Impulsiva escrita por Maíra Viana


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Opa, acho que tenho visita! Já escrevi a história inteira, então, atualizarei aqui todos os dias! Diga o que espera, o que não gostou, como se sentiu... Qualquer coisa é válida e me deixará muito contente para melhorias!



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Capítulo 1

Os raios faziam movimentos bruscos no céu cinzento e o vento forte entrava pela janela velha de um casebre, abandonado ao sul do Canadá. Minha primeira vítima estava sentada em uma cadeira e desacordada.

– Acorda, seu merda! – disse-lhe jogando água e uma expressão de confusão bordou o rosto que me encarava com dificuldade.

– Onde estou? – perguntou, sonolento, e arrastei outra cadeira para me sentar.

– É bom te ver também, Anthony. – ignorei sua pergunta e foi tudo de que precisei pra confirmar que era hora do jogo começar.

– Como sabe meu nome? – ele questionou e pressionou os pés contra o chão, mas não conseguiu se mover. – Me solta! – esbravejou, fazendo sua voz ecoar nas paredes e começou a se debater, tentando, de alguma forma, se livrar das cordas que o prendiam ali.

– Por que tanta pressa? – cruzei minhas pernas, aguardando resposta. Meus cabelos, que antes cobriam boa parte do meu rosto, agora nos deixavam cara a cara.

– O que eu fiz pra estar aqui? – ele perguntou com suas enormes olheiras cravadas embaixo dos olhos azuis e barba por fazer. Não acredito que estava realmente conversando com aquele vagabundo!

– Você se acha uma boa pessoa? – ele soltou um riso irônico abaixando a cabeça e depois a ergueu, como se estivesse prestes a me fulminar com aquelas pupilas dilatadas.

– Bom, eu estou aqui. – percebi seus dedos grossos cutucarem os fios beges da corda, como se ali estivesse a chave de todos os seus pecados. – Então acho que não. – me levantei e dei a volta, ficando por trás de seu corpo. – Você se acha uma boa pessoa, Lisa? – meu nervosismo, que eu lutava para esquecer, voltou à tona.

– O que você acha? – desviei a pergunta, enquanto minha mente dava nós cegos. Ele abaixou a cabeça e riu novamente.

– Você vai me machucar, não é mesmo?

– Se você não disser como sabe meu nome, eu irei. – respondi, pegando no chão um soco inglês. Ele me olhou de soslaio. Voltei a encarar seu rosto pálido e cínico.

– Por que eu te contaria? – sua risada forte preencheu o vazio dos meus ouvidos. – Você não comprou isso só pra me assustar. –e olhou em direção ao metal em minhas mãos. Ele sabia como controlar o pino adversário.

– Acabe logo com isso, pequena Lis. – quando seus lábios se moveram ao pronunciar esse apelido, uma raiva acumulada de meses se manifestou em meu corpo magricela. Só meu pai me chamava assim, e por culpa – não somente – deste cara, ele estava morto. Fechei meus punhos e soquei seu rosto com tanta força que sangue começou a sair de seu nariz. – Pega logo essa maldita arma. – ele disse, em tom de ordem, mas não liguei. Porque ele, querendo ou não, sabendo ou não como as coisas iriam acontecer, eu ia matá-lo. Chamar a polícia? Palhaçada. Logo, ele iria voltar a trazer sofrimento para os outros.

Peguei ao lado da lareira uma pesada espingarda com silenciador que parecia um amigo íntimo, de longa data. Nossos olhos se encontraram por mais que a escuridão fosse nossa melhor amiga naquela noite. Mirei contra sua cabeça, mas desisti por não querer ver aquela cena, e logo mirei em seu peito. Ele deu um longo suspiro como se fosse uma breve despedida e coloquei o dedo no gatilho frio. Soube que naquela hora qualquer um se torna feroz com uma arma nas mãos. E atirei. Seu corpo se inclinou e sua camisa ficou rosada. O que eu consegui fazer por uns longos minutos, foi apenas tremer.

Não havia mais como voltar atrás e devolver-lhe a vida. Já estava feito.

Desamarrei a corda da cadeira e puxei- a da sua mão fazendo com que seu corpo batesse contra o chão duro e áspero. Arrastei-o até o fogo e torci para que seu corpo se queimasse por completo, para que assim não sobrassem vestígios do que um dia me tornei.

Minha moto Triumph Street Triple estava um pouco longe, escondida em um matagal. Joguei as luvas, a arma e o soco inglês ali, porque já não bastava minha cabeça me culpando; eu não precisava ter o que olhar e pensar o quão ruim eu sou.

Saí rodando por longas horas até encontrar um hotel perto da cidade, para me hospedar. Minhas mãos pareciam ter uma imensa placa, escrito “você matou alguém, lembre-se disso”, porque, toda vez que eu as olhava, a cena do crime vinha em minha cabeça.

Fui até o balcão que tinha canetas jogadas e papéis bagunçados e pigarreei de propósito, fazendo que um senhor rechonchudo me olhasse.

– Boa noite. – o recepcionista falou com um tom gentil e finalmente sorri, depois de chorar muito.

– Por favor, um quarto. – pedi e ele me entregou uma chave número 22 e agradeci.

Acendi as luzes fluorescentes e vi uma cama com lençol branco, bem forrado, uma mesa com alguns folhetos e uma televisão pequena na parede. Havia também um banheiro, e aproveitei para tomar uma ducha, tentando assim, me livrar de maus pensamentos. Coloquei em um canal qualquer, que passava sobre a vida dos animais e fiquei tempos me perguntando se nós é que somos os verdadeiros racionais. Roubamos por ganância, matamos por vingança e fingimos, com medo que descubram quem realmente somos.

Depois de descansar um pouco, resolvi passar no refeitório, relendo minhas anotações e esperando o sol se pôr. Minha agenda azul abrigava informações e planos decisivos, e eu levaria aquilo adiante. O nome, endereço e características daquele homem – o segundo assassino de meu pai – estavam bem na minha frente. Eu tinha uma bomba em minhas mãos, e, se eu não a jogasse, ela iria acabar explodindo em mim. Paguei o hotel e caí na estrada novamente, procurando qualquer pensão. Coloquei uma roupa bonita, tudo para que meu plano desse certo.

– Identidade. – o segurança com uniforme preto e bem equipado perguntou e me olhou. Ele estava parado na frente de uma escada estreita que daria para o terceiro andar, que era onde a boate ficava. Não sabia o que havia no primeiro e no segundo andar.

– Ah, droga! Eu sou nova por aqui, não imaginei que precisasse de identidade por ser uma cidade bem pequena. – o rapaz olhou para os lados checando alguma coisa, e depois perguntou minha idade. – 19 anos. – então, ele se afastou para o lado, disse que cederia apenas daquela vez e o agradeci por não ter sido barrada.

Havia muitas pessoas dançando umas com as outras, bebidas voando dos copos enquanto os corpos se remexiam, e risos por todos os lados. Tive que sair praticamente empurrando as pessoas para que o caminho fosse liberado, até que cheguei a um DJ moreno e totalmente eufórico, com os fones no pescoço e dedos agitados.

– Onde está o dono?

– Não posso te dar essa informação. – ele disse quase gritando para que sua voz pudesse ser ouvida no meio de todo aquele barulho.

– Por favor, é importante. – então ele acabou cedendo e me disse para ir até o segundo andar, que lá é onde o chefe estaria. Ao lado do bar havia uma escada, pelo qual desci e encontrei uma porta branca.

– Entre. – e abri a porta, vendo um senhor que aparentava ter 50 anos, sentado e mexendo no computador, com um gráfico refletido nas lentes de seus óculos.

– Olá, sou Clover! – disse com um sorriso, mas como ele nem sequer me olhara, eu completei: – Disseram que a vaga de dançarina seria tratada com o senhor.

– Ah, sim! – e se levantou, rapidamente. Depois foi até uma mini-geladeira perto de sua mesa e serviu um wisky, em dois copos. Quando foi me entregar, bati a mão e o copo se espatifou do outro lado. Pareceu loucura porque nada foi planejado, mas eu estava ali para arriscar.

– Não vim aqui para beber.

E antes que lhe sobrasse algum tempo para retrucar minha atitude, o beijei. O que eu iria fazer? Chegar e sacar uma arma? Ele tinha até uma geladeira no escritório, imagine só se não estaria bem armado?!

Suas mãos caminhavam pela minha cintura e minha vontade era de lascar um tapa naquele rosto gordo, mas eu só iria acabar piorando a situação. Ele acariciava minhas pernas enquanto eu estava sentada em seu colo, quando estendi a minha mão até minha bolsa, na sua mesa. Ele beijava o meu pescoço, quando, finalmente retirei da bolsa uma faca e lhe lancei um sorriso doce que até eu mesma teria acreditado nesse teatro. Então, enfiei o metal contra seu peito e, em poucos segundos, ele urrou em meus braços, enquanto o sangue respingava em minha roupa.

A porta se abriu e, naquele momento, parecia haver uma orquestra inteira dentro do meu peito. Um rapaz ficou me olhando, pasmo, como se estivesse pensando se, aquilo que acabara de ver, era real. Seus passos ficaram mais rápidos e vinham em minha direção, até que vi seu punho se fechar e ir de encontro ao meu rosto. Minha visão se escureceu e pensei ter perdido o ar, por uns instantes, até que perdi a consciência.


Tempos depois me esforcei para abrir os olhos, mas minha cabeça latejava muito, e pude sentir um tremendo galo na minha testa. Estava em um lugar desconhecido, com uma janela estreita e umas caixas de papelão empilhadas no canto, como se fossem uma escadinha. No chão, havia uma barra de ferro e nos meus punhos, uma algema. Deitada em um colchão, fui aos poucos me levantando e olhando ao redor, quando percebi aquele mesmo rapaz que estava no escritório, sentado em um sofá, me observando.

– O que aconteceu? – perguntei baixo para mim mesma, mas ele logo respondeu:

– Tirando o fato de que você matou meu pai? Ah, nada demais. – ele disse, sarcástico e fui obrigada a franzir minhas sobrancelhas. Ele, realmente, estava iniciando uma conversa comigo? Patético.

– Ele matou o meu pai. – respondi seca e ainda meio zonza por tudo aquilo. Ele riu e começou a batucar os pés, como se estivesse perdendo seu tempo com meu papo. O que era verdade.

– Então, você foi lá e se vingou? – ele novamente deixou escapar um riso, e tudo parecia tão normal para ele. Isso não fazia sentido. – Você não está em um filme.

– Até porque se isso acontecesse, você também não seria o mocinho. – falei confiante, mas nada eu iria conseguir fazer se continuasse presa. Eu precisava ter sua confiança, e isso não seria nada fácil quando se trata de Lisa, a garota orgulhosa.

– E por que não?

– Ora essa, parece que o rapazinho não entende muito sobre o que está fazendo. Isso é sequestro e cárcere privado.

– Como se você fosse se livrar disso. – e apontou para minhas algemas. Qual é! Se ele estava carente e solitário, era muito mais fácil comprar um cachorro!

– Isso não é justo. – falei, bufando, enquanto em minha mente ele já estava sem vida.

– E o que você entende de justiça? – milhões de pensamentos poderiam estar se passando na minha cabeça, mas nenhum indicava que ele estava errado.

Por que você não solta as minhas mãos e nós dois sairemos daqui como se nada tivesse acontecido? – senti uma leve pontada de esperança, mas quem eu queria enganar? Era óbvio que aquela história não terminaria assim.

– Eu ainda vou encontrar um jeito de te punir.

– Cara, nós dois cometemos um crime, certo? E agora, quem está agindo como se estivesse em um filme, não sou eu. – e disse aquilo mesmo correndo o risco de levar um tabefe no rosto. Geralmente, esse é um dos principais erros do ser humano: achar que só por que alguém lhe fez algo, você pode fazer o mesmo. – Pois bem, qual o seu nome? – e ao perguntar, se levantou e foi buscar uma bandeja com suco e pães.

– Você não precisa saber. – disse curta e grossa, vendo através da janela que a tarde estava no fim.

– Eu sou Karl Bonnie. – ri de sua cara, porque qualquer coisa que ele dissesse, soaria completamente ridículo! Eu havia matado o seu pai, isso não era suficiente para ele querer, no mínimo, me ver atrás das grades?

– Há quanto tempo estou aqui? – falei com a boca cheia, sujando o lençol com as migalhas. Estava faminta demais.

– Dois dias.

– Não pensou que eu estivesse morta? – e ele respirou fundo, procurando manter a calma.

– Seria uma opção tentadora, e apesar de ter forças para fazer um estrago em você, três socos não são capazes de grandes coisas.

Ficamos sentados por um longo tempo. Ele via televisão no sofá e eu no colchão que foi colocado no chão, tentando me sentir confortável. Missão impossível. Ele dava gargalhadas vendo um programa antigo, enquanto eu pensava em alguma forma de me soltar.

– Você só terá mais gastos me mantendo aqui.

– Cale a boca! Você não irá para lugar nenhum. – ele disse ríspido e logo fiz uma cara de tédio. Se ele queria ser legal comigo, por que simplesmente não me deixava ir?

– E ficarei aqui, mofando?

– Não sou mau a esse ponto. Você poderá ir ao banheiro.

– Nossa! Muito obrigada pela maior liberdade do mundo! – e ele esboçou um sorriso no rosto como se fosse um singelo “de nada”. – Já que é assim, não gostaria de ver até que ponto você é mau.

– Apenas até onde você me fizer chegar.

Seus olhos fortes penetraram nos meus escuros e atordoados, e senti uma pontada de felicidade ao ouvir aquilo, pois sabia que suas atitudes iriam variar de acordo com as minhas. Mas, aquela sensação boa era passageira, porque me lembrei que tudo que eu fazia dava errado. Teria que me controlar e ser esperta, ou minha segurança estaria ameaçada.

– Você precisa de um banho, vou buscar alguma roupa. – e saiu pela porta.

Permaneci olhando o lugar tão silencioso quanto uma praça sem as brincadeiras das crianças. Ao voltar, colocou uma blusa grande em cima do colchão.

Retirou a algema que estava presa na barra e colocou-a em seu punho.

– Isso só pode ser brincadeira, – resmunguei baixo – não vou tomar banho com você!

– Nem em sonhos que você vai sozinha.

– Me recuso. – cruzei os braços e fiquei parada no mesmo lugar, como uma mula, até que assim conseguisse o que tanto queria: ficar sozinha e conseguir escapar.

– Olha, eu juro que tentei ao máximo ser legal com você. – e de início fiquei confusa, mas senti meu corpo virar de cabeça para baixo quando ele pegou em minhas pernas e me jogou em seu ombro.

– Me solta, filho da mãe! – e comecei a gritar, mas aquilo não resultaria em nada, porque, se ele tinha forças para me segurar apenas com uma mão, imagine o que poderia fazer quando realmente quisesse usar aqueles músculos pra valer?

Nós estávamos descendo umas escadas, há alguns segundos, quando vi uma portinha e ele me colocou no chão.

– Doeu? – perguntou irônico e começou a rir, enquanto eu estava embaixo do chuveiro esperando que fosse ligado. – Pode ficar de roupas se assim preferir. – ele ficou um pouco distante com o braço estendido para que não se molhasse e a água começou a cair em meu corpo.

– Você é um completo maluco! – disse, ainda brava por ter me pegado daquela forma e jogado em seus ombros, como se estivéssemos na era das cavernas. Comecei a lavar meus cabelos, quando ele resmungou:

– Fica quieta! – e me surgiu uma ideia um tanto quanto infantil, mas a essa altura do campeonato, eu não me importava mais. Fiz uma conchinha com a mão direita e lhe joguei água. – Agora somos dois malucos. – e não conseguimos evitar um riso, por mais que ainda existisse um clima tenso entre nós. Desliguei o chuveiro e ele me entregou uma toalha enquanto secava os braços. – Vou ficar no outro quarto para você se trocar.

Subimos as escadas e, dessa vez, nada de cabeça para baixo. Ele foi até o porão, tirou a algema de seu braço e a colocou na barra de ferro, novamente.

Fiquei sozinha por um bom tempo, colocando sua blusa que parecia mais um vestido curto para mim e que estava escrito “Tommy Juízo”. Eu estava péssima. Ele entrou no quarto e eu me queixei imediatamente:

– Estou uma droga! – e dei uma voltinha para que ele me avaliasse, e, por mais que pareça impossível ou sem sentido, nosso humor estava melhorando, aos poucos.

– Poxa, assim você ofende o meu bom gosto. – e colocou a mão no peito como se estivesse magoado com meu comentário verdadeiro. Não sei o motivo, mas todo aquele silêncio estava me incomodando tanto, que a impressão que eu tinha era de quê eu estava com uma camisa de força me prendendo.

– Posso te fazer uma pergunta?

– Se eu puder te responder...

– Por que existe um porão aqui? Digo, você mora aqui? – minha curiosidade estava gritando dentro de mim e eu tinha que ser cautelosa.

– Me parece que sou o único filho inútil. – e deu um sorriso quase imperceptível, de canto, talvez aquilo não fosse algo que o deixasse feliz, afinal, não deixaria ninguém, não é mesmo?

– E tem mais quantos irmãos? – acabei perguntando de uma vez, já que ele havia me dado espaço para isso.

– Você está querendo saber demais, não acha? Me diga seu nome e aí, quem sabe, eu respondo outras perguntas.

– Raquel. – falei e ele se sentou no sofá, coçando a cabeça. Depois me olhou e perguntou:

– E amanhã?

– Amanhã o quê?

– Como será o seu outro nome.

– Esse é o meu nome. – dessa vez respondi firme e confiante, como se estivesse em uma espécie de teste e qualquer palavra me custasse um preço alto.

– Eu não gosto de mentiras, sabia?

– E por que eu mentiria? – e revirou os olhos, como um “você é uma idiota e sabe disso, não é?”

– Eu sei mais sobre você do que imagina. – disse com uma voz um tanto quanto preservada, construindo uma muralha de segredos que aparentemente não seriam revelados por nada.

– Então por que me perguntou? – voltei com a minha faceta de dizer tudo como se estivesse em um interrogatório ou coisa parecida, mas esperava nunca chegar a ter que lidar com isso na minha realidade.

– Por um instante, pensei que você fosse diferente dessa menina arrogante que pareceu ser mais cedo. – posso cruzar os dedos, jogar moedas em fontes ou fazer pedidos para estrelas cadentes, mas nada disso seria o necessário para conseguir expressar o quanto juro a você que, dentro de mim, era como se houvesse muitas gargalhadas. Ele mal me conhecia!

– Uma enorme pena, porque confiar em alguém é um ato extremamente burro.

– Tente viver desconfiando até do que você come e depois me conte como foi a experiência, mocinha. – ele disse como se fosse um senhor na cama de hospital, morrendo aos pouquinhos e aí resolveu parar por um instante e pensar no que poderia ter aproveitado, quando mais jovem. Poderia escutar tudo, menos lição de moral.

– Como se você fosse muito mais velho que eu, vovô. – disse zombeteira e ele estava fechando a janela porque começou a chover, quando respondeu:

– Sou nove anos mais velho, caso queira saber. – e deu uma piscadela falsa e saiu do porão, me deixando com uma dúvida tremenda. Como ele sabia que eu tinha 17 anos?! Ah, quando ele disse que sabia coisas sobre mim, não achei que estivesse falando sério. A dúvida é algo que te queima por dentro, porque não sei se torço para ser respondida, ou se fico quieta, deixando que o silêncio me corroa.

– Karl! – gritei e depois de pouquíssimos segundos ele apareceu, me olhando assustado.

– O que foi, enlouqueceu? – perguntou com a respiração acelerada, como quem acabou de sair de uma maratona.

– Escutei um barulho lá em cima, você sabe o que foi?

– Vou dar uma olhada. – e fechou a porta. E os barulhos só foram aumentando, cada vez mais até se transformarem em vozes no corredor.

– Essa é a famosa Lisa? – um rapaz com o cabelo enrolado perguntou e olhei para Karl, que tinha uma expressão basicamente como: “eu te avisei.”

– Vamos conversar em outro lugar. – Karl fez o pedido e um rapaz loiro disse:

– Não sei como ela ainda não foi pro saco. – do que exatamente ele estava falando? Como ele sabia meu nome? Por que pareciam me conhecer? Droga, Lisa! Todos são suspeitos.

– É bonita demais para isso, Rolf. – o outro homem falou, virando-se para o loiro. – Tem língua não? – e revirei os olhos. Qual a dificuldade em, simplesmente, fazer o que Karl havia pedido, e ir para outro quarto e me deixar em paz?

– O que vocês querem? – Karl perguntou sem paciência. Não era para menos!

– Só para avisar que a encomenda de Las Vegas deu certo e que talvez enviaremos outra carga, semana que vem. – Rolf esclareceu com os braços cruzados e com um relógio prateado e grande no braço e perguntou: – Está de acordo, chefe?

– Vocês por um acaso conhecem o celular? Pois é, serve para ligar ao invés de incomodar os outros pessoalmente! – ele disse e, por mais que os outros rapazes estivessem sérios, não consegui evitar um riso. Eu sei, não deveria, mas eu estava começando a gostar daquele mau humor do Karl. Tinha que parar de ser estúpida. – Por mim tanto faz. – e depois de terem saído do porão, eu ouvi um barulho do ronco do motor, e nada mais. Mas Karl não voltou ao meu “quarto”, na mesma noite, somente no dia seguinte.


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Notas finais do capítulo

PS: "Bonnie" tem ligação com o sobrenome do David Bowie, e nada relacionado à Bonnie e Clyde. Por favor, não confundam.

Nos vemos amanhã, certo?!