O neko de cabelos e olhos escuros caminhava alegremente pelo longo corredor daquele nível. Ele girou distraidamente seu taco de baseball na mão duas vezes antes de acomodá-lo de forma distraída sobre os ombros, segurando-o com uma mão em cada extremidade.

Estava muito satisfeito e seu andar gingado com o queixo apontado para cima, orgulhoso, deixava isto muito claro para todos que o conheciam. Aquele estava sendo um dia muito calmo; anormalmente tranquilo.

Ele era o representante do ‘big boss’ por ali e se tudo estava tão calmo era porque estava fazendo o seu trabalho muito bem, obrigado. Não havia nenhuma história tentando pular de sua categoria para outra mais popular, nem personagens proibidos caminhando por ali tentando abrir uma das portas que havia trancado por segurança.

É. O chefe havia lhe pedido apenas para manter aquela sala segura e aqueles personagens estranhos longe dos demais. Estava conseguindo fazer isto bem até uma menina de propaganda de hotel começar a reclamar das acomodações, listando todas as coisas daquela sala que ela usaria como fundamento para dar uma nota baixa para as nossas acomodações.

Ah como se lembrava daquele dia. Os gritos da menina quase fizeram Misaki chorar enquanto tentava explicar com seu jeito doce que a categoria a qual ela pertencia não era permitida no site e que compreendia que a sala de categorias proibidas estava cheia de clones dela e outros personagens estranhos, mas que era lá que ela deveria permanecer até segunda ordem.

Não foi um dia fácil; também não foi um dia tão incomum. Mas Seiji admirava demais o trabalho excepcional que Misaki fazia ali, havia aprendido tudo tão bem e tão rápido...

Detestava vê-la chorar por causa dos desordeiros. Oh sim, Misaki era tão doce e gentil, ver suas lágrimas despertava todos os genes de ‘cachorro louco de Seiji’ que eram bug de criação, afinal como já foi dito, Seiji era o representante do chefe ali. Havia sido feito à sua imagem e semelhança.

O ‘bug’ da fúria descontrolada ele desconhecia até ver Misaki chorar pela primeira vez. Por que foi mesmo?

Ah sim, um trio de bruxos estava discutindo com um casal de vampiros sobre popularidade e lealdade de seus fãs. Misaki não tinha nada a ver com o assunto, só queria manter cada personagem dentro da sala de sua categoria. Este era o seu trabalho, havia sido criada para lhe ajudar ali dentro.

Foi criada depois de si apesar de os usuários do site conhecerem apenas ela. Não sentia inveja disto, sabia que o chefe deveria ter feito esta escolha para ver as usuárias fazendo cosplay da Misaki nos eventos. Afinal para Seiji era completamente normal todas as pessoas acharem a aparência de Misaki a coisa mais graciosa e fofa deste mundo, por que não no outro também... sabe no mundo do chefe.

Seiji parou no meio do longo corredor ao perceber que a presença de Misaki ali tinha o deixado mais calmo também. É. Tão mais calmo que no fatídico dia em que a menina chata da propaganda, mais chata ainda, de hotel havia quase feito aniki chorar ele havia se controlado e apenas trancado a sala à chave e cadeado de segurança. Se fosse no passado teria usado seu super taco de baseball para desfragmentar aquele personagem para sempre.

Aquela sala só servia pra pesar na quantidade de dados do back up diário dos dados do sistema. E sim, era o seu trabalho organizar os dados para o back up. Ele não tinha a mesma paciência que Misaki, falava uma, duas, três, quatro, no máximo cinco vezes e se o personagem não ouvisse, sentiria o poder do seu bastão. Tinha uma coisa com o número cinco, não entendia aquilo também.

Talvez não tivesse sido programado para entender, apenas para fazer. Mizaki não, ela era mais tolerante. Tão amável que não poderia ser humana jamais, afinal nenhum ser humano faria Seiji sorrir no meio daquele corredor daquele nível em questão. Mesmo que as salas estivessem dispostas pela ordem crescente de seus nomes e cada nível tivesse apena suma parte de cada categoria, aquilo não era justo.

Seiji sabia que dava pra ouvir as coisas que aconteciam nas salas vizinhas do lado de dentro de cada quarto. Era muito injusto para uma categoria com apenas duas fanfictions ficar do lado da sala com aquele time barulhento de basquete que comemorava cada review recebido como se fosse um ponto no último segundo de jogo e cada nova fanfic como se fosse o anúncio de uma nova temporada no anime famoso.

Como se fosse um chamado mágico, Misaki surgiu no corredor. Ela acompanhava um pequeno grupo de personagens que voltavam cabisbaixos e contra vontade para dentro de sua sala. Não estava tão longe assim, dava para ouvir o que era dito ali.

– Isto não é justo, nós temos demônios, shinigamis e personagens maravilhosos. – Disse o moreno alto e inconformado. – Aos ecos de vários “eu sei” que Misaki dizia baixinho.

– Eu sou um nobre lord, não deveria ser submetido a este tipo de situação. – Reclamou o menor de todos ajeitando seu tapa olho, esperando que seu mordomo abrisse a porta para sua passagem.

– Não reclame garoto, pelo menos todo mundo faz você ser pego pelo bonitão aí nas fanfics. Eu como se já não bastasse a autor do manga, nem mesmo as escritoras me deixam ser pegado pelo Seby. – A criatura de cabelos vermelhos choramingou a fim de fazer drama.

– Tem fanfiction de vocês dois, sim. – Desdenhou o pequeno mal-humorado antes de finalmente entrar sendo seguido pelo ruivo que queria encontrar a tal fanfiction mencionada pelo humano de seu amado demônio.

– Eu sou um demônio que se faz de mordomo e ainda tenho que ler fanfctions que me fazem ter sentimentos por aquele pirralho mimado e nem um review eu...

– Xiu... Relaxe um pouco, veja o mural – Misaki disse apontando para um grande telão no fundo do interior da sala – A visualizações e os acompanhamentos cresce todos os dias.

E a aura daquela personagem pareceu se tranquilizar, deixando sua energia mais amena aos olhos expectadores de Seiji. Adorava a ver trabalhando, Misaki sempre resolvia qualquer problema. Sorriu ao ver a neko de cabelos cor de rosa suspirar alto após fechar a porta atrás do último personagem, e se escorar contra a porta de forma cansada.

– Queriam ir embora? – Perguntou o mais velho vendo-a apenas fazer movimentos afirmativos com a cabeça.

Aquilo não era incomum. Havia uma depressão muito estranha que atingia alguns personagens que às vezes decidiam de uma hora para outra, simplesmente ir embora. Seiji também não era capaz de entender aquilo, adorava trabalhar no Nyah. Parecia que aqueles personagens não sabiam que se eles fossem embora, ele ou a Misaki teriam que avisar uma das ajudantes do chefe para colar aquele aviso feio de fanfiction excluída na página da história.

Personagens não podem abandonar suas histórias, nem de férias. Nem nos feriados. Ora onde já se viu a fanfiction ficar sem o personagem.

– Devia ir ao andar da categoria de bandas. Está um caos, tem personagens que ainda estão despertando, outros querem ir embora porque a fanfiction já estava concluída quando o chefe mandou acordar os personagens e ligar o telão da sala de novo, aí estão sem nenhuma visualização até agora e estão revoltados. Nham. Tem alguns que estão nervosos, pois estão revivendo sua história enquanto o autor atualiza a evolução da fanfic e acham que estão enlouquecendo. Outros estão se sentindo completamente ignorados por seus criadores.

– Ah pode deixar aquelas estrelinhas para mim Misaki-chan, eu coloco ordem naquele galinheiro.

– Nham. Arigatou gazaimasu, sempai. – Disse a menina com um alívio verdadeiro e uma reverência completa de agradecimento. – Pelo menos eles estão tão perdidos que ainda nem voltaram a brigar pelos shipps, vou ajudar você para terminarmos isto antes que eles voltem a se esquecer que fanfic de banda não tem casal canon.

– Hn.. – Concordou o mais velho ajustando os óculos sobre o nariz para disfarçar o constrangimento que lhe acometia toda vez que a menina lhe fazia uma daquelas reverências completas e cheias de respeito e gratidão.

Lado a lado eles caminharam a fim de chegar em um dos elevadores que ficam no final de cada corredor para descerem até a categoria mencionada. Seiji ainda caminhando com todo seu orgulho expresso e o bastão de baseball sobre os ombros e Misaki com as duas mãos unidas atrás do corpo, sorrindo apenas por caminhas ao lado do senpai.

Gostava tanto da companhia de Seiji, sentia-se muito feliz ao seu lado. Jamais diria aquilo, é claro. Nham. Nham. Estavam ali para trabalhar e manter os personagens do Nyah! Fanfictions em seus devidos lugares.

Estavam quase chagando ao elevador do lado esquerdo do fim do corredor quando uma luz vermelha escura, quase vinho ascendeu na TV que ficava suspensa e mostrava as estatísticas do site, fazendo o desenho de uma patinha se destacar enquanto a luz piscava.

– Ee? – Misaki olhou para aquilo com desconfiança, suas orelhinhas logo levantaram mostrando que a neko estava atenta.

– Etto... O chefe criou uma nova categoria? – Seiji perguntou mais para si mesmo do que qualquer outra coisa.

Não era um novo livro, ou um novo anime ou qualquer uma dessas coisas, era uma nova categoria mesmo. Aquilo fazia um ponto na base de sua orelha coçar de curiosidade, mas não demonstraria. Afinal ele era o senpai ali, não podia passar vergonha na frente da Misaki demonstrando o quanto estava curioso e empolgado em conhecer esta nova categoria.

Oh sim, o trabalho ali era árduo e nunca terminava, mas poder assistir às criações de imaginação sem limites dos usuários era a melhor recompensa que havia. Estavam sempre assistindo alguma fanfic nos telões das salas.

Misaki não, ela não se importava de demonstrar todo o seu entusiasmo diante a novidade. Seiji via em sua visão periférica que a cauda da neko estava completamente ereta com a pontinha balançando, suas orelhinhas estavam atentas e ela emanava uma energia eletrizante de curiosidade.

Ah sim, nekos são criaturas curiosas por natureza. Mas apenas Miasaki era tão adorável.

– Senpai.. Senpai olha está lá! Depois dos ‘livros’ e antes das ‘originais’.

– Etto.. vamos até lá Misaki. Se a categoria é nova os personagens terão dificuldade para se acharem aqui. – Disse Seiji entrando no elevador, sendo seguido pela companheira que ainda concordava com movimentos de cabeça com o que ele tinha dito.

– Qual é o nome da categoria? – Misaki se enfiou por baixo do braço estendido de Seiji que tinha acabado de apertar o botão, a luz piscando e a TV meio longe tinham deixado difícil de ler.

– Nyah? – Disseram ambos ao mesmo tempo, ouvindo o ‘plim’ das portas do elevador se fechando à sua frente.

– Senpai, o que isto significa? – Perguntou a menina.

Mas não obteve resposta, Seiji preferiu ficar em silêncio à responder que não sabia. Não entendiam o que aquilo poderia significar. Nyah era o nome de sua casa e não uma categoria para fanfic.

A resposta veio muito mais rapidamente do que o casal de nekos poderia prever. Assim que as portas do elevador se abriram novamente cerca de meia centena de Misakis e Seijii falavam ao mesmo tempo no meio do corredor pequeno, em que havia apenas uma porta.

Os dois olharam de forma petrificada para aquilo. Muitas Misakis ficam dizendo apenas “nham nham” e todos os Seijis tinham um ameaçador taco de baseball em mãos. Eles estavam quase brigando entre si para defender suas Misakis. Algumas Misakis choravam, outras estavam com medo e outras estavam animadas gritando que “Seiji-senpai era o melhor”.

A verdadeira ainda se mantinha ao lado, quase atrás, do seu senpai verdadeiro sem entender muita coisa daquilo, mas gostando das várias histórias que se passavam ao mesmo tempo no telão. Assumindo o tom completamente rubro ao ver que em uma ela roubava um selinho do neko mais velho enquanto o mesmo cochilava.

Seiji por outro lado, estava segurando seu taco com uma mão e usando a outra para manter Misaki cada vez mais atrás de si. Aquilo era o caos. O que era aquilo? Por que havia tantos Seijis olhando com carinho para MIasaki? Sua Misaki. Sua Misaki. Não dividiria ela nem mesmo com outro Seiji.

Não entendia aquilo. Como assim ali estava cheio de Seiji expondo sentimentos vergonhosos por Misakis fofas, mas não tão fofas como a sua Misaki.

– Seiji-senpai, eu acho... que nós somos o shipp desta categoria. – Disse a neko com cuidado, colocando a mão sobre o ombro do mais velho para acalmá-lo.

Logo em seguida Misaki tomou a frente, passando por todos os clones fictícios deles dois até chegar na porta em que havia uma patinha vermelho escuro, escrito ‘Nyah’ em dourado. Abriu a porta e olhou rapidamente para as acomodações daqueles personagens antes de se voltar para o corredor e explicar para aqueles gatinhos que aquela era sua nova casa, e que encontrariam tudo o que precisavam no manual do personagem.

Mais calmo Seiji apenas observou todos os pares dando suas mãos e entrando na sala. Não gostou de pensar que eles pareciam adestrados como cães, mas ignorou o assunto. Também jamais entenderia como nasceu neko se seu criador era chamado de ‘mad dog’. A única coisa que importava naquele momento era que aqueles eram apenas personagens de criações ficcionais.

Seu segredo estava seguro, Misaki jamais descobria que todos aqueles Seijis expressavam sentimentos verdadeiros. Lembrou-se que tinha uma categoria em pleno caos para organizar, mas seus olhos não conseguiram deixar para trás a imagem de Misaki sentada no meio do corredor de frente para a porta fechada, sua cauda balançava de forma calma e feliz.

Ele sabia que ela estava assistindo alguma fanfiction. Somente eles tinham este poder de ver através das portas das categorias.

Quando viu já estava sentado ao seu lado, assistindo a mesma história. Riu muito do seu eu fictício que tentava proteger Misaki de zumbis.

Podia gostar muito daquela nova categoria. Deixaria para organizar a outra categoria depois.

Por hora estava feliz por ela estar tão concentrada na história que nem percebeu seu braço se colocando protetoramente à frente de seu corpo quando outro zumbi apareceu do nada para pegar a Misaki da fanfic.