Depois da batalha você sumiu escrita por Vindalf


Capítulo 2
Perigo




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Anna estava na sua caminhada ao lado de Thranduil, e ele segurava seu braço. Nunca iam muito longe, pois Anna não aguentava ficar muito tempo em pé, cansando-se rapidamente. O rei comentou casualmente:

— Legolas tem perguntado sobre sua saúde.

Anna ficou espantada:

— Legolas? Oh, é verdade. Eu gosto muito dele. Engraçado não ter me lembrado dele até agora...

— Ele tem pedido para fazer-lhe uma visita.

— Mesmo?

— Sim, mas eu não gostaria de prejudicar sua recuperação, minha querida. Será que você não se extenuaria em recebê-lo?

Anna confessou:

— Eu gostaria muito de ver Legolas...

Thranduil cedeu:

— Talvez... mas deverá ser uma visita curta, claro.

— É muito gentil da parte dele. Gostaria de ver Legolas, se possível.

— Falarei com o médico, e então veremos. Que tal?

— Fico muito agradecida.

— Mas não se esqueça de tomar seu remédio. Ecthelon o considera fundamental para sua recuperação.

Mais uma vez Anna se comoveu com o cuidado e esmero que o rei élfico dedicava a sua saúde. Ela se sentia confortada e satisfeita, sem sequer suspeitar de algum motivo sinistro na atitude de Thranduil. Afinal, se ela estava um pouco desorientada (a ponto de ter perdido a memória a respeito de Legolas), isso era facilmente explicável devido ao choque que recebera.

Nada mais do que isso.

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— Minha senhora, seus ferimentos cicatrizam esplendidamente.

Anna sorriu para o médico, garantindo:

— São suas mãos talentosas, meu bom amigo. Fico-lhe grata.

Ele trocou o curativo, dizendo:

— Vou chamar as amas para trocá-la, a fim que possa fazer seu passeio terapêutico.

— Sim, não é de bom tom deixar nosso rei Thranduil esperando.

Ecthelon informou:

— Oh, milady, sinto muito. Meu lord Thranduil deixou mil desculpas, mas assuntos inadiáveis o impedem de acompanhá-la nesta manhã. Ele pede que não se deixe privar de seu passeio por conta disso.

Anna não esperava por aquilo, e ficou vexada.

— Oh... É claro. Oh, mas que egoísta eu sou: Sua Majestade tem um reino para cuidar, e eu querendo monopolizar as atenções de uma pessoa tão importante!... Eu deveria ter vergonha!

— Milord se preocupa com sua saúde como com nenhum outro hóspede. Ele insistiu que mantivesse seu passeio e destacou guardas para sua segurança.

— Rei Thranduil é extremamente atencioso comigo. Devo seguir seus desejos.

— Sim, milady. Vou providenciar tudo. Não precisa se preocupar com nada.

Anna obedeceu docilmente, fazendo sua caminhada. Porém, sozinha como estava, não demoraram a vir pensamentos pesados, os mesmos que o rei Thranduil tentava dissuadi-la de ter, para benefício de sua saúde. Mas Anna se lembrava de seu amor Thorin Oakenshield, caído na batalha, sangrando, com Kíli e Fíli a seu lado. E então ela ficou confusa e triste. Ela caiu no chão, exausta e chorando. Na verdade, ela chorou do mesmo jeito que fazia à noite. Parecia ser incapaz de se controlar. Suas lágrimas pareciam encharcar rapidamente o chão.

— Milady!

Um dos guardas, Elros, ajudou-a a se erguer. Anna estava tão estressada que se deixou ser levada de volta a seus aposentos. Ecthelon ministrou o remédio para Anna e deixou-a descansar.

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Ela veio sorrateiramente. Anna estava distraída, como costumava ficar aqueles dias, sentada numa janela de seu quarto, olhando a floresta uma vez verde, hoje chamada Mirkwood. Então ouviu a voz:

— Lady Anna?

Anna se virou e viu a elfa. Ela parecia um sonho, com um cabelo ruivo muito comprido, que caía em cascatas, mas preso em elaboradas tranças. Trazia armas e estava vestida em trajes que faziam lembrar os guardas. A elfa se curvou:

— Meu nome é Tauriel, milady. Vim lhe fazer uma pergunta, se me der a gentileza de uma resposta.

— Sim?

— Seu sobrinho, Kíli.

Anna sentiu uma dor profunda no peito. Kíli sempre a tratava por “futura tia”, indicando que já se considerava seu sobrinho, mesmo que ela não tivesse se casado ainda com Thorin. Ele tinha um carinho especial por Anna, e a recíproca era verdadeira. Anna adorava Fíli, mas Kíli tinha um lugar especial em seu coração. E agora ele estava com Thorin e Fíli no salão de seus antepassados, tão longe dela...

Só então Anna percebeu que Tauriel ainda estava falando.

— ... e ele é uma pessoa tão gentil, mas eu não sei se ele realmente-

Anna interrompeu-a, já em lágrimas:

— Por favor, Tauriel, você parece ser uma boa pessoa. Por que me tortura assim?

Ela pareceu espantada:

— Milady?

A voz de Anna falhou ao lembrar:

— Kíli, doce Kíli, não está mais entre nós... Ele morreu, e sua ausência é um vazio profundo dentro do meu coração. Kíli morreu, Fíli morreu e o amor de minha vida também não está mais aqui...

Tauriel estava alarmada:

— Não, milady, está enganada. Kíli vive! Ele se recupera e-

Mas Anna não ouviu mais nada do que Tauriel tinha a dizer, desmanchando-se em lágrimas. A elfa estava chocada, e aproximou-se dela, querendo consolá-la. Mas reconheceu o cheiro de uma erva medicinal na cabeceira de Anna, uma que não deveria estar ali.

Tauriel nada mais podia fazer e saiu, triste e confusa, antes que atraísse atenção, já que o quarto da senhora era proibido a todos, por ordem do rei.

Mas ela precisava consultar seu amigo Legolas.

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— Sentiu isso, esposa?

— Há dias venho sentindo uma grande perturbação por sobre a terra — respondeu Galadriel ao marido. — É um evento insidioso, que pode ter consequências imprevisíveis.

Celeborn quis saber:

— Está bem certa? Não me pareceu ser uma ameaça tão tenebrosa.

— Aí reside a natureza da insídia — garantiu a Senhora de Lothlórien. — Pois estes malfeitos ameaçam a estabilidade de todo o Leste. O dragão pode ter sido conquistado, mas aquelas terras ficam mais uma vez maduras para o espírito daquele que não tem rosto nem nome.

— Quão graves são tais feitos, minha senhora! Que podemos fazer?

Ela se ergueu, decidida:

— Não podemos deixar fatos tão terríveis vir a ser. Minhas águas hão de me ajudar.

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A ajuda a que Balin se referiu demorou alguns dias para chegar a Mirkwood e esperar uma brecha para conseguir adentrar os salões do rei do reino da floresta. Bilbo Baggins teve que prometer a Balin que usaria seu anel mágico apenas tentaria obter informações sobre o paradeiro de Anna ou as intenções dos elfos, se é que a mantinham presa. Ele deveria obter informações sobre tudo que fosse possível, para que eles pudessem formular um plano de resgate.

Demorou um pouco até que o hobbit tivesse algum sucesso. Mas ele se lembrava do tal lugar-tenente de Thranduil, um elfo de cabelos escuros chamado Feren. Ele o seguiu e ouviu o nome de Anna. Então passou a segui-lo. Para sua surpresa, Bilbo viu Anna. Feren a acompanhava de longe. Ela caminhava por uma trilha próxima ao castelo, seguida por alguns guardas, à distância. Estava só, parecia triste.

Bilbo sentiu algo errado. Ou melhor, algo estranho com Anna. Ela parecia fraca e hesitante, como se não estivesse certa do que fazer. Então, ela começou a chorar, e caiu no chão, desmanchando-se em lágrimas sofridas e autênticas. Bilbo se comoveu, mas elfos a ampararam e a levaram para dentro.

Bilbo seguiu o grupo, que levou Anna a um aposento. Lá ele conseguiu entrar a tempo de ver Anna ser medicada e cair em sono profundo.

Então ele resolveu seguir Feren, que foi direto se reportar ao seu senhor Thranduil. O hobbit animou-se. Quem sabe agora ele conseguiria obter as informações que tanto buscava.

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Feren curvou-se diante de seu rei, saudando:

— Milord.

Thranduil livrou-se de seus trajes de caça com elegância costumeira e indagou:

— Que novidades me traz, Feren?

— Tudo correu de acordo com suas previsões, meu rei.

As sobrancelhas elegantes se elevaram:

— Mesmo?

— Talvez melhor do que o previsto. Ela sentiu sua falta a tal ponto que se descontrolou.

Os olhos de Thranduil brilharam.

— Excelente. Aproxima-se a hora de agir.

— Sim, milord.

A entrada de Legolas no aposento fez Thranduil dispensar Feren com um movimento de mão, e o auxiliar se curvou antes de sair. Legolas se curvou:

Ada.

— Os ninhos das aranhas – mandei que fossem destruídos.

— E foram, meu pai. Mas vim novamente pedir para ver Lady Anna. Soube que não esteve com ela hoje. Ela pode ter se sentido solitária.

Thranduil serviu-se de vinho, dizendo:

— Feren acaba de vir me dizer que ela não passou bem esse dia. Pobrezinha. A situação dela... me comove, Legolas.

— Meu pai, a situação dela precisa ser resolvida, ou poderemos ter nova batalha – desta vez por causa de Lady Anna.

Thranduil se tornou duro:

— Se Lady Anna não quer nada com os anões, eu farei o impossível para respeitar seu desejo. Ela nos prestou um grande serviço, Legolas. É nosso dever protegê-la.

— Sim — disse o príncipe, pensativo. — Concordo, hîr nin.

Thranduil suavizou o olhar:

— Vai dar tudo certo, meu filho. Eu deixarei você vê-la no tempo certo. Pode ficar descansado.

Não, pensou Legolas. Descansado era justamente o que ele não ficaria até ele tirar a limpo direitinho as intenções de seu pai.

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Bilbo arregalou os olhos. Ele mal acreditava no que tinha ouvido. Se o que ele ouvira era verdade, Anna estava sendo enganada. Mas ainda não dava para saber até que ponto ela estava sendo usada.

Resolveu colher mais informações antes de pensar no seu próximo passo. Para isso, decidiu voltar ao quarto de Anna.

Acompanhou Legolas para sair do quarto, mas o príncipe élfico impediu sua passagem, e depois Bilbo simplesmente ficou perdido dentro dos imensos corredores e passagens do palácio na floresta. Sua melhor opção era tentar encontrar Feren para localizar os aposentos de Anna. Quis o destino, porém, que outra pessoa chegasse junto de Legolas.

Era uma ruiva baixinha, de queixo definido e grandes olhos verdes. O hobbit a conhecia: era a chefe da guarda. Ela parecia alarmada ao falar com o príncipe, mas Bilbo não entendia a língua deles. De repente, Legolas puxou-a para um aposento vazio.

— Tem certeza do que está dizendo? — insistiu ele, em voz baixa, felizmente em Westron. — Tauriel…

Ela garantiu:

— Eu olhei e reconheci o cheiro. É vinha-do-norte!... Também havia valeriana, talvez pulsatilla.

Legolas sibilou:

— Essa erva é perigosa. Por que o curador a estaria dando a Anna?

— E não é só isso — disse a elfa. — A senhora crê que toda sua família esteja morta!...

— Mortos? Todos?

— Não sei se todos, mas ela mencionou “Kíli, Fíli e o amor de sua vida”.

— Thorin... — adivinhou Legolas. — Mas por que ela pensaria isso?

— Seu pai não lhe disse nada?

Legolas respondeu:

— Ele não me disse muito: só que ela estava desiludida com o rei anão, que finalmente vira como ele é rude e mal-educado... Deu a entender que ela não tinha interesse em voltar para Erebor.

Tauriel indagou:

— Acha que os anões poderiam obrigá-la a ir contra sua vontade?

— Não sei. Mas acho que ela não está em condições de fazer uma escolha.

— Ela está triste além do prudente — observou a elfa. — Temo por ela, Legolas. Gostaria de poder ajudá-la.

— Meu pai diz a mesma coisa — disse o príncipe. — Mas eu posso ver que ele tem planos para Anna. Gostaria de saber quais são. Só o que eu sei é que ele não vai entregá-la aos anões.

— Então haverá guerra - de novo. O rei sob a montanha não vai aceitar isso sem luta.

Uma terceira voz indagou:

— Vocês querem ajudar?

Imediatamente os dois jovens elfos se puseram em guarda, armas em punho.

— Onde está? — indagou Legolas, ríspido. — Mostre-se, ou conhecerá nossa ira!

— Está bem, está bem! — Bilbo saiu de detrás de uma coluna, mãos para o alto. — Por favor, não me matem!

Tauriel reconheceu:

— Você é aquele hobbit dos anões...!

— E você roubou a chave das celas debaixo do nariz da guarda!...

Bilbo garantiu:

— Eu já esclareci isso com seu pai. Agora quero saber se realmente querem ajudar Anna.

— Foi o que veio fazer? — indagou Legolas. — Libertar Anna?

— Não, só vim colher informações e verificar o que aconteceu com ela.

— Diga ao rei anão que ela-

Bilbo o interrompeu:

—Thorin não sabe que eu vim. Ele está muito ferido, não sabe de nada disso. Mas quando souber... Vai querer soltar Anna a qualquer custo.

— E o que pretende fazer?

— Não posso libertar Anna, mas acho que ela precisa de ajuda. O príncipe Legolas tem razão: ela não está em condições de tomar decisões. Está sob efeito de drogas.

Tauriel repetiu, admirada:

— Drogas...!

— Essa vinha-do-norte, como chama, tem poderes calmantes. Mas combinada com outras ervas, pode deixar uma pessoa grogue e influenciável. Acredito que é o que fizeram com Anna. Só assim ela desistiria de ver Thorin.

— Mas por que meu pai faria isso?

— É isso que não consigo entender. Diga, seu pai já mostrou algum tipo de interesse por Anna?

Tauriel indagou:

— Que tipo de interesse?

— Do mesmo tipo que você tem por Kíli.

A elfa enrubesceu, mas Legolas respondeu:

— Elfos amam uma única vez na vida, mestre hobbit. Meu pai amava minha mãe. Nunca mais será capaz de amar outra.

— Então não consigo explicar. Por que ele se daria a todo esse esforço?

— Algum motivo ele tem — garantiu Legolas. — Talvez a longo prazo.

Tauriel quis saber:

— O que podemos fazer?

— O primeiro passo é desanuviar a mente de Anna. Fazê-la parar de tomar o remédio para que ela possa perceber que corre perigo.

— Terá que enganar seu pai — lembrou Tauriel. — Ficará à vontade fazendo isso?

O jovem príncipe fechou os olhos e suspirou:

— Se meu pai não tem intenções honradas, não tenho por que honrar suas intenções.

Bilbo inspirou, sentindo-se mais confiante. Agora ele poderia ajudar Anna, sem a ameaça de uma nova guerra.

Ilúvatar querendo, claro.

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Thranduil sabia que poderia ser uma figura capaz de intimidar, quando queria. Ele tomou cuidado especial para isso quando concedeu a audiência especial ao líder do povo vizinho. Do alto de seu trono de madeira, usando sua coroa invernal, o rei élfico encarou seu convidado de cima para baixo.

— Confesso que não esperava uma visita sua — disse o rei. — Nossa ajuda tem lhe faltado?

Bard se curvou:

— Milord, sua generosidade continua a nos favorecer desde que resolvemos construir a antiga cidade de Valle. Somos muito gratos. Meu propósito aqui é outro.

— Diga então, matador de dragões, o propósito de sua visita.

— É a respeito de Anna, a prometida de Thorin Oakenshield — respondeu Bard. — Ela não foi vista desde a batalha. Seu corpo não foi encontrado. Teme-se por seu destino.

Thranduil apertou os olhos cinicamente e quis saber:

— Que interesse têm os homens de Valle na prometida do anão?

— Uma dívida de gratidão, Majestade — disse Bard. — Ela nos alertou para o ataque do dragão. Salvou muitas vidas. Gostaríamos de recompensá-la. Circula um rumor que ela está abrigada neste palácio.

O rei élfico ergueu-se, fazendo os ricos trajes adamascados flutuarem graciosamente a seu redor enquanto descia de seu pedestal, confirmando:

— O rumor retrata a verdade. Lady Anna é minha hóspede e está sob minha proteção. Parece que seu prometido não a perdoou pelo episódio da Arkenstone.

— Perdoe-me, meu lord — disse Bard. — Mas os anões gostariam de obter a pequena de volta. Ela foi perdoada, de acordo com as leis deles. O noivo real chama por sua pequena.

Thranduil ergueu a voz:

— Eu é que peço seu perdão, senhor, se eu desconfiar da verdadeira motivação do povo da montanha. Para mim, isto é um embuste – apenas um truque para atraí-la para longe da proteção dos elfos da floresta. Não pretendo voltar atrás na minha palavra de protegê-la. Lembre-se do que ela fez, senhor Bard, dos sacrifícios e dos riscos que correu. Eu não verei esses nobres gestos recompensados com traição e desonra. Sugiro que faça o mesmo.

Sem possibilidade de diálogo, Bard inclinou-se respeitosamente, sentindo as negociações terminadas. No fundo da sala, escondido por uma coluna, Legolas inspirou profundamente, ansioso. A seu lado, invisível e apreensivo, Bilbo suspirou da maneira mais silenciosa que pôde. Mas a situação não parecia evoluir para melhorar.

Palavra em Sindarin

hîr nin = meu senhor


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