A Retribuição escrita por BadWolf


Capítulo 36
Essa Dor Eu Desconheço


Notas iniciais do capítulo

Olá!

Pessoal, este é o penúltimo cap.
:O
Finalmente, saberemos se Esther e o bebê escaparam disso. E como.

Boa leitura!



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Aldershot, Hampshire. 27 de Fevereiro de 1901.


Holmes respirou fundo.

Quando chegou à delegacia, ele já estava completamente a par de todo o caso. Há três dias, uma mulher chamada Mary Smith apareceu na delegacia, para fazer uma denúncia. Ela trabalhava como parteira na região e dissera que fora chamada às pressas para mais um parto. Para sua surpresa, a pequena charrete que lhe conduziu da cidade até a área rural do município a deixou em uma casa abandona, no meio do nada. O homem, de feições forasteiras, a conduziu até o quarto onde uma mulher, loira de olhos verdes e abatida demais para uma gestante, contorcia-se pelas dores das contrações.

A princípio, não havia mais ninguém na casa, além do homem que a procurou na cidade e da moça, grávida. Ele mesmo a ajudara, trazendo água, panos e o que mais fosse necessário. Embora tivesse o ar despreocupado, o homem parecia nervoso, como qualquer homem poderia estar nesta situação. Mary chegou a desconfiar que ele fosse o pai da criança, mas ao notar o desprezo da grávida pelo sujeito, percebeu que talvez não fosse. Aquelas pessoas eram estranhas, mas Mary fez seu dever.

Entretanto, a situação mostrou-se incomum quando Mary percebeu as marcas nos pulsos da jovem, que aos prantos, pedia para que ela salvasse seu bebê. Algo que todas as mulheres lhe pediam, isso ela estava acostumada. Porém, nada se comparava ao fato dos grilhões que prendiam a moça à cama, por meio de uma pesada corrente que, no entender da parteira, estavam presos à parede.

–A curiosidade matou o gato, dona. – disse o homem, que insistia em presenciar o parto, quebrando toda a tradição de que os homens deveriam se ausentar. Temendo represálias, a pobre parteira apenas fez seu dever, sem mais perguntas.

Era um menino.

A criança nasceu viva e saudável, sem nenhum defeito visível.

Quando retornou à cidade, entretanto, algo incomodava Mary. Aquela moça, aquela casa. Havia alguma coisa errada ali. Após conversar com seu marido, ela tomou coragem e procurou a delegacia, informando da situação que tinha presenciado, que fez a polícia apurar a denúncia.

Agora, Holmes estava em um cabriolé, parado em frente à porta do Hospital St. George. Ainda não havia plena certeza se a mulher ajudada pela parteira era mesmo sua esposa Esther Katz. Sua ansiedade mal cabia em si. Tem que ser ela, tem que ser ela...

–Somos oficiais de polícia, Dr. Bowman. Estamos aqui para tratar daquele caso...

–Oh sim. – disse o médico, já idoso, cumprimentando a todos.

–Então, ela está bem o bastante para nos receber? – perguntou Lestrade.

–Sim, mas peço que sejam compreensivos. A moça chegou aqui em estado de saúde crítico, pois tivera um sangramento. O parto que tivera quase sentenciou sua morte. Se a polícia não tivesse chegado a tempo, sem dúvida ela não passaria de mais alguns dias.

–Havia sinais de tortura ou agressões?

–Não. Apenas marcas ao redor dos pulsos e dos tornozelos.

Cada palavra do médico fazia Holmes e Watson tremerem.

O que esses canalhas fizeram com ela?

–Ela já informou o nome?

–Ainda não. Ela só pede pelo filho e chora toda noite. Temo que ainda esteja em choque. Bem, ela está acordada. Miss Dowell irá conduzí-los até o quarto dela.

–Podem ir com eles, senhores. Irei recolher o depoimento do Dr. Bowman.

Holmes, Watson e o inspetor Lestrade acompanharam a jovem enfermeira pela ala do hospital.

–Ela está aqui, senhores. – disse uma enfermeira, conduzindo-os até uma ala comum.

Holmes caminhou à frente, ansioso. Ao aproximar-se da cama, mal pôde reconhece-la. Ainda que estivesse em seu peso normal, ela estava mais pálida, com os olhos escuros e as maças do rosto desaparecidas. O cabelo também estava despenteado. Seus olhos estavam vidrados no nada. Algo parecido com que Holmes tinha visto, quando Carlston ousou tocar nela.

Mas ao menos, ela estava viva.

–Esther? – perguntou Holmes, tentando tirá-la de seu devaneio, em vão.

–Meu filho... – ela sussurrava.

Holmes sentou-se na cama, e ignorando a presença de todos, aproximou-se dos ouvidos de Esther, afagando o seu rosto.

–Esther?

Ao perceber que Lestrade analisava a situação sem compreender qualquer coisa, Watson tocou no ombro do inspetor e gentilmente pediu para que ambos se retirassem dali momentaneamente.

–O que está havendo com Mr. Holmes? Ele parece singularmente... Afetado com este caso...

E agora, devo contar a ele?

–Escute, Lestrade... Creio que você seja da confiança de Holmes, por isso devo pedir o máximo de descrição a este respeito.

O inspetor assentiu, ainda mais curioso.

–Meu amigo Holmes, ele... Bem, ele tem inclinações emotivas para com Miss Katz.

–Namorados? – perguntou o inspetor, boquiaberto.

–Digamos que sim. Por isso sua preocupação nos últimos tempos.

–Mas ela estava... Estava... Oh Deus, então a criança era... Dele?!

Watson teve de concordar com a cabeça.

–Céus, agora eu entendo porquê ele estava tão compenetrado, a ponto de recusar casos apenas para se dedicar ao sequestro de Miss Katz. Ela carregava um filho dele!

Watson iria dizer ao inspetor que Holmes não sabia da criança, o que era verdade, mas deixou para lá.

–Eu espero que o senhor não o julgue por isso.

–Longe de mim, Dr. Watson. Mr. Holmes é um homem de carne e osso, assim como eu e você. Muitos poderiam estar em tal situação. E se caso deseja saber, eu não me importo que ele a tenha engravidado antes de contrair matrimônio. O que me importa é pegar o patife que fez isso a essa moça e levou a criança. Aliás, nós sequer consideramos o fato de que a criança pode estar morta a uma hora dessas.

–Deus queira que não, inspetor. Deus queira que não.

Holmes ainda estava sentado sobre a cama de Esther. Ela parecia aos poucos sair de seu transe doentio e agora, conseguia dizer algo coerente.

–Sigerson... – ela disse, com mais otimismo, enquanto acariciava o rsot de Holmes, que ainda ostentava uma barba por fazer.

–Sim, meu amor, estou aqui. – ele disse, apertando sua mão. – Acabou.

–Sigerson, eu... Eles levaram. Nosso bebê.

–Sim, eu sei. Eu vou recuperá-lo, Esther. Eu vou. Agora, iremos para casa. – ele disse, beijando-lhe o topo da cabeça.



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Londres, Inglaterra. 5 de Julho de 1901.
Alguns meses depois...


Risadas, de dentro do cabriolé, pareciam irromper o silêncio da madrugada sombria que caía sobre Londres. O cocheiro não parecia ter pressa, entretanto. O chão estava escorregadio pela chuva e pelo asfalto recém-colocado, além do fato de que os ocupantes não pareciam lá tão afoitos para voltarem para casa. O cocheiro presenciara tudo, enquanto aguardava por seus passageiros. Eles entraram em uma casa no subúrbio, depois silêncio. Uma hora depois, disparos. O cocheiro chegou a pensar em fugir dali, mas logo se lembrou que seus dois clientes eram bons em gorjeta. E por sorte, ele estava certo. Dentro de seu bolso, lá estava o soberano que tanto faria a diferença em sua casa.

–Viu como esse novo oficial da Yard é desajeitado? – disse Holmes, em meio à risadas. – Acho que ele poderia acertar um tiro em si mesmo, menos em nosso fugitivo. Ainda bem que você estava lá, meu caro Watson!

–Acho que a Scotland Yard já viu dias melhores. Bom, ao menos ninguém acabou ferido, e o caso foi encerrado.

–De fato. A rua de Londres estará definitivamente livre de Quebra-Ossos...Como dizia mesmo o jornal? “O mais sanguinário e vil monstro londrino”. Fico aqui me perguntando se já esqueceram de Jack O Estripador, James Moriarty...

–Ora, meu caro Holmes, tudo isso é estratégia para vender jornal.

–Assim disse o especialista na narrativa dramática.

Repentinamente, o cabriolé parou. Holmes sequer percebeu, mas já estava em Baker Street. Antes de descer, ele se voltou ao seu amigo.

–Você me acompanha, Watson?

–Infelizmente não, meu caro. Rose se queixou de dores e... Bem, eu preciso vê-la. Falta pouco para o bebê nascer e todo o cuidado é pouco.

Holmes assentiu. – Está bem. Tenha uma boa noite, meu caro.

–Tentarei o possível. – disse o médico, resignado e claramente insatisfeito por ter de atender a um chamado de Rose. Holmes parou à calçada, assistindo o cabriolé com seu amigo embarcado se afastar dali. Fazia uma madrugada tão fria que ele era capaz d de observar sua respiração deixar névoas pelo ar. Ao subir seus olhos para a janela do segundo andar, Holmes notou que a luz estava acesa, e um vulto se afastar, assim que seus olhos pairaram ali. Ele nem precisava saber quem era.

Ao adentrar aos seus aposentos, no 221-B, Holmes notou que Esther ainda estava próxima da janela. Sem dúvida, tinha observado sua chegada. Antes que ele pudeser dizer um gentil “boa noite”, Esther foi mais rápida.

–Parece que a noite foi divertida para você.

E outra vez, comportamento gélido, pensou Holmes.

–Uma boa noite para você também, minha cara. – devolveu Holmes.

Esther não respondeu ao deboche. Observava-o seriamente.

–Cinco dias, Holmes. Há cinco dias que mal vejo você. Já notou como está sua aparência? Hein? Sua barba por fazer, sua roupa empoeirada, seu...

–Será que poderia ser mais objetiva, Esther? Porque já passam das duas da manhã e pretendo verificar meu experimento daqui a meia hora.

–Oh, sinto muito se estou atrapalhando sua sagrada rotina, senhor detetive. Prometo que da próxima vez marcarei horário. – caçoou Esther. – Mas este não é o ponto em que quero chegar.

–Não? Pois isso é o que você diz sempre, mas eu já sei o que está por vir. Irá me recriminar por eu estar seguindo com minha vida normal, trabalhando e envolvido com casos interessantes, enquanto você fica aqui, com sua vida completamente estagnada e criando teorias e suposições sem ter qualquer tipo de evidência que corrobore os seus...

Esther ergueu a voz.

–Não ouse ofender-me deste jeito, Holmes!

–Não ouse?! E o que você tem feito comigo, desde então? Ofende-me todos os dias, quando diz que eu não me importo com você. É claro que me importo! Tudo que eu quero é que você largue essa investigação infértil e vá viver sua vida. Precisa reconhecer, Esther. Não há mais pistas a respeito do paradeiro desta criança...

–Jonathan. O nome do nosso filho é Jonathan, caso não se lembre.

–Oh, ótimo. Sabe, é difícil lembrar do nome, uma vez que sequer fui consultado a respeito durante a escolha...

Esther parecia inconformada.

–Ah, realmente. Sinto muito se feri seus sentimentos interrompendo a bizarra tradição da família Holmes de colocar nomes estranhos nos membros de sexo masculino. Como seria o nome dele mesmo? Sheridan, não? De jeito nenhum concordaria com isso! Não depois do que o crápula do seu pai fez comigo...

Holmes bufou.

–Por favor, não vamos envolver meu pai nessa conversa. – disse Holmes, quase suplicando. – O que nós precisamos, talvez, é de ar fresco. Eu estive pensando em comprar uma casa no campo. Sussex, Cornwall, não sei... Acho que uma mudança de ares faria bem a nós dois e...

–O quê?! – questionou Esther. – Você quer que eu me isole? E como farei para receber notícias, caso surja algo sobre o paradeiro de Jonathan?

–Esther... – pedia Holmes, segurando na mão de Esther e fazendo sua esposa se sentar ao seu lado. – Meses já se passaram. Todas as nossas pistas morreram, e até agora não recebemos nenhum pedido de resgate. Você precisa aceitar a possibilidade de que...

–Não continue, Holmes. – pediu Esther, seriamente. – Nosso filho está vivo. Eu sinto que sim, todos os dias. E não diga que nossas pistas são infrutíferas. Eu sei que Jenkins não sairia da Inglaterra sem uma ama-de-leite.

A conversa de Esther parecia irritar Holmes.

–Outra vez você, e essa sua idéia de que Jenkins ficara apegado à criança... Aquele homem é um monstro, frio e incapaz de sentir afeto. Sentimentalidades por bebês não fazem parte de sua natureza. Quantas vezes eu preciso te dizer isto?

–Você não estava lá para saber. – disse Esther, se afastando de Holmes, em direção à janela. – Ele já sabia que eu estava grávida. Disse que havia planos para o bebê, “planos grandiosos”, ele dizia. Ainda não posso entender como ele soube da criança. Provavelmente, ele estava me monitorando e soube do diagnóstico do médico que eu me consultei.

–Este é outro fato que me decepcionou a seu respeito. – disse Holmes, com pesar. – Você omitiu sua gravidez para mim. Se eu soubesse na ocasião que você estava grávida... Eu teria sido mais cauteloso, e tudo teria sido diferente...

–Eu tinha apenas dois meses quando descobri. Por já ter sofrido um aborto, preferi esperar até ter certeza de que a gravidez vingaria. Não queria enchê-lo de falsas expectativas. De qualquer forma, o que está feito, está feito. Não há como voltar atrás. Mas admita, minha teoria não é tão absurda. Se Jenkins não pediu resgate por ela até agora, é porque está com ela. E se ele realmente fugiu da Inglaterra, como disse suas pistas, ele precisou de uma ama-de-leite, ou caso contrário o bebê não resistiria á viagem de navio. Ele foi rápido na fuga, por isso eu acredito que ele buscou esa ama-de-leite não muito longe de meu cativeiro.

Holmes pouco interessado.

–A Scotland Yard buscou por essa suposta “ama-de-leite” por toda Hampshire e não encontrou nenhuma mulher que tenha abandonado tudo às pressas repentinamente.

–Talvez não tenham procurado direito. Você mesmo disse que a Yard é incompetente. Não só disse, como provou várias vezes, por meio de suas investigações, sua tenacidade, sua inteligência em desvendar até o mais obscuro dos mistérios. Menos... Menos o paradeiro de nosso filho.

Com a voz já embargada e em lágrimas, Esther se retirou da sala, trancando-se em seu quarto. Holmes chegou a ameaçar segui-la para consolá-la, mas sabia que não tinha qualquer direito nisto. Afinal, o que ele tinha para oferecer a ela? Sua descrença? Seu pessimismo? Ou sua falta de interesse em achar essa criança, que provavelmente já estava morta?

Ouvindo apenas um choro baixo, vindo de seu quarto, Holmes suspirou.

Esta seria mais uma daquelas madrugadas longas, onde Esther o expulsava de seu próprio quarto para chorar sozinha por uma dor que só ela conhecia.

Não restava muitas alternativas, senão seu experimento químico.


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Notas finais do capítulo

OH... MEU... DEUS...

Prometem que não vão me bater?? Prometem??

Puxa, mas que tristeza!!! Será que eles irão conseguir recuperar o bebê?
Parece que o espírito paternal ainda não foi despertado em Holmes. E a Esther, que não é boba, está percebendo isso... É melhor você deixar de ser tão frio, meu caro Holmes, e dar algum apoio à ela. Pô, não custa nada se esforçar mais um pouco.

Aguardo vocês no Epílogo!!!
Finalmente teremos uma conclusão a respeito do pé-de-guerra de nosso casal 20.

Até quarta!



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