Felicidade não era, de fato, o que sentia no momento, mas era o mais próximo que havia conseguido sentir nos últimos tempos. Podia ser algo como conforto e até uma ligeira paz, mas alegria não.
Esse fato não se deve a nada menos, nada mais que crianças.
Crianças em seu estado terminal, em seu momento final.
O que eu quero dizer com isso? Que fui obrigada a servir "voluntariamente" como assistente em um hospital especializado em câncer; há alguns meses, minha depressão voltara, o que deixou minha família "preocupada".
Resumindo: eu limpava quartos, corredores, salas e outros e ajudava em uma coisa ou outra quando precisam de mim; não vou negar, era um trabalho nojento na maior parte do tempo, mas que possuia pontos positivos que eu nunca imaginei que existiam.
Ele tinha a Alessia.
Alessia tinha leucemia, estava em estado terminal, passando por seções de quimioterapia frequentes. Ela não tinha cabelos. Ela tinha uma auréola.
Alessia jazia num quarto que eu fora designada para limpar, na maioria das vezes ela estava lá, observando meu trabalho enquanto expunha suas ideias e conceitos sobre tudo, sempre abordando-me com um assunto diferente. Ela sabia que nós duas estávamos morrendo, sabia, porém, que nossa morte se aproximava por motivos diferentes.
"Você é tão bonita" ela me disse, com o sorriso infantil que caía-lhe bem.
"Só impressão sua" eu respondi docemente.
"Deus nos fez como ele. Todos somos bonitos ao nosso modo, ao mesmo tempo que todos somos tortos" disse ela com convicção, seu modo de pensar supreendeu-me.
"Tortos?" já lembrava de vários livros que li no passado, todos eles com definições diferentes do ser torto.
"Tortos. Somos tortos por não reconhecer as bênçãos de Deus em nossas vidas, o fato de acordar para mais um dia e ter saúde para levantar é uma coisa que só Deus pode nos conceder, não carregue esse olhar de desamparo no rosto, eu estou vendo o Senhor ao seu lado neste momento."