Ele tem 18 anos escrita por Hanna Martins


Capítulo 8
Garotos crescem


Notas iniciais do capítulo

Desculpem pela demora, com o final de "Boa Sorte, Katniss", precisei me dedicar mais a ela para escrever os capítulos finais, mas agora estou de volta com capítulo novo ;)



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Gale os olhava em silêncio. Seu olhar e seu silêncio diziam muito. Ele não era alguém que costumava exteriorizar sua raiva. Não. Ele era alguém que ficava com a superfície aparentemente calma, enquanto por dentro estava preste a explodir. Seus olhos cinzentos estavam escuros. Obscuros como um dia nebuloso. Podia ver os sentimentos que passavam por eles. E Gale não estava apenas com raiva. Havia magoa naquele olhar. Havia tristeza, e... algo que Katniss não poderia distinguir com exatidão.

Ele virou-se, dando as costas para eles. Seus punhos fechados. Todos os músculos de seu corpo estavam tensos. Até mesmo seu modo de andar estava alterado, era firme, raivoso.

— Gale! — Peeta chamou, mas ele continuou a andar, ignorando completamente os chamados do irmão.

— Deixe... ele precisa de um tempo — Katniss pegou o braço de Peeta, o impedindo de ir atrás de Gale.

Sabia que quando Gale ficava com raiva, o melhor era deixá-lo sozinho.

— Eu preciso falar com ele — Peeta a olhava. Havia determinação em seu olhar e preocupação.

Suspirou e soltou o braço dele.

Peeta seguiu o caminho que Gale havia tomado.

“E agora?” Aquela pergunta piscava em sua cabeça como um daqueles anúncios gigantes em neon. Quando começara a sair com Peeta, parecia que parte do seu cérebro havia bloqueado o problema denominado Gale.

Merda. Fora uma idiota. Não deveria ter se deixado levar pelo momento e esquecer desse problema. Mas naqueles dias tudo lhe parecera tão distante.

Não queria se intrometer entre os irmãos. Não queria ser motivo de discórdia entre eles. Não queria magoar Gale. Muito menos que Peeta se magoasse.

O que falaria para Gale? “Sabe aquela noite do seu noivado? Então, eu transei com seu irmão, e depois decidi sair com ele”. Claro, Gale entenderia tudo.

Gale era seu amigo. Gale era seu ex-namorado. E Gale era o irmão mais velho de Peeta. Como ela se sentiria, se estivesse no lugar dele? Era uma pergunta difícil de ser respondida.

Às vezes, não pensar no problema é o melhor que temos a fazer. Principalmente, quando não podemos fazer nada a respeito. Falar com Gale naquele momento era totalmente inviável. E o que mais poderia fazer? Nada, absolutamente nada. Se sentia impotente.

Sabia que o melhor era ter contato a Gale sobre tudo antes. Assim as coisas seriam um pouco melhores. No entanto, agora, não poderia mudar o fato que Gale os flagrara juntos.

Katniss foi para seu apartamento. Tomou um longo banho. Deixou a água morna cair sobre sua nuca, relaxando seus músculos.

E depois ficou tentando encontrar algo para focar sua atenção. Embora não tenha conseguido cumprir essa tarefa com muito êxito. Acabou iniciando várias coisas, mas não terminando nenhuma de fato.

Peeta demorou a chegar. Já estava quase anoitecendo, quando ele chegou e desabou no sofá.

— O que aconteceu? — perguntou, enquanto analisava o estado dele. Parecia cansado. Muito cansado. — Liguei para você, mas você não me atendeu... — ele nada respondeu. — Você falou... com Gale?

Ele colocou a cabeça no colo de Katniss.

— Ele não quer me ouvir... — respondeu laconicamente, com uma voz baixa, de completa derrota e cansaço.

— Dê um tempo a ele — foi só a única coisa que conseguiu falar. Ela não era nada boa em dar conselhos.

Peeta fechou os olhos. E rapidamente adormeceu.

Acariciou seus cabelos louros. Eles eram macios e gostosos de tocar. Dava uma ótima sensação passar a mão em seus fios. Perdeu-se em pensamentos, enquanto sua mão acariciava os cabelos dele. Poderia ficar um bom tempo assim.

Seu celular vibrou. O nome de Gale piscou na tela. Retirou a cabeça de Peeta de seu colo, com cuidado para não o acordar.

— Estou te esperando naquele lugar — foram as únicas palavras que ele disse antes de desligar.

— Você poderia ser um pouco mais expansivo ­— resmungou, apanhando um casaco.

Aquele lugar... era o lugar em que eles costumavam ir quando estavam namorando. Era uma espécie de lugar só deles. Quer dizer, não era realmente só deles. Mas eles gostavam de pensar que fosse, naquela época.

Katniss encontrou Gale observando uma das plantas da estufa. Ele realmente não estava olhando para a planta. Não. Seu olhar era distante.

Embora fazia muito tempo que não ia mais ali, o local continuava exatamente como ela lembrava. Era grande e repleto das mais variadas espécies de plantas. Deu uma boa olhada no local. Ele estava cheio de memórias. Gale fora talvez um tanto cruel em escolher exatamente aquele local para o encontro. Ali eles passaram muitos momentos... Se ele estivesse tentando se vingar de alguma forma dela, havia conseguido um pouco.

Gale percebeu sua presença assim que ela entrou, mas ele demorou algum tempo para demonstrar isso. Parecia estar se decidindo sobre o próximo passo. Por fim, Gale parou de examinar a planta (ou fingir que examinava a planta) e voltou-se para ela.

Ele a olhou silenciosamente por vários segundos. Aquele silêncio já estava começando a aborrecer.

— Então? — disse sem saber ao certo o que falar em seguida. Apenas não queria que aquele estranho silêncio pairasse sobre eles.

Gale suspirou. Merda. Ele estava ainda muito zangado. Talvez, não como antes, mas ele continuava zangado.

— Por quê? — a voz dele saiu calma. Muito calma e isso não era nada bom. Em Gale aquela voz calma, não significava que tudo estava bem, pelo contrário.

Katniss deu os ombros.

— Não sei... Peeta é... — poderia descrever Peeta?

Ele esperou que ela prosseguisse.

— Alguém muito especial — completou por fim.

— Ele só tem 18 anos! — falou um tanto exasperado.

— Como se eu não soubesse disso — não pode evitar certo sarcasmo na voz. Fora quase sem querer.

Aqueles olhos cinzentos de Gale a estudavam, como se estivessem procurando uma resposta.

Gale esperava por uma resposta. E o que diria a ele? “Dormi com seu irmão na noite de seu noivado, sem saber que ele era seu irmão”? Por favor, aquela resposta não era nenhum um pouco adequada.

— Peeta sabe o quer... ele pode ter 18 anos, mas ele... ele é alguém bastante responsável e maduro...

Aquela não era a melhor resposta, mas... não conseguia pensar em nada mais para dizer a ele.

Gale começou a andar pela estufa. Esbarrou em alguns pesados vasos sem plantas, que estavam espalhados pelo chão, mas se aquilo doeu, não demonstrou.

— Peeta é jovem demais. Ele está tomando algumas decisões equivocadas. Ele pode parecer ser maduro e tudo mais, mas ainda continua tendo 18 anos — falou preocupado. Gale não estava zangado naquele momento, estava agindo como um irmão zeloso. — E nessa idade... acreditamos que podemos fazer tudo. Amamos tudo intensamente...

Gale passou a mão pelo cabelo.

— Sabe o que ele me disse hoje aos gritos? Disse que é apaixonado por você desde os 14 anos.

Katniss desviou o olhar de Gale.

— Eu sei... — confessou.

— Ele idealiza você... O que ele sente por você é uma paixão adolescente. Será que você não vê isso?

Suspirou. Ela também havia pensando muito sobre isso, sobre os sentimentos de Peeta em relação a ela. Será que ele não a idealizava? Será que ela não estava se aproveitando dos sentimentos dele por ela? Mas, no final, reconheceu que estava sendo injusta com Peeta.

— Peeta não é um garotinho, Gale — rebateu. — Ele é um homem. Garotos crescem! Você deveria parar de vê-lo como uma criancinha indefesa. Ele sabe o que está fazendo. Eu não estou fazendo nada de errado com Peeta. Nada. Não estou me aproveitando dele.

Gale a olhou, silenciosamente. Foi impossível saber naquele momento o que ele estava pensando.

— Você não entende...

— Eu não entendo? O que exatamente eu não entendo?

Gale novamente ficou em silêncio. Sabia que aquela conversa não iria chegar a lugar nenhum. Não poderia resolver o problema entre os dois irmãos, não poderia resolver seu impasse com Gale.

— Se já terminou o que tinha que falar, estou indo embora — não queria levar as coisas a um ponto que não tinha mais retorno, em que as palavras iriam machucar e abrir um abismo entre eles.

Ele nada disse. Ela voltou as costas para ele e começou a andar lentamente. Mas, quando saiu da estufa, praticamente correu até o carro.

Estava aborrecida, triste, zangada. Por que sua vida havia se transformado naquele caos?

Abriu o vidro das janelas do carro e deixou que o vento frio da noite batesse em seu rosto. Não ligou o rádio. Apenas dirigiu em silêncio.

Peeta continuava dormindo no sofá, quando chegou no apartamento. Ele dormia tão profundamente que não quis despertá-lo. Pegou um cobertor e o cobriu.

Se jogou na cama. Estava tão cansada, mas não conseguia dormir. Fechava os olhos, mas o sono não vinha. A conversa com Gale se repetia a cada momento em sua cabeça, como um filme, bastava fechar os olhos. Assim como respostas que ela deveria ter dado, que não lhe ocorreram na hora. Era impossível dormir.

Pegou o notebook e o ligou. Ficou navegando por vários sites, sem se prender a um de fato. Não soube exatamente quando dormiu, apenas que havia dormido bem pouco e de forma totalmente desconfortável. Ainda estava com o notebook em cima de suas pernas, quando acordou. Seu corpo estava todo dolorido e sua cabeça latejava.

Peeta havia ido para o trabalho. Trabalhar no domingo lhe garantia um dinheiro extra.

Domingos eram tediosos. E aquele seria ainda mais. Comeu alguma coisa e se empoleirou em frente ao notebook, no sofá da sala, lendo artigos e vendo aleatoriamente alguns episódios de suas séries favoritas. Também escutou um pouco de música. Ouvia The Smiths, quando Peeta chegou.

Ele veio em sua direção e a abraçou sem dizer uma única palavra. Um abraço longo e aconchegante.

— Senti saudades — sussurrou em seu ouvido.

Katniss se desprendeu um pouco de seus braços, não muito, apenas o suficiente para olhar seu rosto. Ela passou levemente as pontas dos dedos pela face dele e sorriu. Ele apanhou sua mão e a beijou. Depois beijou seus lábios demoradamente, sem pressa.

— Essa é uma das minhas músicas prediletas — disse ele, beijando seu pescoço.

Asleep? — essa era música que tocava naquele momento.

Ele assentiu.

— Eu poderia a ouvir por horas... — ele entrelaçou os dedos nos dela. — Houve uma época que ficava a escutando sem parar.

Ele cantarolou baixinho um trecho da música:

Cante para eu dormir

Cante para eu dormir

Eu não quero mais acordar

Sozinho

Cante para mim

Cante para mim

Eu não quero mais acordar

Sozinho

Não se sinta mal por mim

Eu quero que você saiba

Do fundo do meu coração

Eu realmente quero ir

— Eu gosto dessa música... ela é linda e um tanto melancólica. Parece um bilhete de despedida... como se alguém disse para as pessoas não ficarem triste com a partida de alguém querido...

— Sempre que a escuto me dá uma sensação de consolo, de que precisamos deixar algumas coisas irem porque é melhor assim — disse Peeta.

Ela o olhou. Peeta tinha o olhar distante. Um olhar perdido. Era... incomum vê-lo assim.

— Peeta...

Ele a olhou. Seu olhar ainda estava um tanto perdido. Katniss o beijou. Seus lábios estavam frios.

— Você está bem? — indagou, acariciando seu maxilar com as pontas dos dedos.

Ele a abraçou. A abraçou forte. Tão forte que chegou a pensar que não conseguiria respirar.

— Peeta?

— Só vamos ficar por um momento assim, sim? — pediu, seu tom era quase uma suplica.

Katniss se entregou ao abraço. O que estava acontecendo com Peeta? Não era simplesmente o fato de Gale rejeitar sua relação, havia mais coisas ali. Muito mais.


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Notas finais do capítulo

O que acharam do capítulo? Gale não aceitou muito bem o relacionamento de seu irmão caçula com Katniss...
Essa música, Asleep do The Smiths que o Peeta tem como sua preferida de certa forma tem algo a ver com o que ocorreu em seu passado...