All Out War escrita por Filho de Kivi


Capítulo 38
The Greater Good


Notas iniciais do capítulo

Hei!

Olá galerita, como estão?

O Filho de Kivi está aqui para mais uma atualização semanal de AOW! E adivinhem só, mais uma vez trago a fic em dose dupla! Cap 38 e 39 para a sua degustação!

Originalmente seria um capítulo único, mas como ficou bastante grande, resolvi dividi-lo para que a leitura ficasse mais agradável...

Quero agradecer a Menta, minha grande amiga e incentivadora, a Sami, por estar comentando sem parar (espero que se atualize logo, adoro os seus comentários!), e a todos os leitores que acompanham a fic sem expressar sua opinião! Como diria a Menta, os fantasminhas também são muito importantes! É claro que seria muito maneiro se vocês também comentassem hehehe...

Essa primeira parte trará uma introdução a visita de Rick ao Reino, que se dará com profundidade no 39, e trabalhará também acontecimentos paralelos no Garden, onde o bicho está pegando! Para quem estava com saudades do desenvolvimento de um arco mais voltado para conflitos internos, sociais e de certo modo políticos, acho que irão gostar desse capítulo 38...

Boa leitura!



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Rick subira no teto do furgão, improvisando um palanque. Seria mais fácil ser ouvido enquanto todos ainda estivessem na praça. Era isso ou reuni-los na igreja, mas acabaria demorando muito. Jesus já o esperava, e os dois fariam mais uma daquelas inesperadas viagens rumo a um local do qual o xerife jamais ouvira falar. Estranhamente isso já estava se tornando rotineiro demais.

O barbudo posicionara-se na linha frente, juntamente a Andrea, Michonne, Matti, Rosita e Eugene. Os demais rostos assustados aglomeravam-se próximo as árvores, ainda assim perto de onde Grimes se encontrava. Aquelas pessoas mais pareciam um cardume de peixinhos apavorados, fugindo em bando quando um predador se aproximava. Estava cada vez mais claro que sem ele, Alexandria jamais teria conseguido chegar aonde chegou.

A barba já estava cumprida novamente, retrato do descuido com a própria aparência. Às vezes era fácil se esquecer de que na zona segura havia água encanada, luz elétrica e caprichos como barbeador. Para alguém que se acostumou a pressão das estradas, comendo comida enlatada vencida e acostumando-se com o próprio odor de dias sob higiene precária, algumas semanas sem fazer a barba não era nada. Talvez até realçasse a sua imagem de líder, vai saber.

O rosto não encontrava-se mais cansado. Rick Grimes estava sereno, aliviado. Não que a situação de Alexandria tivesse melhorado, pois a presença dos Salvadores ainda era real e o perigo imediato, mas o policial sentia-se muito mais leve. Resgatara o filho das mãos de um assassino, e retomara o prumo do seu relacionamento com Andrea.

O sorriso no rosto sardento e levemente rubro de Andrea ainda era o mesmo que o fitara na noite anterior. O xerife tivera um dos melhores desempenhos dos últimos tempos, e as lembranças das três vezes em que se engalfinharam sob os lençóis na última madrugada, ainda faziam os pelos de sua nuca se arrepiar. As coisas realmente pareciam estar melhorando.

— Sei que estamos todos aliviados em ver Carl são e salvo – O xerife iniciara de forma eloquente –, mas ainda há muito trabalho a ser feito... Olivia – Rick apontara a mulher responsável pelo arsenal e mantimentos – preciso que você trabalhe com Andrea para catalogar tudo o que conseguimos em nossa última coleta! Quero estar pronto para quando os Salvadores vierem novamente.

— Negan poupou o meu filho! Acredito que ele esteja tentando mostrar que de certo modo é maleável... Bom, eu prefiro encarar isso de forma positiva. Fico mais confortável para confiar nele e mostra que tomei a melhor decisão... Espero que esteja certo quanto a isso!

O policial abrira os braços.

— Estamos vivendo tempos difíceis, e ele irá prosseguir, não posso mentir quanto a isso... Mas todo esse esforço valerá a pena! Agradeço a todos pela confiança... Acredito que poderemos fazer muitas coisas se continuarmos a trabalhar juntos! Segurança em números, ainda se lembram? – Uma breve pausa fora feita – Eu realmente acredito que as coisas irão melhorar de agora em diante... Precisamos ser otimistas!

Algumas vivas e palmas se seguiram, e a impressão que ficara era de que as palavras do mandatário haviam sido bem aceitas pelo público geral. Tomar uma atitude, posicionando-se de alguma maneira, ajudava a amenizar o caos e medo gerais.

Grimes então descera do furgão, e observara o dispersar da população de Alexandria, retornando a suas tarefas diárias, fingindo que suas vidas atribuladas ainda seguia o mesmo ritmo pacato de outrora. Esperando pelo policial, Andrea passara a caminhar a seu lado. As mãos nos bolsos, e a expressão um tanto quanto intrigada, anunciavam que logo ela se manifestaria a respeito de algo.

Rick já a conhecia o bastante para saber disso.

— Exagerou um pouco no final, não?

Como esperado, ela aparentava estar levemente preocupada.

— Na verdade foi o único momento em que fui sincero... – Respondera Rick, em um tom que apenas a loira pudesse escutar – Eu realmente acredito que as coisas irão melhorar, principalmente depois que acabarmos com Negan – Complementara.

— É justamente sobre isso que estou falando... – Como sempre a sardenta possuía um contra-argumento – Eu entendo os seus motivos para esconder os planos de todo mundo, mas... Acho que talvez esteja indo longe demais. Você está mentindo para eles, e é quase certo que não ficarão nem um pouco felizes ao descobrirem toda a volta que você deu para despistá-los... Tem certeza que vale a pena?

Rick tocara o ombro de sua mulher.

— Eles estarão vivos, Andrea. Não importa o que eles irão pensar... No fim irão me agradecer por estarem vivos!

 

*****

 

Bill Flood lhe acariciava os seios, tocando-os de forma suave. Os dedos percorriam por toda a extensão do seu corpo, deslizando pelo suor em seu abdome até a altura do umbigo. Já sem blusa e totalmente ofegante, Patricia Peck apenas sorria enquanto deixava-se tomar por todo aquele prazer.

Mordendo sua orelha, o turrão caipira a tomava nos braços, com toda a força bruta de quem a vida inteira fora acostumado a trabalhos pesados, puxando os seus cabelos e lhe arrancando mais alguns suspiros. Penetrando-a com mais afinco, em meio a urros e pedidos de “mais e mais”, Flood , totalmente dispneico, via-se chegando ao nirvana completo, assim como sua amante, em uma simbiose total.

Juntos os dois alcançaram o máximo do prazer, repousando sobre o gramado em meio ao bosque, sem forças, sem conseguir pensar em mais nada. Tendo os cabelos acarinhados pelos grossos e ásperos dedos de Bill, Patricia aconchegara-se a seu lado, cruzando os braços sobre o seu corpo em um íntimo e profundo abraço. Os olhos agora perdidos, voltando-se para a realidade após mais uma fantasia realizada, pareciam totalmente sem vida. A mente passando a raciocinar sobre tudo o que acabara de ocorrer.

Flood colocara novamente o seu inseparável chapéu de boiadeiro, apoiando a cabeça sob um dos braços, admirando o pouco do céu que as copas das árvores permitiam. A manhã calma e silenciosa só era cortada pelo barulho dos pássaros, cantarolando de forma alegre, tentando dar um sinal de que ainda havia algum tipo de normalidade no mundo dominado pelos mortos.

Depois que perdera o posto de médica da comunidade, desmascarada em frente a todos pelo recém-chegado Doutor Desmond Wales, Patricia passara a buscar novas formas de ajudar o Garden a seguir em frente. Oferecera-se então para ajudar Bill Flood, o caçador e sentinela mais fiel da Imperatriz, além é claro, de ser o seu amante secreto. Se distanciar um pouco mais de Lawrence, seu marido, ajudava a encarar todos os seus deslizes com menor culpa.

A culpa ainda a acompanhava, mas assim como Bill era o seu veneno, também era o seu antídoto. Estar com ele aliviava sua pressão, fazia com que as coisas parecessem mais fáceis, mais leves. Tratava-se de uma sensação estranha e difícil de ser explicada. E compreendida. Mas Peck sentia que no fundo tudo aquilo a anestesiava.

E na atual situação, qualquer morfina era bem vinda. Qualquer ilusão era melhor que a cruel realidade.

— No que tá pensando? – Indagara Patricia.

Peck olhara para Flood, que fitava o céu, totalmente disperso. Algo parecia preocupá-lo.

— Em tudo o que aconteceu... A Imperatriz se juntou com essa tal de Alexandria. Estamos em guerra, boneca! Você consegue imaginar o que é isso?

O rosto do caçador estava sisudo, tenso. Patricia já o conhecia o suficiente para saber quando algo o afligia de verdade.

— Isso não é bom? – Questionou, achegando-se ainda mais – Quero dizer... Não será bom darmos finalmente um basta nisso tudo? Parar de viver trabalhando para sustentar os Salvadores? Morrendo nas mãos deles?

Um muxoxo evidenciara a negativa do caipira.

— Não é esse o ponto, benzinho... É ele, aquele cara.

Aquele cara significava o novato, o estranho homem ligado às duas comunidades, que ganhara rapidamente um posto de importância dentro do Garden, algo que jamais havia ocorrido. Na verdade, algo que apenas havia ocorrido uma vez. E o final dessa história fora bastante trágica. O caso de John e Bonnie ainda reverberava na mente de todos, e o medo de que algo assim se repetisse era o que tanto lhes deixava com um pé atrás.

— Deus sabe que eu respeito e acato todas as decisões da Imperatriz. Todas. – O sotaque interiorano de Flood se evidenciava ainda mais quando o mesmo tentava enfatizar algo – Mas, droga, eu não consigo aceitar que esse cara ande livremente por aí depois de quase ter condenado todo mundo a morte! Ele entregou nossa posição para as pessoas da outra comunidade! Eles poderiam ter nos matado, boneca! Eu poderia estar morto agora...

Peck soubera do acordo. Soubera também que Wales refutara o plano criado por Eloise, e que se não fosse pelo acerto entre os dois mandatários, a linha de frente do Garden poderia ter sido facilmente executada em Alexandria. Só de pensar que Bill poderia não ter retornado, Patricia já sentira um frio lhe subir a espinha. Ela não saberia como viver sem suas fugas.

— O maldito mentiu até o próprio nome! – Exclamara Bill, seguindo em frente – Eu estou com um mau pressentimento... Tenho medo que a Imperatriz tenha errado mais uma vez... Não podemos contar apenas com a sorte. Não dá pra deixar esse sujeitinho vivendo sob o nosso teto!

A enfermeira erguera-se. O seu coração palpitava. Peck tinha medo de onde aquela conversa poderia parar, e talvez não estivesse disposta a ir tão longe quanto Flood. Ela também não gostava de Desmond, não conseguia confiar nele, mas também não conseguia acreditar que ele pudesse se tornar uma segunda versão de John Kenny. Ou pelo menos era nisso que queria acreditar.

— Ele e a Lizzy não se desgrudam... – Flood ainda não havia desistido – Eu a vejo cada vez mais no consultório dele, e na cabana ao lado da choupana da nossa Imperatriz... Isso não te faz lembrar de nada, boneca? Lembra quando a Bonnie...

— Ok, Bill... Pra mim já basta. É muita coisa pra minha cabeça...

Patricia começara a se vestir, colocando o sutiã e em seguida a blusa. Antes que terminasse, Bill lhe tocara as costas com a ponta dos dedos, por sobre sua recente cicatriz. O corte em formato de cruz, produzido por Eloise como uma forma de castigo, ainda não havia sarado por completo. O calor do toque lhe causara um leve ardume.

— Você sabe que isso também foi culpa dele... – O caipira também se erguera, beijando carinhosamente sua nuca, e lhe agraciando com um abraço por trás – E você sabe que estou certo... Isso não é paranoia, é apenas cuidado. Precisamos acabar com o Desmond antes que ele acabe com a gente...

 

[...]

 

Vincent Hall verificara os sinais vitais do senhor Hudson, deitado sobre uma das macas do barraco da enfermaria, dormindo após receber mais uma injeção de antibióticos. Balançando a cabeça negativamente, o cirurgião atestara que a pressão e batimentos cardíacos haviam aumentado espantosamente, e que para seu desespero, não vinha atendendo a nenhum dos padrões conhecidos.

Hudson já era o terceiro infectado por uma mazela que ainda não passava de uma incógnita. Juntamente a ele, Rose Kennedy, uma senhora de sessenta e tantos anos, e Miles McCain, um garotinho de oito, também se encontravam em observação na cabana do doutor Hall.

Os sintomas eram exatamente os mesmos. Tosse exacerbada, seguida de excreções com sangue, febre alta, vômito e diarreia. Os três estavam desidratando rapidamente, e com a falta de equipamentos médicos necessários, talvez não houvesse muito o que ser feito. Até porque, Vincent temia se tratar de algo completamente novo. E se assim fosse, as chances de se espalhar sem controle por toda a comunidade eram cada vez maiores.

Uma coisa era sabida, todos os doentes haviam tido algum contato com os animais criados na comunidade. Rose e Bernard Hudson ajudavam Lawrence Peck na criação dos porcos, e Miles, mais uma das crianças que perderam os pais e foram acolhidos pelo povo da Imperatriz, costumava brincar constantemente próximo ao chiqueiro.

Dois porcos já haviam morrido misteriosamente, o que era prova mais do que concreta de que o vírus, ou seja lá o que fosse, estava sendo transmitido por eles. A grande questão era que todos os moradores da comunidade tinham como alimento base os animais criados no Garden, o que indicava que a doença poderia de certa forma estar sendo incubada em todos os organismos.

Hall aprendera a pensar nas mais diversas possibilidades, e se precisasse escolher uma delas, era sempre mais seguro ir na que parecesse mais absurda. Ele começara a pensar na probabilidade da doença se espalhar pelo ar, ou pelo contato com as secreções, como no caso do Ebola Zaire. Se assim fosse, bom, o Jardim estaria diante de um problema tão mortal quanto Negan e seus Salvadores.

Era preciso se preparar.

Vincent fechara a cortina que utilizava para isolar cada leito, deixando que o senhor Hudson descansasse mais um pouco. Dirigira-se então até o centro do imóvel de cômodo único, verificando sobre a mesa, os equipamentos de proteção que ainda restavam. Uma caixa de luvas pela metade, algumas máscaras de procedimento e onze toucas cirúrgicas. Muito pouco para lidar com uma possível epidemia.

Hall então sentira medo. Mas não um medo comum, como o que sentira todas as vezes em que se deparara com um errante, por exemplo. Era um medo diferente, mas profundo, incisivo. Sentira medo de fracassar, de não mais conseguir consertar as coisas. Lembrara-se então de sua primeira cirurgia solo.

Atendendo como plantonista no setor de emergência, deparara-se com um caso grave de traumatismo após um acidente de carro. Era uma jovem, dezesseis anos, voltando de uma festa com o namorado de vinte. Os dois bateram em um poste, giraram na contramão e depois atingiram mais dois carros, que estavam estacionados em frente a uma lanchonete. O namorado da jovem morrera na hora. Sem cinto, teve a cabeça esfacelada contra a barra de direção.

A moça se chamava Angie, e Hall jamais conseguira esquecer-se de seu rosto. Fora necessário a realização de uma craniotomia, um procedimento delicado vide o grande inchaço interno que ela apresentava. Vincent estava nervoso, sentindo o peso de se carregar uma vida nos ombros.

Ele não conseguira. Angie falecera após quatro horas de cirurgia.

Por mais que estivesse preparado, por mais que soubesse que iria ter de enfrentar perdas na dura profissão que escolhera, Hall não conseguira evitar a dor que lhe tomara conta após a morte de Angie. A primeira morte sob sua responsabilidade.

Mas ele precisava se concentrar, não podia permitir que o medo lhe algemasse.

Fechara os olhos, contando lentamente até dez. Em seguida inspirara profundamente, soltando o ar de forma compassada. Agora estava se sentindo mais calmo, suas sinapses retornaram com perfeição, e ele finalmente podia pensar em uma maneira de não permitir que a desconhecida doença se espalhasse.

Era sim uma grande mazela, mas poderia ser cotrolada.

— Doutor! Doutor!

As vozes ao fundo anunciavam a chegada de visitantes, e pela tonalidade, algo grave havia ocorrido. Hall apenas girara nos calcanhares, direcionando-se para a porta de entrada, quando avistou a chegada de três pessoas.

J.J. e Peter carregavam um corpo inerte, enquanto Olga, a ucraniana, abria espaço para que os dois pudessem adentrar ao consultório improvisado.

— Precisamos da sua ajuda, Des!

O jovem Cheever parecia assustado. Aquelas eram as primeiras palavras que trocavam desde que Vincent descobrira que o garoto estava espionando-o a mando da Imperatriz. Hall decidira se distanciar por um tempo, sabia que não era algo muito maduro de se fazer, mas talvez servisse para que o garoto compreendesse que quebrara sua confiança.

— Coloquem ele aqui em cima!

Vincent retirara os equipamentos de cima da mesa, fazendo do móvel um leito. A situação estava ficando cada vez mais precária, e a enfermaria, que deveria servir apenas como suporte, já estava praticamente lotada de doentes.

O médico finalmente pudera ver de quem se tratava. O rosto arredondado e os curtos cabelos cor de areia, além da protuberante barriga, muito clara apesar de escondida sob uma camisa de Star Wars, só podiam ser de uma pessoa ali dentro. O simpático e pacato Lawrence Peck, marido da ex-enfermeira local, Patricia Peck.

— O que houve? – Indagara Hall, iniciando os procedimentos de rotina.

J.J. retirara o gorro negro. No torso vestia-se com a típica proteção dos jogadores de futebol americano. A camisa dos Redskins manchada de lama, indicava que ele deveria estar treinando.

— A Ucraniana estava gritando, eu e Peter...

A alta mulher de curtos cabelos negros e pele alva o interrompera.

— Lawrence estava dando comida aos animais... – O sotaque de Olga, apesar de carregado, ainda permitia que ela se fizesse entender – Ele então começou a tossir bastante, e não parava... Quando eu cheguei para ajudá-lo, ele caiu desmaiado. Aí então eu gritei por ajuda, e Peter e Cheever vieram até mim!

Peter, amigo de J.J., também vestia-se com o mesmo equipamento que Cheever. Os olhos estavam arregalados, e a boca levemente aberta.

Vincent calçara um par de luvas, abrindo os olhos de Peck e verificando sua pupila.

— Preciso que me ajudem a...

Uma crise de tosse do homem que até então se encontrava desacordado, interrompera no meio o pedido que Vincent faria. Descontrolado, o homem tossia até praticamente perder as forças, em um inexplicável e repentino acesso. Hall o segurara pelo tronco, impedindo que ele caísse de seu leito, e de alguma forma tentando ampará-lo.

O ataque seguira até que ele escarrasse sangue, em grandes quantidades, assustando a todos que assistiam perplexos à horrenda cena. O corpo de Lawrence amolecera outra vez, e agora sua pele carregava um aspecto mais pálido, quase amarelado. Hall elevara sua cabeça, limpando sua boca e impedindo que ele se afogasse com a própria secreção.

Virando-se momentaneamente, pronto para prosseguir com o que falara anteriormente, o cirurgião Vincent Hall notara que os rostos espantados das três pessoas que ali prosseguiam, permaneciam tão visíveis quanto no decorrer do ataque de Peck. Ele percebera que algo seguia errado, algo que ele tardara a perceber.

O médico havia retirado sua máscara, assim que encerrara os procedimentos nos outros doentes. Um erro básico. Básico e grave. Levando a ponta dos dedos até a própria face, Hall sentira algo de diferente no toque. Um líquido viscoso lhe cobria o nariz, próximo aos olhos, assim como nas bochechas e também na testa. Ao levar os dedos até a altura dos olhos, enxergara o que mais temia.

Uma coloração rubra viva. O sangue de Lawrence Peck.

Um gosto amargo começara a tomar conta de sua boca. Hall nem mais sabia se isso se tratava da secreção do doente, ou se era o seu cérebro tentando lhe enganar em meio a uma sensação de estresse. Passando a controlar a própria respiração, Vincent fechara os olhos mais uma vez, contanto até cinco, buscando novas forças para agir.

— J.J. – O médico erguera a cabeça, olhando diretamente para o quarterback— Preciso que vá até a Imperatriz agora, e relate a ela tudo o que ocorreu... Preciso que ela me ajude a organizar uma quarentena! Estamos lidando com algo muito sério aqui.

 

*****

 

— Você conhece esse tal de Ezekiel?

Rick caminhava ao lado de Jesus pela Normandy, exatamente em seu cruzamento com a Wyoming Avenue. O dia sem nuvens, levemente frio pela brisa que corria vinda do Rock Creek, trazia uma sensação agradável ao xerife. Ele estava alerta, como sempre, mas ao contrário de suas recentes viagens, essa estava sendo feita com outro objetivo. Paul prometera lhe apresentar um poderoso aliado, um mandatário de uma comunidade enfiada no interior de Washington.

A guerra era inevitável, era preciso agora saber quem estaria disposto a se arriscar por ela. Não havia mais como viver sob o jugo de Negan, mas para vencê-lo, seria necessário bem mais do que bravatas e apenas coragem. Toda ajuda era mais do que bem-vinda.

— Ele também faz parte da rede – Respondera o barbudo – Juntamente com vocês e o Garden... Há também umas comunidades menores, mas nunca se mostraram confiáveis... Depois do Alto do Morro, o Reino é a maior delas.

Rick estranhara a forma como Jesus se referira.

— Reino?

O diplomata abrira um sorriso, estacionando aos primeiros passos na Wyoming.

— Não olha pra mim, não fui eu que escolhi esse nome!

Grimes esticara os olhos, observando a avenida que se mostrava a sua frente. Carros queimados, acidentados e totalmente abandonados, fruto dos três anos de um apocalipse que não parecia ter fim. O lixo espalhado pelo asfalto da cidade que já fora modelo, era apenas mais um dos socos no estômago de quem ainda teimava em acreditar que as coisas poderiam voltar a ser como eram antes.

O xerife não era uma dessas pessoas, há muito já havia deixado de acreditar. De acreditar em qualquer coisa que não fosse o seu próprio esforço em se manter vivo. Essa era a nova e única lei. E era por ela que o mundo passaria a ser regido enquanto o último ser humano seguisse com vida.

Ele havia passado em frente à casa oficial do vice-presidente, apenas mais um dos prédios abandonados, dentre tantos. Ao lado, a U.S. Naval Observatory não apresentava mais serventia alguma, tornando-se apenas um bando de entulhos. Aquilo sim era uma prova cabal de que o mundo havia realmente acabado.

— Bom... E quanto falta para chegarmos a esse tal de Reino?

Rick olhara para o horizonte. O sol estava baixo, mas não havia beleza alguma que pudesse ser apreciada. Apenas uma imensidão desolada.

— Tecnicamente já estamos nele.

O policial olhara para os lados, e não percebera nada de diferente. Antes mesmo que pudesse iniciar qualquer formulação de teoria, Rick tivera sua resposta quanto à evasiva afirmação de Jesus.

Dois homens sobre dois cavalos galopavam em sua direção. Com espadas nas mãos e uma improvisada armadura feita a partir da proteção utilizada pelos goleiros no hockey, os dois bradavam palavras de ordem enquanto se aproximavam da dupla.

— Alto! – Vociferara um deles. Grimes levara a mão esquerda ao coldre, tocando o cabo de sua rurger— Quem ousa adentrar as terras reais de... – A expressão do homem se modificara estranhamente – Jesus... É você?

O diplomata abrira um sorriso, caminhando tranquilamente em direção aos soldados.

— Olá Damon, como estão às coisas?

O que bradara anteriormente voltara-se para Paul, guardando sua espada e se dirigindo a ele como se fossem velhos amigos. Rick seguia sem entender nada.

— Tudo certo, barbudo... Desculpe se assustamos vocês! Estranhamente estamos recebendo muitas visitas nos últimos tempos.

Monroe apontara para Rick, que permanecia na mesma posição.

— Este é Rick Grimes! Ele chefia uma comunidade amiga há alguns quilômetros daqui. Gostaríamos de solicitar uma audiência com o Rei Ezekiel.

O cavaleiro sorrira de forma amistosa.

— Tenho certeza que ele ficará muito feliz em vê-lo! Qualquer amigo de Jesus é também amigo do Reino! Venham conosco, os levarei até ele!

O grupo então começara a se deslocar, seguindo os dois soldados montados. O xerife puxara Jesus levemente pelo casaco, aproximando-se e indagando a ele de forma discreta.

— Rei Ezekiel?

Parecia bizarro e patético ao mesmo tempo.

— Tente aceitar a ideia... É só entrar no clima. E lembre-se, você nunca pode entrar no Reino se não tiver uma escolta!

A escolta os guiara pela avenida. Não havia nenhum errante nas redondezas, todo o perímetro parecia seguro, o que realmente deveria indicar a proximidade com a referida comunidade. O silêncio quase fúnebre só era interrompido pelo casco dos cavalos em contato com o asfalto, em um trotar sincronizado.

Alcançaram então a Ashmead, exatamente no X em que ela faz ao passar pela Avenida Connecticut. A desolação ali seguia a mesma regra de toda a DC, com exceção de um ponto em específico. Grimes erguera os olhos, compreendendo que aquele seria o ponto de parada.

Uma antiga escola primária tinha os seus muros reforçados por três ônibus escolares enfileirados, dando suporte a placas de metal que complementavam falhas nas paredes. Lonas eram postas sobre as grades, possivelmente como mais uma medida defensiva, tentando esconder aqueles que ali viviam de qualquer olhar hostil.

A bandeira norte-americana estava erguida, impávida, o último reduto de orgulho por uma nação morta. Morta como o mundo inteiro.

Os cavaleiros então pararam, e sinalizaram para que Rick e Jesus mantivessem distância. Grimes ainda não sabia o que pensar a respeito dessa nova comunidade, mas não havia como não estranhar os seus métodos. Após conhecer a Imperatriz, chegara a hora de se deparar com um pretenso Rei. As coisas estavam ficando cada vez mais malucas.

— Eles não permitem a entrada de veículos – Jesus se comportava como uma espécie de guia, deixando sempre o xerife a par das regras malucas daqueles sujeitos – Apenas homens e animais.

Os portões então foram abertos, permitindo a entrada dos dois forasteiros. Aos primeiros passos no lado de dentro do Reino, Rick notara uma estranha configuração. No pátio havia dezenas de barracas de camping, dos mais diversos tamanhos e modelos. Assim como em um centro de refugiados, que o policial lembrara já ter visto em um noticiário da CNN, todas as moradas improvisadas pareciam estar a menos de dois metros uma das outras. Mas a parte estranha de tudo aquilo era que nenhuma das barracas estava sendo ocupada. E não havia mais ninguém no pátio.

Rick não se sentia bem. Seu instinto começava a sussurrar em seu ouvido que poderia haver algo de errado. Era melhor permanecer em alerta máximo.

— Estão todos dentro da escola... – Paul parecia ter lido os seus pensamentos – No inverno eles se abrigam dentro do prédio, mas assim que as temperaturas voltam a subir, todos retornam ao pátio, para as suas barracas.

Parecia um pouco menos estranho agora.

— Aguardem aqui até que nosso Rei venha ao seu encontro! – Bradara o cavaleiro Damon.

Um dos homens descera do cavalo, adentrando o prédio pela porta principal. A frente desse portal, dois guardas, sem as proteções de hockey, mas com pistolas visíveis na cintura, vigiavam a porta de entrada.

Ele ouvira passos se aproximando, seguido por vozes, em uma breve conversa da qual Rick não conseguira identificar o teor. A porta então se abrira, os dois guardas se afastaram, posicionando-se como militares na presença de um chefe de estado. Pelo portal saíra um homem, e Grimes soubera na mesma hora que se tratava do referido Rei.

Com um longo casaco lhe cobrindo o corpo, e um cetro cumprido na mão esquerda, Ezekiel descera as escadas, com um largo sorriso no rosto, os olhos pequenos praticamente cerrados. Os dreads grisalhos e os colares de dentes de répteis não eram a única marca que indicava toda a excentricidade do líder do Reino.

Na mão direita ele segurava uma corrente, grossa, firme. A corrente tinha a extensão de dois metros aproximadamente, e estava presa a coleira de um animal, que a distância mais parecia uma miragem. A tigresa siberiana que o mandatário carregava como um gato de estimação caminhava com toda a sua pompa, acompanhando calmamente o seu estranho dono.

— Olá Jesus! – Sua voz era grossa e rouca – Muito me alegra recebê-lo mais uma vez em meu reino! – O homem descera mais alguns degraus, aproximando-se ainda mais da dupla – Diga-me, que bons ventos o trazem até mim? Trouxeste um novo aliado?

A tigresa bocejara. Grimes quase pudera sentir o acre de seu hálito.

Jesus o cumprimentara a distância, de forma respeitosa.

— Sem dúvidas majestade, trago um grande aliado, ele... – Jesus voltou-se para Rick – Acho que esqueci de mencionar, mas Ezekiel tem um tigre...

Rick nada dissera, apenas seguira o encarando. Será que realmente havia passado pela cabeça do barbudo que o xerife não havia percebido a presença do colossal felino, há quatro metros de distância?

Ignorando-o, o policial preferira manter-se em silêncio, apenas seguindo a maré, como o diplomata havia aconselhado-o. Jesus parecia ter tudo sob controle.

— Ao que parece, o destino abençoou esse dia com grandes surpresas! – Exclamara Ezekiel – Venham comigo, conversaremos melhor lá dentro!


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam?

Ao que parece Vincent precisará lidar com dois problemões no Jardim! Quero saber suas opiniões, será que ele se contaminou? O que Bill fará daqui para a frente? Teorias seriam muito bem vindas! Hehehe...

Nos vemos comentários!

Ah, só lembrando que o 39 já está postado, é só apertar nesse botãozinho aí embaixo e aproveitar... Teremos muito do Reino, e mais ainda sobre a guerra!

Moi moi.



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