O garoto sem nome escrita por Gessikk


Capítulo 3
Carta 3


Notas iniciais do capítulo

"Se por acaso fujo, não é por falta de luta. Qualquer abandono exige coragem. Qualquer fuga tira um pedaço de nós que não volta. É preciso força até para desistir." Verônica H.



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Start of Time– Gabrielle Aplin

"Maybe we could be the start of something

Be together at the start of time

(...)

When you walked into the room just then

It’s like the sun came out,

Oh, I’m an atom in a sea of nothing

Looking for another to combine

(...)

My voice is just a whisper

Louder than the screams you hear

It’s like the sun came out"

Derek Hale, aparentemente, é completamente o oposto de mim. Lobisomem, forte, marrento, quase não se vê ele sorrindo ou fazendo alguma brincadeira. Nós muitas vezes tivemos nossas discussões e eu sempre o provoquei, o perturbando propositalmente por saber que não gostava das implicâncias que fazia.

Porém, acabei descobrindo que nós não éramos tão diferentes assim. O cara passou por muita coisa, perdeu toda a família quando novo, teve relacionamentos desastrosos, em que a primeira namorada morreu, a segunda o traiu e incendiou a sua casa e depois, quando achou que tivesse encontrado uma pessoa legal, Jennifer se revelou mais uma psicopata, que fez diversos sacrifícios pela cidade.

A última garota que ele arrumou, era uma mercenária, Braendon, não a conheço muito,porém parece não querer morrer tão cedo e nem matar ninguém que Derek ame, o que já é um bom começo.

O que acabei descobrindo em comum com o Derek foi a dor. Ele sabia o que era a perda, o desespero, o luto, ele conhecia a morte, a sensação de ser um morto vivo, completamente apodrecido por dentro. Eu entendia a sua dor e que o seu jeito, muitas vezes grosseiro, era a forma de se defender, assim como eu usava o sarcasmo.

Eu nunca soube ao certo se nós éramos amigos, só consegui entender isso quando me vi completamente sozinho e ele foi capaz de estar comigo, de suportar a agonia e o desespero asqueroso que emanava de mim, quando ninguém mais conseguia se aproximar devido a minha dor excruciante.

Não vou falar sobre esse assunto agora, é algo para outra carta, isso é claro, se você continuar lendo uma por uma.

Acho que estou ficando muito repetitivo, sempre falando sobre se você tiver coragem de ler até o final. Talvez seja por me sentir estúpido em escrever essas cartas e nem saber para quem vou entregar. Só sei que a garota que eu amo, também receberá e vai precisar de ajuda, vai precisar ser forte, suportar uma dor devastadora, então, se você é a outra pessoa que está lendo, é porque confio em você a única pessoa importante que me restou em vida. Enquanto ela viver, eu estarei vivo nela, com ela.

Voltando a falar de Derek, acho que não mencionei que ele é primo de Malia, a garota que me apaixonei. E por falar em Malia, nós ficamos juntos por meses e eu achava que tudo ficaria bem entre nós, até ela ouvir sobre a Loba do Deserto, sua mãe.

Primeiro, Malia ficou obcecada por descobrir quem era a sua verdadeira mãe, acho que tinha esperanças de que se encontrasse a mulher, poderia diminuir a culpa por ter matada a mãe adotiva e a irmã em sua primeira transformação, quando ainda era pequena.

Eu me mantive firme com Malia, por ela.

Muitos meses se passaram com Malia presa na sua busca. Completamos um ano de namoro, aprendemos como agir um com o outro e quando percebi, a pequena paixão tinha se tornado um sentimento devastador. Naquele tempo aprendi a verdadeiramente amar Malia e me desprendi do que sentia por Lydia, mesmo ficando cada vez mais próximo dela, nos tornando amigos inseparáveis, pois já tinha apreendido a não confundir os sentimentos.

Foi aos poucos que Malia se perdeu. Eu percebi os primeiros sinais, mas não fiz nada, não imaginava que a garota estava se perdendo dentro de si mesma quando passava longos minutos perdidas em pensamentos. A esperança que tinha de encontrar a mãe foi sumindo, suas buscas não davam em nada e a culpa que sentia por sua família parecia piorar a cada dia, além de sua falta de identidade. Por mais que eu me esforçasse para a ajudar, Malia não conseguia se sentir bem em meio as pessoas, nem mesmo na alcateia conseguia interagir da maneira certa.

Os sentimentos de inadequação, de culpa, de medo, foram aumentando na menina que conquistou meu coração. Ela falava repetida vezes que a única coisa boa que aproveitava na vida humana, era eu, que ela lutava todo dia para ser uma pessoa por me amar.

Um dia ela desistiu de lutar.

Eu estava no meu quarto, jogando, quando Malia entrou repentinamente e trancou a porta. Ela se despiu com voracidade e me derrubou na cama, de certa forma eu estava acostumado com aquilo, pois Malia simplesmente amava sexo, era como se seus instintos animalescos a incentivassem.

Mas naquele dia tinha algo diferente. Malia parecia triste enquanto nossos corpos se uniam, ao mesmo tempo que agia de uma maneira selvagem, mais violenta do que costumava ser. Minhas costas sangraram quando suas garras se fincaram em mim e ela parecia estar prestes a se transformar quando nossos movimentos se tornaram mais intensos, seus olhos já brilhavam em um azul gélido quando nos separamos.

Lembro de como fiquei assustado no pós-sexo, ao ver seu descontrole e o estado das minhas costas, mas a explicação para aquilo veio logo depois, quando ainda estávamos deitados em minha cama.

"Eu desisto, Stiles" foi o que ela sussurrou, chorosa.

"Como assim desiste?"

"Cansei de ser humana, eu não suporto mais".

Eu chorei, implorei que ela não me deixasse, mas Malia já estava decidida, ela já tinha aprendido a controlar a transformação bem o suficiente para voltar a ser coiote.

"Me perdoa, Stiles, mas eu tenho que ir. É o melhor para mim." Malia chorava quando disse aquelas palavras, ela me abraçou com força e me beijou uma última vez. "Você mudou minha vida, me fez ter forças para viver, mas eu não pertenço a esse corpo humano."

"Você prometeu que nunca me abandonaria", lembro como os olhos de Malia se escureceram quando eu disse aquelas palavras. Ela se lembrava muito bem daquela promessa, feito em meu Jeep, no México.

Malia não teve respostas para o que disse, apenas deixou que mais lágrimas caíssem e saiu do meu quarto. Eu corri atrás dela e pedi para que pudesse ver quando ela se transformasse, seu rosto demonstrou relutância, mas era o último pedido que faria a ela, Malia sabia disso e concordou com o rosto, sem dizer nada.

As últimas palavras que ela disse foi "Eu te amo, Stiles" e então, ela me deixou. A vi se transformar em um pequeno coiote que uivou, me encarou com os olhos conscientes e correu até a floresta.

Naquele momento, Malia sabia quem eu era, me amava da mesma maneira que eu a amava, mas eu sabia que depois de alguns anos, os instintos a dominariam completamente e ela se tornaria um verdadeiro animal selvagem e viveria sem lembrar que um dia eu existi.

A saudade que tive de Malia foi devastadora. Ela invadia meus sonhos todas as noites e eu sempre acordava de madrugada, desorientado, desesperado para sentir seus braços em volta de meu corpo, mas ela não estava ali para espantar meus pesadelos.

O sabor de seus beijos permanecia em minha boca, até agora, quando fecho os olhos, posso sentir os movimentos familiares de sua língua. Sentia falta de tudo nela, de seu sorriso, seu jeito descontraído e animalesco, sua personalidade, seu corpo, seus carinhos, sua companhia nos domingos de manhã.

Eu ansiava vê-la, chorava no banho com a dor de minha saudade e meu único desejo era busca-la na floresta, correr pela mata desconhecida gritando o seu nome, até encontrar a coiote e implorar aos prantos que ela voltasse para mim. Porém eu não podia fazer isso, justamente por ama-la eu tinha que respeitar a sua escolha, por mais que isso estivesse me destruindo.

Malia foi a pessoa que manteve a minha sanidade quando todo meu mundo desmoronou, quando fui corrompido e me tornei um monstro. Depois de a perder, senti a humanidade que me restava desaparecer.

Faltei a escola por uma semana, meu pai permitiu que eu faltasse, pois via o quanto eu estava arrasado, mas me fez prometer que depois daquela semana de "luto" eu voltaria tudo ao normal.

Foi na sexta feira a noite, que eu abri a porta do quarto, após ter três batidas rápidas e encarei surpreso Lydia, quando esperava encontrar meu pai.

Naquele momento de escuridão para mim, foi como se o sol invadisse meu quarto, com raios ultravioletas ruivos que batiam nas costas da dona dos olhos verdes. Ela conseguiu não somente transformar meu dia, mas também mudar, mais uma vez, toda a minha vida.

Lydia não falou nada, apenas me encarou com os olhos expressivos e eu sabia que ela era capaz de me interpretar por minha expressão.

"Avisei para os meus pais e para o xerife que vou dormir aqui!"

"Vai?"

"A não ser que você prefira ficar sozinho."

A última coisa que eu queria era passar mais uma noite sozinho naquele quarto, ele estava imundo de lembranças que não voltariam a ser o presente. Assim, Lydia, minha melhor amiga, dormiu pela primeira vez na minha casa.

Nós assistimos todos os filmes do Star Wars pela milésima vez, logo em seguida Diário de uma Paixão, como fazíamos todo sábado à tarde, que dedicávamos um tempo a nossa amizade, deixando namoradas e ficantes.

Fizemos pipoca, que deixamos queimar e mesmo assim comemos tudo, Lydia comeu sozinha duas barras de chocolate enquanto eu devorava um pote de sorvete. Ela não fez nenhuma pergunta sobre Malia, nem tentou me dar uma palavra de ânimo, apenas ficou comigo e me fez feliz aquela noite, arrancou risadas e sorrisos do meu rosto cansado de chorar.

Quatro meses, três semanas e dois dias. Era o tempo exato que eu não via Malia, quando Lydia me beijou. Não foi um selinho como na última vez, nem um meio beijo rápido, foi um beijo longo, de língua, sexy, devastador.

Faltava uma semana para a formatura do colégio. Eu tinha sido aceito para três universidades diferentes e bem, Lydia tinha sido aceita para todas as universidades que tentou e estava em um grande dilema de qual era a melhor para ela e se cursava Matemática, Física, Química ou algo a mais relacionado a essas matérias. Ela tinha liberdade de escolher qualquer curso, as faculdades estavam disputando para ter uma garota com o currículo impecável que ela tinha.

Nós estávamos conversando bastante sobre isso, então se tornou normal após as aulas ela ir a minha casa e foi em um desses dias rotineiros que ela disse: "É incrível como a sua voz cala os gritos que eu ouço ".

As vezes eu esquecia que Lydia era uma Banshee, até que ela dizia algo sobre as vozes que a perturbavam. Não entendi o que ela quis dizer com aquilo e a de olhos verdes explicou que passava a noite e a manhã inteira com as vozes gritando em sua cabeça e que o único momento que tinha paz era quando eu falava com ela. De alguma forma, a minha voz, o meu sussurro, era o antídoto para o sofrimento que seus dons causavam.

Eu me sentia um grande nada. Quando Malia entrou em minha vida, eu me tornei alguém, voltei a ser um humano, que vivia verdadeiramente, mas quando ela se foi, eu voltei a ser apenas um átomo em um grande oceano de nada, até Lydia me reconstruir.

A de olhos verdes me encarou por longos minutos, após ter dito que eu calava as vozes que escutava e foi então que me beijou.

Eu tive consciência de que o beijo foi interminável, minhas mãos andaram pelas costas de Lydia e ela puxou meu cabelo com muita força, porém apesar dos longos minutos, eu fiquei inconformado quando separamos nossas bocas, foi como se só tivesse durado segundos. Ela beijava tão, mais tão bem, devia ser considerado crime provar algo tão bom e não poder ter mais imediatamente.

"Você me beijou."

"Desculpa, você ainda pensa nela, não é?" Lydia sabia que o nome de Malia ainda era algo proibido para mim, por isso não ousou o proferir.

"Penso, o tempo todo."

Lydia ficou calada por alguns instantes, a expressão em dúvida, observando meu rosto sem emoção. Estava muito surpreso para formular sequer uma reação.

"Eu quero muito beijar mais."

"Me beijar?" Apesar da pergunta parecer estúpida, eu sentia a necessidade desesperada de confirmar se a garota linda a minha frente queria realmente me beijar novamente.

A dona de olhos verdes fez uma expressão engraçada, os lábios compridos como se segurasse o riso.

Quando fecho os olhos posso relembrar perfeitamente como seu rosto estava alegre ao concordar que sim, queria me beijar. Tinha um toque de deboche em sua expressão, se divertindo com a minha surpresa e eu nunca pude tirar aquela cena da minha mente.

"Eu não vou me importar se você me beijar." Sim, foi a exata frase genial que disse naquele momento.

E então, ela me beijou.

Nos beijamos uma segunda vez.

Uma terceira.

Uma quarta.

Uma quinta.

Lydia em algum momento tirou minha blusa e eu não me importei com isso.

Nos beijamos ainda mais, até sentir a boca completamente dolorida e a língua cansada e mesmo assim, não paramos.

Sempre soube que Lydia era tarada, eu vi a vida toda ela se agarrando com vários caras e depois que ficamos amigos, era obrigado a ouvir suas saliências, mas ser assediado por Lydia, era algo completamente diferente.

Suas mãos pequenas corrompiam a inocência dos meus pensamentos e enquanto o beijo permanecia calmo, ela ficava aflita, se contorcendo por as minhas mãos não saírem de suas costas.

Aos poucos, a intensidade foi aumentando. Meu corpo fica em chamas só de lembrar o momento que, após muitos beijos, Lydia pegou minha mão e colocou em seus seios. Com a surpresa, eu reclamei como uma menina virgem, dizendo que só estávamos nos beijando e ela, em resposta, disse que minhas mãos tinham que estar em um lugar bom se eu quisesse continuar a beijando. E eu queria desesperadamente.

Aquela foi a primeira vez que cedi a alguns dos desejos carnais da garota. Eu toquei seu corpo, como quis por anos a fios, em que tinha todos os dias, sonhos indevidos com Lydia.

Depois de a tocar por muito tempo, Lydia retribuiu o favor prontamente, conhecendo aos poucos, meu corpo.

Apesar de tudo, nada mais aconteceu. Somente beijos carnais, repletos de mãos indecentes.

Somente quando Lydia foi embora, já de noite e eu fui dormir, foi que finalmente percebi que tinha ficado com minha paixão de infância.

Nunca entendi como as mulheres podem ser tão complicadas, quando eu finalmente tinha esquecido Lydia, respeitado sua decisão, ela tinha resolvido ficar comigo.

A partir daquele dia, a dona dos olhos verdes, começou a me visitar com mais frequência e pelo menos três vezes por semana, nós ficávamos a tarde inteira nos agarrando. No sofá, na cama, no chão, na cadeira, na cozinha, no shopping, no cinema, em cima de mesa, em qualquer lugar em que estivéssemos.

Em nenhum momento eu esqueci Malia. Era impossível, eu amava a que me abandonou. Ainda assim, meu peito era grande o suficiente para a paixão por Lydia, enterrada em meu coração imaturo, reascender, nem que fosse uma parcela do sentimento que já tinha abrigado por ela.

A dona dos olhos verdes e a que me abandonou, tinham controle total da minha vida.

A partir daqui a mínima felicidade que me restava, estava prestes a ser arrancada brutalmente de mim.

Nesse momento a minha morte já tinha começado, mas a partir do mês seguinte, antes de eu sequer conseguir dormir com Lydia, a minha alma entrou em decomposição.

O garoto sem nome.


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