Realidade Alternativa escrita por Nana Roal


Capítulo 1
One-shot


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas.

Como estão?

Após muito tempo parada, sofrendo em silêncio com esses dois, eu finalmente trouxe minha "visão" sobre o relacionamento deles, o The Last, 700 e Gaiden.

Espero que apreciem!

Eu admito que me emocionei ao escrever.

Ofereço esse capítulo a FP And (de aniversário atrasado) e a Millyin. Ambas que sempre são obrigadas a me aguentar!

Essa é pra "nós", minas! o/



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Seu dever era viajar entre as dimensões de Kaguya, buscando rastros de um possível inimigo. Aquela era a missão que havia assumido há mais de doze anos, a missão que o fez ficar tanto tempo longe de sua filha, a missão que provava o sucesso da cooperação que Naruto tanto buscou. Um ninja protegendo na luz e outro protegendo na sombra, ambos exercendo a função de Hokage.

Era até irônico pensar que ambos eram fortes o suficiente para esmigalhar meteoros e proteger a paz no mundo, mas não conseguiam ser bons pais. Sasuke havia conversado um pouco com o Nanadaime sobre algumas novas descobertas que havia feito e, de alguma forma, o assunto recaiu sobre a família de ambos e sua inaptidão para lidar com elas.

O assunto havia surgido após Naruto relatar sua conversa com Sarada. Até parecia que o Uzumaki conseguia lidar melhor com a garota do que ele, o que, estranhamente, não o irritava ou frustrava; na verdade, era um alivio saber que podia contar com Naruto para proteger e guiar sua filha.

Mas isso não o fazia esquecer o fato de que ambos eram semelhantes até na falta de tato com a própria família, e chegava a ser patético. A gritante diferença é que Naruto conseguia, ao menos, demonstrar apreço pela esposa, algo que ele não conseguia fazer muito bem; na verdade, ele era capaz de admitir pra si mesmo que sentia apenas respeito e gratidão por Sakura, afinal ela era uma boa mãe para Sarada e agora eles partilhavam o amor que sentiam por ela.

Algumas vezes ele chegou a se sentir cruel por não poder corresponder o amor e devoção de Sakura, mas logo afastava a sensação, pois jamais havia mentido para ela e, ainda assim, ela aceitou ser sua esposa e ajudá-lo com o renascimento de seu clã. Mas Sasuke sabia que ela sofria com sua ausência, não apenas a física, mas também a sentimental. A prova disso foi a expressão que ficou em seu rosto quando, há poucos dias, ao se despedir para sair novamente em missão, ele não conseguiu corresponder ao carinho que ela lhe dedicava.

Sasuke soltou um suspiro e balançou a cabeça, tentando afastar aqueles pensamentos e se focar na missão. Estava na hora de acessar mais uma dimensão de Kaguya e buscar qualquer rastro de perigo.

Concentrou-se, ativando seu doujutsu, e logo abriu um portal, que levava a uma das diversas dimensões de Kaguya. Sem hesitar a adentrou, mas enrugou a testa quando reparou no panorama à sua frente.

Diante dele estava Konoha, encoberta pela noite. Era possível ver algumas poucas pessoas caminhando, as luzes dos postes e das casas, algumas casas noturnas funcionavam a todo vapor e os ninjas responsáveis pela ronda noturna pareciam alheios à sua chegada. Ele nem ao menos havia disfarçado seu chakra e ninguém o percebeu.

Uma das dimensões de Kaguya levava diretamente ao monte Hokage e a vila mostrava-se totalmente vulnerável a um possível ataque. Sasuke sabia que, possivelmente, existia outra pessoa que tinha acesso às dimensões; suas investigações o haviam levado a essa constatação.

Naruto precisava saber dessa informação, e eles precisavam pensar em um modo de bloquear aquele acesso ou reforçar a segurança da vila. Além disso, precisavam descobrir se existia algum acesso às outras vilas da aliança.

Ainda sem sair do Monumento Hokage, Sasuke se concentrou, buscando a localização do chakra do líder da vila. Queria confirmar se seguia para seu escritório ou para sua casa e não queria esperar até o dia seguinte para reportar esse novo dado. Quando finalmente rastreou seu chakra, estranhou o fato dele estar no centro da vila, mas logo relaxou ao perceber que Naruto se encontrava a alguns quarteirões do local onde ficava o Ichiraku.

Sem esperar mais, seguiu para onde o Nanadaime estava. Saltou de telhado em telhado, até parar sobre um conjunto de apartamentos relativamente grande. Lançou um olhar ao redor, buscando Naruto pela rua, mas ficou confuso ao perceber que o chakra dele vinha de dentro de um dos apartamentos e que ele parecia acompanhando. Um pressentimento estranho o invadiu e, no mesmo instante, Sasuke encobriu seu chakra com perfeição.

Sigilosamente, desceu pela parede da construção, se encobrindo com as sombras, até chegar a uma janela, observou se havia alguém naquele cômodo e, ao perceber que estava vazio, entrou no apartamento, especificamente em um quarto. Os chakras estavam em outra parte da casa, mas a poucos metros dele.

Saiu silenciosamente do quarto, sem reparar em nada ao redor, e seguiu para onde estavam os chakras. Passou por um corredor não muito longo, atravessou a sala de tamanho mediano e finalmente chegou ao seu destino, mas travou antes de entrar no local ao escutar uma voz extremamente conhecida:

— O que você está tentando cozinhar? — Aquela voz… Era sua?

— A única coisa que sei, teme: rámen. — Já a outra voz, com certeza, pertencia a Naruto, e aquele “teme” o confundiu ainda mais.

O que Naruto estava fazendo naquele apartamento com um impostor seu e, ainda, agindo tão amistosamente? Respirou fundo, buscando manter sua racionalidade, e voltou pelo caminho que o havia levado até ali. Precisava ter cautela para lidar com alguém que havia enganado Uzumaki Naruto.

Saiu pela janela do quarto e rodeou o apartamento em busca de outra janela, uma que permitisse melhor observação do Nanadaime e do impostor. Para sua sorte, havia uma na parte alta da cozinha – provavelmente apenas para ventilação melhor do local –, onde ele poderia enxergar tudo sem ser visto, além de poder escutar o que ocorria lá dentro.

Sasuke observou atentamente as duas pessoas diante dele: Naruto estava na frente do fogão, observando concentradamente a panela e, o que chamou mais sua atenção, foi a forma despojada de se vestir, já que estava apenas com uma regata branca desgastada, calças folgadas e descalço. Aquele usuratonkachi parecia estar se sentindo em casa.

Não muito longe dele, sentado à mesa e observando atentamente a movimentação do Hokage estava… ele. Os mesmos cabelos negros um pouco cumpridos, os mesmos olhos escuros, o mesmo modo de se vestir, a manga vazia do lado esquerdo, mas… Ele sorria. Um sorriso estranho para Sasuke, um sorriso relaxado, como poucos que ele havia dado em sua vida.

Sério que Naruto tinha caído em uma armadilha tão idiota? Obviamente aquele cara não era ele. Bastava olhá-lo nos olhos e seria fácil perceber. Principalmente para a pessoa que mais o conhecia no mundo.

Sentiu um incômodo no peito ao pensar nisso. Naruto tinha família e uma vila inteira para proteger e cuidar, e eles haviam passado tantos anos longe um do outro… Talvez ele não o conhecesse mais tão bem. Será que conhecia Naruto tão perfeitamente ainda?

A voz do Nanadaime o puxou de seus devaneios e ele voltou a se concentrar na dupla à sua frente:

— Relaxa, não será só rámen. Tem sopa de tomate também. — O homem sorriu e girou para encarar o impostor sentado à mesa.

— É o mínimo que você poderia fazer, usuratonkachi, já que me forçou a comer rámen a semana toda — rebateu com um sorriso prepotente, mas seus olhos brilharam de um jeito que Sasuke nunca imaginou ver em si mesmo.

Afastando o pensamento sobre as expressões do outro, se concentrou no que havia sido dito: eles se encontraram a semana inteira? Há quanto tempo Naruto estava sendo enganado?

— Você sabe que estou tendo muito trabalho nesse período — o Hokage resmungou e começou a servir dois pratos: um de rámen e o outro de sopa de tomate. Logo se acomodou diante do impostor. Ambos agradeceram o alimento e começaram a se servir. — Na segunda-feira vai ter a graduação da academia. Tenho que deixar toda a burocracia preparada e também que escrever o discurso.

— Você não é bom em escrever discursos, dobe — o impostor rebateu. Sasuke começava a ter certeza de que aquele homem o havia estudado com perfeição, principalmente sua relação com Naruto. Ele sabia todas suas expressões, seu jeito de falar e suas opiniões. — Bastará você olhar para eles e saberá o que dizer.

A risada de Naruto reverberou pelo ambiente de uma forma descontraída.

— Acho que você está certo — respondeu relaxado.

— Quando eu não estou? — o impostor arqueou uma sobrancelha e deu um sorrisinho presunçoso.

Naruto se levantou abruptamente da cadeira, inclinando-se sobre a mesa e puxou o impostor pra si… Então Sasuke viu, com horror, o inesperado acontecer: Naruto o beijou. Foi algo agressivo, intenso e rápido. Logo ambos se separaram e o impostor parecia levemente desconcertado, porém longe de estar irritado.

— Adoro arrancar esse sorrisinho de bastardo do seu rosto — Naruto comentou com naturalidade.

— Usuratonkachi — o impostor resmungou e logo abriu um sorriso pequeno, porém verdadeiro. Os olhos escuros brilharam com intensidade.

Sasuke saiu rapidamente da janela e se acomodou no telhado do apartamento. Seu coração palpitava acelerado, seus olhos estavam arregalados e sentia as mãos suarem. A imagem do beijo e aqueles olhares intensos pareciam gravados em sua retina.

Que merda era aquela? Naruto estava traindo Hinata? E com um impostor seu? Desde quando? Por quê? Como?

Seus questionamentos foram interrompidos ao sentir outro chakra conhecido. Sem titubear correu em direção ao chakra, mas um pressentimento novamente o forçou a se ocultar antes de se aproximar totalmente.

Quietamente, sobre um dos prédios, viu Sakura caminhar despreocupadamente pela rua e, ao seu lado, estava Hinata. Ambas pareciam entretidas em uma amistosa conversa e ele as seguiu sigilosamente até que ambas pararam diante do conjunto de apartamentos onde se encontravam aqueles dois. Os olhares de ambas pareciam nostálgicos ao observarem a porta de um dos apartamentos, até que a voz de Hinata soou alta e clara:

— Hoje é dez de julho — o tom calmo e seguro chamou a atenção de Sasuke.

— Tenho certeza que esses dois idiotas nem se lembram disso — Sakura respondeu com diversão. — Hoje eles completam doze anos de união — falou baixo e logo encarou os olhos da mulher ao seu lado. — Hinata, você... — hesitou por instantes — se arrepende de não ter tentado algo?

A mulher sorriu de maneira verdadeira e tocou o ombro da outra, logo dizendo de forma quase sábia:

— Às vezes, a melhor maneira de ficar perto de alguém que você ama é sendo apenas um amigo.

— Eu sei, mas admito que, às vezes, eu imagino como seria se ele tivesse me escolhido. Então logo penso que eu jamais poderia fazê-lo tão feliz quanto o Naruto — admitiu em tom encabulado. — Talvez eu pudesse ajudá-lo com o renascimento do clã Uchiha, mas não despertaria algo além de gratidão por isso.

Sasuke não conseguiu se impedir de estremecer ao escutar isso e seu peito se comprimiu um pouco.

— Eu também já imaginei como seria — Hinata revelou. — E penso quase o mesmo que você. Naruto-kun poderia até me amar, mas ele ama todos os seus amigos. — Deu um pequeno sorriso.

— Pelo menos, como amigas, podemos presenciar a verdadeira felicidade deles — Sakura suspirou, lançando mais um breve olhar para a porta daquele apartamento.

— Acho que amanhã farei um bolo para lembrá-los — Hinata afirmou, buscando desviar o assunto de um jeito estranhamente descontraído.

— Ótima ideia — Sakura assentiu e segurou o punho da outra. — Vamos comprar os ingredientes, Hinata! — gritou e saiu puxando a morena.

As duas saíram dali aos risos, parecendo mais jovens do que realmente eram. A luz de um poste próximo iluminou completamente Sakura, fazendo Sasuke perceber seu sorriso radiante e olhos brilhantes de alegria, além disso, a parte de trás de sua blusa apareceu: não havia símbolo do clã Uchiha.

Sasuke arregalou os olhos, novamente seu coração bateu descompassado e, então, ele finalmente entendeu o que estava acontecendo. Novamente buscou a janela da cozinha do apartamento, mas não viu nenhum dos dois no local. Seguiu para a janela do quarto e ali achou um deles.

Naruto estava esparramado na cama e encarava fixamente o teto, até que o outro apareceu no quarto, usando apenas uma calça folgada e esfregando uma toalha nos cabelos.

— No que você ‘tá pensando, dobe? — indagou logo após pendurar a tolha em uma cadeira próxima e se sentar ao lado do loiro.

— Hoje é dez de julho — Naruto respondeu e virou a cabeça para encarar o moreno. — Feliz aniversário, teme — sorriu.

— Meu aniversário é dia vinte e três, usuratonkachi. — Girou os olhos e se lançou de costas na cama, lado a lado com o outro, fixando seus olhos no teto branco.

Naruto deitou de lado, ficando de frente para Sasuke e para a janela, mas nem olhou para ela. Levou a mão esquerda até o rosto do parceiro e sorriu de forma singela, seus olhos azuis brilharam tanto que o ninja na janela se desconcertou por alguns instantes.

— Hoje faz doze anos que assumimos nossa relação para o mundo e que decidimos morar juntos — disse mantendo o sorriso. — Feliz aniversário, teme.

— Hm… — o outro resmungou e girou também, ambos ficaram frente a frente. Por causa do espelho aos pés da cama, Sasuke pôde perceber que ele sorria também.

— Obrigado por estar comigo, Sasuke — soltou brandamente e deu um suave selo no outro. — Eu já disse uma vez, mas não custa repetir: você é meu laço mais importante e eu não conseguiria alcançar meus sonhos sem você ao meu lado.

Sasuke sentiu uma estranha dor no peito ao ver aquela cena. Pensou ser o incômodo pela proximidade dos dois, mas era apenas o olhar brilhante que ele enxergava pelo espelho. O olhar do outro Sasuke.

— Não me agradeça, idiota — a voz geralmente altiva soou quase gentil. — Estar juntos é nosso destino.

— Não importa como, quando ou onde — Naruto completou sorrindo. — Nossos caminhos nos levam um ao outro.

Ambos se abraçaram com cumplicidade e Sasuke se afastou da janela, sentindo o coração palpitar e a cabeça latejar. Aqueles olhos brilhantes, seus olhos brilhantes, pareciam sufocá-lo. Como ele conseguia agir daquele jeito? Mostrar tanto sentimento? Retribuir o carinho de outra pessoa tão naturalmente?

Precisava voltar pra Konoha… Pra sua Konoha! Saltou pra longe daquele prédio e correu para o monte Hokage. Expandindo seu chakra ao máximo, abriu o portal e se lançou de volta para casa.

De volta ao apartamento, o casal se separou do intenso beijo que trocava e olhou para a janela com espanto. Haviam sentindo um poderoso chakra se expandir sobre Konoha e logo desaparecer completamente.

— Parecia seu chakra, teme — Naruto murmurou impressionado.

­— O dono do chakra estava observando vocês há bastante tempo — Kurama afirmou entediado.

— O quê?! — Naruto encarou a grande raposa, com os olhos arregalados.

— Sério que não perceberam? Ele sabe camuflar chakra tão bem quanto o Uchiha, mas eu percebi — afirmou em tom prepotente.

— E não pensou em me falar? E se ele fosse um inimigo, Kurama?

— Você tá realmente enferrujado, garoto — balançou a cabeça em negativa. — E ele não era um inimigo, ele era Uchiha Sasuke.

Naruto voltou totalmente para a realidade e arregalou os olhos enquanto olhava para o homem diante de si, que parecia estranhamente calmo.

— Kurama acabou de me dizer que aquele homem é Uchiha Sasuke — Naruto falou extremamente sério. — Você não tinha fechado aquele portal, teme?

— Eu não posso mais ter acesso ao outro lado, bloqueei isso, mas pelo jeito o outro Sasuke acabou de descobrir a porta que existe do lado de lá.

— Vamos torcer para que ele feche essa porta — Naruto murmurou e massageou as têmporas.

— Apesar dos nossos rumos diferentes — comentou calmo. — Ele é muito parecido comigo. Tenho certeza que vai fechar o portal.

— Hm… — resmungou em resposta. — Ele ficou nos vigiando, teme! Deve ser um tarado.

Sasuke girou os olhos e empurrou Naruto para ele deitar na cama novamente.

— Para de ser idiota, dobe, e vamos continuar. — O beijou sem esperar resposta, e Naruto rapidamente correspondeu.

Era o dia deles, afinal.

**************************

Naruto estava tentando firmemente se concentrar no documento; só faltava mais aquele para ele finalmente terminar seu expediente. Se fosse por horário, seu expediente havia terminado há três horas, mas a quantidade enorme de trabalho o impeliu a ficar ali, buscando enxugar a pilha de documentos o máximo possível. Quem sabe assim ele não conseguiria sair mais cedo no dia seguinte?

Talvez ele pudesse sair mais cedo, passar no Ichiraku e comer uma gigantesca porção de rámen de porco... Ou melhor: poderia levar Himawari e Boruto para comer uma enorme porção de rámen com ele! Seria genial! Claro, se Boruto não ficasse tentando atacá-lo a cada cinco minutos. Era tão complicado lidar com aquele garoto…

Hinata era extremamente gentil, tão gentil que não conseguia enfrentar os acessos de raiva do filho, enquanto Naruto achava extremamente complicado lidar com alguém tão parecido com ele mesmo. Boruto precisava de alguém para guiá-lo, alguém de caráter forte, mas diferente do deles.

Soltou um alto bocejo e coçou os olhos, para logo se focar novamente no trabalho. Leu a última frase do papel e em seguida o assinou. Sorriu satisfeito ao colocá-lo na pilha de assinados e levantou, se espreguiçando de forma languida.

Foi até a porta sem olhar pra trás, mas interrompeu sua caminhada ao sentir um denso e grande chakra aparecer sobre o Monumento Hokage. Sem pensar duas vezes usou o Hiraishin para chegar até lá, já com um Rasengan em mãos, porém este desapareceu quando ele se deparou com o dono do chakra que estava ajoelhado no chão e com um olhar reto.

— Sasuke? — questionou um tanto confuso e até preocupado pelo olhar perdido do outro. — Sasuke, ‘tá tudo bem? — indagou, se inclinando para tocar um de seus ombros.

Sasuke saltou pra longe dele e o encarou com o cenho franzido, mas em seguida sua expressão se relaxou, assim como sua postura.

— Aconteceu alguma coisa — Naruto afirmou com calma e logo suspirou. Seu expediente se estenderia ainda mais.

— Você estava trabalhando até essa hora? — Sasuke perguntou, mas seu tom saiu quase afirmativo.

Naruto passou a mão no rosto e nos cabelos, tentando dispersar o cansaço; ele era o Hokage e, pelo visto, não tinha carga horária máxima de trabalho. O Uchiha o observou com maior atenção, percebendo as olheiras sob os olhos, a expressão cansada e os ombros ligeiramente encurvados. Tão diferente da expressão relaxada daquele outro.

Uzumaki Naruto parecia o típico homem que carregava o peso do mundo nas costas, sem tempo pra descanso e sem esperança de ter com quem dividir esse pesado fardo. E ali estava Sasuke, disposto a jogar mais um peso sobre ele. Suspirou, abriu um fraco sorriso cansado e se endireitou; estava na hora de mostrar que ele era seu apoio, eles eram um time e deveriam cooperar como tal.

— Estava e acho que ainda não terminei meu serviço — Naruto finalmente respondeu e virou em direção ao Edifício Hokage, disposto a voltar para lá, mas sentiu seu braço esquerdo ser segurado com firmeza e virou para Sasuke. — O que foi? Vamos conversar no escritório, assim já facilita qualquer decisão burocrática que tenha de tomar.

— Vamos conversar em outro lugar — Sasuke decretou. — Preciso te contar algo que vi e também preciso de uma bebida forte. — Naruto arregalou os olhos, em seguida franziu o cenho e logo o manto dourado da Kyuubi cobriu completamente seu corpo, para depois desaparecer rapidamente. — Mas que merda foi essa?

— Eu só queria confirmar se era você mesmo — respondeu com naturalidade. — Você quase nunca toma saquê, Sasuke, só em ocasiões especiais. E quando digo isso, só consigo me lembrar do ritual de casamento.

— Eu realmente só bebi naquela ocasião, mas você não pode me julgar, já que também só bebeu nesse ritual!

— Minha mãe disse que beber é uma das três proibições ninja, apesar que também me deu permissão pra beber após os vinte anos, mas não tive vontade até agora — esclareceu com naturalidade, mas logo fez uma expressão confusa. — Como você sabe que só bebi no meu casamento? Aliás, como sabe o que fiz no meu casamento? Você não foi.

— E qual o problema? Você também não foi ao meu casamento e sabe que fiz o ritual do saquê! É por isso que chama “ritual”, acontece em todos os casamentos. — Girou os olhos. — Vamos logo, usuratonkachi — chamou em tom impaciente, já se sentindo menos abalado do que quando havia chegado ali. Naruto tinha o dom de estabilizá-lo, mesmo sem querer.

— Como você ousa chamar seu Hokage de “usuratonkachi”, teme? Eu poderia te prender por esse desrespeito.

Sasuke apenas ignorou as reclamações do Hokage e ambos seguiram até o Shushuya, local que Naruto às vezes ia com Tsunade – quando esta visitava a vila –, mesmo não bebendo. Não demoraram muito pra chegar, se acomodar e fazer o pedido e, em menos de cinco minutos, ambos já estavam com as garrafas de saquê à sua frente.

— Então, teme, o que te forçou a beber? — Naruto indagou calmo, enquanto servia a ambos.

Sasuke respirou fundo, pegou o pequeno recipiente e virou rapidamente todo o liquido na boca, tragando quase sem respirar e sem deixar de encarar o outro diretamente nos olhos. Naruto, seguindo o exemplo do amigo, sorveu da própria bebida e, como se tivessem ensaiado, ambos depositaram os pequenos copos na mesa ao mesmo tempo. Sasuke – que ainda estava tentando encontrar uma forma de iniciar sua narrativa – se surpreendeu ao ver Naruto abrir um sorriso e logo a risada dele reverberou pelo local.

— O que é, dobe? — Arqueou uma sobrancelha.

— É que a gente veio falando dos nossos casamentos e eu acabei percebendo que nós colocamos os copos na mesa ao mesmo tempo, teme — respondeu ainda dando uma leve risada. — Parece que algumas promessas realmente não podem ser quebradas.

O Uchiha ficou alguns segundos sem entender, mas logo arregalou levemente os olhos e olhou para o próprio copo. Então se lembrou do que havia acontecido na pequena cerimônia de casamento que ocorreu fora da vila, com poucos convidados – apenas a equipe Taka, um sacerdote e o casal Haruno – e onde Sakura e ele sentaram-se frente a frente e tomaram um gole de saquê. Os copos deveriam ser depositados ao mesmo tempo na mesa, para representar que os noivos morreriam juntos… Ninguém percebeu que ele encostou seu copo na mesa milésimos de segundos antes dela.

Motivo? Na época ele pensou que era por acreditar que iria morrer cedo, cedo demais pra levar Sakura junto. Agora, diante de um sorridente Naruto e se lembrando de uma promessa muito antiga, ele não tinha mais certeza.

— Agora conta o que aconteceu, teme, já ‘tô ficando impaciente. — Naruto movimentou o corpo de maneira inquieta, tirou a capa de Hokage – a colocando ao seu lado no assento – e serviu mais bebidas para ambos. — Você encontrou alguma coisa em uma das dimensões da Kaguya?

— Sim, eu encontrei alguma coisa... Na verdade algumas pessoas — quase murmurou e encarou o outro, se deparando com o olhar atento e inquisidor dele. Tomando isso como um incentivo, Sasuke narrou os acontecimentos de forma detalhada e Naruto guardou silêncio até ele terminar.

— Nossa — o Hokage murmurou e virou mais uma dose de saquê. — Isso deve ter sido intenso e estranho.

— É tudo que você tem a dizer? Que foi intenso e estranho? Você, ao menos, me escutou, usuratonkachi?

— É claro que eu te escutei, teme — rebateu indignado. — O que exatamente você quer que eu diga?

— Mais do que “intenso e estranho”, talvez chocante, bizarro, angustiante, vergonhoso e… — parou abruptamente ao perceber-se completamente descomposto e respirou fundo, mas não conseguiu controlar a próxima frase que saiu em um sussurro: — Parecia tão certo.

— Eu já passei por algo semelhante — afirmou calmamente e recebeu um olhar confuso. — Na época eu achei que Obito havia me lançado, junto com a Sakura-chan, em um poderoso gennjutsu, mas após todos os acontecimentos da guerra, penso que ele tenha nos lançado – de alguma forma – em outra dimensão. Foi bem estranho: meus pais estavam vivos, os pais da Sakura-chan mortos, você era um tipo de conquistador…

— Conquistador? — interrompeu franzindo as sobrancelhas.

Naruto soltou uma risada e assentiu:

— Ficava distribuindo rosas e sorrisos para qualquer garota que passasse e, além disso, aparentemente o clã Uchiha existia, Itachi era o líder de uma versão boa da Akatsuki e o outro eu era procurado. O cara destruiu Konoha, Sasuke — afirmou muito sério.

— O Sasuke desse lugar não fez nada pra impedí-lo?

— Menma – sim ele tem um nome diferente do meu – estava sendo controlado por Obito e agia sempre usando uma máscara, mas parece que sua saída da vila era algo muito recente, já que as pessoas daquela Konoha, pensando que eu fosse ele, me trataram naturalmente. — Deu de ombros.

— Ele saiu da vila e a destruiu mesmo tendo a família dele?

— Como eu disse: Obito o estava controlando. Mas, indo direto ao ponto, eu quero dizer que ir até lá e ver como teria sido minha vida se meus pais estivessem vivos me abalou completamente. Eu vi fotos dos aniversários do Menma, senti a preocupação deles e recebi uma bronca por não querer jantar. — Soltou uma leve risada, mas logo voltou à seriedade. — Mas aquele não era meu lugar, não eram meus pais, não eram meus amigos e — pausou levemente, encarando com mais intensidade o amigo — aquele Sasuke não era você. Aquela era a vida do Menma e não a minha.

Sasuke guardou silêncio por alguns minutos, apenas observando o próprio copo, mas não deixou de reparar que Naruto pedia mais saquê, e não se importou ao vê-lo encher novamente seu copo. Sua cabeça dava algumas voltas, absorvendo as informações recebidas e as encaixando com as lembranças daquele lugar. Sinceramente ele nem entendia o motivo de ter ficado tão malditamente abalado e, pior, por algo muito distante do fato de não existir sua família naquele lugar. Mas, pensando melhor, o que mais o havia marcado naquela situação foram as conversas tanto de Sakura com Hinata, quanto a que havia acontecido no quarto.

Aquela Sakura não tinha um olhar resignado e sempre baixo; mesmo estando ainda claramente apaixonada por Sasuke, ela parecia bem. Porém, o mais chocante, foi ela ter descrito exatamente o que ele sentia em relação a sua esposa: gratidão.

— Você alguma vez já se arrependeu das escolhas que fez? — indagou e esvaziou mais um copo de saquê. Realmente aquela bebida facilitava a comunicação. Sóbrio, ele jamais perguntaria algo do tipo e, por isso, resolveu aproveitar para ser mais direto: — Já se arrependeu de ter se casado?

Naruto, longe de parecer surpreso com a pergunta, apenas relaxou contra o encosto do assento e adotou um olhar pensativo.

— Eu não encaro como um arrependimento de ter casado... Está mais para um arrependimento de não ser suficiente — esclareceu muito calmo. O saquê parecia diminuir parte de sua constante energia. — Parece que o que eu sinto pela Hinata não chega a 10% do que ela sente por mim. Você já se sentiu assim?

Sasuke abriu um sorriso ladino e a opressão, que ele nem havia notado que existia, abandonou seu coração. O homem diante dele ainda conseguia ler seus sentimentos melhor que qualquer pessoa e ainda partilhava deles. Estando afetado pelo álcool, Sasuke conseguia admitir que estava satisfeito com o fato da conexão deles permanecer intacta, mesmo após anos de estarem fisicamente separados. Era uma ligação diferente da que ele tinha com a Sarada e Sakura: com a filha era uma conexão de proteção e profundo afeto, o que o fazia pensar nela em vários momentos durante as longas viagens; já com a esposa, a conexão estava diretamente relacionada à filha e ele sabia que sem Sarada esse laço se resumiria a uma amizade distante.

Como naquele lugar.

— Eu sei como é — Sasuke finalmente respondeu. — Mas Sakura me contou que você realmente se apaixonou pela Hinata e que até foi o primeiro a se declarar.

— Vocês ficam falando sobre mim quando estão juntos-dattebayo? — Naruto arqueou uma sobrancelha de maneira brincalhona.

— Usuratonkachi — resmungou antes esvaziar mais um copo.

Naruto soltou uma risada leve e voltou a falar:

— Quando aconteceu toda aquela situação envolvendo a lua, o grupo que foi resgatar a Hanabi acabou passando por um local onde havia um tipo de água mágica…

— Água mágica, dobe? — soltou uma risada discreta.

— Fica na sua, teme — rebateu, fazendo uma careta. — Enfim, essa água acabou nos prendendo em um gennjutsu, o que nos fez reviver algumas lembranças. Por algum motivo, Hinata e eu partilhamos algumas dessas lembranças e eu acabei vendo uma conversa que ela teve com a Sakura-chan. — Soltou uma risada sem humor e bebeu mais um pouco. — Basicamente, ela disse a Hinata que eu não sabia a diferença entre o amor das pessoas e amor por rámen.

Sasuke, sem conseguir ou querer evitar, adotou uma expressão de puro espanto. Era certo que Naruto era viciado naquele prato, mas essa comparação beirava o ridículo. Naquele instante, ele lembrou o motivo de achar Sakura irritante.

— Mas sabe? — Naruto coçou a nuca e baixou o olhar, encarando o copo que segurava. — Talvez ela não estivesse totalmente errada. Quero dizer: o que eu sabia sobre amor naquela época? Hinata e Sakura-chan se esforçaram e lutaram pelo amor que sentiam.

— Isso não torna a comparação que a Sakura fez viável, Naruto — Sasuke afirmou extremamente sério, beirando o irritado. — Rámen pode ser a coisa que você mais aprecia no mundo, mas é apenas isso… uma coisa. E eu sei que você sabe muito bem a diferença, sabe que comer rámen é muito melhor quando se está com as pessoas, dobe. As pessoas que você ama! — afirmou categórico e em seu típico tom altivo.

Naruto levantou o olhar e sorriu, se lembrando do que havia planejado mais cedo: comer rámen com seus filhos.

Você ‘tá certo, teme — concordou, se sentindo leve. — Mas voltando, após compartilhar essas lembranças, eu percebi algo crescer em mim. Era um sentimento forte e estava diretamente relacionado à Hinata, era forte o suficiente para eu associar ao amor.

— Então você descobriu que a amava e se declarou?

— Eu achei que correspondia aos sentimentos dela e me declarei, mas, como eu disse antes, o que eu sinto por ela não chega a 10% do que ela sente por mim. Eu não posso dizer que me arrependo de ter casado, afinal essa união me trouxe meus maiores tesouros. Eu sou grato por ser pai, Sasuke, e amo os meus filhos. Eles me mostraram que tenho a capacidade de morrer por alguém sem hesitar.

— Na nossa adolescência você parecia bem disposto a morrer, dobe — rebateu sem pensar e arregalou os olhos. Naruto deu uma risada curta.

— Quando eu era jovem, estava disposto a lutar até as últimas consequências, mas eu vivia gritando que não morreria antes de me tornar Hokage e era verdade. Por outro lado, eu estava disposto a morrer com você, pois sempre soube que não conseguiria ser Hokage se você não estivesse lá. Morrer por alguém é diferente de morrer com alguém.

— Para com essa conversa sentimental. — Sinalizou pedindo mais saquê, para esconder a leve vergonha que sentiu. A bebida o estava “transformando”, mas ele não estava disposto a parar.

— Toda essa maldita conversa é sentimental-dattebayo. — Balançou a cabeça negativamente.

Após serem servidos e o garçom se afastar, Sasuke indagou:

— Então o que você exatamente sente por ela? O que você sentiu de verdade quando as lembranças foram compartilhadas?

— Foi incrível presenciar e sentir o mesmo que ela. Hinata é uma mulher gentil, serena, inteligente e uma ótima ninja. Naquela época, os sentimentos dela me alcançaram literalmente e eu fui completamente envolvido, também houve uma enorme gratidão por ela estar sempre ali por mim, mesmo que eu não soubesse. Eu sei que amo minha esposa, teme, mas não da mesma forma que ela me ama. Entende?

Sasuke assentiu e novamente se lembrou da realidade alternativa, especialmente as palavras ditas por aquela Hinata. Porém sua atenção recaiu sobre Naruto, quando este voltou a falar:

— Mesmo sabendo isso, eu sei que nossos sentimentos estão interligados, pois temos Boruto e Himawari. Eu escolhi casar e, como qualquer escolha, isso trás um lado bom e um lado não tão bom. O lado bom, na verdade ótimo, são meus filhos e o lado não tão bom é que eu não sou loucamente apaixonado por minha esposa. Na verdade, sinto mais gratidão e respeito por ela, além de considerá-la uma grande amiga.

— Eu sei como você se sente — comentou baixo e deu um pequeno sorriso, olhando diretamente nos olhos do amigo.

— Eu sei. — Naruto também sorriu.

Os dois ficaram em silêncio, apenas se encarando e desfrutando da bebida, mas cada um preso em seus próprios pensamentos, até Sasuke se lembrar da conversa que escutou daqueles dois e, novamente, indagar:

— Você acredita em destino?

Naruto coçou o queixo e encarou o teto por algum tempo, mas logo voltou a encarar o amigo.

— Eu escutei Neji dizer que o destino é decidido no nascimento e que as pessoas não podem mudar isso. Ele encarava esse “destino” como algo muito concreto e cruel, e o fato de não controlar meu próprio futuro me enfureceu e eu rechacei essa ideia. Era absurdo pensar que eu não poderia mudar, tornar-me melhor e decidir por mim mesmo meus objetivos — soltou uma risada fraca. — Mas após todos esses anos eu entendo que Neji não tinha ideia do que era “destino”.

— O que é destino pra você, dobe? — Sasuke não pôde deixar de expressar uma genuína curiosidade. Ele estava se sentindo leve e sem controle de suas expressões ou palavras.

— Existe aquele destino que pode ter o mesmo significado de objetivo, como meu sonho de ser Hokage, por exemplo — Naruto sorriu e sorveu mais um pouco do saquê, se ajeitando melhor no local onde estava sentado.

— Alguns, realmente, acreditam que você estava destinado a ser Hokage — comentou de forma relaxada.

Naruto balançou a cabeça em negativa, soltando um riso frouxo.

— Ser Hokage foi uma escolha e uma meta, eu não estava destinado a isso. Qualquer outro poderia ter sido Hokage, mesmo a Sakura-chan, Shikamaru ou você. Ninguém nasce destinado a carregar um título de liderança. O destino do qual estou falando é algo maior, um impulso incontrolável que te faz seguir em uma direção, mesmo sem querer.

— A bebida te deixa filosófico e mais incompreensível que o normal — o Uchiha soltou uma risada, antes de tomar mais um gole de sua bebida.

— Não é tão difícil de entender — rebateu. — Neji é um bom exemplo de alguém que avançou até seu destino.

— Você ´tá querendo dizer que o destino dele era morrer pra te proteger? Desde quando você virou um egocêntrico?

— Claro que não, bastardo — bufou e bebeu um pouco mais. Logo voltou a falar: — Quando eu o conheci, Neji acreditava que seu pai havia sido apenas um sacrifício, alguém que existiu para servir de troca quando fosse necessário; mesmo pensado dessa forma e dizendo odiar a família principal, ele não conseguia deixar de pensar no destino de seu pai e repetia a mesma história pra todos. Então, ele descobriu que seu pai, na verdade, escolheu morrer pra proteger sua família e seu irmão gêmeo; ele tinha escolhido morrer por amor. Esse era o destino dele.

— Hm — resmungou incitando o outro a continuar.

— Neji também estava destinado a sempre proteger sua família, mas não por uma imposição cruel e sim por amor. Ele morreu protegendo uma pessoa que amava.

— Você ainda não era da família dele, dobe — afirmou arqueando uma sobrancelha. — ‘Tá dizendo que ele te amava, hã?

— A bebida me deixa filosófico e você engraçadinho — alfinetou. — Ele não morreu me protegendo: Neji morreu protegendo a Hinata.

Sasuke assentiu, novamente deixando aquele confortável silêncio pairar sobre eles. Mas alguns novos questionamentos surgiram: Qual seria seu destino? Será que era como aqueles dois haviam dito?

Voltou a prestar atenção em Naruto e percebeu que este o encarava com intensidade, parecendo o estar analisando criteriosamente, usando sua expressão de “Hokage”. Isso poderia ter um valor mais significativo se suas bochechas não estivessem ligeiramente avermelhadas e suas pálpebras pesadas, mostrando o quanto a bebida já o estava controlando.

— O quê? — indagou de forma seca, tentando ocultar o incômodo que aquele olhar fixo deixava nele. Lembrava tanto aqueles dois.

— Para de pensar neles, Sasuke — a ordem lenta, seguida de um sorriso ladino, fez o Uchiha franzir as sobrancelhas. — Eles são eles, com as escolhas deles. Mas penso que as escolhas deles levam ao mesmo destino que o nosso.

— De que merda você ‘tá falando, usuratonkachi? — perguntou quase de forma histérica. O que aquele babaca de cabeça vazia estava insinuando? Que o destino deles era… era… Aquilo?

Naruto gargalhou ao ver a expressão horrorizada do amigo.

— Calma, teme. — Fez um gesto apaziguador. — Eu não quis dizer que a gente vai se enfiar em um quarto de motel barato, ter uma louca noite de paixão desenfreada e coisa do tipo. Fizemos escolhas diferentes daqueles caras, mas as escolhas, provavelmente, levam ao mesmo destino.

— E qual você acha que é esse destino, usuratonkachi? — perguntou, preso entre a irritação e curiosidade.

— Nós já falamos sobre isso há muito tempo, teme. Até teve uma participação especial do velho Rikudou. Acho que a idade já começa a afetar sua memória — comentou em tom relaxado e ignorou o olhar repreensivo do companheiro. — Nós somos nosso destino. Você é o meu e eu sou o seu.

O Uchiha lhe lançou um olhar cético. Muitas coisas haviam mudado desde que houve a conversa com o Rikudou: a rixa milenar havia acabado na luta no Vale do Fim e depois cada um havia construído sua vida. Kami-sama! Eles tinham filhos agora e, mesmo que não conseguissem corresponder aos sentimentos de suas esposas, eles as respeitavam e isso era a maior prova de que, definitivamente, suas prioridades haviam mudado. Naruto até havia afirmado que estava disposto a morrer por seus filhos e isso era algo que Sasuke também partilhava com ele, pois também seria capaz de morrer por Sarada.

Eles não eram como aqueles dois que tinham apenas um ao outro.

— Não diga besteiras — retrucou de forma grosseira, sem entender muito bem o motivo. Talvez fosse por, racionalmente, achar absurda a afirmação do outro ou por, irracionalmente, concordar com ele. Olhou para o copo que segurava, achando que já estava na hora de parar de beber.

— Não é besteira, teme — afirmou convicto. — Desde pequenos nossos caminhos nos levam um ao outro, mesmo sendo – aos olhos dos outros – tão diferentes, nossas semelhanças sempre nos uniram, e mesmo nossas diferenças nos aproximam. Nós acabamos de conversar sobre o quão parecidos são nossos casamentos! — Soltou uma risada e balançou a cabeça em negativa. — Você teve problemas com a Sarada-chan e eu acabei me envolvendo nisso, talvez até possa acontecer alguma coisa que o faça me ajudar com Boruto…

— Mas eu nem consigo lidar com a Sarada, dobe — contestou.

— E eu não sei lidar com o Boruto — retrucou rápido e sério. — Mas isso sobre você me ajudar é só uma suposição, no entanto. A situação com a Sarada-chan é prova suficiente. Nós não temos a relação que aqueles dois têm, mas isso não muda o fato de que você é meu laço mais importante, pois eu não teria conseguido alcançar meus sonhos sem você ao meu lado. — Se inclinou um pouco pra frente e seus olhos brilhavam tanto que Sasuke se desconcertou por um momento, mas não desviou o olhar. — Somos complementares, evoluímos paralelamente, nos compreendemos com perfeição e nossos caminhos continuarão se cruzando, pois este é nosso destino.

— Não importa como, quando ou onde — repetiu o que havia sido dito por um daqueles dois.

— Isso — Naruto escancarou um sorriso, parecendo até mais jovem e Sasuke retribuiu o gesto mais discretamente.

Um novo silêncio os envolveu. Naruto voltou a se recostar desleixadamente no assento, mas ambos continuaram com os olhares conectados. Eles não sabiam o que aconteceria dali em diante, provavelmente tudo permaneceria igual na relação deles com o mundo, principalmente a conexão deles, e isso os fazia pressentir que os problemas pareceriam menores.

— Precisaremos selar o acesso a essa dimensão, teme — afirmou no tom mais profissional possível, para alguém claramente bêbado. Sasuke assentiu, enquanto finalizada aquela que seria a última garrafa de saquê da noite. — Mas é melhor fazer isso amanhã, pois agora eu ‘tô vendo tudo em dobro-dattebayo — murmurou quase infantilmente e deitou a cabeça sobre a mesa.

Sasuke soltou uma leve risada e, pela primeira vez na noite, virou-se para a janela. Estava escuro, mas não foi a paisagem exterior que captou sua atenção, mas seu reflexo no vidro. Ali estava Uchiha Sasuke, com as bochechas coradas pelo álcool, a expressão relaxada e… olhar brilhante. Ele sabia que aquilo não era efeito do álcool, aquela expressão estava diretamente relacionada à pessoa diante dele, aquela que era seu destino.

Então ele sorriu e não achou tão estranho, afinal já tinha visto uma expressão semelhante naquela realidade alternativa. Sua mão, como já era um hábito de anos, tocou ligeiramente o metal frio do hitaiate riscado que Naruto havia entregado a ele tantos anos antes e o sorriso se ampliou levemente. Lembrou-se do que disse então: “Eu vou manter isso... até, realmente, resolvermos as coisas entre nós.”

Sentiu-se leve e percebeu que, enfim, as coisas estavam completamente resolvidas.

***********************

Vinte anos depois

O garoto estava sentado no píer, a cabeça baixa e o olhar distante. Havia passado a manhã toda treinando, mas quando um de seus companheiros de classe apareceu acompanhado do pai, ele resolveu sair daquele lugar e seguiu para o píer.

Ele não queria ter aqueles sentimentos negativos, aquela inveja de seu companheiro por poder treinar com o pai. Seu pai era Capitão Anbu, sendo seu time um dos mais solicitados para missões... Já sua mãe estava se preparando para assumir o posto de Hokage. Quem não estaria orgulhoso de ser filho de tão exemplares ninjas?

O jovem tentava ao máximo, mas não conseguia evitar sentir tristeza – e raiva – por quase nunca estar com eles. Ele fazia questão de rechaçar esses sentimentos ruins, pois sabia que eles faziam o melhor possível. Sua mãe sempre estava lá pra ele durante o jantar, enquanto seu pai buscava sempre passar as folgas com ele. No entanto, ambos pareciam sempre cansados e o garoto evitava perturbá-los muito.

Porém, havia momentos em que o garoto sentia-se tomado pela raiva e solidão.

Esse era um desses momentos. Muitos de seus amigos estavam treinando com seus pais para realizar o Exame de Graduação da Academia, mas tudo que o jovem tinha era ele mesmo. Nem sua tia podia ajudá-lo com o treinamento, já que ela era sensei da academia.

Suspirou e observou seu rosto refletido nas águas calmas. Quem poderia ajudá-lo com o treinamento? Levantou a cabeça e seus olhos automaticamente se voltaram para o Monumento Hokage. Um grande sorriso tomou conta do rosto jovial e o garoto se colocou de pé em um salto.

— Yoshi! — gritou empolgado e saiu correndo do local. — É melhor esse velhote se preparar!

O jovem correu a toda velocidade em direção ao centro da vila, pois sabia onde estaria aquele que poderia ajudá-lo com seu treinamento. Não parou nem ao tropeçar em compras, se chocar com pessoas ou ao escutar gritos revoltosos. Tudo que ele fazia era berrar um “sinto muito” e continuar avançando até seu destino.

Derrapou, ofegante, diante da conhecida fachada do restaurante favorito do “velhote”; mesmo estando fora conseguia escutar a voz escandalosa e madura do homem que tanto admirava. Sorriu ainda mais empolgando com a perspectiva de um mega treinamento e avançou correndo para dentro do lugar, mas acabou se chocando com um corpo maior e só não foi ao chão por ter sido segurado pelo braço.

— Pare de ficar correndo por ai, Nisshoku — a voz altiva o fez arregalar os olhos e olhar pra cima.

— Sasuke-ojii-san! — gritou empolgado e agarrou a cintura do homem de cabelos já grisalhos e rosto marcado pelo tempo.

Sasuke, mesmo um tanto desconfortável pela efusiva demonstração de afeto, retribuiu timidamente o abraço do garoto, mas logo se afastou para encarar os olhos azuis e brilhantes do neto.

— Por que estava tão apressado? — indagou, direto.

— Eu estava atrás do… — se interrompeu ao ver uma pessoa sair do Ichiraku e sorrir radiante para ele. — Naruto-jii-chan!

Naruto avançou até ele e bagunçou os rebeldes cabelos escuros, ainda sorrindo.

— Yo, Nisshoku-chan! — cumprimentou, aumentando mais ainda o sorriso, o que fazia as rugas no canto dos olhos se evidenciarem. — Não fique muito tempo conversando com o ranzinza do seu avô, ele vai acabar destruindo sua personalidade. Assim como fez com seu pai.

— Mas, jii-chan, o Sasuke-jii-san é pai da okaa-chan — rebateu, um tanto confuso.

— Ele foi o sensei do Boruto, e foi assim que seu pai aprendeu a assustar criancinhas. Por sorte, eu consegui passar tempo suficiente com a Sarada-chan pra que ela se tornasse mais simpática.

— Cala a boca, dobe — Sasuke rebateu automaticamente. — Não diga asneiras ao garoto.

— Escuta aqui, teme, eu não digo asneiras — Naruto apontou um dedo no rosto do outro. — Eu só digo a verdade, e a verdade é que você é um maldito velho ranzinza e por isso não aceitou competir comigo pra saber quem come mais rámen.

— Pelo amor de Kami-sama, usuratonkachi! Já passamos da idade de ficar apostando coisas idiotas.

— Para de arrumar desculpas, teme, você ‘tá é com medinho de perder! Gatinho medroso...

— Usuratonkachi… — Sasuke apertou o punho e trincou os dentes.

Logo os dois homens – os mais respeitados da vila, que deveriam ser sábios e sérios – começaram a discutir como se fossem adolescentes. Nisshoku acabou soltando uma gargalhada ao ver ambos se encararem tão ferrenhamente e se colocou entre eles.

— Jii-san, Jii-chan — chamou divertido e ambos olharam pra baixo, encarando os olhos azuis brilhantes. — Vocês poderiam ajudar com meu treinamento?

— Claro-dattebayo! — Naruto afirmou, empolgado. — Aposto que consigo te ensinar técnicas muito mais interessantes e poderosas do que esse teme do seu avô.

— Como você vai ensiná-lo a usar o Sharingan, usuratonkachi? — Sasuke rebateu, prepotente.

Nisshoku deu uma risada baixa ao ver outra discussão surgir. Desde que ele se conhecia por gente, seus avôs eram daquele jeito: discutiam por tudo, mas sempre estavam juntos. Sua mãe dizia que Sasuke-jii-san era muito sério quando ela era pequena, enquanto seu pai afirmava que Naruto-jii-chan era muito ausente e até um pouco estressado; o garoto não conseguia enxergá-los assim, já que os via sempre descontraídos e suas discussões eram divertidas. Foi sua tia, Himawari, que contou que o comportamento deles havia mudando bastante desde que Naruto havia deixado o posto de Hokage – passando-o a Konohamaru-sama – e que Sasuke havia parado de fazer tantas missões fora da vila.

A única coisa que Nisshoku achava esquisito é que seus avôs passavam mais tempo juntos do que com suas avós, mas ele não podia negar que se divertia muito com eles. Estando com aqueles dois velhos brigões, Nisshoku sentia sua solidão desaparecer; talvez fosse por isso que ele não desanimava com a ausência constante dos pais.

— Diz pra esse ranzinza que eu sou o melhor, Nisshoku-chan — a voz de Naruto o fez sair de suas lembranças e ele riu ao ver o olhar brilhante do avô.

— Não ensine meu neto a mentir, dobe — Sasuke disse debochado.

Nisshoku apenas negou com a cabeça e, aproveitando que estava entre eles, segurou a prótese de Naruto e a manga da blusa de Sasuke.

— Vamos treinar, velhotes! — gritou empolgando, os puxando com força.

— Quem é velho, pirralho? — Naruto rebateu aos berros, mas se deixou ser puxado.

— Esse garoto herdou sua falta de educação, dobe — Sasuke resmungou.

Os dois seguiram sendo puxados por Nisshoku, aquele que havia feito o caminho deles se cruzar mais uma vez, um elo que tornava o laço deles ainda mais precioso e forte. O que fazia questão de sempre unir o Sol e a Lua.


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Notas finais do capítulo

Notas:

Ritual do saquê: Neste ritual, o noivo e a noiva partilham sake sentados numa mesa em frente um do outro, olhando-se nos olhos, dão um gole ao mesmo tempo, tendo o cuidado de pousar os recipientes ao mesmo tempo. Isto é feito com o intuito de não morrerem um antes do outro, ou seja, o que colocar primeiro o copo na mesa será o primeiro a morrer.

Shushuya: (酒酒屋, Literalmente significa "Loja Saquê Saquê") é um restaurante Estilo chinês/bar de Konohagakure que vende sua própria marca de saquê e serve sua própria comida e pratos de boa cozinha, quando todo o alimento é colocado em uma placa grande e única. Jiraiya levou Tsunade ali para um drinque antes de sair da aldeia para se infiltrar em Amegakure.

Nisshoku: Eclipse Solar.

Hello again!
E ai? Curtiram? Descurtiram? Críticas? Elogios, Sugestões? Drama?

Podem ficar a vontade para comentar!

Até uma próxima!
Beijos Beijos