Nove Meses escrita por Teddie


Capítulo 3
Abortar


Notas iniciais do capítulo

É a terceira vez que tento postar! Enfim, desculpe por não responder a todos que comentaram no ultimo capítulo, as coisas andam complicada. Prometo que responderei!

Aproveitem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/611104/chapter/3

– Não entendo o que estamos fazendo aqui – resmunguei, ao mesmo tempo que Austin coloca uma bandeja com um hambúrguer, batatas fritas e refrigerante em minha frente. – Deveríamos estar indo para o outro lugar.

Austin revirou os olhos, enquanto pegava uma batata distraidamente e olhava seu celular, concentrado.

– Pensa que eu não notei que você estava mais fraca hoje? Precisa se alimentar, Dawson – pegou outra batata, e voltou a falar, de boca cheia dessa vez – E isso para não falar desses saltos.

Reviro os olhos, mordendo o hambúrguer de má vontade. Acho que minha careta se desarmou, porque o hambúrguer estava simplesmente delicioso.

– Não revire os olhos para mim, Ally – reclamou – Você precisa se cuidar. Isso é perigoso para você e o bebê.

Ele fala em um tom alto demais e vejo pessoas nos olhando. Encolho-me na cadeira, querendo afundar e sumir.

O hambúrguer perdeu metade do gosto.

– Nem vai ter bebê nenhum – resmungo – Aliás, o que você tanto olha nesse celular?

Austin dá um gole demasiado alto em seu refrigerante, o que me faz revirar os olhos. Ele tem essa capacidade de ser uma pessoa absolutamente irritante fazendo absolutamente nada. Eu fico com raiva às vezes das coisas mais idiotas, como por exemplo, a jogada de cabelo dele para trás, porque ele faz isso de um jeito convencido demais.

Queria ter coragem de falar para ele que, na verdade, parece um bicho preguiça com torcicolo.

Ele me mostra a tela do celular com um endereço, e eu reconheço como o da clínica especial que ele me levaria. Abortos – odeio essa palavra – eram permitidos nos Estados Unidos há anos, e eu nunca me senti tão agradecida sobre isso.

Eu costumava achar esse tipo de coisa um absurdo, até estar nessa situação, e ver que e a única solução possível.

– Não fica muito longe daqui, e eu andei lendo que não tem exatamente um pré operatório, não no seu caso, onde a gravidez está só no começo. Então você pode relaxar e comer esse maravilhoso hambúrguer, que eu, tão benevolente, comprei para você.

Ele sorriu, e eu tentei sorrir, mas só havia lágrimas. Nunca pensei que Austin seria capaz de ser tão legal comigo quanto ele estava sendo.

Claro, no fundo da minha mente, eu imaginava que poderia ser algum tipo de plano do mal dele para me humilhar de todas as maneiras possíveis depois. E se ele o fizesse, eu nunca mais me recuperaria.

Austin tem me visto no pior e mais triste lado. Se ele tirasse proveito disso, eu morreria.

Sacudo a cabeça levemente para espantar esses pensamentos. Nem Austin seria capaz disso, ele nem era tão inteligente assim.

– Obrigada, Austin. – disse, e esperava que ele entendesse que não era só por me levar à clinica.

Ele pisca e da um sorriso de lado, sem mostrar os dentes.

Nosso contato visual é quebrado quando meu celular vibra e eu dou um pulo de susto, quase derrubando o que sobrou do meu hambúrguer.

Onde você está? Dezidiota e eu estamos preocupados – Trish.

Trish e Dez tem uma relação engraçadíssima. Trish é esquentada e explosiva, além de um pouco rude. Dez é o oposto, nunca conheci alguém tão simpático e alegre, além de sempre usar roupas extravagantes que a Trish detesta.

Eles se detestam, mas ao mesmo tempo tem uma das amizades mais sólidas que eu já vi. Implique com Dez e ganhará uma surra de Trish. Zombe Trish e ganhe uma vingança de Dez.

Sinto-me imensamente sortuda por ter esses dois como amigos.

E talvez Austin agora.

Respondo Trish sobre meus planos com Austin, e mandando o endereço também, para ela me encontrar depois. Trish me entenderia e me apoiaria.

– Quem era? – perguntou Austin.

– Trish, queria saber onde eu estava. Vamos, Austin? – chamo-o, querendo acabar logo com isso.

Meus problemas finalmente acabariam. Austin assentiu, e segurou minha mão, me puxando levemente para sair do lugar.

Somente quando chegamos no carro foi que notei que nossas mãos ainda estavam entrelaçadas. Fiquei constrangida, mas como ele não pareceu se importar, ou notar, resolvi deixar para lá.

O caminho no carro era silencioso, e a música que tocava no rádio era ruim. Pergunto-me quando seriam as minhas músicas a tocar na rádio. Só precisava perder o medo do palco, gravar uma música, lançá-la, torcer pra fazer sucesso e pronto.

– Ally, tem certeza do que vamos fazer? Quer mesmo que Noah nunca nasça?

– Não vai me dizer que agora é um desses ativistas a favor da vida e.... Você deu um nome? Austin!

Ele ficou vermelho na hora. Notei que as mãos deles seguraram o volante com mais força.

– Primeiro: Não sou um ativista, ou nada do gênero. Acredito que as mulheres tenham total direito sobre seu corpo, inclusive de não ter filhos se não quiser, mas isso não parece ser algo que você faria.

Se eu estivesse em meu estado normal, retrucaria algo sobre ele não me conhecer, mas eu ainda estava chocada por ele dar um nome ao meu bebê... ao feto. Ele ainda não poderia ser considerado um bebê, ainda mais meu bebê.

– Isso não muda o fato de que você deu um nome a ele. Não pode dar um nome, se der, vai se apegar. E o bebê nem é seu! – minha voz sai três vezes mais fina.

– Se controla, Ally! É que dá trabalho falar bebê e gravidez toda hora. E Noah é um nome unissex, achei que convinha.

– Mas não convém. – soei ríspida – Não pode dar um nome, fica mais difícil para se livrar depois.

– Ally – a voz dele ecoa no carro, ele está com raiva – Esse bebê na sua barriga não é um cachorro, para falar desse jeito. É um ser humano, por mais que você esteja a caminho de uma clinica de aborto, você não pode falar assim. Mostre respeito.

As palavras dele me machucam. Sinto-me infantil, idiota e todos os adjetivos ruins possíveis. Nunca pensei que levaria u sermão, ainda mais um vindo de Austin.

Ele estava certo, obviamente. Eu deveria parar de tratar Noah... o feto como um cachorro que eu poderia me desfazer facilmente. Fazer isso era uma coisa difícil.

– Noah é ótimo. – digo apenas.

Paramos no estacionamento, que não parece muito cheio. Aperto a mão de Austin e vamos assim até dentro da clínica, que de fato, não estava cheia.

Austin pegou uma ficha, que eu preenchi rapidamente e entreguei pra a mulher estranha da recepção. Ela deve ter notado minha apreensão, pois sorriu delicadamente.

A clinica era toda pintada de branco, o que não me deixava mais calma, e sim cada vez mais nervosa. Eles não deviam por tudo tão branco em um ambiente tão... mortífero.

Austin e eu não conversamos, e a cada menina que era chamada, ele apertava suavemente minha mão. Tudo ficaria bem...

– ALLY! Vamos embora agora – Trish surge com Dez em seu encalço e nos dá um susto. Austin e eu levantamos no ato.

– Trish, Dez, o que fazem aqui? – perguntei, tentando ignorar que todos nos olhavam, e isso só me deixava mais nervosa.

– Viemos te levar embora. Trish... – Dez levou uma cotovelada de Trish – Nós achamos que você não pode fazer isso.

Fito Trish, furiosa.

– Você não tinha o direito de se meter assim na minha vida.

De todas as pessoas do mundo, nunca imaginei que Trish discordaria de mim em um momento desses. Trish sempre fora minha melhor amiga, sempre me incentivou nas decisões mais importantes que eu fiz, sempre me deu suporte. Ela mais que ninguém deveria saber que eu não me sinto pronta para ser mãe, eu nunca quis ser mãe para começar.

Depois que minha mãe me deixou, eu sempre achei que, se tivesse um filho, faria tudo igual.

E ninguém está pronto para maternidade aos dezessete anos.

– Ally, você não pode fazer isso. Abortar? – falou, e eu senti a repulsa na voz dela – É uma vida ai, Ally!

Reviro os olhos, já cansada da situação. Todas as pessoas na clínica se olhavam e cochichavam um com os outros.

– Tecnicamente, ainda não tem uma vida ai – Austin comentou, totalmente relaxado – É só o zigoto, é um feto, ainda não tem pensamentos e sentidos.

Trish bufa em alto e bom som e Dez se encolhe, colocando as mãos nos ombros de Trish, para que ela se acalmasse. Trish deu um tapa na mão de Dez.

– E ainda está aqui com ele! – olhou para Austin com nojo, o loiro revirou os olhos – Austin, Ally? O mesmo que inferniza sua vida há anos!

Sinto-me irritada por algum motivo. Sim, Austin tem sido um carrasco na minha vida, mas isso não muda todas as coisas boas que ele fez para mim nos últimos dias. Quer dizer, ele fez eu me alimentar, me consolou, soou a cara do Dallas!

Esse tipo de coisa não se esquece assim, nem releva quando postas em uma balança.

– Por favor – a recepcionista se pronunciou, a cara dela estava bem feia – Se não vão parar de discutir, pelo menos discutam mais baixo.

Todos nós quatro reviramos os olhos para ela.

– Vamos, Ally. Assuma a responsabilidade pelo que você fez. Deixe o panaca do Austin ai, e vamos embora. Você ainda tem que contar para o seu pai – Trish apelou, e eu senti o corpo de Austin retesar atrás de mim.

– Espera um pouco – a voz dele é cautelosa. Ele vai explodir com Trish por causa das ofensas, aposto – Como assim contar para seu pai? Ally! Você não contou para ele que está grávida?

– Você é o que agora para me julgar? Jesus Cristo? É claro que eu não contei.

– Ally, isso está errado – ele e Trish falam ao mesmo tempo, mas não pelos mesmos motivos, eu acho.

Bem quando eu ia dizer alguma coisa bem feia para Austin e Trish, uma voz vem de dentro do consultório chama meu nome. Meu estomago gela na hora, e eu tenho vontade de vomitar o hambúrguer que eu comi com tão boa vontade.

Olho para Trish, que me olha com aquela repreensão que só ela consegue ter. Austin, me lança um olhar de encorajamento.

Então olho para Dez.

Dez, que sempre sorri, faz brincadeiras idiotas e se veste tão colorido. Dez, que sempre tem alguma estupidez na ponta da manga. Dez, que contou para Didi, e que começou toda a confusão no colégio. Dez, meu melhor amigo.

Dez, que estava alheio a essa discussão toda entre Trish e Austin.

Dez me manda um olhar compreensivo, e diz, sem produzir som nenhum:

– Faça o que tiver que fazer.

Poucas vezes vi Dez ser tão sério na vida, ou não falar babaquices. Ver Dez sendo uma pessoa madura me desestabilizou totalmente.

Eu realmente queria abortar? Era uma vida dentro de mim. Sempre detestei esse tipo de atitude, e agora eu estava ali, pronta para fazer o mesmo.

Ouço meu nome sendo chamado novamente, e engolindo seco, entro na sala.

A doutora está sentada atrás de uma mesa de madeira tingida de branco. Seu olhar é tão benevolente que eu me sinto enjoada. Esperava alguém com cara de mau, roupas sujas de sangue e nojento, como sempre retratamos médicos que realizam esse tipo de procedimento.

Pelo contrário, a doutora tinha cabelos compridos e loiros presos em um rabo de cavalo, e olhos azuis cobertos por óculos de grau de armação vermelha. Tinha por volta dos cinquenta anos, e eu sentia, olhando para ela, que ela compreendia o olhar desesperado que eu mandava para ela.

– Ally, sente-se, por favor. – apontou para a cadeira de frente para ela. Sentei-me vagarosamente, e ela me lançou um sorriso doce – Então, quer me contar o que está havendo?

Olhando de um tempo futuro, cheguei a conclusão que doutora Angie – como ela me contou que se chamava, bem propício, por sinal – era algum tipo de bruxa.

Só sendo uma para me fazer desabar como ela conseguiu que eu fizesse. Contei para ela como conheci Dallas, e como foi importante minha primeira vez com ele. Ai falei da camisinha esquecida e como eu engravidei.

Contei para ela da reação do Dallas essa manhã e então eu notei que tanta coisa já tinha acontecido, que nem parecia que ainda era o mesmo dia.

Mas ainda era.

E a partir desse momento, todos os meus dias seriam corridos assim. Bem, depende da minha decisão.

Contei para ela também todos os meus anseios e minhas dúvidas. Angie ouviu tudo calada, assentindo às vezes para mostrar que me acompanhava. Imaginei que fosse desabar em lágrimas de novo, mas não o fiz. Acho que amadureci um pouco nesse tempo de gravidez, ou minhas lágrimas secaram de vez.

Seja qual for o motivo, não chorei. E quando eu acabei de contar, ela passou a falar dos riscos, do procedimento, de como ela introduziria um aspirador de pó em mim e sugaria Noah... o feto.

Eu ficava enjoada cada vez que aquela criatura angelical falava sobre como o aborto se realizaria.

Mas notei também que essa era a função dela, ela deveria explicar do jeito mais explicito para as mais fracas desistirem, e as que realmente quisessem falassem logo aspire-me. Não sei em qual me encaixo.

Faça o que tiver que fazer.

Que maravilha, Dez, muito obrigada!

– E então, Ally? – Angie perguntou, após terminar a explicação sobre a sucção – Pronta?

(...)

Sai do consultório sem fazer barulho. Estava nervosa, com medo, me sentindo frágil. Todos aqueles sentimentos confusos quando você perde o controle da situação.

Eu estava perdida.

Nenhum dos três repara em mim. Dez está lendo uma revista de cabeça para baixo. Noto que a garota na capa é a namorada dele, Carrie. Trish estava olhando para a tela do celular com a cara amarrada. Trish sendo Trish. E Austin. Acho que nunca tinha reparado em Austin assim. Ele estava quase deitado em uma das cadeiras com os olhos fechados e cantarolava The Night Is Still Young, da Nicki Minaj.

Sei que era isso, pois o volume estava altíssimo.

Nunca imaginei que Austin ouviria esse tipo de música.

Ele abriu levemente um dos olhos, e quando me viu parada diante dele, deu um pulo da cadeira, quase caindo, e se prostrando junto a mim. Ele me olhava preocupado, avaliando cada detalhe em mim. Tocava em meu rosto, e em meus braços. Gostei um pouco dele por se importar tanto.

Trish e Dez colocaram-se ao lado de Austin, olhavam-me com expectativa.

– Vamos embora logo – funguei – Tenho que contar ao meu pai que vou ter um bebê.

Trish abriu um sorriso e Dez assentiu, sorrindo levemente. Os dois saíram na frente correndo, dizendo que tinham que passar em algum lugar antes, mas que nos encontrariam antes de eu contar a Lester as novidades.

Novamente, estávamos eu e Austin sozinhos. Senti-me meio aliviada, para ser sincera.

– Você fez a coisa certa – ele disse, por fim, quando já estávamos no carro dele.

Franzi o cenho. Não estávamos conversando muito, e a fala dele me surpreendeu um pouco.

– Então por que me ajudou, me levando até lá? O que você quer com tudo isso, Austin? – perguntei, expressando todas as minhas iniciais dúvidas.

Ele suspirou, dando-me uma olhadela rápida.

– Quero somente estar aqui, Ally.

Ele não me respondeu absolutamente nada, e sinceramente, não me esforcei nem um pouco para tentar desvendaras palavras dele.

Tinha mais com o que me preocupar.

Como, por exemplo, o fato de estar quase chegando em casa, e sentado na varanda, meu pai, lendo um livro, totalmente alheio à situação.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

O que acharam?