Kiyotsugu realmente tinha muitas perguntas separadas. Rikuo se perguntava quanto tempo ele havia levado para separar todas. Se havia começado a juntar desde quando descobrira a verdade sobre o amigo ou desde muito antes. Talvez desde quando Rikuo se transformara a primeira vez? Ainda se lembrava do dia. O ônibus escolar da escolinha tinha sido atacado por youkais que queriam afetar ao herdeiro do clã Nura que, naquela época, não passava de uma pequena criança indefesa. O desejo de proteger os amigos fez o coração de Rikuo arder e, pela primeira vez, ele assumiu sua forma youkai. Ainda bem que não estava dentre os amigos quando virou youkai e nem quando voltou a forma humana. Dessa forma, pode ajudar os amigos e manter o segredo intacto por mais tempo.

Kiyotsugu perguntou e perguntou por horas e sobre todo tipo de coisa. Os poderes de Rikuo, membros do clã, território do clã, outros youkai, a família Nura, todas as aventuras em que eles se encontraram com outros youkai e muitas coisas mais. E Rikuo contou... contou que basicamente lutava com uma katana e aliava seus poderes à isso; contou sobre a primeira vez que se transformara; contou que muitos youkai não aceitaram que o herdeiro e agora novo líder, fosse mais humano que youkai; contou que antes só queria uma vida normal e nem queria herdar o clã, mas muita coisa mudara desde então; contou que não só sua mãe e seu avô eram sua família, seu clã inteiro era sua família. Chegou um ponto em que todos, menos Kiyotsugu, já estavam cansados de tantas perguntas.

— Kiyotsugu-kun... Chega! – reclamou Shima que já estava jogado no chão do quarto de Rikuo. O garoto loiro (tingindo) fanático por futebol já estava quase dormindo

As outras meninas não estavam muito diferentes. Embora todos ainda ouvissem, ninguém aguentava mais. Rikuo também estava cansado de responder as perguntas (não que ele tenha respondido todas), mas tentava dar o máximo de si para ter mais paciência pelo amigo.

— Tá, tá. Ultima coisa então – disse Kiyotsugu – É uma pergunta mais simples. Será que... Bem... Imagino que agora seja talvez até meio sem graça pra você, mas... Será que poderíamos ainda investigar os lugares com youkai assim como fazíamos? Como quando fomos ao Monte Nejireme e quando fomos à escola à noite.

— Claro. Porque não? – disse Rikuo afirmando brevemente com a cabeça e dando de ombros. Seria até bom pois, assim, poderia ficar de olho no seu território. Claro que tinha pessoas incumbidas de o fazer, mas sempre era bom ele mesmo checar – Só... Cuidado com os lugares que escolher.

Só precisou disso para Kiyotsugu abrir um imenso sorriso em seu rosto. O garoto até estava com os olhos brilhando.

— C-Claro! Sim senhor! – disse Kiyotsugu até mesmo batendo continência para Rikuo – E-eu te falo o lugar e aí você fala o que acha!

Rikuo acenou com a cabeça concordando enquanto os outros se contentavam em suspirar sem estar muito entusiasmados por mais uma aventura do tipo.

— Bem, acho que pelo menos agora podemos ter mais certeza de que vamos voltar vivos dessas aventuras doidas que você inventa – disse Maki enrolando uma mexa de cabelo em seu dedo.

 - Sim, afinal, sabemos que temos o Nura-kun para nos proteger. – disse Kana com um sorriso tímido e corado.

Tsurara fitou a menina com o olhar frio. Notara a mudança de comportamento de Kana e não concordava nem um pouco com a mudança. Era claro que Rikuo, ao menos no começo, tinha alguns sentimentos começando à nascer por Kana. A garota, no entanto, nunca tinha dado bola para Rikuo. O que Tsurara desaprovava era que, do nada, ao descobrir que Rikuo era o forte youkai que muitas vezes tinha salvado o grupo, Kana parecia magicamente mais interessada. Tsurara entendia que Kana podia ser a conexão que seu jovem mestre precisava para uma vida humana normal, mas não aprovava a mudança repentina em Kana. O que tranquilizava seu coração, era que Rikuo parecia ter mudado também com o passar dos meses e o aumento das responsabilidades como herdeiro e então líder nas suas costas.

Tendo ficado muito tempo ali sentado respondendo as dúvidas e curiosidades de Kiyotsugu, Rikuo se levantou um pouco para poder se espreguiçar e foi até a porta de seu quarto com vista para a cerejeira. Ele se apoiou na porta de correr da casa de estilo tradicional japonês e admirou o céu que ia escurecendo enquanto Kiyotsugu falava:

— Se é assim, acho que já tenho o primeiro lugar que podemos ir – disse Kiyotsugu já entusiasmado pegando o celular e abrindo no Google Maps.

— Waka ainda está se recuperando da batalha! Não pode sair por aí já arriscando a vida de novo! – reclamou Tsurara.

— Podemos começar com algo simples então – disse Kiyotsugu fazendo com que Tsurara, Shima e Maki revirassem os olhos enquanto Torii e Kana se encaravam desconfiadas do plano do amigo.

— É, pode ser. Pelos velhos tempos. Algo simples vai ser bom para tirar o tédio e pra entrar em forma de novo – disse Rikuo com um sorriso olhando para os amigos. Para surpresa dos mesmos, que haviam por alguns segundos parado de prestar atenção no garoto, Rikuo estava agora em sua forma youkai visto que já havia anoitecido e ele queria usar as habilidades de cura de sua forma youkai, indiscutivelmente melhores do que as da forma humana, para poder melhorar mais rápido dos ferimentos. Não foi o Rikuo baixinho de cabelos castanhos curtos e olhos no mesmo tom de castanho que encarou o grupo de amigos, foi o Rikuo alto de voz grave, olhos dourados e cabelos longos prateados que os observava.

— É-É... – gaguejou Kiyotsugu olhando para Rikuo. Kiyotsugu foi então tentando voltar ao normal enquanto os dedos rapidamente percorriam a tela touch screen do celular para mostrar o que queria – E-Estão falando algo estranho sobre um... Um templo que fica aqui em Tokyo mesmo.

— Que tipo de coisas estranhas? – perguntou Rikuo ao se sentar de novo no kotatsu e então tentar ver a localização do tal templo Kiyotsugu mostrava na tela do celular. A voz mais grossa da forma noturna era a maior prova de que, daquele jeito, o amigo que conheciam era totalmente diferente. Podiam ver a semelhança no rosto caso prestassem atenção. Mas, por algum motivo, a voz era a maior prova de que até a personalidade entre Rikuo-humano e Rikuo-youkai era diferente.

— A história que circula por aí é a seguinte: De uns anos para cá, algumas coisas aconteceram nesse templo. O interessante, é que ninguém saiu ferido na maioria delas. As histórias contam de sempre um mesmo pequeno grupo de youkai surgir no templo e então ir embora. – começou a explicar Kiyotsugu – A história começou a circular só agora, mas fala que isso acontece há tempos lá. No entanto, ninguém, nem os residentes do templo, se quer reclamaram. Todavia, acho que se pode dizer que eles estão tendo alguns problemas recentemente porque parece que youkai de fora estão invadindo o templo.

— Invadindo o templo? – perguntou Tsurara se interessando com o problema e se aproximando para ver o mapa também – Me preocupa o que eles poderiam ver de interessante em um templo. Seria algum kami (*)?

— Até onde eu saiba, não tem nenhum kami nesse templo. – disse Rikuo olhando o mapa – Engraçado... Nunca tinha ouvido histórias de que esse lugar tinha problema com youkai.

— Achei essa história muito bem escondida na internet. – justificou-se Kiyotsugu que tinha quase travado quando Rikuo chegou perto demais para poder ver a tela de seu celular.

— Bem, acho que não custa nada ao menos fazer uma visita ao templo durante o dia, não? Deve ser mais seguro do que a noite – disse Torii.

— Mas só à noite temos a proteção do Rikuo. – disse Maki lembrando-se muito bem que o amigo só podia se transformar em youkai durante à noite ou em meio à completa escuridão.

— Eu também treino durante o dia na forma humana – disse Rikuo cruzando os braços - Pode não parecer, mas sei lutar mesmo sem ter que usar os poderes.

— E eu também vou estar lá – enfatizou Tsurara que não queria se deixar ser esquecida e muito menos deixar seu jovem mestre desprotegido. Como uma youkai completa, a garota não tinha que se preocupar com qualquer limitação sobre seus poderes devido à coisas como quantidade de luz ou hora do dia.

— Nas histórias por acaso diz o que atrai os youkai para invadirem esse templo? – perguntou Shima.

— Aí é que tudo fica meio doido – disse Kiyotsugu como se estivesse guardando essa revelação para o final – Segundo as histórias, lá existe um poço que pode te levar de volta para o passado.

— Voltar no tempo? – disse Maki surpresa enquanto os outros só arregalaram os olhos ou fizeram cara de estranhamento.

— Você já ouviu falar de algo assim? – perguntou Rikuo para Tsurara. Podia não parecer, mas Tsurara era muito mais velha. Não chegava a ter uma idade de 3 dígitos, mas a longevidade youkai lhe garantiu a aparência de 14 anos, assim como o resto do grupo, embora ela já aparentasse 7 quando Rikuo nasceu.

— Já ouvi histórias, mas nunca vi nada do tipo que realmente funcionasse. – admitiu ela dando de ombros – Acho bem provável que não vai dar em nada, mas...

— Vale a pena dar uma olhada. – disse Rikuo fazendo com que Kiyotsugu imediatamente desse um pulo e começasse a pular feito sapo de tanta alegria.

— Yey! Isso! O Esquadrão de Kiyojuuji está de volta à ativa! – comemorou Kiyotsugu.

— Falando nesse esquadrão... – começou Maki – Se me lembro bem... Você tinha dito no começo que o intuito dele era investigar youkai e o Nurarihyon. Não acha que deveria reconsiderar os objetivos do grupo uma vez que o neto do Nurarihyon é um dos membros do grupo?

Tsurara, Shima, Kana e Torii concordavam com a cabeça enquanto Rikuo só achava graça daquilo e Kiyotsugu se encolhia vermelho todo sem graça.

— Assim vocês me fazem parecer um stalker do meu próprio amigo. – disse Kiyotsugu.

— Mas é realmente o que parece agora já que o líder dos youkai que você tanto queria conhecer era na verdade o Nura-kun – disse Shima cruzando os braços e pensando um pouco.

— Tiramos a parte de investigar a família do Nura-kun e ficamos só com os youkai então – disse Torii e Kana, Shima e Maki concordaram com a cabeça enquanto Rikuo e Tsurara olhavam a cena achando um pouco de graça e Kiyotsugu ficava morrendo de vergonha.

Rikuo notou com o canto do olho que o rumo da conversa havia deixado Kiyotsugu meio desconfortável, logo, ele resolveu dar uma ajuda ao amigo para mudar o rumo da conversa.

— E então, para quando ficará a próxima missão do Esquadrão de Kiyojuuji renovado? – perguntou Rikuo.

— Poderia ser amanhã à tarde! – disse Kiyotsugu já animado de novo.

A sugestão fez Maki, Rikuo e Shima fecharem a cara e todos foram falando o porquê de não gostarem do dia só que falaram praticamente ao mesmo tempo fazendo com que ficasse meio difícil entender direito.

— Tenho coisa marcada para amanhã já – disse Maki.

— Minha cabeça ainda está me matando com essa ressaca – reclamou Rikuo – E acho que tenho certas coisas para resolver do clã nos próximos dias já que finalmente voltei. Principalmente papelada.

— Tenho treino de futebol amanhã. – disse Shima.

Eles continuaram tentando achar um dia que combinasse para todos e acabaram decidindo pela quinta feira seguinte depois da escola embora Rikuo ainda não soubesse se iria para a escola. Assim, com tudo marcado, os amigos de Rikuo foram embora até que ficaram apenas Rikuo e Tsurara sozinhos no quarto.

— Então, Waka, sei que tem muitas coisas pra resolver do clã... – disse Tsurara – Existem muitos youkai, fortes e fracos, e clãs de vários tamanhos tentando entrar em contato com você desde antes de voltar. Imagino que vai tentar dar atenção a isso nos próximos dias?

— Sim. – disse Rikuo suspirando e deitando-se no chão – Fiquei muito tempo fora. Tem que tirar o atraso das tarefas como Sandaime. E também, quero falar com a Yura.

Yura, a amiga que veio para Tokyo tantos meses atrás quando tudo era tão diferente. Yura era de Kyoto e de uma família onmyouji. Ou seja, uma família especializada em selar, lutar e destruir youkais. O irmão mais velho de Yura foi o primeiro à descobrir quem Rikuo realmente era. Agora, a garota havia voltado para Kyoto e, sendo ela bem poderosa mesmo em comparação aos outros membros da família, foi nomeada a nova líder dessa. Ah, isso sim seria uma conversa interessante.

— Yura? – perguntou Tsurara.

— Sim. Estava pensando em talvez inclusive achar um tempo para ir até Kyoto uma vez que ela não parece querer vir até aqui ou está ocupada demais. – disse Rikuo.

— O que quer falar com ela é tão importante a ponto de precisar ir até Kyoto ao invés de resolver tudo pela internet ou algo do tipo? – perguntou Tsurara.

— Na verdade é. Estive pensando em umas coisas enquanto estive fora e acabei tendo uma ideia e quero discutir ela com a Yura. – disse Rikuo fechando os olhos, mas não de fato caindo no sono enquanto Tsurara o olhava e apenas se perguntava o que poderia estar passando na mente dele.