Perspectiva de Sam.

Sam estava tirando uma soneca da tarde. Isso era bom, principalmente depois de um almoço, e melhor ainda quando o almoço eram empadinhas de frango recheadas com catupiri. Mas é claro, a felicidade de um elfo não pode durar muito tempo. Felicidade de elfo é igual felicidade de pobre: dura pouco.

Yo soy más hermoso elfo en el mundo. ¿Quién es el elfo más guapa del mundo? I i i.

Que barulhinho incomodo era aquele? Ah, espere, era o celular dele tocando. Digamos que Sam tinha um gosto muito estranho para musicas de chamada. Vocês pensam isso por que nunca virar o barulho do despertador dele... aquilo sim era estranho.

O elfo não tinha a menor vontade de levantar da cama para atender o celular. Devia ser só Alec avisando que tinha achado Vanessa. O vampiro tinha ficado a manhã e tarde inteira procurando a irmã, Sam tinha dito que não era para ele se preocupar e que Vanessa só devia estar em um quarto de algum garoto por aí. Sam quase levou um soco por ter falado mal da irmã dele. Sam nunca entendeu por que as pessoas se irritavam com a sinceridade dele e depois ficavam reclamando que o mundo é hipócrita.

¿Quién es el elfo más guapa del mundo? I i i.

¿Quién es el elfo más guapa del mundo? I i i.

— Sam atende logo essa porcaria! — Damien berrou. Onde o Damien simpático e legal foi parar? Bom, provavelmente ficou dormindo em outra dimensão, pelo visto.

Damien estava cochilando na outra cama, bom, estava, por que o som do celular maldito o acordou. Sam murmurou alguma coisa que devia ser : "Deixa o celular tocar", mas saiu como "deuxa o cebular tleuacar".

É evidente que Damien não conseguiu entender. Damien geralmente é uma pessoa simpática e calma, mas depois de ter sido tirado da sua soneca, aparentemente ficou de mau humor por que ele pegou o celular e arremessou na cara de Sam.

Sam abriu os olhos subitamente. Não tem como continuar dormindo quando um celular voa a 100km/h na sua cara. Caso estejam se perguntando se doeu, bom, peçam para alguém arremessar seu celular na sua cara, aí você vai descobrir.

— Alô? — O elfo disse de mau-humor. Seu nariz estava doendo incrivelmente, ele fez uma nota mental para na próxima vez que fosse comprar um celular, iria comprar um mais leve — Seu filho da mãe desgraçado! Dane-se se você achou a Vanessa por aí. Você tem noção que acabou de me acordar?— E é claro, ele falou dezenas de palavrões que não podem ser escritos aqui.

— Sam Castleood, se você continuar repetindo essas palavras grotescas serei obrigada a ter uma conversa com seus pais — A voz era formal e feminina. Para o desespero de Sam, ele conhecia de quem era aquela voz.

Estou ferrado, pensou enquanto imaginava seu tumulo.

— Ilithya! — ele arquejou — Meus deuses! Desculpe-me, por favor. Sou apenas um elfo tolinho, nunca tive a intenção de te ofender!

Damien tinha se levantado da cama e estava rindo dele. Feiticeiro cruel. Até Ilithya no outro lado da linha parecia estar se segurando para não rir.

— Não importa, mais tarde terei uma conversinha com a Sra. e o Sr. Castlewod, seus pais irão adorar saber sobre o seu "comportamento exemplar". — Parecia que ela tinha um prazer cruel em dizer isso. Claro que tinha, o maior prazer dos professores é ferrar a vida dos alunos — Compareça á minha sala ás sete e meia. Boa tarde.

Damien se inclinou na direção dele para escutar e depois se afastou rindo. Rindo da desgraça de Sam.

— Cara, você está ferrado

— Ah, antes que eu me esqueça — a feiticeira disse apressadamente — Avise para Damien Whyde também comparecer a minha sala.

Damien parou de rir subitamente. Por que será?

Então ela desligou o telefone.

— Eu não fiz nada! — Damien quase berrou.

— Eu também não fiz nada que ela saiba... ou será que sabe? — Sam estava começando a ficar preocupado com a possibilidade que Ilithya tivesse descoberto... algumas coisinhas. Tipo, a câmera secreta que ele mantinha no vestiário feminino, que foi ele que junto com Christine colocaram água oxigenada em alguns shampoos de pessoas irritantes, que foi ele que colocou a barata mecânica na sala de Raphael ( ele morre de medo de baratas), também foi ele quem colocou óleo nas escadarias... É melhor parar, se for listar tudo que ele fez nos últimos meses seria necessário um capitulo inteiro.

Não importa, por algum motivo, ele estava se sentindo desesperado. Sua intuição estava lhe dizendo que ele tinha sérias chances de se ferrar naquele dia.

Oh, deuses, ele pensou, espero que Ilithya não chame papai e mamãe para uma reunião.

Perspectiva de Damien.

Damien estava a beira do desespero quando abriu a porta para a sala maldita.

Ele tinha se atrasado, a reunião era ás sete e meia, e ele tinha atrasado cinco minutos. Era apenas mínimos cinco minutos, mas ele se sentia como se tivesse engolido um porco-espinho.

Entenda, ele nunca foi o tipo de aluno que se mete em confusões. Damien sempre foi o aluno exemplar: tirava boas notas, aprendia feitiços rápido, não arranjava encrenca com os professores, nunca aprontou nada ao contrario de Sam que vivia na diretoria. O feiticeiro não tinha feito nada de errado para ser convocado para uma reunião.

Quando ele abriu a porta, não conseguiu conter um suspiro de alivio. Não era só ele e Sam que estava na reunião, Mary, Alec, Raphael e Christine também estavam lá. Ilithya estava sentada ao lado de Vanessa.

Espere, Vanessa? Damien ficou a manhã inteira junto de Alec procurando aquela garota, e ela estava o tempo todo ali com Ilithya.

Felizmente não era só ele e Sam que foram convocados. Aquilo o deixou confuso.

Assim que viu ele, Ilithya conferiu o relógio.

— Cinco minutos de atraso. Você já foi mais pontual, Damien.

Damien sentiu como se a bola de espinhos na sua garganta estivesse revirando.Agora é que ela me transforma em um guaxinim, pensou.

Mas para a surpresa dele, ele não virou um guaxinim. Ilithya apenas acenou e uma cadeira apareceu e fez sinal para Damien sentar. O feiticeiro, como um bom garoto, sentou na cadeira cuidadosamente como se de repente pudesse aparecer uma taxinha na cadeira.

— Vocês todos devem estar se perguntando qual é o motivo da reunião, imagino — disse Ilithya, apoiando as mãos na mesa de vidro.

— Eu não fiz nada de errado! — Damien deixou de escapar. Sim, ele realmente estava desesperado. Quem não fica desesperado quando Ilithya está te encarando fixamente?

Ilithya encarou ele como se o feiticeiro fosse uma espécie rara de animal.

— Você não fez nada de errado.

— Mas... ah, é, eu não fiz nada de errado — ele confirmou antes que ela mudasse de ideia.

Isso era bom, saber que não estava ali para levar uma bronca. Pode parecer covardia da parte dele, mas Damien ouviu histórias que Ilithya transformou um aluno em um veado (literalmente) por irrita-la. Damien não gostava da ideia de ter chifres, bom, eu acho que ninguém gostaria. Exceto Hera talvez, mas ela tinha outro tipo de chifres...

— Voltando ao assunto — A feiticeira pigarreou — Ontem a noite tive uma visita inesperada ao meu quarto. A minha sobrinha veio aqui em desespero dizendo que Thanatos em pessoa foi conversar com ela. Isso foi minutos depois de eu ter um pesadelo... digamos, muito realístico. Realístico demais para o meu gosto. No sonho, os generais de Trivia estavam assassinando humanos para se manterem vivos já que a alma deles foi retirada do Mundo Inferior. Assim que acordei, fui olhar em um site de noticias e para minha surpresa, dezesseis assassinatos de mortais aconteceram durante a madrugada. E a policia não achou vestígios do assassino.

Damien odiava assassinatos. Primeiro, houve os assassinatos no Campo de Treinamento, e agora estavam assassinando mortais? Se ele soubesse que Layla era Trivia e que ela iria causar tudo isso, o feiticeiro teria matado ela enquanto dormia.

— Então tive uma ideia para obter informações sobre o exército de Trivia, tanto como parar os assassinatos — disse Ilithya, aparentando estar muito satisfeita consigo mesma.

Raphael fechou os olhos com uma suave irritação.

— Eu já falei que esse plano não vai dar certo — ele avisou —, é arriscado demais.

— Então você acha melhor que fiquemos parados esperando Trivia nos atacar novamente enquanto os generais dela matam mortais? — Um pouco mais e a feiticeira estaria gritando. Ilithya nunca pareceu o tipo de pessoa que perdia a paciência facilmente, ela sempre era fria em punições, mas naquele momento pareceu que ela queria decapitar alguém.

Todos na sala ficaram quietos ouvindo a discussão, afinal, não é todo dia que você tem a oportunidade de ver seus professores discutindo. Damien esperava sinceramente que eles não transformassem ninguém em animais por engano enquanto tentassem se matar, caso isso viesse a acontecer.

Como Raphael se calou, Ilithya continuou falando.

— Não importa se é arriscado. Pensei que seria bom enviar alguém como espiões para o lado de Trivia para retirar informações — Ilithya iria continuar falando mas Mary interrompeu.

— Mas isso é trapaça! — A ninfa protestou.

Para a surpresa de Damien, foi Vanessa que respondeu e não Ilithya,

— Mary, sinceramente, você não acha que já tem espiões de Trivia aqui?

Mary ficou vermelha.

— É claro que não, depois dos acidentes — Damien reparou que ela evitou usar a palavra assassinatos — O Campo de Treinamento parou de aceitar novatos por razões de segurança, assim não tem como espiões de Trivia entrarem.

Vanessa riu, ela parecia um pouco alucinada e também nervosa.

— Ah é? Você não acha que enquanto Thanatos estava aqui ele não observou nossos números e as nossas fraquezas? Você não acha que nenhum dos alunos antigos podem ter se virado para o lado de Trivia? Se você pensa assim, você é uma ingênua.

Depois disso, Mary empalideceu.

— Vanessa está certa — Ilithya parecia orgulhosa do raciocínio da sobrinha — Então decedi que seria bom enviar Vanessa e Alec como espiões. Thanatos se mostrou bastante afeiçoado por minha sobrinha e Alec deve ir junto para protege-la caso ocorra algo, e também ouvi que Trivia, quando era Layla nutria alguns sentimentos por ele.

Vanessa parecia satisfeita ao ouvir isso. Ela estava querendo se vingar de Thanatos, Damien percebeu. Alec parecia surpreso, mas não falou nada.

— E quanto aos assassinatos, durante a noite inteira pesquisei formas de mandar os generais novamente ao Mundo Inferior. Invoquei Hades e pedi sugestões á ele. O deus da morte achou que sua protegida, Christine poderia dar conta de mata-los novamente e se eu quisesse poderia mandar outro feiticeiro para auxiliar na tarefa e ajuda-la — Ilithya olhou para Damien e ele não gostou disso — Então Damien, o que acha de mandar algumas almas para o Mundo Inferior.

Damien engasgou.

— Bom, e para finalizar, durante a noite lembrei de uma pessoa. Rowena Ryen, a mãe de Trivia nesse vida. Estudei com ela á quinhentos anos atrás, quando era apenas uma garota. Não tive muitas noticias dela durante esses anos, mas soube que depois dela dar a luz a Trivia, Erebo a aprisionou. Se ele a aprisionou, devia teme-la de alguma forma e quero descobrir o que ele teme. Vou ir á um oraculo para tentar descobrir onde ela está aprisionada, mas para chegar até o oraculo preciso atravessar uma área protegida por Demeter, e para atravessar essa área vou precisar da ajuda de um elfo e uma ninfa. Mary e Sam, vocês aceitariam ir comigo?

Mary aceitou sem hesitar, Sam parecia cuidadoso como se a qualquer momento descobrisse que era uma armadilha de Ilithya para castiga-lo, mas por fim aceitou sem reclamar.

Ilithya parecia muito satisfeita.

— Agora que decidimos tudo, podem ir embora.

Damien queria protestar e dizer que não queria se meter com os generais, que era extremamente poderosos, mas algo lhe dizia que isso seria muita covardia da parte dele se falasse aquilo. E seria vergonhoso confessar aquilo na frente de seus amigos e professores.

Antes de atravessar a porta ele ouviu Raphael dizer:

— Sam, espere. Temos que ter uma conversinha a respeito de câmeras, baratas e água oxigenada.

Damien teve a ligeira impressão que Sam estava ferrado.