Valentino‏ escrita por TM


Capítulo 3
Cena - II




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A medida que a noite ia engolindo a cidade de Florença, a minha ansiedade aumentava. Eu sabia que a qualquer momento Cesare poderia entrar pela porta e me surpreender com aqueles olhos castanhos. Antes do retoque final, me encarei no espelho: Agora não via mais a menina de alguns verões atrás, agora via a mulher que com a ajuda de Cesare eu tinha me tornado. Cecília me ajudou com o pó de arroz, e ela me disse que se beliscasse as bochechas, elas adquiriram um tom rosado, e eu ficaria como uma doce boneca.


A campainha tocou, e antes que eu pudesse descer as escadas e ser a primeira a ver a família Borgia, Cecília já tinha feito isso por mim; ela era rápida como um gato, e eu a admirava por isso. Meu pai desceu as escadas e pediu que eu esperasse por seu chamado, e assim o fiz. Enquanto ele não me chamava, batia meu pé nervosamente e andava de um lado para o outro, pensando nas palavras certas que iria dizer a Vossa Santidade.

– Giorgia, por favor, se apresente aos nossos convidados. - Ouvi meu pai dizer com um tom alegre.

Desci nervosamente as escadas com medo de tropeçar em algum degrau e algum estrago acontecer, mas graças ao bom Deus, nada disso aconteceu. Quando finalmente ergui meus olhos para ver quem era o dono dos olhos que me seguiam, fiquei assustada por não ser de Cesare, mas sim de seu pai, do Papa de Roma.

Os três - O Papa Alexandre, Cesare e Lucrezia - estavam enfileirados esperando me conhecer. Cesare me olhava disfarçadamente, conversando com meu pai e tomando um bom gole de vinho espanhol, enquanto dona Lucrezia me olhava com certa arrogância, e percebi o quanto éramos parecidas - se nos vissem nas ruas do Vaticano, provavelmente diriam que éramos irmãs gêmeas. E o Papa! Ah, o Papa! Esse me devorava com o olhar e não fazia questão de esconder isso de ninguém, até de seu filho, Cesare. O mesmo ficou enciumado quando percebeu que além dele, outros homens também me desejavam, e nesse momento, meu ego ficou tão inchado que eu mal podia conter meu sorriso.

Passei primeiro em frente a dona Lucrezia, que me lançou um olhar questionador, mas depois abriu um longo sorriso e trocamos nossas referências, depois, passei em frente á Cesare, como sempre, ele estava vestido de preto da cabeça aos pés, tentei fingir que não o conhecia, e que nunca tivemos uma ligação, mas quando ele tocou minha mão e depois a beijou, foi quase impossível que isso acontecesse. Instantaneamente, meus pés ficaram bambos e eu senti que poderia desmaiar a qualquer momento, mas continuei minha pequena caminhada até chegar ao Papa.

Não que ele fosse feio, não, de maneira alguma, até que pra um senhor de 60 e poucos anos ele tinha um corpo de atleta, mas seu olhar me questionava de certa forma que eu não pude entender o que ele estava querendo tomar de mim. Depois de arquear a sobrancelha, ele se virou ao meu pai e disse:

– Sua filha tem quase os mesmos traços que a minha! Mas, sejamos realistas, essa Giorgia tem a beleza concedida pelos deuses. - Ele esticou minha mão e a beijou. - É realmente uma beleza raríssima.

– Como se eu não soubesse disso, Sua Santidade! Giorgia tem recebido muitas propostas de casamento, mas nenhuma como dote adequado, sabe? Não que minha filha possa valer tanto quanto a sua, não de forma alguma, mas também não quero "trocá-la" por uma miséria. - Eu bufei no mesmo instante. - Não que eu e Giorgia não conversamos sobre isso, claro que sim, e como ela concordou, ela irá conhecer seu noivo antes de pode-lo chamar de marido.

– Igual eu fiz com Alfonso. - Lucrezia exibiu um sorriso orgulhoso de recordar aqueles velhos tempos. - Isso foi de grande ajuda para mim, para saber onde eu estava me metendo. Com quem os Borgia formariam uma aliança, uma família.

– Mas, Machiavelli, você não quer que eu arrume um noivo da França para a sua filha? Posso procurar até um príncipe quando estiver por lá. - Não, o único noivo que eu quero é você! - O que acha dessa ideia, Giorgia?

– Sua ideia é tentadora, Cesare, mas agradeço mesmo assim. Eu vou procurar algum noivo que esteja mais perto de mim e que seja acessível a qualquer momento, e que também, fale a minha língua. Não que eu não saiba outras línguas como o latim e o grego, mas para mim, o italiano é fundamental. - Percebi que havia uma ponta de interesse em seu olhar, então continuei. - Também acho considerável que o cavalheiro trate com respeito e que deseje sua dama como nunca desejou outra mulher, para que assim não se tenha traição e conspirações ao redor do casal, e que como assim em tantas histórias infantis, eles sejam, finalmente, felizes para sempre.
Mudando de assunto, quando o senhor irá partir para a majestosa França?

O Papa apontou seu dedo indicador para mim e com um sorriso no rosto, disse:

– Essa menina tem futuro! Olha o que ela diz! Poderia ser muito bem outra filósofa, e com certeza eu a apoiaria nisso... - Seus olhos brilharam quando encontraram os meus, me deu um certo enjoo que tive que fazer muito esforço para não demonstra-lo.

– Eu vou para a França amanhã de manhã e - Cecília o interrompeu.

– O JANTAR ESTÁ NA MESA! Primeiro os convidados, por favor. - Cecília gritou da cozinha, percebendo a conversa que tinha interrompido, ela abaixou a cabeça e fez uma prece silênciosa. - Por favor, me perdoem.

– Claro que sim. - Eu sorri e coloquei uma mecha de cabelo atrás de minha orelha. O assunto estava começando a ficar interessante. - Por favor, Cesare, continue.

Lucrezia, Nicolau e até mesmo o Papa estavam a caminho da mesa, deixando Cesare e a mim a sós. Eles pensavam que era apenas uma conversa com uma adolescente curiosa e um nobre cavalheiro, mas não era assim, nós dois sabíamos que não.

– Giorgia, depois do jantar saia disfarçadamente da mesa e me encontre lá fora, no jardim. - Essas foram suas últimas palavras antes de me abandonar perdida em pensamentos e ir em direção a mesa, sorrindo.

Cheguei a mesa com um sorriso bobo no rosto, sabia que todos iam perguntar o por quê, e eu estava tentando bolar alguma mentira, mas era tudo em vão. Tudo que eu conseguia pensar era em Cesare e em sua fama, dizem por aí que ele mesmo matou seu irmão, Juan, o motivo disso tudo? Ciúmes. O que tinha de beleza tinha de violento; O duque Valentino era famoso por isso e se orgulhava de sua fama.

– Então, minha filha, o que você e Cesare estavam conversando que você não conseguiu tirar esse sorriso bobo do rosto? - Meu pai disse aquilo enquanto todos nós estavamos comendo, tinha que inventar algo, e rápido.

– Cesare e eu estávamos conversando sobre - Pensei rápido. - a beleza de Roma. Estou muito ansiosa para conhecer meu futuro lar. Ele disse que ama tanto a cidade quanto a sí próprio. Roma é famosa pela suas belas artes, pai, e isso eu vou colocar na lista "Coisas para ver antes de morrer". - Forcei um sorriso.

–Ah, sim! Que bom que Cesare te disse isso. Ainda mais agora que eu estou patrocinando parte das artes. - O Papa não desistia mesmo. Ele me deu um sorriso que fez com que meu estômago desse voltas. - Minha filha e La Bella Farnese foram retratadas com um pintor que qualquer realeza merece ter, se é que me entende. Você gostaria de ser retratada um dia, Giorgia? Pediria que alguém da guarda papal viesse buscar-te pessoalmente, se necessário.

– Eu agradeceria, Sua Santidade.

– Óh, pra você eu sou apenas Alexandre, minha doce criança. - Percebendo o rumo que aquela conversa ia dar, coloquei as mãos em minhas têmporas, fingindo uma dor de cabeça.

– Tudo bem minha filha? - Nicolau se levantou rapidamente e veio em minha direção mais rápido do que imaginava. Lucrezia arqueou uma sobrancelha, gostando do que estava vendo. Gostando de me ver "sofrer".

– Vou tomar um pouco de ar, pai. Não estou bem. - Cambaleei quando consegui levantar, Cesare deu um sorriso de canto, apreciando o espetáculo. Nicolau tentou se aproximar, mas ergui minha mão, pedindo que não fosse. - Por favor, preciso de alguns minutos sozinha, é muito importante pra mim. Tenho que absorver toda essa informação que o senhor me deu essa noite. Quando estiver melhor, eu volto. Prometo.

Assim, eu continuei a fingir, e desta vez, não olhei para trás. Mas posso dizer, com toda a certeza, que ainda sim sentia os olhos do Papa Borgia em meu corpo, e isso me causava náusea. Cecília tombou comigo, e preocupada, perguntou:

– O que você tem menina? - Eu dei um sorriso de canto.

– Eu vou me encontrar com Cesare Borgia. - Sorri ainda mais. - Mas não fale nada para meu pai ou para algum convidado, eles pensam que eu estou saindo por que estou com dor de cabeça. Te peço um favor, Cecília. Enrole o meu pai. Invente histórias. Sirva comidas. Cante, dance. Mas por favor, não deixe ele estragar minha noite com o meu príncipe encantado.

– Vou fazer o que estiver ao meu alcance, princesa. - Com um sorriso maternal no rosto, ela caminhou em direção a mesa, mas á essa altura eu já havia corrido o mais rápido que pudia para o jardim.

Quando me dei conta, Cesare já estava lá. Quase não deu para notá-lo em meio a escuridão, me sentei em um banco para retirar os meus sapatos e depois olhei para ele. Mas... Onde estava Cesare? Ele sumiu.

Senti uma onda de calor no meu pescoço e eu sabia que era ele.

– Você é a mulher mais bonita de toda a Itália, sabia disso? - Dizia ele, beijando meu pescoço.

– Pra quantas mulheres você já disse isso? - Me forcei a sorrir.

– Você não é como as outras, você é diferente. - Ele me virou bruscamente e me fez o encarar. Seus olhos estavam fixados nos meus, e ele acariciava meu rosto com uma das mãos. - Você é uma Machiavelli.

– Então sou melhor que as outras por causa de um nome? - Arqueei uma sobrancelha. - Muito gentil de sua parte, mas não, se quiser outra Machiavelli tenho uma prima - Ele me puxou pra mais perto.

– Eu quero você, Giorgia. - Ele me beijou com tanta intensidade que fiquei sem ar. - Você precisa de um apelido, o que acha de arrumarmos um? Giorgia é um nome muito complexo para dizê-lo todo minuto que eu for te chamar.

– E qual seria esse apelido? - Dei um sorriso.

De repente, ouvimos passos vindos em nossa direção, rapidamente Cesare se escondeu no meio das sombras, me deixando no meio do jardim sozinha. Vi uma sombra vindo até mim, mas não conseguia dizer quem era. Só quando se aproximou mais e eu pude sentir o cheiro de sua arrogância. Lucrezia.

– Olá, bastarda.

– O que você quer? - Perguntei sem rodeios.

– Quero que você fique longe do meu irmão, do meu pai, da minha família, da minha Roma. Não sei que tipo de feitiço você está jogando neles, mas quando eu descobrir, irei mandá-la para a fogueira, e lá estarei eu, toda sorridente vendo você queimar.

– Não são meus os boatos de que sou uma bruxa, não é mesmo, Lucrezia? - Eu dei um passo adiante, estava ganhando poder. - Se minha beleza os enfeitiça, não posso fazer nada a esse respeito, á não ser ficar parada, e é exatamente isso que estou fazendo. Como você disse, sou uma bastarda e não posso fazer nada pra mudar isso, mas afinal, disso toda Florença já sabe.

Roma sabe que você mantem relações com os empregados? - Ela me encarou com desdem e um certo medo. - Não queira me ter como inimiga, Borgia. Sou mais influente e melhor do que você pensa.

– O fato de você ser uma Machiavelli me dá náusea, Giorgia. - Ela me deu as costas enquanto eu sorria. Eu ganhei.


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