Survive escrita por Claire Haddock


Capítulo 6
Drastic Measure


Notas iniciais do capítulo

Nossa, faz muito tempo! Revisitando antigas histórias, me deparei com esta e senti muita vontade de continuar. Bom, nos falamos após o capítulo hehe



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Ohio

Apesar dos grunhidos de dor do rapaz, Merida não perdeu um segundo sequer e empurrou Hiccup para dentro do veículo abandonado, entrando em seguida e batendo a porta. Fez seu último movimento bem a tempo de escapar das mãos putrefatas de um dos acéfalos. Levou alguns segundos para que Merida saísse do torpor em que se encontrava, sua respiração ofegante e desritmada.

Quando olhou para Hiccup, percebeu que ele estava desmaiado, pálido como os mortos que sacudiam o carro e urravam do lado de fora.

Sua respiração ficou ainda mais apressada, começava a entrar em pânico. Por que aquilo estava acontecendo? Será que fizeram muito barulho ou estavam já no caminho daquela horda, mas não sabiam? Foi um verdadeiro milagre que tivesse conseguido arrastar Hiccup tão longe sem auxílio, sorte que era bastante magro.  

Então, percebeu que, além de hiperventilar, estava chorando. Sentiu raiva de si mesma.

― Não posso perder o controle, não agora… ― cobriu o rosto com as mãos, tentando segurar as lágrimas. 

As batidas contra as janelas e a lataria do carro deixavam sua mente cada vez mais inquieta.

― Merida… ― Hiccup parecia recobrar a consciência.

Ela se sobressaltou e ergueu o rosto. 

― Haddock! ― Ela o ajudou a se endireitar no banco traseiro. ― Ah, não! Você está sangrando! 

― Está tudo bem. ― Ele deu um sorriso fraco. ― Mal estou sentindo.

A ruiva balançou a cabeça, sua expressão grave.

― Isso não é bom sinal. Droga, acabei nos trazendo para um beco sem saída, cavei nossas próprias covas! Como pude ser tão idiota?

Hiccup deu um longo suspiro, parecia completamente exausto.

― Você fez o melhor que pôde. 

― Ora, não me venha com essa conversa indulgente, não temos tempo pra isso! Estamos presos! Vamos morrer!

― Pode ser que sim. Pelo menos, tentamos, não foi?

Merida encarou o garoto, incrédula. Como ele podia ter uma atitude tão derrotista e resignada? Apesar de que, no fundo, ela concordava. Assim como vários com quem esbarrou por sua jornada até ali, ela também encontraria uma situação inescapável, que resultaria em seu fim. 

― Eu matei um homem quando fugimos da arena ― ela confessou repentinamente. ― Matei e, na hora, senti tanto alívio e, quem sabe, até alguma satisfação. Vi quando a vida deixou o corpo dele, seu sangue ainda estava quente nas minhas mãos. Eu fiz isso. E agora, é a minha vez. Não achei que seria assim.

Hiccup estava muito debilitado, mas até ele sabia que Merida começava a se afundar num poço de negatividade do qual não conseguiria sair tão facilmente. Ele esticou com algum esforço o braço e tocou a mão dela.

― Ei, estou contente que te conheci. E tenho certeza de que o Jack também. Eu não gostaria que tivesse sido de outra forma.

Merida pareceu comovida pelas palavras. Prestes a dizer algo, foi impedida quando um dos zumbis arrebentou o rosto contra o vidro traseiro, fazendo com que ela gritasse. No entanto, em vez de investir novamente contra o vidro, o morto escorregou lentamente, deixando um rastro de sangue seco, até cair para o lado. A poucos metros deles, puderam ver, estava Jack com sua arma na mão.

― Merida! ― ele gritou. ―  Estou com seu arco e flecha. Vou limpar os zumbis do seu lado, preciso que me ajude, ok? Você não terá muito tempo para sair daí.

Ainda que estivesse surpresa e confusa, não havia brecha para perguntas naquele momento. Ficou a postos ao lado de sua porta, com a mão sobre a trava.

Jack deu meia dúzia de tiros. Um deles atravessou a lataria e se alojou no banco do motorista.

― Merda! ― exclamou Merida, baixando a cabeça. ― Está tentando nos salvar ou nos matar?!

Foram necessários mais quatro tiros para que os zumbis caídos cedessem espaço suficiente para abrir a porta. Ela fez seu movimento o mais rápido que conseguiu, fechando a porta atrás de si.

― Tranque e aguente firme, Haddock!

Ela correu para a lateral da estrada na direção de Jack, que jogou o equipamento a ela. Os pelo menos quinze zumbis restantes dividiram sua atenção entre o carro e a dupla armada.

― Vamos acabar com isso ― disse Jack, recarregando a arma com destreza.

― Estou de saco cheio desses malditos ― resmungou Merida, preparando o arco.

 

――――――――――――

Demorou mais tempo desta vez para encontrarem um novo abrigo. Como não podiam perder tempo, aplicaram o antibiótico em Hiccup assim que conseguiram livrar o veículo dos zumbis. Acabaram ficando numa madeireira deserta a apenas vinte minutos de Cleveland. Na sala da administração, havia um sofá, no qual deixaram o garoto enfermo descansando. Revezaram-se entre vigiar e ficar perto de Hiccup.

Quando amanhecia, Jack estava do lado de fora tentando manter-se atento aos arredores, apesar do sono já consumi-lo. As últimas palavras que trocou com Rapunzel, aquela estranha garota do hospital, ecoavam em sua cabeça.

― Jack, deixe-me dizer só mais uma coisa antes que vá. 

Os olhos dela estavam ansiosos, as mãos posicionadas de maneira acanhada atrás das costas.

― São tempos difíceis estes… Se precisar de alguma coisa, pode me procurar. Digo, não é como se eu fosse a algum lugar tão cedo. ― Ela sorriu timidamente.

Ele sorriu de volta, ainda curioso em relação a ela.

― Ok. Pode deixar.

― Se cuida, está bem? ― Rapunzel apontou para a própria testa, referindo-se ao curativo que fizera nele pouco antes.

Encostado agora contra a parede, durante a vigilância, Jack tocava aquele curativo, imerso em pensamentos.  

Ela era tão peculiar, mas ao mesmo tempo, emanava uma aura tão revigorante. A última vez que vira alguém assim, bom, já tinha muito tempo. Desde que aquele caos começara, não havia conhecido ninguém que ainda possuísse aquele brilho esperançoso.

― Então, quer dizer, que uma garota aleatória te deu remédios, suprimentos e, de quebra, um bicicleta inteirinha? ― Merida surgiu ao seu lado, de braços cruzados.

Jack quase se alarmou com sua presença, mas se controlou para não transparecer, tirando a mão despreocupadamente da testa e repousando-a sobre o cabo da arma.

― Acredite ou não, foi isso que aconteceu.

― Você precisa admitir que é um pouco surreal dadas essas circunstâncias. ― Merida se aproximou.

― Não pense que não fiquei surpreso. Foi a coisa mais esquisita que vi nesses últimos tempos, mas também bastante conveniente. Se não fosse por ela, teríamos de nos preocupar com nosso jantar.

― E com o Haddock. ― Ela se encostou contra a parede, ao lado do garoto. ― Apesar de que, preciso ser sincera, ele está muito mal. Talvez estes antibióticos tenham segurado um pouco, mas a perna dele está inchada e ficando com uma cor estranha… ― A ruiva respirou fundo, como se tentasse manter a calma. ― Não sei se conseguiremos fazer alguma coisa por ele. Eu… temo que ele possa não aguentar.

A culpa que Jack sentia era arrasadora. Eu tinha que ter parado aquele carro e tentado falar com aqueles caras. Por que fiz aquilo? Se tivesse dado meia volta, não teríamos ido para a arena e Hiccup não teria levado aquele tiro. Quantos ainda terão de morrer até que eu aprenda a não ser um imbecil? 

Apertou seus olhos com o indicador e o polegar, para evitar que lacrimejasse, apesar de não importar mais se Merida o veria chorando. Seu melhor amigo estava sucumbindo a uma infecção e nada que fizesse poderia salvá-lo.

Merida pôs a mão sobre seu ombro.

― Eu sei. Não precisa ser forte o tempo todo.

Se precisar de alguma coisa, pode me procurar, ele lembrou mais uma vez daquela frase. Era a única saída que restava.

― Só que, na verdade, eu preciso. ― Jack se afastou, indo em direção à bicicleta recostada sobre uma pilha de tábuas. 

― Vai sair de novo?! ― perguntou Merida, descrente. ― Eu não vou aguentar sozinha outra vez se os mortos-vivos aparecerem!

Ele destravou a bicicleta e montou nela. 

― Eu serei mais rápido desta vez, já sei aonde ir. Estamos na metade do caminho agora.

― E o que você vai fazer?

― Apostar na nossa última chance. É um tiro no escuro, mas é o melhor que temos.

Dito isso, Jack saiu pedalando. O sono aparentemente havia se dissipado por completo.

 

―――――

 

A dor era tremenda. Sentia muito frio. E o cansaço o possuía, a ponto de que abrir os olhos parecia uma tarefa penosa e exaustiva. 

― Ei.

Ele voltou seus olhos para a origem do som. Merida sorria para ele, sentada numa cadeira à sua esquerda, e segurava sua mão. Hiccup queria dizer algo, mas estava sem forças.

―  Não precisa falar ― a ruiva pareceu ler seus pensamentos. ― Jack já deve estar chegando com ajuda. Você vai ficar bom, entendeu? Não tem outra opção, ouviu?

Hiccup podia não estar totalmente no controle de suas faculdades mentais, no entanto, sabia que a esta altura, dificilmente se recuperaria. Apesar do corpo dolorido, já não sentia a perna ferida, como se já não fizesse mais parte dele.

Houve um burburinho do lado de fora. Merida ergueu-se, aflita.

― É ele! ― Apontou para a janela.

Poucos instantes depois, Jack entrou na sala acompanhado de uma garota loira que jamais havia visto.

Ele devia estar com uma expressão confusa, pois Jack começou a explicar a situação logo que largou seus pertences sobre uma mesa.

― Hiccup, esta é a Rapunzel. Eu acabo de descobrir, no caminho até aqui, que ela estava para se formar em enfermagem. 

― Olá, Hiccup. ― Ela sorriu para ele, ajoelhando-se e retirando seus utensílios médicos de uma maleta apoiada sobre a cadeira que Merida usava há pouco. ― Prometo que farei o meu melhor.

Jack estava a alguns passos deles, observando, enquanto Merida andava de um lado para o outro, inquieta. 

― Sei o que está pensando ― prosseguiu Jack. ― Essa garota não tem uns dezessete anos, no máximo? Antes de tudo, não, ela tem vinte. E mesmo assim, não é um pouco jovem para estar perto de se formar, quando ainda existia civilização? Bem, acontece que nossa amiga Rapunzel é um pequeno prodígio, e pulou três anos escolares. Um currículo impressionante, não acha?

― Obrigada por essa introdução, Jack ― disse Rapunzel um pouco sarcástica, concentrada em examinar a perna de Hiccup.

― É, acho que já entendemos que ela é um grande achado ― disse Merida, impaciente. Voltou-se para a loira.― Agora, será que pode nos dizer o que acha? O que podemos fazer?

Rapunzel parou com o exame e suspirou. Mirou os dois que estavam de pé.

― É tarde demais para usar somente os antibióticos. O tecido já está gangrenando. Se demorar mais, ele vai acabar sofrendo de septicemia e, então, não teremos como tratá-lo. Ele vai morrer.

― Você quer dizer, que… Será preciso…? ― Jack mal pôde completar a pergunta. 

Todos os olhares se voltaram para Hiccup.

― A única maneira de você viver é se retirarmos a perna em processo de necrose ― disse Rapunzel, consternada. ― Eu sei como fazer, mas precisarei de ajuda. Quero saber se é a sua vontade. Você concorda que sigamos em frente com isso?

 Talvez não estivesse mais raciocinando propriamente, só desejava que aquela agonia acabasse. Sem argumentos naquele momento, ele assentiu fracamente. 

― Faça ― sussurrou, seus lábios rachados pela secura.

Rapunzel adquiriu uma fisionomia resoluta, prendendo os cabelos num coque improvisado com o elástico que estava em seu pulso.

― Vou precisar de mais luz, conseguem providenciar?

 

―――――

 

Já era quase fim de tarde quando Rapunzel terminou a cirurgia. Merida tinha se encarregado de se livrar do pedaço de perna removido, enquanto Jack, já tendo ajudado no que podia, aguardava do lado de fora.

Rapunzel abriu a porta, parecendo tranquila.

― Ele parece estar bem, dentro do possível. Deve dormir por um bom tempo.

Jack deu um suspiro aliviado.

― Acho que não temos como te agradecer. Primeiro, os suprimentos e agora, isso. 

Ela concedeu um sorriso.

― Estou feliz em ser útil de alguma maneira, de verdade. Mas preciso voltar, tudo bem?

Jack a olhou com um pouco de suspeita.

― Bom, ainda temos tempo de ir, mas não está muito cansada? Podemos encontrar um canto para você descansar.

Rapunzel abanou a cabeça em negativa.

― Eu realmente tenho que ir. Mas claro, acho apropriado acompanhar o processo de recuperação de Hiccup. Que tal se me buscar amanhã pela manhã?

Mesmo que achasse um pouco duvidoso, Jack não se sentia em posição de retrucar. Deviam muito a ela para retribuir em forma de desconfiança.

― Combinado. Vou avisar à Merida e vamos, ok?

Ele se distanciou, lançando um olhar por cima do ombro. Rapunzel levantava a bicicleta, sacudindo a poeira sobre a garupa. A garota parecia inofensiva como na primeira vez que a vira, porém, sentia que ela estava escondendo algo. Só não fazia ideia do que poderia ser.

 


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Notas finais do capítulo

4 anos! E que momento para voltar a escrever sobre um apocalipse zumbi, não? Espero que estejam todos bem e se cuidando nesses tempos complicados.

Quando estava vasculhando aqui meus arquivos, notei que já havia feito um resumo para os próximos 10 capítulos, wow! Acabei fazendo umas alterações neste, mas acho que está indo por um rumo bacana. E tem um preview deste capítulo, pra não perder o hábito!

https://youtu.be/Mz1lpgZIp2s

Fiquem bem e até a próxima :D



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