Cadê os Bombeiros? escrita por Juliana Rizzutinho


Capítulo 5
Corra, Mozart, corra!


Notas iniciais do capítulo

E aí está o derradeiro capítulo do spin-off de Chamem os Bombeiros, o Cadê os Bombeiros? E para fechá-lo, nada melhor que convocar a dupla mais animal da história! Bora?
Lembrando que este é um capítulo exclusivo aos leitores do Nyah ;)



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— Jú, você poderia colocar o Ernesto na gaiolinha? – ela me pergunta.

Penso comigo: “Por que logo eu?”. E qual é a outra alternativa tenho? Chamo o gato com ar de autoridade:

— Ernesto, vem aqui com papai!

“Esse cara é idiota? Papai! Mania de achar que sou filho desses dois! Viro-me do lado e percebo que o Mozart também tenta se esconder. Não quer tomar banho, né, safadão?”.

— Ernesto, venha aqui meu amor! Mamãe está chamando.

“Ótimo, agora é a humana! Mamãe? Estou escondido atrás do sofá e vejo aquele brutamonte tentando entrar atrás do menor. Sem chance, oh, peludo fedorento! E ao menos consigo...”

— Ah, peguei você!

“Como... Como...Como isso é possível? A humana aparece do alto do sofá. Não fiz barulho, a não ser...”

— Ernesto, meu amor, você precisa saber esconder sua cauda melhor.

“Cauda, não! Rabo mesmo! Como sou idiota! E assim sou arrastado para fora. Fico enfurecido e aí do nada fica tudo escuro”.

— Tem certeza que esse truque vai funcionar? – pergunta minha pequena.

— Lógico! Agora, observe!

Prenso o gato com cuidado dentro da mantinha do Mozart, de modo que não consiga me unhar. E agora, só coloca-lo na gaiolinha...

“’Tire-me daqui!!! Esse cheiro irá me matar!!!’, esperneio”.

****

“Como é tonto, esse gato! Agora já era, amigão! Estamos a caminho do banho!

— Mozart, por que você tentou escapar do banho? Logo você que gosta tanto! – pergunta o papai.

‘Não gosto do barulho do secador no meu ouvido!’, lato.

— Vai ser rapidinho. Acho que Ernesto vai gostar de um bom banho também!

E aí vejo o gato se chacoalhando dentro da gaiolinha. Que bobão! O papai não me prende. Oh! Aproveito e mostro a língua.

— Estamos virando a esquina e logo, logo vocês verão novos amiguinhos. – diz o papai.

E o gato mais uma vez começa a dar um ataque histérico”.

*****

Isso é de matar! Para que me dar banho? Tenho uma língua que faz a higiene completa! Me jogam em um tanque cheio de água e sabão. A moça começa a me dar banho e a cantarolar!

— Banho cheirosinho! Para um gatinho fofinho!

‘Ela é atordoada?’, me pergunto. Fico pensando, se o patrão daqui faz o processo seletivo com Lego! Se conseguir montar uma casinha, muito bem, está contratado!

— Um gatinho fofinho para um banho cheirosinho!

Agora, a idiota me coloca na bancada para secar e liga aquele treco barulhento! Putz, é um secador! Ela conversa comigo, mas não entendo patavinas do que diz! Quando a garota desliga o aparelho para me escovar, vem outro rapaz de jaleco e fala:

— Maria, depois do Ernesto, o próximo é o Mozart.

— Ah, pode deixar! – e aí ela vira para mim e pergunta: - É seu amiguinho, Ernestinho?

Afinal, por que ela fala tudo com inho? É doida? Só pode ser xarope! E desde quando o peludo fedorento é meu amigo?

Ela me seca, depois me direciona para gaiolinha e me tranca.

— Agora é a vez de seu amiguinho tomar banhinho!

Ele deveria tomar outra coisa. Cara besta! E aí, a tal Maria o apanha pela coleira e o leva para a sala de tortura. Respiro fundo! Me sinto um herói. Resisti bravamente sem unhá-la. Isso porque se a gente unhar estes chatos, não recebe biscoito. E, diga-se de passagem, os biscoitos daqui são maravilhosos.

Vejo o abobalhado do meu colega de casa todo feliz na banheira. E a groselha da Maria começa a cantar para ele. Te digo, ninguém bate bem da bola neste pet shop. Enquanto isso, fico observando desinteressado os outros bichos. Há gatos, mas a grande maioria são cachorros. Alguns grandes e bobos como Mozart, outros pequenos e mais violentos. Aliás, eles tentam me provocar. Nem aí! Se der uma patada sai ganindo que nem um bebê que teve sua chupeta roubada.

Quando viro do lado, vejo agora o idiota peludo choramingando por causa do secador.

— Já, já desligo, viu, querido? Você está ficando tão booooooonito! – diz a Maria para o estúpido.

Que tédio do cacete! Quando volto os meus olhos para a porta do pet shop, vejo entrar uma dupla para lá de esquisita.

— Bom-dia, Isaías! Tudo bem? – cumprimenta o tiozinho que conversou com a Maria.

— Opa! Tudo, meu bro!

Que seria bro? É o nome do cara?

— Tranquilo! O que tem para hoje?

— Vim trazer o Champs para tomar banho!

Quando direciono meu olhar para o infeliz, percebo que é um cachorro orelhudo, grandão e com cara de nariz empinado. Mas, que babaca! Quem pode ser nariz empinado, somos nós, os gatos!

O bicho começa a cheirar a loja, e o rapaz tem dificuldade de segurá-lo na guia. O piolhento (sim, ele tem cara que tem piolho!) fica tão eufórico que quase o derruba para entrar.

O dono do orelhudo repara que os observo e me encara. Ele faz uma careta com nojo, que penso: ‘como alguém desta espécie pode ser considerada inteligente?’. O examino melhor... Espera aí! Com esse tempo gelado, o cara fica de regatinha para exibir os músculos? E a bermuda? Só deixa evidente que ele trabalha os músculos da parte de cima. Aliás, precisava é trabalhar o cérebro. Esse deve ter se atrofiado.

De longe, ele parece um frango assado. Gordo na parte superior com as pernas finas e tortas. Não é só isso. Os olhos dele são... estranhos!! De uma cor esquisita que nunca vi antes. Parece até aquelas lentes de contato que os humanos compram para fazer cosplay. Como sei disso? Esqueceu que moro com um casal nerd e que adora essas coisas?

— O Champs é um dogue alemão, não é? – indaga o moço do pet shop.

— Não reparou? Le-gí-ti-mo!

Aaaaaaah, por isso que é bobalhão e de pouca inteligência. Aliás, bruto e tapado. E aí quando o tiozinho leva para parte de banho o orelhudo para tomar banho, o ‘frango assado’ vem na minha direção.

— Ei, bichano! Pensa que não reparei que você está me encarando? Eu e meu amigo? Coisa que você não tem! – me diz mostrando a língua.

Franzo os olhos tentando entender qual é do cara.

— Gatos são do Demo! Graças a Deus que odeio vocês.

Só o miro no fundo dos seus olhos, jogando as maiores pragas. Poderia unha-lo? Oh, se podia! Mas conheço esse tipo de babaca! A primeira coisa que faria é gritar que o feri nos olhos ou que o ceguei! Oh, que não seria uma má ideia...

Reparo que o ‘frango assado’ tem uma barba cerrada, meio estrábico e com voz anasalada, sem graça e com um sotaque carregado que não consigo identificar de onde é. Do nada, ele começa a entoar um canto:

— Vocês são do Inferno! Gatos são do Inferno! Gatos são do Demo!

Mexe a cabeça para lá e pra cá, com uma toquinha de lã que na ponta tem um pompom. Cara, se você soubesse o quanto está ridículo em usar esta touca com pompom combinando com a sua regata, iria parar de falar essas merdas agora mesmo! E se fosse meu brinquedo, poderia pular em você, arrancar sua cabeça e estraçalha-la como um isopor!

— E aí, Isas! – chama o rapaz do pet shop. – Tem feito amizade com o Ernesto?

O estrupício faz uma cara que foi pego no pulo. Se vira para o moço e diz:

— Ah, ele tem um nome...

— Tem! É Ernesto!

E se volta pra mim com um sorriso forçado como tivesse com disenteria. E dá dois soquinhos na minha jaula.

— Estamos se dando bem, né, Ernesto? Que nem aquela música: O Ernesto nus convidô pro um samba, ele mora no Brás!

— Não seria Arnesto? – pergunta o moço do pet.

— Ernesto, Arnesto! Dá na mesma!

— Pô, cara! Tá tirando uma com Adoniran Barbosa?

— Quem é esse perto de Isaías, o às das escritas! – ri e dá um tapa que quase desequilibra o funcionário do pet. – Sem contar que ele nunca vai chegar aos meus pés.

— Ah, é? – o moço diz com jeito irônico. Esse é dos meus! – E por que o senhor diz isso?

— Tô arrebentando com meu sucesso! Tem um Sol no meu Coração! Quase um milhão de visualizações! – e levanta o dedo em riste. Ah, pensei que ele iria fazer aquele gesto feio.

— Nooosssssssa! Legal, fera!

— Pois é! Até uma editora me chamou para publicar o livro!

— Jura?

— É! Pena que ainda não terminei!

— E por quê?

E aí nem dá tempo para o energúmeno explicar do sucessão que ele se gaba. Sai uma gritaria entre cães lá dentro. E quem está envolvido?

— Calma, Champs! Calma! – grita a moça que nos deu banho.

O dogue alemão quer pegar o peludo fedorento, que, aliás, está de banho tomado! O cachorro desgraçado do energúmeno tenta morder o Mozart que faz de tudo para se esquivar!

‘Idiota! Enfie uma dentada nesse orelhudo! Honre os colhões que você tem!’, mio. Ops! Mas ele não tem colhões...

— Segure o Mozart! – grita outra moça lá dentro.

O xarope do meu companheiro de casa tenta dar uma rabeira para fugir! Pô! Cachorro frouxo! Morde a orelha deste bosta! O que tá esperando???

E nessa o dogue o surpreende por trás e morde o rabo do Mozart. QUE ÓDIO DISSO! E aí o babaca da toquinha com olhos vidrados do nada vira pra mim e diz:

— Tá vendo! Vocês são tudo mau-agouro!

‘Mau agouro você vai ver no seu olho, seu frango assado!’, mio!

— Rápido, o Mozart fugiu! – berra a Maria.

Fico sem ar! Como que é? A loja vira alvoroço! Cachorros latindo e ganindo e o babaca do dogue não se decide se ataca o povo dentro do pet shop ou corre atrás do peludo fedorento.

Cacete! Preciso fazer alguma coisa! Com a pata bato no trinco da gaiola uma, duas, três vezes.

— Corra, Benê! Não é para pegar a coleira! Vá atrás do golden!!

Bato mais uma vez no trinco e ele se abre. Vou em direção à porta atrás do Mozart. O que mais posso fazer? Mas antes volto ligeiro, mordo a bunda do energúmeno e enfio a pata nos olhos do dogue. ‘Vão para puta que pariu! Agora quem tem que limpar essa sujeira sou eu!’, mio. E corro para rua.”

*****

Enquanto isso...

— Aaaah! Chega, Sailor Moon! – levanto da cama e a minha pequena me agarra pelo pescoço.

— Ah, Texudo Kamen, por favor! Me leve para a Lua novamente! – ela me pede fazendo biquinho, vestindo apenas as botas vermelhas e a peruca louca.

— Agora, Texudo precisa descansar, Sailor Moon.

— Aaaah, Texudo, te imploro!

Ao longe ouço o toque do meu celular. Tento ignorar porque a minha pequena está bem exigente.

— Chega, Sailor Moon! – digo rindo, e tento me levantar da cama, trajando apenas a máscara.

Mais uma vez o toque do celular aumenta e exige que vá atender.

Ela me puxa e me rouba um beijo. A agarro e...

— Amorzinho, o celular...

— Pense! Se nós atendermos...

Ela me cala com um beijo. Se afasta e pergunta:

— Mas, você pediu para o pet trazê-los para cá, né?

— Sim, mas temos mais alguns minutos...

E mais uma vez nos beijamos. O celular se cala, mas não passa nem meio minuto e começa de novo a tocar.

— Júlio! – agora ela me empurra com uma cara assustada. – Vá atender!

— Pode ser nada demais...

— Vai, que me deu uma agonia do nada!

Suspiro, me levanto resoluto e vou até o aparelho. Pelo visor, vejo que é o número do pet shop e fico encucado.

— Senhor Júlio?

— Sim?

— É do pet shop...

— Mas, vocês não iriam trazer os bichos?

— Trazer? É...

Atrás de mim surge a minha pequena enrolada no lençol com uma cara apavorada.

— Aconteceu alguma coisa? – indago para o rapaz do pet.

*****

“Corro, corro! Corro para longe dali! Aquele cachorro maledeto me mordou a orelha e meu rabo! Tentei me defender e quase me cega. Se não fugisse, não sei o que seria de mim.

Ultrapasso um senhor com bengala, uma garota de mochila e quase derrubo uma mulher cheia de sacolas.

— Veja por onde anda, rapaz!

Não sou um rapaz, sou um cachorro! Meu coração pula tanto, que tenho medo. Corro e corro. E vou perdendo o fôlego.

Que raiva, viu? Pensa que não vi o dono dele atiça-lo? Pensa que não ouvi ‘Isca! Isca!’? Com aquela touca idiota! Corro, mas percebo que não consigo continuar. Perco o fôlego e paro. Me sento e olho em volta. Onde estou? Pessoas estranhas passam por mim. Algumas me olham com dó, outro moço até tenta chegar perto, mas diz:

— Vai que você é bravo, rapaz. Qual é o seu nome?

‘Mozart!’, lato.

— Não! Quem sabe outra pessoa chegue perto. Hoje não estou a fim de ser mordido.

Eu não mordo! Juro! Principalmente se me ajudar a voltar para casa. Aliás, como volto para casa? Me agacho com cara infeliz. Faz frio, sinto fome. Começo a chorar baixinho. Que droga de dia!

‘— Bem típico de você!’

Ouvi isso? Respiro fundo, me sinto sozinho e perdido.

‘— Vamos! Para de sentir pena de si mesmo! Quem mandou não morder aquele orelhudo idiota?’

É mesmo! Devia ataca-lo por trás!

‘— Sabe o que acho? Te falta colhões! Se bem que... eu também não os tenho mais!’

Viro do lado e dou de cara com ele. O Ernesto. Agora entendi um miado que vinha não sei de onde.

‘— O que foi? Pensou que sou um fantasma?’ – ele mia.

Levanto-me e dou dois passos para trás. O que isso? Ele está possuído?

‘— Saia daí espírito ruim! Não conheço você!’. – lato.

Agora é ele que arregala os olhos assombrado. E se arrepia todo. E ronrona estranho.

‘— Espírito? De onde você tirou essa asneira!? Mas perai... Você me entende?’.

‘— Não sei. É você mesmo que fala ou é um espírito?’

Ele me olha com desdém. Vira-se do lado e olha para a rua.

‘— Bem, onde estamos?’ - mia e se volta para mim.

‘— Você fala?’ – pergunto.

‘— Claro que falo! Agora como o entendi não sei. Afinal, vocês fazem um barulho tão tosco!’

‘— Tosco?’ – pergunto. – ‘Por que tosco?’

‘— Eu sei lá! Vocês têm uma voz irritante! Digo, todos os cachorros!’.

‘— E vocês com uma voz fininha, dá dor de cabeça!’.

‘— Até parece!’- ele me diz com desdém. – ‘ Nem os pássaros emitem um som tão bonito! A propósito... Que saudades de comer um desses...’.

‘— Você... Você já comeu pássaros?’ – indago.

‘— Claro que sim, idiota! Vivi na rua!’

‘— Não sou idiota! Só perguntei se você comeu pássaros!’

Ele respira como procurasse não perder a paciência. Até parece que estou o provocando. Cara rabugento, este gato!

‘— A propósito, onde estamos?’ – ele me pergunta.

Giramos nossas cabeças conjuntamente.

‘— Para ser sincero...Eu não sei!’ – respondo.

‘— Já sabia...’ – e depois bufa. Se encolhe e depois mia falando:

‘— Que tal você farejar para encontrarmos o caminho de...’

Nem o deixo terminar e digo:

‘— Negativo! Para o pet shop não volto!’

‘— Não iria dizer isso!’

‘— Não ia?’ – o provoco indignado. – ‘Aposto e ganho que bem você gostou que fui mordido!’.

‘— Aí você está errado! Se não estivesse ligando, viria atrás de você?’.

Viro a cabeça e penso. Depois, respondo.

‘— É verdade!’

‘— E então? Como voltamos para casa?’. – ele me indaga.

Farejo a rua e não sinto cheiro familiar nenhum. Me dá um desespero! E procuro apoio do Ernesto dizendo:

‘— Sabe que não sei!’

‘— Óbvio que não!’ – ele diz com desprezo.”

******

Chego no pet shop, já puto da vida!

— Júlio, vá com calma! Nós não sabemos direito o que aconteceu! – diz a Gi.

— Calmo? Puta que pariu, Giovanna! Meu cachorro sumiu, seu gato também! Como... como... como eles podem... – mas a minha garganta se fecha quase querendo chorar de desespero.

Ela se aproxima de mim, e me abraça.

— Pensa que não estou tão preocupada quanto você? Mas, não adianta irmos com violência! Vamos com calma que vai dar tudo certo! – me diz, enquanto acaricia meus cabelos.

Nós nos soltamos. Ela, então, me dá a sua mão e entramos no estabelecimento.

— Mas é óbvio que foi aquele bobalhão que provocou o meu pobre Champs! – diz um carinha baixinho, todo marombado, de regata e toquinha. Quando ele percebe a minha presença se cala.

O encaro e depois o seu cão, um dogue alemão com cara de poucos amigos.

— Senhor Júlio, mil perdões! – vem se desculpando a Maria.

— E ao menos vocês começaram a procurar os dois...

— Espera aí! Vocês são os donos do gato e o cachorro? – indaga o nanico vesgo.

— Sim! – diz a minha pequena, rangendo os dentes.

— Quero uma retratação pelo que eles fizeram com o Champs!

— Que retratação? – eu e a Gi indagamos ao mesmo tempo.

— O cachorro de vocês mordeu a orelha do meu anjo e aquele gato demoníaco me atacou por trás...

— Mordeu sua bunda, você quis dizer. – fala o Paulo, o moço que me ligou.

— É... que seja! Mas o pior que aquele gato...

— O que tem o Ernesto? – a Gi avança dois passos para frente e o encara no ponto de briga.

— Então! Ele cegou o Champs e...

— CEGOU, É? PELO QUE PARECE ESSE... ESSE BICHO ESTÁ PERFEITAMENTE BEM! SABE-SE LÁ SE OS MEUS ESTÃO! – grita a Giovanna. E olha, em todo esse tempo que estamos juntos, nunca a vi tão louca da vida. – DUVIDO E FAÇO O DÓ QUE VOCÊ E ESSE ESTÚPIDO...

— PERA LÁ! – ele berra. – ELE TEM NOME! É CHAMPS!

— FODA-SE! – agora, eu que perco a paciência. – SEU FILHO DA PUTA, CADÊ OS BICHOS?

— Ei, espera aí! Vocês sabem com quem estão fal...

O cara não consegue terminar a frase, a Gi se aproxima dele e puxa a touca de tal forma que o sufoca. O cachorro tenta atacá-la, mas a minha pequena só o encara com os olhos flamejando de raiva.

A seguro e me coloco na frente.

— VOU TE PROCESSAR! - o rapaz grita tenta avançar.

— E você e esse orelhudo nojento deveriam tomar um Lexotan na veia! – retruca a Gi.

E o cachorro começa a latir ao ponto que quase o derruba no chão!

Minutos mais tarde...

— Calma, Gi! Calma! – peço enquanto dirijo o carro.

— CALMA? VOCÊ VIU QUE AQUELE ESTRÁBICO DISSE? QUE... QUE... AQUELA MONTANHA MAL-CHEIROSA...

— Montanha?

— É! AQUILO NÃO É UM CACHORRO! É UMA MONTANHA! – e começa a chorar.

— Gi, vamos circular pela região...

— Quem sabe se... se ... eles estão passando frio, fome... – e a minha pequena soluça.

— Gi! Nós vamos encontra-los!

*****

“‘— Espere aí! Você vai começar a andar sem saber onde estamos indo?’ – pergunto.

O bobalhão fareja, fareja, e continua com a mesma cara de interrogação de antes.

‘— Sabe que a gente deveria fazer?’

‘— O quê ?’ – ele me devolve a pergunta com cara de desdém. Pera lá, quem faz essa cara sou eu!

‘— Deveríamos ficar parados até que alguém nos encontre’. – sugiro.

‘— Não vou fazer isso!’

‘— E por quê? Posso saber?’

‘— Vai vir alguém e pode nos raptar. Vender a gente no mercado negro e...’

Ei! Como esse idiota sabe disso? Ah, é! Ele assisti aos telejornais junto com barbudinho. Valhe-me!

Ele para de falar e encara o seu lado esquerdo. Cheira algo no ar. Levanta as orelhas e diz:

‘— Me segue!’

Oh! E aqui desdenhando o peludo idiota! Quem sabe ele acerta desta vez? Ele anda focado e fareja no ar algo. E o observo. Andamos mais um pouco e ele para em frente a... um açougue?

‘— Ooooh, xarope!’ – o chamo.

‘— Pois não?’. – falou bonito agora! Até parece um lord inglês.

‘— Que saiba não moramos em um açougue!’.

‘— Ah, é?’ – me diz com deboche. – ‘Juro que se você não me dissesse não saberia’.

Do nada aparece um cara com um charuto na boca, brutamontes e faz uns quatrocentos da gente.

— Ei, rapazes! Com fome? – ele nos pergunta.

O Mozart na altura do campeonato aciona seu lado fofura e abana o rabo. Como cães podem ser tão estúpidos? Já eu recuo desconfiado. Alguns anos de vivência na rua te faz ficar alerta com os perigos. E cá para nós, esse cara não tá com jeito que tenha boas intenções.

— Quer um prato de comida?

‘— Eu quero!’ – late o imbecil. Viu só? Ele é esperto até a página 7.

— Espera aí que vou buscar...

Puxo o Mozart pela coleira.

‘— Vamos embora!’ – digo.

‘— Mas por quê? O moço é bonzinho...’

‘— Bonzinho! Te manca, rapaz! Ele vai querer nos envenenar ou dar um sedativo para dormir’.

Ele me olha incrédulo, enquanto o brutamontes se afasta.

‘— E por que você faria isso ?’

‘— Por quê? Vi um desses dando comida para um amigo quando morava na rua. E aí, ele deu pancada no coitado, fez escalpo e entregou para um chinês!’.

‘— Um chinês?’ – ele indaga assustado.

‘—É! E sabe que ele iria fazer?’

‘— O quê?’

‘— Usar a carne dele para fazer pastel! Será que ...’

— Prontinho! – diz o brutamontes.

Nisso o Mozart fica paralisado o olhando.

‘— Bora, fugir, idiota!’

— Não vai co... AI!

Dou uma patada bem no seu saco, puxo o Mozart e saímos correndo.

— VOLTEM AQUI, SEUS DESGRAÇADOS!

E mais uma vez estamos correndo sabe-se lá para onde! Começa a anoitecer e já prevejo onde podemos passar a noite. Eu sou de boa. Isso não é nenhuma novidade para mim. Mas para esse peludo fresco são outros quinhentos. E do jeito que é essa cidade, melhor esperarmos procurar o caminho de casa pela manhã.

Durante a caminhada, o Mozart me pergunta:

‘— Você virou vegetariano depois disso?’

‘— Depois disso o quê?’

‘— Do seu amigo virar... – ele dá uma tremida, vai ver que é de medo. Engole e termina a pergunta: - virar... pastel?’.

Respondo de modo irônico:

‘— Você mora comigo. Por acaso deixei de comer carne? Atum?’.

Ele mexe a cabeça negativamente.

‘— Então? Francamente!’. – reclamo baixinho”.

****

— Ai, Júlio! Eles devem estar com fome, frio, perdidos! – a minha pequena choraminga. – Daqui a pouco é noite! Aí sim, eles... eles... O QUE FAREMOS?

Confesso, meu coração está apertado e preocupadíssimo. Acontece que o Ernesto viveu na rua antes. Sabe se virar, é um gato. Agora o Mozart... O meu cachorro é ingênuo! Perdido, sabe-se lá o que ele pode aprontar.

Não sabemos se o Ernesto está com ele ou se desencontraram. Tento não me apavorar, porém, tem sido difícil.

— Gi e se contratarmos um caminhão de som?

— Para quê? – ela me indaga perplexa.

— Ao menos, se berrarmos os nomes deles podem muito bem aparecer.

— Ernesto pode nem estar aí!

— É... pensando bem, não é uma boa ideia! – digo. – Do jeito que o Mozart é, capaz de vir atrás e ser atropelado...

— NÃO!

****

“‘— Escuta aqui, idiota!’- chamo o cachorro que nem tem sido tão imbecil assim.

Ele me vira com olhar fuzilando. E desde quando o Mozart é assim? Trouxa!

‘— Precisamos procurar algum lugar para dormir’. – aviso.

‘— Vamos dormir na rua?’. – pergunta surpreso.

‘— Não! Não! – digo irônico. - Oh, você vai entrar ali, naquele hotel chique, e latir: - Ei, quero a suíte presidencial porque sou cão de raça! E aí você vai pedir...’.

E daí, ele desanda a chorar. Que chatice!

‘— E por que está chorando?’

‘— Quero o papai! Quero a mamãe!’. – ele se lamuria.

Respiro fundo para não perder a paciência. Na altura do campeonato, ele começa a chorar? Tenha dó!

‘— Quero meu cobertor! Minha caminha! Minha ração! Minha bolinha!’

‘— Também queria estar em casa!’ – tento acalmá-lo. ‘- Mas, oh, Mozart! Nem sabemos onde...’.

— Oh, que cachorro mais bonitinho!

É uma moça baixinha, mais ou menos do tamanho da humana. E que tenta fazer amizade com o Mozart. Ela oferece a costa da mão para ele cheirar. Fareja e depois abaixa a cabeça e fica com toco do rabo se mexendo. Não falei? Qualquer atençãozinha eles abaixam a guarda. Turma mais carente.

— E você, queridinho?

E aí percebo que ela está falando comigo.

— Que olhos lindos você tem! Um de cada cor.

‘— Obrigado!’ – mio. – ‘A gente faz o que pode’.

— Posso olhar a colerinha de vocês? Parecem perdidos!

‘— E estamos!’ – late o peludo.

Ela com cuidado verifica a medalha do xarope.

— Vou ligar para o pai de vocês, certo?

‘— Por favor!’ – gane o imbecil.

Eu já sou mais incisivo:

‘— Já era tempo, não? Pare de gracinhas e ligue para os humanos que estamos com fome, frio... e putz! Tô fedido! Argh!’”.

****

O meu celular começa a tocar, mas estou dirigindo.

— Queridinha, por favor... – mas nem termino de pedir para minha pequena atender o celular e já está com ele nas mãos.

— Alô! Sim? Mozart? – ela se vira para mim. – Sim! Sou a dona dele! O gato? – mais uma vez me encara. – Sim!

— Encontraram os dois? – indago num misto de surpreso e feliz.

A Gi faz sim com a cabeça.

— Estão bem?

— Eles estão bem? – agora quem pergunta é ela.

— Sério? Onde podemos te encontrar? Certo! Estamos indo para aí!

Minutos mais tarde...

Assim que estacionamos o carro, praticamente corremos para o local indicado. Então logo de cara os avistamos. O Mozart sentadinho ao lado da garota e o Ernesto... Ele está no colo dela?

— Olá! – nos cumprimenta uma garota simpática, baixinha e magra, com uma mochila e algumas sacolas.

— Demoramos? – indaga a minha pequena.

— Até que não!

— Eu não tenho como agradecer! – digo emocionado.

— Vem com a mamãe, meus amores. – fala a minha pequena para o Mozart e o Ernesto. O cachorro não sabe nem o que fazer de tão alegre que fica.

‘— Estou tão feliz! Que bom! Vou voltar para minha casa!’.

Já o Ernesto.... Primeiro, do nada, ele a lambe, se chacoalha pedindo para sair do colo. Pula e fica ao lado da Gi. E a encara como tivesse repreendendo.

‘— O que você tem na cabeça? Merda? Onde já se viu nos largar num lugar como aquele? Sabe o que tive que aguentar? Como foi o meu dia? Bom, pra começar, teve a Maria, que ficava cantando como uma idiota para mim. Mas aí me colocou naquela jaula, que vocês falam que é uma gaiola. E não foi só isso! Teve aquele imbecil do frango assado me chamando de demônio. Não contente com isso...’

O gato começa a miar, de forma bem indignada. E não há nada que o cale.

‘— E aí este pacoça aqui...’

‘— Não sou paçoca! Só tentei me defender!!’ – lato.

‘— Posso terminar?’.

‘—Não, não pode!’

‘— Fique sabendo que o falta são culhões!’.

‘— Até onde sei você também não tem!’.

— Júlio! – a minha pequena me chama. – Podemos levar a moça para casa.

— Por favor, não se incomodem! – diz ela.

— Não, senhora! Vamos te dar uma carona! – falo.

De repente, ela fica encarando a Gi por um tempo e pergunta:

— Você também gosta da Sailor Moon!

A minha pequena arregala os olhos e fica boquiaberta.

— Como... Como... como você sabe?

— Você está o broche da Sailor Moon.

Aí que me toco que na correria, a Gi colocou a blusa do cosplay.

— Eu gosto! E você também?

— Eu também!

E as duas fazem: Aaaaahhh

— Você assistiu a nova animação? – indaga a garota.

— Assisti! Mas prefiro a antiga porque foi a que marcou a minha infância.

— Gosto tanto, menina, que o meu gato chama Artémis! – revela a moça.

— Sério isso?

E elas vão conversando em direção ao carro. Enquanto isso, tento resgatar esses dois. Mas está difícil! O Mozart que não para de latir para o Ernesto. E o gato não para de miar para o cachorro. Suspiro, e aí vem na minha mente a palavra mágica... aliás, as palavras mágicas para eles pararem e virem de bom grado.

— Mozart! Ernesto! Vamos para casa!

Os dois me encaram como atrapalhasse a “discussão”.

— Vamos embora, porque assim que chegarmos em casa, você – aponto para o Mozart, - vai ganhar um belo bife. E você – me viro para o gato. – uma pizza de atum!

Viu? Agora, o Ernesto pede colo e o Mozart vem grudado do meu lado. Oh, diazinho, viu? Ainda bem que ele está terminando!

Fim!


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Notas finais do capítulo

Como você pôde perceber, finalmente nossos amigos “conversam”! E caramba, foi o capítulo mais “complicado” para escrever. Aí você me pergunta: “Mas por que, Juliana?”. Também, pudera! Ria como uma idiota em determinadas partes! XD Esse capítulo do spin é lotado de mensagens subliminares ;)

O nosso glossário é curtinho. Bora?

Glossário – Cadê os Bombeiros?

Lego – é um tipo de brinquedo baseado em peças que se encaixam e pode dar inúmeras combinações. Ele é usado até como uma das ferramentas de aprendizagem para Pedagogia.

Lexotan – é um medicamento controlado, ansiolítico (contra a ansiedade) e usado para transtornos psiquiátricos, esquizofrenia, entre outros.

E aqui se encerra o spin-off de Chamem os Bombeiros, o Cadê os Bombeiros? Quero agradecer a cada leitor(a) que continuou e apoiou esse projeto. E aos que futuramente chegarem, obrigada também ;)

Agora, esta autora, que nos escreve, irá recolher para um próximo projeto um pouquinho mais ousado do que este. Espero que em breve posso repartir com você essa experiência. E sim, esta história irá me mexer com muitos sentidos^^

Beijos, muito obrigada e até a próxima oportunidade^~^~



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