Ele ainda podia ouvir o tiro. O som de sua liberdade e da de Tobias.

Spencer estava em sua casa, em sua cama com a insônia como companheira naquela noite e as lembranças daqueles dias tão tenebrosos do caso de Tobias Hankel. O caso onde ele foi sequestrado.

Mas não eram as torturas de Raphael ou o pai de Tobias que assombravam a sua mente, e sim aquele único momento onde a câmera do notebook se encontrava desligada. Aquela vez, a única vez que ele não teve uma resposta ou uma explicação para o que havia acontecido.

"Spencer acordou alarmado olhando para os lados daquela cabana macabra e fria se recordando da situação onde estava. Era sempre horrível a hora de acordar.

- Você acordou cedo, Raphael ainda não chegou - Disse a voz masculina de tom doce e amedrontado.

- T-Tobias? Por favor... Me deixe ir, eu posso te ajudar, eu posso...

- Eu já te disse que não tem jeito - Disse Tobias de modo triste - Ele sempre sabe.

- Por favor... - Implorou Spencer.

Tobias retirou o vidro com o líquido para que Spencer adormecesse, mas antes que pegasse a seringa, o agente voltava a tentar confundí-lo.

- Tobias eu quero te ajudar.

- Não tem como me ajudar.

- Tem sim, você tem que assumir o controle!

Tobias largou a seringa e o vidro levando as mãos aos ouvidos. Raphael não podia escutá-lo, não podia voltar agora, não podia ver que ele havia pensado por um segundo em tentar lutar e muito menos voltar para machucar Spencer.

- Para! Ele vai te ouvir! Ele vai te ouvir!

Spencer suspirou frustrado. De certa forma Tobias tinha razão, eles faziam parte de uma mesma pessoa, se ele dissesse mais alguma coisa estaria morto.

Tobias tirou as mãos dos ouvidos e encarou Spencer visivelmente triste.

Reid não pôde deixar de encará-lo com o mesmo olhar melancólico. Ele sentia pena de Tobias, preso em si mesmo, a mercê de outro "eu". Era difícil imaginar aqueles olhos tristes que lhe dirigiam a palavra numa voz tão mansa, pudesse fazer mal a alguém. Mas ali estava ele, preso, amarrado e machucado naquela cadeira dura.

Spencer gemeu sentindo sua cabeça e seu pé latejarem.

- Vai melhorar - Disse Tobias recolhendo o vidro com a droga.

- Não, não faz isso - Implorou Reid. No fundo ele queria a droga, ela o ajudava a superar tudo aquilo, mas não era certo.

- Você não vai aguentar. Ela ajuda - Disse Tobias - Ela já me ajudou.

- Só você pode se ajudar Tobias. Se assumir o controle. Você não é mal, você é bom.

Tobias ouvia as palavras de cabeça abaixada e com as mãos trêmulas. Ele levantou a cabeça encarando os olhos castanhos e amedrontados de Spencer. Ele não lhe parecia um pecador, muito menos do tipo que mentia. Tobias ergueu sua mão direita até o outro e o viu fechar bem os olhos, provavelmente temendo que ele lhe fizesse mal, mas Tobias não faria mal à ele.

Spencer sentiu a mão se afundar em seus cabelos e acariciá-lo gentilmente. Ele abriu os olhos atordoado, mas logo os fechou novamente ao sentir uma sensação boa com aquele simples ato. Spencer sentiu um calor se aproximar dele e lábios pressionarem-se contra os seus fazendo com que seu peito ardesse, mas antes que pudesse corresponder àquela loucura, ele sentiu um imenso torpor invadí-lo. Sentiu algo forte invadir sua corrente sanguínea.

Era óbvio que Tobias havia injetado a seringa nele e era óbvio que quando ele acordasse não o encontraria ali, e sim Raphael, mas nem mesmo o torpor podia fazê-lo esquecer do que seus lábios lembravam."

Spencer suspirou lembrando da crueldade de Raphael no dia seguinte em lhe fazer escolher um de seus parceiros do FBI para morrer, e suspirou ao se lembrar do sorriso aliviado e das últimas palavras de Tobias caído naquele chão com a bala cravada no peito.

"Você matou ele"