As Máscaras de Sakura escrita por Siryen Blue


Capítulo 2
Primeira Fase: Demônio


Notas iniciais do capítulo

Vamos lá!



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A minha casa é pequena e modesta, porém confortável. O meu quarto... Bem... Ele não era exatamente um quarto. Ficava no sótão, mas eu prefiro chamar de segundo andar.

Na verdade, minha casa tem dois quartos, mas quando eu completei 11 anos resolvi me mudar para o sótão. O motivo? Ha! Uchiha Sasuke, é claro.

Mudei-me no mesmo dia em que descobri que a janela do sótão dava de frente para a janela do quarto de Sasuke-kun.

Ainda lembro de como a mamãe ficou furiosa, de como papai riu e da desculpa esfarrapada que dei a Sasuke-kun. "Papai precisa de mais espaço para guardar os livros e instrumentos do vovô, por isso cedi meu quarto", falei.

Eventualmente, eu mesma contei que me mudei para ficar mais próxima dele. Só não contava com a sua cortina, quase sempre fechada.

Para mim, alguns dias eram diferentes de outros. Em certos dias eu ficava encarando a janela com cortina do Sasuke-kun, sonhando acordada. Em minha imaginação éramos só nós dois, e estaríamos juntos para sempre. Em outros, eu queria estar bem longe dele e de Konoha. Em um lugar onde pudesse ser só eu, sem dor nem mágoas.

Em certos dias sentia como se ninguém no mundo me entendesse ou me conhecesse de verdade. Sei que esse é um sentimento que quase todos os adolescentes possuem, mas eu não podia evitar.

Sasuke-kun disse que preciso seguir em frente. Mas para onde? Ou para quem? Meu amor por ele é tudo que já conheci. É tudo que sou. Se tirassem isso do meu coração, o que seria de mim, então? Ainda me restaria alguma coisa?

A insônia me mantinha acordada e eu não conseguia afastar os milhares de pensamentos em minha cabeça. Já estava tarde e eu precisava dormir. Tinha aula no dia seguinte.

Talvez um pouco de televisão me ajudasse a ter sono.

Em minha casa não tínhamos TV à cabo, então o jeito era se conformar com o sinal aberto.

Os mesmos programas de sempre. Os mesmos filmes de sempre. Encontrei um canal falando sobre celebridades e me interessei com a entrevista da atriz Hyuna. Ela era sempre tão engraçada e fofa, que desejei que a sua entrevista fosse mais longa.

Só que logo começam a noticiar os últimos acontecimentos no mundo dos famosos.

"E temos novidades sobre escândalo em que Sabaku no Gaara, o Demônio Adolescente, se envolveu na semana passada! Esse é o terceiro, só neste mês! Caiu na rede um vídeo do exato momento em que o superstar agride seu empresário. Assista!" Quando o repórter terminou de falar, começou a exibição do vídeo de um ruivo completamente ensandecido dando socos e chutes em um homem careca de meia idade.

Eu fiquei chocada. Sabaku no Gaara definitivamente não conhecia nenhum limite. E pensar que ele já foi considerado o orgulho do Japão, por sua fama internacional!

Com apenas 12 anos, Gaara debutou em Hollywood, na pele do protagonista August Rush, no filme 'O Som do Coração', que até hoje está entre meus preferidos. Desde então, o garoto japonês virou sinônimo de sucesso mundial.

Inúmeras campanhas publicitárias, papéis importantes em diversos filmes e finalmente, seu debut no mundo da música.

O primeiro e único álbum de Gaara foi lançado ano passado. Ele foi um dos maiores sucessos teens de que já se ouviu falar. Sua voz grave e composições maduras para alguém de sua idade conquistaram não só o coração dos adolescentes, como o respeito e admiração dos adultos e críticos.

As coisas começaram a desandar há mais ou menos três meses atrás, após seu aniversário de dezesseis anos.

Gaara foi acusado de envolvimento com drogas, e, para piorar, foi pego dirigindo embriagado. As festas passaram a ser frequentes demais em sua vida. Ele até foi preso por brigar com um segurança que não aceitou propina para lhe deixar entrar numa boate, afinal, ele é menor de idade.

Foi uma confusão, mas no dia seguinte ele estava solto, após pagar fiança.

Isso tudo sem contar os shows em que ele simplesmente deixou de aparecer, sem aviso prévio, e seu mau comportamento em premiações.

Os paparazzis eram um caso à parte, sempre perseguindo Gaara e arrancando palavrões e comportamentos agressivos do garoto. Ele não podia dar um passo para fora de casa sem ser completamente cercado de câmeras.

A soma de todos os escândalos em que Gaara se envolveu, deu-lhe rapidamente a fama mundial de "Demônio Adolescente".

Para mim, no entanto, as músicas do ruivo eram uma inspiração, e eu torcia para que ele sobrevivesse à essa fase e voltasse a compor canções. Ele é tão talentoso. Mas seu comportamento tem desapontado muita gente, inclusive a mim.

Como pode uma pessoa mudar tanto em tão pouco tempo — e para pior? O que Gaara poderia querer mais, afinal? Ele é incrivelmente lindo, talentoso, famoso, jovem e podre de rico. Qual o sentido de uma pessoa que tem tudo se destruir desse jeito?

"Eu não vou processar o Gaara." O programa passava agora uma entrevista com o empresário agredido, Stuart Camp. "Mas eu conversei com os pais dele e nós resolvemos tomar uma medida drástica." Disse, em inglês, enquanto as legendas em japonês apareciam na tela. Era um pronunciamento oficial de Stuart, em uma conferência de imprensa, realizada há três dias.

"E que medidas serão essas?" Perguntou o repórter americano.

"Logo todos vocês saberão." O empresário despistou.

"Você acha que o Demônio Adolescente tem chance de redenção?" Perguntou outro repórter.

"O que eu posso dizer é que Gaara precisa de paz, precisa deixar essa vida de festas que Nova York o proporciona porque isso está o estragando. Ele tem que colocar os pés no chão, e lembrar quem realmente é. Por favor, sejam compreensivos." Stuart termina a entrevista, mesmo em meio a inúmeras perguntas dos repórteres.

Pergunto-me o que farão com Gaara. Provavelmente o internarão em uma casa de reabilitação. Seja o que for, espero que funcione.

Finalmente o sono me atinge e eu desligo a televisão. Sabaku no Gaara se metendo em confusão não era realmente uma novidade. Avise-me quando ele parar de bancar o bad boy e resolver lançar um novo álbum. Isso sim seria algo grande.


*
*
*

O relógio marcava 6:15. Quem foi o infeliz que ativou o alarme em plenas férias?

Desliguei o barulho irritante e voltei a dormir.


*
*
*

"Acorda, Sakura!" Ouvi a voz de minha mãe e senti uma mão irritante me chacoalhando. Estranho, ela odiava subir aqui. Não a culpava. A minha "porta" para o sótão — quarto — era uma espécie de abertura tampada com madeira no teto. Tinha uma alça que você puxava para abrir, e de lá, tirava as escadas — estreitas e instáveis. Mamãe continuou me chamando. Ignorei. "O Sasuke está te esperando lá na frente."

Acordei.

"O Sasuke-kun?" Perguntei já pulando da cama, com meus olhos brilhando.

"São 6:45, Sakura! Ele quer saber o porquê de você estar atrasada. E eu também!" Mamãe falou, brava, com as mãos na cintura.

Droga! Meu subconsciente deve estar de férias ainda. Segundo dia de aula e eu preciso estar na escola em 15 minutos.

"Diga pro Sasuke-kun que eu saio em 5 minutos."

Desci as escadas, esgueirando-me para o banheiro e tomei uma ducha rápida, ao mesmo tempo que escovava os dentes. Não podia esquecer de me perfumar. Sasuke-kun disse uma vez que gostava de meninas cheirosas.

O uniforme da escola até que era bonito. A minha saia vermelha ia até os joelhos — mas algumas meninas usavam em um tamanho bem menor. A blusa branca tinha mangas curtas, o símbolo da escola e uma gravatinha vermelha em forma de laço. O blazer vermelho era opcional.

Vesti tudo o mais rápido que pude, deixando de lado apenas o blazer. Calcei meu tênis branco e saí de casa penteando o cabelo.

"Porra, Sakura!" Esbravejou Sasuke-kun. "Plena terça e você bancando a bela adormecida."

"Desculpa, Sasuke-kun." Guardei o pente na bolsa e fiz um rabo-de-cavalo. "Eu meio que dormi tarde ontem..."

"Hn. Vamos logo." Disse, emburrado. Sasuke-kun empurrou uma garrafinha de iogurte para mim. "Espero que você consiga beber isso enquanto anda de bicicleta." Sorri.

Sasuke-kun e eu costumávamos caminhar até o colégio. Meio que precisei insistir muito para irmos andando. Disse que era um exercício para emagrecer, que ia ajudar na minha dieta — não que eu realmente fizesse alguma, mas... Enfim, na verdade, era só mais uma desculpa para passar mais tempo com ele. No fundo, Sasuke-kun sabia disso.

Somente em ocasiões como a de hoje é que pegávamos as nossas bicicletas. E era bom. Muito bom. Eu adorava andar de bicicleta com o Sasuke-kun. Só que o percurso que nós fazemos em 20 minutos andando, na bike durava apenas 10.

"Desculpem, crianças. O portão já fechou. Esperem pelo segundo tempo." Disse-nos o porteiro.

"Mas são 7:07!" Sasuke-kun retrucou.

"Às ordens são claras. Ninguém entra após 7:05." O sorriso zombeteiro do porteiro chegava a irritar.

"Merda! Culpa sua, Sakura."

"Calma, Sasuke-kun." Disse, envergonhada. Até que a lembrança da aula de ontem me fez sorrir. "Primeiro tempo é química, e lembra que a Anko-sensei disse que você e a Ino seriam parceiros no trabalho de hoje? Então... Pensa pelo lado bom! Pelo menos você não vai ter que aturá-la. Provavelmente a professora vai colocar Ino em dupla com o Lee, o meu parceiro, e nós dois teremos que fazer o trabalho juntos!" Essa realização me encheu de alegria.

"Ah! Então foi isso?" A voz de Sasuke-kun estava séria e carregada de raiva. "Isso tudo foi mais um dos seus planos mirabolantes, não foi? Você não se atrasou porque dormiu tarde, mas sim porque quis. Para que você fosse minha parceira no trabalho de química." O olhar de Sasuke-kun, acusador e irado, amedrontou-me. Não porque achasse que ele fosse me fazer mal, mas porque foram raras vezes eu o vi assim.

Sim, eu já armei para que eu e Sasuke-kun fizéssemos trabalhos de escola juntos. Ou para que os encontros dele com alguma garota fracassassem. Algumas vezes ele até ria, em outras ficava bem chateado. Mas se de uma coisa eu tenho certeza, é de que ele nunca — nunca! — ficou assim com tanta raiva por uma travessura minha. E olha que dessa vez eu era inocente.

Meu coração se apertou.

"Não, Sasuke-kun. Dessa vez eu juro que eu—"

"Corta essa, Sakura. Tem vezes que você passa de todos os limites." Dito isso ele pegou a sua bicicleta e saiu, furioso.

Eu quis chorar. Quis seguir ele, mas não o fiz. Sasuke-kun nunca foi tão grosso comigo. Eu sei que às vezes eu o irritava... Mas qual a razão de ele ter perdido a cabeça daquele jeito? E o pior é que eu nem tinha feito nada — a não ser dormir demais.

"Se você quiser, pode sentar aqui dentro, para esperar o sinal bater. Eu deixo." O porteiro falou, com a voz em tom de compaixão.

"Não precisa, Tomoya-san." Disse, com a voz embargada. "Não precisa."


*
*
*

Eu vagava sem rumo, com a minha bicicleta. Já havia caído três vezes. Meu joelho estava sangrando, mas não tanto quanto o meu coração.

Era um trabalho com Ino, poxa!

Sasuke-kun deveria ficar feliz de poder trocar de parceira. Aquele comportamento dele não era normal.

Então, eu lembrei do dia de ontem no Old Arcade.

O jeito que Sasuke-kun parecia gostar de perder para Ino no Pac Man. Os sorrisos dela. E finalmente, a reação dele hoje mais cedo.

Ino...?

Seria essa a razão?

Eu já nem olhava por onde ia. A minha raiva era descontada na bicicleta. Estava pedalando tão rápido que o vento secava minhas lágrimas.

Não podia ser.

O Sasuke-kun e a Ino...?

Não! Não fazia nenhum sentido.

Eu sabia que precisava pensar com a cabeça, mas meu coração gritava uma verdade que eu tinha que negar.

"Que besteira!" Revolto-me. "Isso não faz sentido! Isso não faz nenhum—"

Um baque.

De repente eu estava voando.

Mas eu caí.

A dor foi horrível. Eu queria gritar mas não conseguia.

"PORRA!" O grito não era meu. Era de uma voz grave, masculina. Estranhamente familiar. "Você é maluca, garota? Como que você se joga na frente do meu carro desse jeito?"

Senti uma mão em meu rosto, puxando-me em alguma direção que não identifiquei.

A claridade do sol foi coberta por um rosto, que entrou em meu campo de visão. Tentei reconhecê-lo, mas ainda era claro demais. A minha visão estava embaçada.

"Você consegue me ouvir?" A voz familiar disse, novamente. "Seu rosto está banhado em lágrimas." Falou, mais em uma observação para si mesmo do que qualquer outra coisa.

Eu queria responder, porém não conseguia.

Tudo o que eu via era vermelho. Vermelho vivo.

"Porra! Porra! Você vai ficar bem! Porra!" E então, o estranho familiar me pegou em seus braços.

Seu cheiro me invadiu.

O perfume dele era muito bom, mas não foi isso que me dominou. Ele tinha um cheiro próprio. De homem. Um cheiro que perfume nenhum podia reproduzir.

Ele era forte. E em seus braços me senti alta. A dor se amenizou.

Vermelho. Eu só via vermelho.

E então ele me olhou e seu rosto era tão bonito e familiar que me fez tremer. Tão lindo. Tão, tão... Lindo.

Mas então, eu vi seus olhos.

Verde. Agora eu também via o verde.

Vermelho e verde.

Mas o verde não era vivo como o vermelho. Era misterioso e profundo. Tão, tão... Profundo. Eu me perdi.

Aqueles olhos me olhavam com preocupação.

Algo quente escorreu pelos meus olhos.

"Não chora." O estranho familiar falou. Eu estava chorando..? "Você vai ficar bem, prometo."

E então, finalmente o reconheci.

Primeiro veio o choque.

Depois percebi... Talvez eu tivesse batido a minha cabeça forte demais.

Alucinando. Eu estava alucinando.

Mesmo assim, eu o via. Lindo. Tão lindo.

E ainda que ele fosse considerado a encarnação do perigo, nunca havia me sentido mais segura do que naquele momento.

Eu senti meu coração saltar e de repente eu perdi o ar.

Não, não foi perdido. Foi roubado — pelo o olhar dele.

Antes de apagar, pensei que não havia demônio mais bonito que Sabaku no Gaara.


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Notas finais do capítulo

Na vida real, August Rush é interpretado pelo ator britânico Freddie Highmore, no filme "O Som do Coração". Mas, nessa fanfic, faz de conta que o papel é do Gaara, ok?

XOXO