O preço de um olhar escrita por Cíntia


Capítulo 1
1-Festa na São Bernardo




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/618009/chapter/1

O preço de um olhar - Capítulo 1

10 de dezembro de 1896

Por Laura

Eu estava terminando de me arrumar em frente ao espelho. Meus olhos se mantinham fixos num mesmo ponto... Não queria acabar, pois sabia o que me aguardava...

Minha mãe, D. Augusta Cavalcanti Viana, como ela gostava de dizer com toda pompa, queria me apresentar a um rapaz. Um rapaz que ela nunca tinha visto, mas por ser o filho único da sua recente amiga, Ritinha, e do Senador Cristóvão Albuquerque, ela achava que seria o meu pretendente dos sonhos.

O rapaz também era amigo e colega do meu primo Alvim. Ser amigo de Alvim era uma grande vantagem pra minha mãe. Mas como sabia que meu primo não era flor que se cheire, algo que D. Augusta em sua visão distorcida não enxergava, isso contava contra o rapaz. Podia ser um cafajeste como meu primo, o que era um fato mais preocupante para mim do que à incerteza quanto a sua aparência.

Eu também ainda era muito jovem e não sabia o que queria da vida. Completara 13 anos há menos de um mês, e somente há poucos meses tivera a minha primeira regra. Não me sentia preparada e não queria namorar, ainda mais ter algo mais sério como minha mãe queria.

Os rapazes não me atraiam tanto. Tinha uma vontade muito maior de ler bons livros (ler era uma grande paixão, mais ainda quando se tratava de livros que minha mãe achava inapropriados), descobrir as verdades do mundo, imaginar os lugares e as pessoas das histórias que lia, brincar no quintal da minha casa, escrever em meu diário e de ajudar meu pai, no atendimento de seus pacientes (ele era um ótimo médico), do que ir em festas e conhecer pretendentes.

Era tedioso ter que conversar com moços cheios de si e possuidores de ideias conservadoras. Rapazes que achavam que o sonho de toda mulher era arrumar um pretendente, que todas sonhavam em encontrar o amor como nos folhetins românticos ou até mesmo apenas um marido, que não passava nada mas cabeças femininas além da ideia de casar, ter filhos, comprar joias e roupas bonitas.

Eu não era assim. Na verdade, ainda não sabia o que queria, mas uma coisa era certa, eu almejava fazer algo diferente, diferente do que pensavam que uma mulher tinha que ser ou querer. Achava que podia ser mais do que apenas esposa e mãe. Mais ainda, que era muito nova, cheia de dúvidas para pensar em casamento, ou ter uma decisão tão definitiva do que seria o resto da minha vida.

Devagar, eu escovava o meu cabelo, era como um pretexto pra pensar nisso tudo, mas fui acordada desses pensamentos ao escutar a voz da minha mãe:

–Laura, filha... Os convidados já estão chegando. Termine de se aprontar.

Eu olhei no espelho e vi que ainda não estava pronta. Faltava um detalhe em meu cabelo, uma fita, presilha ou outro enfeite. Por mim, eu iria com o cabelo solto, ou o amarraria de qualquer forma. Mas era uma festa na fazenda dos meus pais, cheia de convidados “ilustres” e resolvi fazer essa concessão.

– Estou quase pronta, só faltam uns detalhes.

– Tá bom... Mas não demora muito. Fernando Albuquerque deve estar chegando. Ahh... E esteja linda.

“E esse esteja linda”? Pensei no que estava vestindo. Não era uma roupa feia ou deselegante... Eu a achava bonita e graciosa, e não me sentia tão desconfortável nela, o que era ótimo pra mim. Detestava o incômodo exagerado que muitas mulheres se submetiam em prol do dito padrão de vestimenta e de beleza... Assim, naquele vestido eu me sentia mais eu. Mas sabia que não agradaria à minha mãe, já que ela tentava colocar na minha cabeça que eu tinha crescido e era uma moça, tinha que me vestir como uma mulher feita. Coisa que sentia que não era

Usava um vestido rosa claro que ia somente até abaixo do joelho. Ele era apertado na parte de cima, e levemente rodado em baixo. Não tinha muitos enfeites, babados ou brilho. Na verdade, só havia uma fita vermelha que, amarrada na cintura, a delineava. Era uma roupa para uma garota, a garota que eu era, e não uma mulher, ou moça como minha mãe já queria que fosse.

Pensei mais uma vez sobre o vestido, olhei para o que ela tinha escolhido e que ainda estava em cima da cama. Um vestido dos mais finos tecidos, de cor verde, com alguns brilhos, babados e um pequeno decote que destacaria os meus seios, que começavam a apontar. Não... Aquela não era eu... Isso irritaria minha mãe... Mas estava decidida, iria com o outro mesmo.

Agora era pensar no penteado. Também não queria algo que não se parecesse comigo, ou que me deixasse desconfortável com o receio de mover a cabeça e despencar a qualquer momento. Escovei mais uma vez os meus cabelos, puxei duas pequenas mechas da frente, as prendi com uma presilha na parte de trás da cabeça à altura da nuca. Nesse ponto ainda fixei uma orquídea rosa, de um tom mais vivo, que tinha colhido no jardim.

Era um penteado simples, provavelmente simples demais pra minha mãe, mas eu gostava do efeito que causava em mim. De certa forma, o achava parecido comigo. Uma maneira como me via por dentro. Uma menina que gostava da simplicidade, cheia de dúvidas e com sede de liberdade. Ao me olhar pela frente denotava meiguice, ordem, mas se olhassem as minhas costas, veriam os meus cachos rebeldes presos apenas pelas mechas.... E além de tudo havia aquela flor ... A natureza, a beleza das coisas naturais.

Saí do quarto e fui para o salão, respondi ao cumprimento de homens e mulheres quase desconhecidos para mim e provavelmente para os meus pais também. Até que avistei o Dr. Álvaro Viana, com seus cabelos castanhos salpicados de fios brancos, e belíssimos olhos azuis. Ele era o meu pai, e sorriu ao me avistar. Mentalmente agradeci, “Ah... finalmente alguém conhecido” e fui até ele:

– Pai! – o abracei.

– Querida! –ele respondeu carinhoso e depois continuou – A sua mãe está te procurando!

– Bem, estou aqui... E espero que o nosso encontro demore um pouco mais.

– Não diz isso, Laura... –ele fez uma pausa, me olhou detalhadamente e falou – Você não colocou a roupa que ela escolheu, né?

– Não...

– Mas está linda do mesmo jeito- ele sorriu novamente, me abraçou e como era mais de 20 centímetros mais alto do que eu, essa aproximação me fazia sentir totalmente protegida – É a minha garotinha!

– Por isso mesmo que ela não vai gostar...

– Dá um desconto para sua mãe... Ela só quer te arrumar um bom marido. Está pensando em seu futuro. – falou calmo.

– E se eu não quiser um bom marido? – perguntei.

– Então você quer um marido ruim? – ele devolveu a pergunta.

– Não... – eu pensava e se eu não quisesse um marido, qualquer marido? Mas decidi não falar, meu pai era muito carinhoso, e até amigo, o considerava um homem relativamente moderno, mas mesmo assim essa ideia/dúvida poderia deixá-lo preocupado, na sociedade ainda imperava a visão de que o objetivo das mulheres era apenas se casar e ter filhos – Ahh, pai, é que eu não me interesso pelos rapazes, pelo menos não os que a mamãe me apresenta.

– Mas vai se interessar, filha... Você é nova, ainda tem muito tempo para adquirir essa vontade, e quando conhecer o rapaz certo, vai se interessar! - ele parecia tão seguro

– Você é um romântico! – comentei.

– Sou... Alguém nessa família tem que ser, não é? E eu conversei com o Alvim sobre esse Fernando. Ele me disse que é um rapaz bem apanhado. E quando um homem, principalmente o seu primo, diz que outro homem é bem apanhado. Quer dizer que é um rapaz bonito!

– Isso não faz muita diferença pra ... – fui interrompida.

– Mas pelo menos, já é um começo... O começo do interesse – ele terminou sorrindo.

Assim então vi que minha mãe se aproximava e sua expressão não era muito boa, apesar de ela tentar disfarçar. Ela vinha com a cabeça erguida, não era alta, mas por sua pose até parecia. Seus cabelos eram castanhos-claros, quase loiros. Essa era uma das poucas diferenças físicas entre a gente. Os meus eram mais escuros, com um tom mais parecido com os do meu pai. Mas em nós duas, ambos eram cacheados. Nossos olhos também tinham o mesmo tom de castanho claro. E nossos traços clássicos eram bem semelhantes.

– Que vestido é esse? Cadê o que eu escolhi? – ela me olhava de cima a baixo e falava autoritária.

– Eu preferi esse – apesar de me sentir um pouco insegura, resolvi enfrentá-la.

– Estou vendo...Vá vestir o outro... – ela falou baixo tentando manter a calma e eu a olhei desafiadora.

– Augusta, meu amor... Se contenha. Laura está linda nesse vestido! –meu pai interviu.

– Parece uma menina – ela rebateu.

– Ela é uma menina...

– Não, ela cresceu... Você é pai, Álvaro, e não percebeu isso. Aliás, nem ela parece que percebeu – ela voltou o olhar pra mim ameaçadora – Laura, vá pra cima e vista ...

– Augusta, não é motivo pra tanto... Pense bem, você não quer chamar a atenção por tão pouco. Já começam a olhar pra gente – ele tocou no ponto sensível da minha mãe e ela se recompôs.

– Está bem. Deixe assim ... Fernando Albuquerque vai achar que ela é uma criança. Mas se ela quer... Lavo as minhas mãos. Quem sabe ele não se interesse pela meiguice e pureza infantis... E você, Álvaro, a está mimando demais! Assim ninguém aguentará Laura... Nem a gente ou um pretendente, quiçá um marido – ela saiu com um sorriso falso nos lábios para manter as aparências, mas eu sabia que estava chateada por dentro.

– Obrigada, pai! – agradeci com um sorriso

– Querida, ande um pouco por aí. Vou atrás da sua mãe... Ela ...

– Eu sei, pai.

– Talvez fosse bom arrumar alguma companhia mais apropriada para sua idade... Joana e Cândida, filhas do Bento Nabuco, estão aí...

– Elas são tão aborrecidas... Só falam das roupas glamorosas que mandaram fazer, criticam as roupas e modos das outras. Falam de joias. E claro... pretendentes.

– Assuntos de moças... Mas se não quer conversar com elas, ou desses assuntos... seu primo e o amigo dele, o Inácio estão por aí.

Até que eu não achava Inácio um rapaz ruim. Era amigo de Alvim desde criança. E ele normalmente se portava de maneira gentil comigo. Junto do meu primo acabou indo estudar direito na Faculdade do Largo de São Francisco em São Paulo... Onde conheceram o tal Fernando que minha mãe queria me apresentar.

Inácio me parecia um rapaz sem uma personalidade forte, mas possuía um jeito doce e sorridente. Tinha um tom de pele claro, cabelos encaracolados e escuros, assim como os olhos.

– Depois, eu falo com o Inácio. E a tia Carol, já apareceu?

– Sim... –ele riu- Eu querendo que você fique com os jovens e você me pergunta sobre sua tia.

– A tia Carol é uma fofa, pai... E não é uma velha... para mim é jovem ainda.

– Espero, pois senão eu seria muito velho, já que sou mais velho do que ela... Ela foi por ali – ele me apontou o caminho e eu saí

Encontrei minha tia Carolina com uma taça de vinho na mão enquanto a outra pegava alguns quitutes numa mesa. Ela era um pouco gulosa. Podíamos dizer que não era gorda, nem magra, mesmo assim minha mãe a perturbava em relação a sua forma, apesar de que eu a achar bonita do jeito que era.

Carolina Cavalcanti de Mello era viúva, mãe do meu primo Alvim e irmã mais nova da minha mãe. Ela tinha um jeito doce... E era até inocente em alguns aspectos. Apesar de características distintas, um rosto mais redondo com bochechas salientes, conseguia ver alguns traços físicos semelhantes entre ela e D. Augusta. Ambas tinham o seu charme, enquanto o da minha mãe se assemelhava mais a uma beleza sedutora, altiva, o de tia Carol representava a meiguice. Quando criança eu até pensava nela como uma boneca de porcelana, ou uma fada... Pequena, alva, com olhos verdes- esmeralda faiscantes e lindos cabelos escuros e cacheados.

As aparências até pareciam se refletir na personalidade de ambas. Ainda que um tanto opostas, elas possuíam certa sagacidade reconhecida nas Cavalcantis. E mesmo que minha tia se mostrasse ingênua em algumas ocasiões, em outras, eu percebia que ela também era muito esperta.

Fiquei conversando com minha tia enquanto comíamos. Com ela as coisas me pareciam divertidas, e sentia que podia ser eu mesma, algo que me acalmava. Em alguns pontos até parecíamos duas meninas sorridentes falando sobre brincadeiras. Nós resolvemos andar pela casa e acabamos indo até o salão. Ficamos lá paradas enquanto comentávamos entre sorrisos se conhecíamos ou não os convidados que chegavam.

Minha mãe tinha a mania de fazer festas grandiosas, e às vezes, convidava pessoas que não havia trocado meia palavra. Tudo para manter sua imagem de grande anfitriã. E até mesmo apareciam “penetras”, pessoas não convidadas, mas que D. Augusta acaba fingindo que eram:

– Olha lá, Laura. Ritinha e o Senador Cristóvão Albuquerque. Pelo menos, eles eu conheço – tia Carol me falou inocente.

Só que eu gelei. Os Albuquerques tinham chegado. E com isso, imaginava que meu provável pretendente também. Olhei o casal, e perto dele vi um rapaz. Era a primeira vez que o via.

Ele era magro e alto. Não usava barba, pela pouca idade talvez não conseguisse cultivar uma barba densa como a que muitos homens gostavam de manter. Assim podia ver o seu rosto completo: nariz afilado, lábios finos, boca um pouco grande, sobrancelhas grossas, mas bem separadas. Tudo lhe dava um aspecto belo, e ao sorrir até parecia um menino mais jovem do que devia ser.

O tom da pele era de um moreno claro. Os cabelos bem negros e lisos, que ele usava um pouco maior do que os homens costumavam, deixando até alguns fios tampar parte da sua testa. E olhos? Não podia mentir. Eles eram belíssimos. Grandes. Nunca tinha visto olhos daquele tom... Uma espécie de verde escuro e claro, misturado a outras cores como castanho, amarelo...

Aquele era Fernando Albuquerque. E não podia negar o que os meus olhos viam, ele era realmente muito bonito.

Por Fernando

Estávamos na charrete, eu, meu pai e minha mãe, além do condutor. Meu pai tinha importado um carro há pouco tempo, mas não sabíamos as condições da estrada para a fazenda São Bernardo, então optamos por ir de charrete mesmo.

Íamos pra um destino que a mim parecia incerto. Eu tinha aceitado para tranquilizar a minha mãe, que era tão frágil, mas fui a contragosto, pois sabia o que ela planejava. Ela queria me colocar no bom caminho, me arrumar uma boa moça, mas eu ainda queria viver muito antes de seguir o meu rumo na vida.

Ainda era jovem, faltavam poucos dias para eu completar 18 anos, fazia apenas um ano que começara o meu curso de direito. E mal tinha iniciado as minhas aventuras, a tratar das minhas vontades carnais tão intensas, e me entreter com moças da vida ou de moral duvidosa... Eu estava na fase de experimentar, de me deleitar com suas carnes quentes e macias, aproveitar da ousadia e da falta de decoro delas. E gostava muito, me sentia inegavelmente atraído por essas mulheres e os prazeres que elas me proporcionavam.

Sabia que aquilo não duraria para sempre. E realmente não pensava em nada definitivo com elas, uma hora teria que sossegar. Não seria com aquele tipo de mulher que eu terminaria, mas ainda não queria compromisso, não naquele momento da minha vida.

Meu pai, o senador Cristóvão Albuquerque, até entendia esses meus anseios juvenis, mas minha mãe, D. Maria Rita ou Ritinha, como lhe chamavam, não. Ela era uma mulher de sociedade, e apesar de já ter certa idade, ainda era ingênua em alguns aspectos, pois sempre fora muito protegida em sua vida. Ela sonhava com um destino de conto de fadas para mim, casado com uma boa mulher e a enchendo de netos.

Eu olhava para ela. Ainda a achava jovem, tinha apenas 35 anos. Era magra e pequena com traços delicados. Possuía cabelos castanhos escuros e lisos, olhos verdes, mas de um tom mais claro que os meus, às vezes, seus olhos até pareciam azuis. Nunca a vira com muita cor no rosto, nem mesmo quando se maquiava, sempre me parecia pálida, talvez por sua saúde precária.

Já meu pai tinha 46 anos. Um homem forte, encorpado, alto. Possuía cabelos bem negros e lisos. Olhos castanhos. Sua cor morena denotava saúde. E sua figura mostrava imponência. Apesar de possuir algumas características do meu pai, como a altura, os cabelos, tom de pele, nas feições me achava mais parecido com minha mãe.

Há quase um ano, meu pai tinha assumido o cargo de Senador da República e se mudou com minha mãe para o Rio de Janeiro. Eu fiquei em São Paulo para estudar, e sabia que eles não pretendiam voltar. A verdade é que Seu Cristóvão tinha unido o útil ao agradável. Havia firmado fortuna como fazendeiro no Oeste Paulista, mas era um homem inovador, um empresário nato, sendo sócio de empresas relacionadas a diferentes meios de transporte, que atualmente era o seu principal ganha pão. E boa parte dessas empresas estava no Rio.

Eu até comecei o meu curso de Direito, sem pensar se essa era a minha verdadeira vocação, com meu intento principal de seguir o desejo do meu pai de ter uma formação para ajudá-lo em seus negócios. Mas de qualquer forma, o curso não fugia tanto do que eu gostava, pois tinha certa ligação com a escrita, que eu pensava ser uma das minhas habilidades naturais.

Eu gostava de ler e escrever, ainda que escondesse os meus escritos das pessoas do meu convívio como meus colegas de turma e companheiros de farra, Álvaro de Mello(Alvim), e Inácio de Castro, até mesmo dos meus pais. Talvez o fizesse para acobertar meu lado mais sensível, o que poderia manchar a minha masculinidade com os meus colegas ou com meu pai. Já com minha mãe se referia mais ao teor do que escrevia, que achava um tanto picante para uma senhora da sociedade como ela.

Também tinha o fato de que, há quase um ano, eu vivia separado dos meus pais, sozinho em nossa antiga casa em São Paulo, enquanto eles apenas me fizeram umas poucas visitas e mandaram cartas durante esse período.

Claro que possuía outros hobbies: gostava de desenhar (e as moças que posavam, normalmente nuas pra mim, elogiavam o meu talento). Além disso, nadava em lagoas e rios da cidade. Até mesmo ia para o litoral em fins de semanas e feriados para praticar a natação na imensidão do mar. Gostava daquela sensação de liberdade, do contato com a natureza. Um momento em que eu podia pensar sem ninguém para interferir. Tinha uma boa dose de inconsequência em mim, mas eu refletia muito ... Acerca de tudo... Sentia em demasiado. Analisava...

E o lado positivo dessa atividade, era que além de proporcionar essas reflexões mais íntimas, tivera notícias de pesquisas que começavam a relacionar a saúde, um corpo saudável à prática de esportes.

No meio desses pensamentos, acabei sendo chamado por minha mãe:

– Fernando, filho, chegamos!

Eu suspirei fundo. Íamos ficar alguns dias naquela fazenda quando o que eu queria de verdade era conhecer mais a cidade do Rio, aproveitar suas belezas e mulheres. Mas não, meus pais me arrastaram para o interior. Para fazenda de seus amigos, os pilares da sociedade carioca, D. Augusta e o Dr. Álvaro Viana, tudo para conhecer uma moça, que eu não tinha a mínima vontade de conhecer: Laura, a única filha deles, que provavelmente devia ser uma mocinha feia e sem graça. Pelo menos era o que Alvim, o primo dela, insinuava.

– Anime-se, filho. - meu pai percebia o meu real estado de ânimo- Laura é uma menina bonita e encantadora. - devido às opiniões contrárias, eu tinha que ver para acreditar, só que, naquele momento, a minha tendia mais para a do meu amigo, mas a verdade é que fosse bonita ou não, eu não queria uma namorada.

Olhei para ambos que já tinham descido da charrete e decidi fazer o mesmo.

– Vão ser dias ótimos, querido – completou minha mãe enquanto eu me movia.

– Espero, pai. Espero, mãe.

Já estava no chão, estiquei e sacudi minha roupa tentando desamassá-la e tirar a poeira da estrada. Usava um fraque com paletó e calças pretos, camisa branca, colete e gravata beges. Mesmo sem muita vontade, eu não apareceria mal vestido.

Tentava me animar, pensando em coisas positivas, ao menos meus amigos Alvim e Inácio estariam lá. Isso melhorou meu ânimo, e fui subindo as escadas, entrando na casa principal.

Eu e meus pais fomos recebidos por D. Augusta e o marido no salão. Ela me parecia bem elegante, exagerando no luxo. Usava um vestido sereia vinho que ia até os ombros, possuindo um bom decote. E alguns adornos, dentre eles uma coroa, brincos e uma pulseira de brilhantes. Também estava com uma echarpe de pele nos ombros o que era claramente uma ostentação, já que mesmo fazendo um pouco mais de frio na fazenda, ainda estava muito quente para aquilo.

Apesar de se conhecem há pouco tempo, os casais pareciam bons amigos e conversavam animadamente. Minha mãe me apresentou orgulhosa enquanto tocava em meu ombro:

– Esse é o meu o rapaz, Fernando... Augusta Cavalcanti Viana, filho.

– É um rapagão, Ritinha. Minha Laura vai ficar encantada... – a senhora disse sorrindo simpática. Era uma mulher madura, devia até ser mais velha que minha mãe, mas ainda assim era bonita. A cumprimentei cumprindo com a etiqueta, e sem mostrar meu real estado de espírito.

Meu pai tratava com o Dr. Viana assuntos referentes à nossa bagagem. Eu me ofereci para guardá-las junto do condutor, mas D. Augusta intercedeu:

– Não, deixe que Álvaro cuide de tudo. Vocês são os convidados de honra... - ela fez uma pausa e me olhou sugestiva - Venha, Fernando, quero que conheça a minha filha.

Eu a segui acompanhado dos meus pais enquanto via o Dr. Álvaro se afastar. Ela se aproximou de uma mocinha que estava com uma mulher, me indicou a garota e falou:

– Essa é Laura, minha filha. Filha, esse é Fernando Albuquerque.

Eu a olhei bem, ela era pequena, branquinha. Tinha belos cabelos e grandes olhos castanhos, esses últimos claros. Possuía traços finos... Uma boca bem formada e pequena com lábios superiores estreitos, e os inferiores mais largos e vermelhos, que ao final lhe proporcionava um formato similar a um coração. Havia uma pinta miúda logo acima da boca no lado esquerdo. O que era um diferencial e que eu achei um charme. Um nariz bem construído, de um tamanho delicado, afilado, pontiagudo na extremidade. Sobrancelhas finas e bem desenhadas. Bochechas levemente salientes, mas num rosto fino com um queixo ligeiramente pontudo. Diferente do que Alvim falava, ela não era feia nem me parecia sem graça. Estava um pouco assustada, talvez constrangida. Eu sorri, me curvei, peguei em sua mão e a beijei gentilmente:

– Senhorita, é um prazer.

– O prazer é meu. - ela disse docemente e sorriu em resposta.

E sua boca até parecia grande ao sorrir, pois quando o fazia, essa tomava conta de toda a parte inferior do rosto, mostrando covinhas em suas bochechas. Os olhos expressivos com um ar contente também tinham um grande encanto. Enfim, era uma menina bonita, graciosa. Usava um vestindo meigo e simples que me agradava, e que talvez reforçasse a sua doçura e inocência.

Mas havia um problema, ela era uma menina muito nova, sem o corpo formado, uma garota ainda. Eu queria e me sentia atraído por mulheres completas. Além de, claro, não aspirar um relacionamento sério, e garotas de sociedade como ela só tinham relacionamentos sérios.

Notas Finais:

Diário de Laura: Me calo sem vontade de conversar. Me calo sem vontade de falar. Tenho medo de desapontar as pessoas com minhas palavras sinceras.

Caderno do Fernando: Eu não sabia o que fazer, mas não fazia o que queria. Pois magoaria alguém, uma pessoa boa e querida, e não me sentia capaz de tal ato. De despedaçar ilusões... De ferir emoções... Então eu ficava quieto, desconfortável, torcendo para que o destino agisse por mim. Podia estar sendo um covarde, enganando, mas ao menos, era guiado por um sentimento mais nobre do que o costume, a compaixão.

Então o que acharam? A sua opinião é muito importante. Coloquei esse capítulo apenas como degustação... Assim, se quiserem continuar lendo, eu estou postando em dois outros lugares www.oprecodeumolhar.com.br e https://www.wattpad.com/story/37022863-o-pre%C3%A7o-de-um-olhar.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O preço de um olhar" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.