Despertador gritando.

Eu poderia não estar de ressaca, mas aquele barulho agudo fazia a minha cabeça doer.

Levantei com a maior preguiça do mundo, juntei o material e me vesti. Fui andando para a escola como uma morta-viva de tanto sono.

—Ta atrasada queridinha – A mulher que ficava no portão da escola não me suportava. Sempre arrumava motivos para que eu não entrasse. Mas dessa vez eu realmente estava atrasada.

—Eu entro na segunda aula, sem problemas. – Disse com voz de sono.

—Porque não da meia volta e vai pra casa?

De longe vi Roberta passando pelo corredor.

—Roberta! - Chamei

Ela parou ao ouvir minha voz. Mas seguiu andando como se não tivesse escutado.

Fiquei estática. Não sabia o porquê ela estava me tratando dessa forma.

—Deixa ela entrar. - Disse ela já no final do corredor. - Ela vai entrar no segundo horário.

A mulher bufou, mas liberou a minha entrada.

Segui Roberta até sua sala. Ela se sentou e começou a mexer em papéis que estavam na mesa.

Ignorando completamente a minha presença.

Eu tive vontade de apenas sentar a sua frente e manda-la me encarar para começarmos a jogar como se nada tivesse acontecido. Mas eu não poderia continuar fingindo que nada estava acontecendo.

—Então... vai me dizer o que esta acontecendo? – Disse sem pensar direito

—Nada esta acontecendo.

—Você não almoçou comigo na sexta...

—Tive outros compromissos...

—Não atendeu minhas ligações...

—Meu celular... ele...

—Ruby! – Protestei.

—Que? – Disse levantando a cabeça para finalmente olhar em meus olhos.

—Vai mentir pra mim assim? Tão descaradamente...

Ela abaixou a cabeça e ficou em silêncio por alguns instantes

—Você beijou a Dia?

—Que? - Me espantei

—Pela sua cara deve ter beijado... - Olhou para a minha cara esperando eu negar, mas vendo que não neguei continuo - Ouvi ela comentando sobre isso com a Lídia... Não achei q fosse verdade... - Fez uma pausa esperando eu me defender, mas nada fiz - Então quer dizer que você foi no casamento só pra beijar a noiva?! – Disse num tom sarcástico.

—Eu fui no casamento esperando te encontrar na festa - Finalmente me pronunciei - E eu não beijei a noiva. Ela me beijou – Disse me defendendo, como se esse argumento de defesa fosse ajudar em alguma coisa.

Na verdade não estava entendendo o porquê da indignação de Roberta.

—Então ela que te beijou? - Disse num tom raivoso 

—É... - Respondi um tanto intimidada, mas sem demonstrar.

Roberta me encarou com um olhar que nunca tinha usado comigo antes, eu não podia decifrar o que ela queria me dizer com aquele olhar.

Ela se levantou e caminhou ao meu encontro.

Avançou em mim vorazmente e me beijou. Senti meu corpo sendo prensado contra a parede e meus lábios unidos aos dela.

Eu só poderia estar sonhando. Isso não poderia acontecer de verdade.

Foi então que senti sua língua pedindo passagem que obviamente foi concedida. Sua língua explorando minha boca, suas mãos apertando minha cintura contra a dela. Naquele momento eu não conseguia pensar em mais nada, apenas em suas mãos em meu corpo, seus lábios junto aos meus num beijo longo, voraz e um tanto necessitado, para ambos.

Eu não podia acreditar no que estava acontecendo. Mas como tudo que é bom dura pouco logo ela interrompeu o beijo se afastando e virando as costas para mim.

—Vai pra sala Jessy - Disse com a respiração falha

—Ruby...

—Agora! - levantou o tom autoritário - Me deixa sozinha. – Pediu. Soou mais como uma ordem, mas eu sabia que era um pedido.

Peguei minha mochila e sai da sala atendendo seu pedido. Caminhei em direção a sala completamente distraída e acabei esbarrando em Inácia que estava com vários livros nas mãos que foram parar ao chão por culpa do esbarrão.

—Me desculpa. – Disse me abaixando para ajudar a recolher os livros – Eu estava no mundo da lua – Disse rindo, na verdade eu estava no meu mundinho perfeito onde Roberta não parava de me beijar.

—Mundo da Lua é? – Disse recolhendo os outros livros. – Achei que não viria hoje. – Disse se levantando.

—Só me atrasei um pouco – Disse me juntando a ela.

—Perdeu a hora?

—Quase isso... Tive problemas com a Rose para entrar na escola.

—Aquela mulher é um saco mesmo – Disse baixinho como se fosse um segredo.

Sorri concordando.

—Você precisa ir pra sala né?! – Perguntou olhando para o relógio.

—Não necessariamente .

—Como assim? – Perguntou sem entender.

—Educação Física... – Disse enquanto ela ria.

—Então você é do tipo de aluna que mata as aulas de Educação Física?

—Eu sou do tipo de aluna que vai te ajudar a carregar os livros. – Disse me oferecendo.

Ela assentiu com a cabeça e me guiou até a sala em que daria as próximas aulas.

—Obrigada – Disse pegando os livros da minha mão.

—Eu que agradeço. – Disse fazendo ela não entender do que eu estava falando.

Era engraçado como Inácia sempre fazia essa cara quando conversava comigo.

—Obrigada por me fazer perder o começo da aula de Educação Física. E por não me entregar para a direção. – Me expliquei.

—Eu nunca disse que não te entregaria. – Sorriu sarcasticamente.

—Faria isso comigo? – Fiquei chocada com a ameaça.

—Não... – Disse abaixando a cabeça – Mas só porque eu também não suportava Educação Física no colégio. – Sorriu meio sem graça.

Ouvimos passos no corredor. Passos com barulho de salto. Provavelmente a diretora estava rondando a escola.

—Eu tenho que ir, antes que ela me pegue – Disse , me despedindo.

Sai andando o mais rápido que pude mas aquele barulho de salto estava cada vez mais perto. Me deparei novamente na frente da sala de Roberta.

Ao ouvir os passos se aproximando resolvi entrar na sala.

—O que esta fazendo aqui? – Perguntou com a maquiagem em volta dos olhos borradas – Eu disse pra ir para a sala. – Disse tentando disfarçar as manchas em seu rosto.

—Eu... – Comecei a olhar sua maquiagem escorrida - Você estava...

—Por que esta aqui? – Me interrompeu

—Eu juro que ia pra sala...

—Por que não foi? – Me interrompeu de novo.

—A diretora Célia esta rondando a escola e...

—Já entendi... – Disse ela olhando para seus papeis organizados procurando algo para fazer apenas para não ter de me encarar. – Pode ficar aqui até ela voltar para a direção disse ainda de cabeça baixa apenas encarando a mesa de madeira.

—Ruby... – Disse me sentando a sua frente.

Ela levantou sua cabeça em câmera-lenta e fixou seu olhar em meus olhos.

Meu celular vibrou quebrando totalmente o momento que eu simplesmente não saberia descrever, mas que estávamos tendo.

—Admirador secreto? – Perguntou Roberta se virando de costas para mim.

Eu sorri sem entender completamente o que estava acontecendo, mas alguma coisa na minha mente sussurrou que Roberta poderia estar com ciúmes.