gregos e a Troianos.

No entanto, os números jogaram a meu favor (e não tive que usar magia!). Lee levou mais duas pessoas e, de repente, todos os lugares se tornaram necessários. Consegui colocar Jess à força entre mim e Mike no banco dianteiro do Suburban. Mike poderia ter encarado a situação com maior graciosidade, mas, pelo menos, Jess parecia tranquilizada. Eu devia realmente amaldiçoá-lo por ser tão cego!

La Push ficava apenas a quinze quilómetros de Forks, com a estrada ladeada por densas e deslumbrantes florestas verdes durante a maior parte do percurso e o largo rio Quillayute a serpentear debaixo daquela em dois locais. Abríramos os vidros novamente – o Suburban ficava um pouco claustrofóbico com nove pessoas no seu interior – e eu tentei absorver o máximo de luz possível. Utilizando os meus cabelos para evitar que os outros vissem o leve brilho da minha pele.

Já frequentara muitas vezes as praias nos arredores de La Push durante os Verões que passara com Charlie em Forks, pelo que a meia-lua com um quilómetro e meio de comprimento da First Beach não me era estranha. Caracterizava-a uma beleza de cortar a respiração. A água tinha uma tonalidade cinzento-escura, mesmo à luz do Sol, coroada de branco e elevando-se sobre a praia cinzenta e rochosa. Ilhas erguiam-se das águas do porto de aço com íngremes escarpas, culminando em cumes desnivelados, coroadas de abetos austeros e altaneiros. A praia tinha apenas uma estreita faixa de areia na orla da água, após a qual se transformava em milhões de grandes pedras polidas, que, à distância, pareciam uniformemente cinzentas, mas, ao perto, se revestiam de vários tons: terracota, verde-mar, alfazema, cinzento-azulado, dourado-opalescente. A linha de maré estava juncada de enormes árvores flutuantes, que as ondas salgadas haviam descolorado e às quais haviam conferido uma tonalidade branco-osso, estando algumas amontoadas junto à orla da floresta e outras jazendo solitárias, fora do alcance das ondas.

Um vento acelerado soprava das ondas, fresco e salgado. Pelicanos flutuavam na ondulação, enquanto gaivotas e uma águia solitária voavam em círculos acima deles. As nuvens cingiam o céu, ameaçando atacar a qualquer momento, mas, por enquanto, o Sol ainda brilhava com intensidade no seu halo de céu azul.

Inspirei fundo o ar salgado da praia e dei por mim a sentir-me como se houvesse um perigo algures, foi o estranho sentimento de estar a ser observada que me fez arrepiar-me. Olhei à minha volta procurando algo ameaçador à segurança de qualquer um do meu grupo, mas não encontrei nada e então continuei a andar.

Caminhámos cautelosamente até à praia, com Mike a indicar o caminho em direcção a um recinto formado por toros flutuantes que já havia sido manifestamente utilizado para a realização de festas como a nossa. Havia um círculo para fogueira já a postos, repleto de cinzas negras. Eric e o rapaz que eu pensava chamar-se Bem recolheram ramos quebrados de madeira flutuante a partir dos montes mais secos que se encontravam junto da orla da floresta e depressa se ergueu uma construção semelhante às tendas cónicas dos peles-vermelhas sobre as velhas cinzas.

- Já viste uma fogueira de madeira flutuante? – Perguntou-me Mike.

Eu estava sentada num dos bancos cor de osso; as restantes raparigas agruparam-se, bisbilhotando animadamente, tanto à minha direita, como à minha esquerda. Mike ajoelhou-se junto da fogueira, ateando alguns dos paus mais pequenos com um isqueiro.

- Não. – Disse eu enquanto ele encostava cuidadosamente o ramo em chamas ao cone formado pela madeira.

- Então, vais gostar disto; observa as cores.

Ateou outro pequeno ramo e colocou-o ao lado do primeiro. As chamas começaram a consumir rapidamente a madeira seca.

- Está azul! – Exclamei com espanto.

- É um efeito provocado pelo sal. É bonito, não é?

Ateou mais um galho, colocou-o num ponto ao qual o fogo ainda não alastrara e, em seguida, foi sentar-se a meu lado. Felizmente, Jess encontrava-se do outro lado. Virou-se para ele e exigiu a sua atenção. Eu observei as estranhas chamas azuis e verdes a crepitarem em direcção ao céu. Para me distrair, entoei em voz baixa um feitiço (que era mais um canto que outra coisa) que fez o fogo dançar perante as palavras.

Após uma hora de conversa, alguns dos rapazes quiseram fazer uma caminhada até às poças residuais da maré que ficavam nas proximidades. Era um dilema. Por um lado, eu adorava as poças residuais da maré. Fascinavam-me desde pequena; eram uma das raras coisas por que eu ansiava quando tinha de ir para Forks. Por outro lado, também caíra nelas imensas vezes, o que não é nada de mais quando se tem sete anos e se está acompanhada pelo pai. Isto fez-me recordar o pedido de Edward – que eu não caísse ao mar.

Foi Lauren quem tomo a decisão por mim. Ela não queria caminhar e os sapatos que calçara eram, sem dúvida, inadequados para tal. A maioria das raparigas, além de Angela e Jessica, decidiu ficar também na praia. Eu esperei até que Tyler e Eric se comprometessem a permanecer com elas para me levantar discretamente e me juntar ao grupo que era a favor da caminhada. Mike lançou-me um enorme sorriso ao ver que eu ia.

A caminhada não foi demasiado longa, ainda que eu, nos bosques, detestasse perder o céu de vista. A claridade verde da floresta tornava-se estranhamente incompatível com o riso adolescente, sendo demasiado tenebrosa e ominosa para estar de harmonia com os alegres gracejos que me rodeavam. Tinha de calcular com muito cuidado cada passo que dava, evitando as raízes no plano inferior e os ramos no plano superior, e depressa fiquei para trás. Acabei por conseguir ultrapassar os confins esmeraldinos da floresta e voltei a deparar com a praia rochosa. A maré estava baixa e um rio de maré corria, passando por nós e dirigindo-se para o mar. Ao longo das suas margens juncadas de seixos, poças com pouca profundidade, que nunca secavam por completo, pululavam de vida.

Eu tinha uma extrema cautela em não me debruçar demasiado sobre os pequenos lagos oceânicos. Os outros eram destemidos, saltando por cima das rochas, empoleirando-se precariamente à beira das mesmas. Encontrei uma rocha com um aspecto estável na orla de uma das maiores poças e ali me sentei cautelosamente, enfeitiçada pelo aquário natural que se encontrava debaixo de mim. Os ramalhetes de anémonas brilhantes ondulavam sem cessar na corrente invisível; conchas retorcidas agitavam-se ao longo das orlas, ocultando os caranguejos; estrelas-do-mar permaneciam estaticamente presas às rochas e umas às outras, enquanto uma pequena enguia negra com listas de corrida brancas serpenteava por entre as algas de um verde-vivo, esperando que o mar regressasse. Estava completamente absorta, à excepção de um pequeno recanto da minha mente que se perguntava o que estaria Edward a fazer naquele momento e tentava imaginar o que estaria ele a dizer se estivesse ali comigo. Estaria ele a pensar em mim? Estaria ele a fazer-se as mesmas perguntas que eu me fazia neste momento? Eu começava a compreender as ditas confusões da adolescência.

Por fim, os rapazes ficaram com fome e eu levantei-me contrafeita para segui-los no caminho de regresso. Desta vez, esforcei-me por acompanhá-los ao longo dos bosques, pelo que acabei por cair algumas vezes. Fiquei com alguns arranhões superficiais nas palmas das mãos e as minhas calaças de ganga ficaram manchadas de verde na zona dos joelhos, mas podia ter sido pior.

Quando regressámos à First Beach, o grupo que havíamos deixado multiplicara-se. Senti novamente aquela sensação de estar em perigo, instinto que apenas entrava em acção muito raramente (mas mesmo muito raramente). Ao aproximarmo-nos, conseguimos ver os brilhantes cabelos negros lisos e a pele acobreada dos recém-chegados, adolescentes da reserva que foram conviver um pouco. A comida já circulava e os rapazes apressaram-se a reivindicar um quinhão, enquanto Eric nos apresentava à medida que cada um de nós entrava no círculo de madeira flutuante. Eu e Angela fomos as últimas a chegar e, quando Eric disse os nossos nomes, reparei que um rapaz que aparentava ser o mais novo, que se sentava nas pedras perto da fogueira, me olhou com interesse. Sentei-me ao lado de Angela, e Mike levou-nos sandes, assim como uma grande variedade de refrigerantes para que escolhêssemos, enquanto um dos rapazes, que parecia ser o mais velho dos visitantes, proferia rapidamente os nomes dos restantes sete que se encontravam com ele. Consegui apenas perceber que uma das raparigas também se chamava Jessica e que o rapaz que reparara em mim se chamava Jacob. Sem perceber porque, algo me fez comichão no nariz e comecei a espirrar incontrolavelmente, conseguindo apenas parar depois de proferir mentalmente um feitiço que me tirasse a sensibilidade do nariz por breves momentos.

Estar sentada junto de Angela era relaxante; era o género de pessoa cuja companhia era repousante – não sentia necessidade de preencher cada momento de silêncio com tagarelice. Deixou-me à vontade para reflectir, sem perturbações, enquanto comíamos e eu reflectia sobre a forma como o tempo parecia fluir incoerentemente em Forks, passando, por vezes, de modo confuso com imagens isoladas a destacarem-se mais nítidas do que outras. Outras vezes, cada segundo era significativo, ficava gravado na minha mente. Eu sabia exactamente o que originava a diferença e isso incomodava-me. Mas não me podia queixar, Forks estava a mostrar-se como um refúgio e eu estaria certa se pensasse que me sentiria desprotegida sem a vegetação caso voltasse para Phoenix.

Durante o almoço, as nuvens começaram a avançar, movimentando-se furtivamente pelo céu azul, precipitando-se por momentos diante do Sol, projectando extensas sombras sobre a praia e enegrecendo as ondas. Ao acabarem de comer, as pessoas começaram a afastar-se em grupos de duas e três. Algumas caminharam até à beira das ondas, tentando pular de rocha em rocha através da superfície agitada. Outras reuniram voluntários para uma segunda expedição às poças residuais da maré. Mike – com Jessica a segui-lo como uma sombra – encaminhou-se para a única loja da aldeia. Alguns dos miúdos indígenas acompanharam-nos; outros alinharam na caminhada. Quando já todos se haviam dispersado, eu estava sentada, sozinha, no meu toro flutuante, enquanto Lauren e Tyler se entretinham com o leitor de CD que alguém se lembrara de trazer, e três adolescentes da reserva estavam empoleirados em torno do círculo, incluindo o rapaz chamado Jacob e o mais velho que desempenhara o papel de porta-voz… e que por algum motivo continuava a lançar-me olhares pouco indiscretos e visivelmente curiosos.

Alguns momentos depois de Angela ter partido com o grupo que iria realizar a caminhada, Jacob avançou vagarosamente e ocupou o lugar dela a meu lado. Senti um estranho sentimento que me deixou ligeiramente curiosa, parecia que o rapaz irradiava algum tipo de magia, nada que fizesse o monstro em mim desejá-la mas que estava lá definitivamente. Tinha aparência de um rapaz muito mais novo, mas eu fazia as minhas apostas de como a idade dele estava próxima dos meus “quase” dezoito anos. Tinha cabelos negros longos e brilhantes, presos com um elástico na nuca. A sua pele era linda, sedosa e de cor castanho-avermelhada; os olhos eram escuros, profundamente encovados acima das elevadas superfícies planas das maçãs do rosto. Tinha ainda apenas um resquício de pueril rotundidade em torno do queixo. No conjunto, um rosto muito bonito. E eu estava com a estranha sensação de que já vira aquele rosto, algures nos desenhos das visões de Ana, ela costumava desenhar tudo o que as suas visões lhe mostravam, dizia que era um modo de se recordar mais facilmente daquilo que vira. No entanto e tirando-me dos meus pensamentos, a minha opinião positiva a respeito da sua aparência foi afectada pelas primeiras palavras que ele proferiu.

- És a Isabella Swan, não és?

Era como reviver o primeiro dia de aulas. Mas desta vez, com o travo amargo de ter uma cara que me parecia familiar.

- Bella. – Disse, suspirando.

- Eu sou o Jacob Black. – Declarou, estendendo a mão num gesto amigável. Jacob Black… Hum, este nome não me é nada estranho. – Compraste a pick-up do meu pai.

- Ah! – Exclamei, em parte aliviada, apertando-lhe a suave mão. Tinha ainda a sensação de que aquele nome já me fora proferido muito antes de o conhecer propriamente. – És o filho do Billy. Provavelmente devia lembrar-me de ti.

- Não, sou o mais novo da família. Lembrar-te-ias das minhas irmãs mais velhas.

Ah ah! Dessas eu sou capaz de me lembrar.

- A Rachel e a Rebecca. – Recordei-me de repente. Charlie e Billy haviam-nos juntado muitas vezes durante as minhas estadas em Forks, de modo a manterem-nos entretidas enquanto eles pescavam. Éramos todas demasiado tímidas para fazer com que a nossa amizade evoluísse de forma significativa. Como é evidente, quando completei onze anos, já fizera birras suficientes para pôr termo às pescarias, embora eu não tivesse, de facto, sido uma criança muito dada a birras, essa era mais Ana.

- Elas estão aqui?

Examinei as raparigas que se encontravam à beira do mar, perguntando-me se agora as reconheceria.

- Não. – Disse Jacob, abanando a cabeça. – A Rachel obteve uma bolsa de estudo na Universidade do Estado de Washington e a Rebecca casou com um surfista samoano. Agora, vive no Havai.

 - Está casada. Ena. - Eu estava aturdida. As gémeas eram pouco mais de um ano mais velhas que eu.

- Então, que tal te parece a pick-up? – Perguntou ele.

- Adoro-a, funciona às mil maravilhas.

- Pois, mas é mesmo lenta. – Riu-se. Nisso eu tinha que concordar, se eu tivesse possibilidades, trocaria a velha Chevy por um belo Audi A4, mas facto era que eu adorava aquela carrinha. – Fiquei tão aliviado quando o Charlie a comprou. O meu pai não deixava que eu me dedicasse à construção de outro carro, já que tínhamos um veículo em perfeitas condições ali mesmo.

- Não é assim tão lenta. – Protestei.

- Já tentaste ultrapassar os cem quilómetros por hora?

- Não. – Reconheci.

- Ainda bem. Não tentes.

Esboçou um sorriso rasgado. Não consegui evitar retribuir-lhe o sorriso.

- Sai-se muito bem numa colisão. – Mencionei em defesa da minha pick-up.

- Acho que nem um carro de combate conseguiria dar cabo daquele velho monstro. – Concordou ele com outra gargalhada.

- Com que então constróis carros? – Perguntei, impressionada.

- Quando tenho tempo livre e peças. Por acaso não sabes onde posso arranjar um cilindro principal para um Volkswagen Rabbit de 1986? – Acrescentou em tom de graça.

Ele tinha uma voz agradável, rouca.

- Sinto muito. – Ri. – Não vi nenhum ultimamente, mas ficarei atenta.

Como se eu soubesse do que se tratava. Afinal de contas quem queria eu enganar? Não percebia nada que envolvesse o interior de um carro. Mas surpreendi-me ao aperceber-me que o meu cérebro recolhia pequenas peças para conseguir completar o puzzle do sentimento de familiaridade ao rosto de Jacob. Era muito fácil conversar com ele.

Exibiu um sorriso fulgurante, olhando-me com apreço, de uma forma que eu estava a aprender a reconhecer. Foi então que a última peça caiu no sítio. Foi tão fácil como conversar com ele de me lembrar do que a minha irmã me dissera uma vez a respeito dos homens que ela conseguia ver no nosso futuro. O homem dela como ela o descrevia seria alguém estupendo.

“ Tu vais adorá-lo, Bella! Ele há-de ser lindo, os seus olhos tão escuros como a noite, a sua pele tão suave como seda, cabelos negros como as asas de um corvo. O seu sorriso há-de ser tão alegre que hás-de sentir-te contagiada! Ele há-de ser tão divertido que vai ser difícil alguém não gostar dele, Bells. Tu vais ver! ” As palavras de Ana passaram-me o pensamento e eu percebi logo que Jacob era o homem que Ana vira no seu futuro. O seu destinado.

No entanto, não fui a única a notar no apreço que o seu olhar sustentava.

- Conheces a Bella, Jacob? – Perguntou Lauren, naquilo que eu imaginava ser um tom insolente, do lado oposto da fogueira. Cobra venenosa.

- De certa forma, conhecemo-nos desde que eu nasci. – Riu-se, sorrindo-me novamente.

- Que giro!

O seu tom de voz não transmitia a ideia de franqueza e os seus olhos claros, semelhantes aos dos peixes, semicerraram-se. Espero que mordas a língua e morras com o teu veneno! Gritou a minha consciência.

- Bella! – Exclamou ela novamente, observando o meu rosto cuidadosamente. Não vem aí coisa boa. – Estava mesmo agora a comentar com o Tyler que era uma pena o facto de nenhum dos Cullen poder ter vindo hoje. Ninguém se lembrou de convidá-los?

O seu ar de preocupação era pouco convincente. O que me deixou ainda mais enfurecida. Como é que ela, aquela cobra venenosa, se atrevia a falar dos Cullen naquele tom? Senti um rugido formar-se no meu peito, mas dei-lhe pouca importância ao pensar nos muitos feitiços que a fariam engolir as suas palavras.

Bella, acalma-te! Sugeriu a minha consciência. Não deves fazê-lo.

Como não? Desta vez foi a voz do “monstro”, este estava estranhamente do meu lado, enfurecido com o mesmo motivo que eu. Antes, os Cullen eram vistos por si como a presa; agora, eles eram alguém a quem ele se sentia obrigado a proteger. Tu ouviste como ela falou deles! Ela não tem qualquer direito a falar dos Cullen com aquela boca suja e venenosa!

Se eu pudesse, teria aplaudido o que o lado negro da minha mente tinha “dito”, mas fazê-lo em frente desta gente toda iria fazer-me ganhar a fama de louca. E disso eu não precisava.

- Referes-te à família do Dr. Carlisle Cullen? – Interrogou o rapaz alto, o mais velho, aquele que me tinha estado a lançar olhares estranhos, antes de eu poder responder (da forma correcta, da forma diplomática), o que provocou bastante irritação em Lauren. Na verdade, ele estava mais próximo de ser um homem do que um rapaz e a sua voz era extremamente grave.

- Sim, conhece-los? – Perguntou ela de modo condescendente, virando-se parcialmente na direcção dele. O modo como ela ficou era perfeito para lhe lançar um feitiço que a fizesse cair de boca nas pedras. Não! Bella, pensa noutra coisa, não cedas à tentação.

- Os Cullen não vêm aqui. – Afirmou ele num tom que encerrava o assunto, ignorando a pergunta dela.

Tyler, tentando reconquistar a atenção de Lauren, perguntou-lhe a sua opinião a respeito de um CD que ela segurava na mão. Ela estava distraída.

Eu olhava fixamente para o rapaz de voz grave, tendo sido apanhada de surpresa, mas ele lançava o olhar na direcção da floresta sombria atrás de nós. Dissera que os Cullen não iam ali, mas o seu tom de voz insinuara algo mais – que a sua presença não era permitida; estavam proibidos de frequentar aquele local. O seu comportamento deixou em mim uma estranha impressão e tentei ignorá-la sem sucesso.

Tinha duas opções, ou deixava o comentário sobre os Cullen ser esquecido, ou então iria arrancar a verdade de um dos rapazes fosse de que modo fosse.

- Então, Forks já está a dar contigo em doida? – Perguntou Jacob, interrompendo a minha meditação.

- Oh, eu diria que isso é ser comedido nas palavras. – Afirmei, fazendo um esgar; esboçou um sorriso largo, demonstrando compreensão.

Ainda com o breve comentário acerca dos Cullen a revolver-me o pensamento, tive uma inspiração súbita. Era um plano idiota e sabia perfeitamente que se Ana soubesse, me iria matar, mas não tinha outro melhor. Esperava que o jovem Jacob ainda fosse inexperiente no que se referia ao relacionamento com raparigas, de modo que não se apercebesse das intenções das minhas tentativas de namoriscá-lo, as quais estavam votadas a ser dignas de pena. Que Ana me perdoasse em todos os sentidos possíveis; o primeiro, por estar a fazer-me ao “homem dela”, e o segundo, por não ter conseguido guardar na memória nenhuma das suas tácticas para conquistar os homens. Que, também, Edward me perdoasse pelo que eu estava prestes a fazer.

- Queres caminhar comigo pela praia? – Perguntei, tentando imitar aquela forma que Edward tinha de lançar o olhar de debaixo das suas pestanas. Sabia que estava longe de conseguir o mesmo efeito, mas Jacob levantou-se de um salto e de bastante bom grado.

Enquanto caminhávamos para Norte ao longo das pedras com diferentes matizes em direcção ao paredão de madeira flutuante, as nuvens cerraram finalmente fileiras no céu, desencadeando o escurecimento do mar e a diminuição da temperatura. Enterrei bem as mãos nos bolsos do meu casaco, tentando ignorar a sensação de perigo que me envolvia e a estúpida sensação de que as nuvens me transmitiam um presságio dos maus.

- Então, que idade tens? Dezassete? – Perguntei, tentando não parecer uma palerma ao pestanejar como vira Ana fazer várias vezes.

- Acabei de completar dezasseis. – Confessou ele, sentindo-se lisonjeado.

Se não fosse por eu estar ciente de que tinha uma missão a cumprir, eu teria ficado realmente chocada com o facto de Ana estar destinada a ficar com um rapaz de dezasseis anos!

- A sério?

O meu rosto estava repleto de surpresa. Mais novo que nós as duas… Quem diria.

- Eu diria que eras mais velho.

- Sou alto para a idade que tenho. – Explicou.

- Vais a Forks com muita frequência? – Perguntei maliciosamente, como se ansiasse por uma resposta afirmativa. Parecia uma idiota aos meus próprios ouvidos, não admirava que Ana dissesse que eu não tinha prática nenhuma no que tocava aos rapazes. Receava que ele me virasse as costas, manifestando repugnância, e me acusasse de dolo, mas continuava a aparentar sentir-se lisonjeado.

- Nem por isso. – Confessou, franzindo o sobrolho. Hum… A Ana iria gostar de saber       que para ver o “namorado” teria que vir à praia, azar o dela que aqui o Sol não era o forte das praias. – Mas, quando terminar o meu carro, passo a ir lá sempre que quiser, depois de tirar a carta de condução. – Corrigiu. Ele continuava a dar-me razão no que dizia respeito a Ana.

- Quem era aquele outro rapaz com quem a Lauren estava a conversar? Parecia-me um pouco velho de mais para andar connosco.

- É o Sam, tem dezanove anos. – Informou-me ele.

- O que é que ele estava a dizer acerca da família do médico? – Perguntei inocentemente. Desejando intensamente que eu não fosse obrigada a ter que lançar um feitiço a Jacob para saber da verdade.

- Os Cullen? Ah, eles não podem entrar na reserva.

Desviou o olhar, na direcção de James Island, ao confirmar aquilo que eu pensara ter ouvido nas palavras de Sam. Parecia que não teria que usar magia para nada.

- Porque não?

Voltou a relancear o olhar na minha direcção, mordendo o lábio. Talvez o meu anterior pensamento estivesse errado.

- Ups. Não posso dizer nada a esse respeito.

- Oh, eu não conto a ninguém, estou apenas curiosa.

Muito curiosa. Tentei esboçar um sorriso cativante, perguntando-me se estaria a exagerar e se teria mesmo que usar magia.

No entanto, ele retribuiu o sorriso, parecendo cativado. Depois, levantou uma sobrancelha e a sua voz ficou ainda mais rouca do que antes.

- Gostas de histórias assustadoras? – Perguntou ele de forma ominosa.

Sorri de forma provocadora. Ele só podia estar a gozar com a minha cara. Histórias assustadoras? Por Deus, eu era uma daquelas criaturas saídas dos filmes de terror e ele tencionava assustar-me com uma história desse género? Por amor de Deus,

- Adoro-as! – Exclamei fingindo entusiasmo, esforçando-me por lhe lançar um olhar ardente.

Jacob deambulou até uma árvore flutuante cujas raízes se projectavam como as patas adelgaçadas de uma enorme aranha sem cor. Empoleirou-se sem dificuldade numa das raízes retorcidas, enquanto eu me sentei, abaixo dele, no tronco da árvore. Ele fixava o olhar nas rochas, com um sorriso a aflorar aos seus lábios grossos. Eu conseguia ver que ele iria esforçar-se para que aquilo valesse a pena. Concentrei-me para evitar que o interesse vital que eu sentia se reflectisse nos meus olhos.

- Conheces alguma das nossas histórias antigas, a respeito das nossas origens – dos Quileutes, quero eu dizer? – Principiou.

- Nem por isso. – Confessei.

- Bem, existem imensas lendas, das quais algumas remontam precisamente ao Dilúvio; supostamente, os antigos Quileutes amarraram as suas canoas às copas das árvores mais altas da montanha para sobreviverem como Noé e a arca. – Ele sorriu, de modo a mostrar-me quão pouca fé tinha nestas histórias. Sim, isto não podia ficar mais estúpido! Uma bruxa a ouvir uma história de um povo em que alguns acreditam que tiveram uma salvação tão miraculosa como aquela. – Segundo outra lenda, nós descendemos de lobos, e estes são ainda nossos irmãos. A lei tribal proíbe que sejam mortos. – Isto está a ficar interessante.

- Depois, existem as histórias acerca dos frios. – Afirmou, tendo o tom da sua voz baixado um pouco.

- Dos frios? – Perguntei, estando agora sinceramente intrigada. O que eram os frios?

- Sim. Existem histórias acerca dos frios que são tão antigas como as lendas sobre os lobos, havendo também algumas muito mais recentes. De acordo com a lenda, o meu próprio bisavô conhecia alguns deles. Foi ele quem firmou o tratado que os mantinha longe das nossas terras. – Disse ele, revirando os olhos.

- O teu bisavô? – Incitei-o a continuar. Eu precisava de saber o que é que aquelas lendas tinham a ver com os Cullen.

- Ele era um ancião da tribo, tal como o meu pai. Sabes, os frios são os inimigos naturais do lobo. Bem, não propriamente do lobo, mas dos lobos que se transformam em homens, como os nossos antepassados. Poder-se-ia chamar-lhes lobisomens.

Isto estava-se a tornar em vez de interessante em loucos! Uma bruxa a ouvir uma história sobre lobisomens? Isto era a piada do ano.

- Os lobisomens têm inimigos? – Perguntei. Sentindo-me estúpida por estar sequer a considerar as palavras do rapaz. Lobisomens não deveriam existir. Mas quem era eu para o negar? Eu própria era uma bruxa!

- Apenas um.

Fitava-o com um ar sério, esperando disfarçar a minha impaciência de admiração.

- Portanto, como vês, – prosseguiu Jacob -, os frios são, por tradição, os nossos inimigos, mas o bando que chegou ao nosso território no tempo do meu bisavô era diferente. Não caçavam como os outros da sua espécie o faziam – não deviam constituir uma ameaça à tribo. Assim, o meu bisavô decretou uma trégua com eles. Se prometessem manter-se afastados das nossas terras, ele não os denunciaria aos caras-pálidas.

Ele piscou-me o olho. Neste momento compreendi que estava a acreditar na sua história, mais do que devia.

- Se não constituíam uma ameaça, porque é que…? – Tentei compreender, esforçando-me por não deixar que ele percebesse quão a sério eu estava a levar a sua história de fantasmas.

- Existe sempre perigo para os humanos ao estarem perto dos frios, mesmo que sejam civilizados como este clã era. Nunca se sabe quando é que eles podem ficar demasiado famintos para conseguirem resistir.

Humanos? Eles eram o maior perigo para os humanos?

Introduziu deliberadamente um carregado laivo de ameaça no seu tom de voz.

- O que queres dizer com “civilizados”?

- Eles alegavam não caçar humanos. Supostamente eram, de alguma forma, capazes de atacar animais como alternativa.

Caçar humanos? Eu não ouvi mal. Ele está mesmo a dizer que os frios caçavam humanos! Será que o pai estava informado disto? Do conhecimento dos Quileutes?

Tentei manter um tom de voz desinteressado enquanto entrava em pânico interiormente.

- Então, como é que isso encaixa nos Cullen? Eles são como os frios que o teu bisavô conheceu?

- Não. – Deteve-se teatralmente, fazendo com que o meu coração acelerasse com o medo. Se ele queria dizer que eram outros, então eu teria que avisar o meu pai sobre o excesso de conhecimento que esta tribo tinha era demasiado perigoso. – São os mesmos.

Os mesmos? Ele deve ter pensado que a expressão estampada no meu rosto se devia ao temor inspirado pela sua história. Sorriu, satisfeito, e prosseguiu.

- Agora há mais, uma nova fêmea e um novo macho, mas os restantes são os mesmos. No tempo do meu bisavô, já tinham conhecimento da existência do líder, o Carlisle. Ele estivera aqui e partira antes de a vossa gente ter sequer aqui chegado.

Ele tentava reprimir um sorriso. Já em mim, o medo tinha sido substituído pelo espanto.

- E o que são eles? – Perguntei por fim. – O que são os frios?

Sorriu misteriosamente.

- Bebedores de sangue. – Retorquiu num tom de voz arrepiante. – A tua gente chama-lhes vampiros.

Fixei o olhar na encrespada ondulação depois de ele ter respondido, não sabendo ao certo o que o meu rosto expressava. Nem sequer sabia o que devia pensar.

- Estás com pele-de-galinha. – Riu-se com satisfação.

- És um bom contador de histórias. – Elogiei-o, olhando ainda fixamente para as ondas.

- Mas é uma coisa de loucos, não é? Não admira que o meu pai não queira que nós falemos disto a ninguém.

Ainda não conseguia controlar suficientemente a minha expressão facial para olhar para ele.

- Não te preocupes, eu não te denuncio.

- Suponho que apenas violei o tratado. – Riu-se. Não conseguia ver onde é que havia humor nisto. Mas também, não era eu que era uma humana despreocupada.

- Este segredo irá comigo para o túmulo. – Prometi e, em seguida, senti um calafrio.

- Agora a sério, não comentes nada com o Charlie. Ele ficou bastante enfurecido quando soube que alguns de nós não iam ao hospital desde que o Dr. Cullen começou a trabalhar lá.

- Não comentarei, claro que não. – Estás a brincar? O meu pai tem que saber disto!

- Então, pensas que nós somos uma súcia de indígenas supersticiosos ou quê? – Perguntou ele num tom jocoso, mas com um laivo de preocupação.

Eu ainda não desviara o olhar do mar.

Assim, voltei-me e sorri-lhe com a maior normalidade possível.

- Não, mas penso que tens muito jeito para contar histórias assustadoras. Ainda estou com pele-de-galinha, vês?

Mostrei o meu braço.

- Porreiro! – Disse ele, sorrindo.

Então, o ruído das rochas da praia a baterem umas nas outras alertou-nos para o facto de que alguém se aproximava. As nossas cabeças viraram-se rapidamente, ao mesmo tempo, e avistámos, então, Mike e Jessica a cerca de cinquenta metros de distância, caminhando na nossa direcção.

- Aí estás tu, Bella! – Exclamou Mike com alívio, agitando o braço sobre a sua cabeça.

- É o teu namorado? – Perguntou-me Jacob, alertado pelo laivo de ciúme patente na voz de Mike.

Fiquei admirada por tal ser tão óbvio. E irritada por todos chegarem àquela irritante conclusão!

- Não, de modo algum. – Sussurrei entre dentes.

Estava tremendamente grata a Jacob e ansiosa por agradar-lhe o mais possível como agradecimento. Piquei-lhe o olho, voltando-me cuidadosamente de costas para Mike para o fazer. Ele sorriu, enlevado pelo meu inepto galanteio. Sorri com o pensamento de que ele seria um óptimo cunhado.

- Então, quando eu tirar a carta de condução… - Principiou.

- Devias ir visitar-me a Forks. Podíamos passar algum tempo juntos um dia destes. E talvez com muita sorte, venhas a conhecer a minha irmã!

Senti-me culpada ao proferir tais palavras, tendo consciência de que usara Jacob, mas simpatizei, de facto, com ele. E por isso acrescentei as últimas palavras. Ele, pelo menos, seria recompensado pelos serviços a mim prestados. E ele era uma pessoa de quem era fácil ficar amigo.

Mike chegara junto de nós, encontrando-se Jessica alguns passos atrás. Eu conseguia ver os olhos dele a examinarem Jacob e mostrando satisfação perante a sua aparência mais jovial.

- Onde tens andado? – Perguntou, ainda que a resposta estivesse mesmo diante dele.

- Jacob estava apenas a contar-me algumas histórias nativas. – Mencionei. – Foi realmente interessante.

Lancei um sorriso caloroso a Jacob e ele retribuiu-mo com um sorriso rasgado.

- Bem. – Mike deteve-se, reavaliando cuidadosamente a situação ao observar a camaradagem que existia entre nós. – Estamos a arrumar as coisas, parece que vai chover não tarda nada.

- Muito bem. – Concordei, levantando-me de um salto. Subitamente ansiosa por sair das terras dos Quileutes. – Eu vou já.

- Foi bom ver-te novamente. – Disse Jacob, tendo eu percebido que ele estava a provocar Mike um pouco. Revirei os olhos fazendo-o sorrir ainda mais.

- Foi, de facto, muito bom. Da próxima vez que o Charlie vier visitar o Billy, eu também virei. – Prometi. Desejando que a sorte estivesse do meu lado e que dessa vez, Ana viesse comigo.

O seu sorriso rasgou-se-lhe no rosto.

- Isso seria porreiro.

- E obrigada. – Acrescentei com um ar sério.

Coloquei o capuz enquanto caminhávamos pesadamente sobre as rochas em direcção ao parque de estacionamento. Começavam a cair algumas gotas, deixando manchas negras nas pedras em que pousavam. Quando chegámos junto do Suburban, os outros já estavam a colocar tudo novamente dentro do carro. Entrei para o banco de trás, ao lado de Angela e Tyler, comunicando que já tivera a minha oportunidade para viajar no lugar do pendura. Angela limitava-se a olhar, pelo vidro, para a tempestade que se avolumava e Lauren contorcia-se no seu lugar central para chamar a atenção de Tyler, pelo que eu podia simplesmente recostar a cabeça no banco, fechar os olhos e esforçar-me arduamente por não pensar. Mas da minha mente não saia a história que Jacob me contara e eu sabia que esta noite Charlie, o Tio Angel e eu teríamos uma longa conversa.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Twilight - a Magia do Amor" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.