1.

A primeira vez foi um acidente, eu acho. Haruhi realmente não pensa nas coisas ou em seus atos. Ela tropeça em uma ideia, e depois eventualmente, com um sorriso demoníaco e os olhos brilhando coloca seus planos em ação.

Assim, provavelmente era apenas isso: um simples caso de precisar andar na mesma direção, com o mesmo objetivo em mente e por coincidência de ter sido no mesmo horário. Isso acontece. Em tese isso era inevitável. Já que nos encontramos no caminho não temos escolha à não ser continuarmos andando juntos, porque nós vivemos em uma distância semelhante da escola, apenas em direções diferentes, e ambos tiveram que ir para a escola no mesmo horário.

Além disso, nós dois nos conhecemos. Não importa como alguém chama o nosso... uh, estou hesitante em usar a palavra "relacionamento"... mas que diabos, sim, "relacionamento" – mesmo que não houvesse nada o suficiente para qualificar isso para tal estatuto. Não havia nada de incomum em duas pessoas que se conheciam, caminhando juntas na mesma direção. Certo?

Certo.

Ainda me lembro dela ali, surpresa, olhando para mim como se ela nunca tivesse me visto antes. E provavelmente, eu estava olhando estupidamente para ela.

A única coisa estranha que tinha acontecido naquela manhã foi que minha irmã não pulou como de costume na minha cama, na tentativa de me acordar. Posso assim dizer que este inesperado foi um eufemismo.

Apesar do tempo que nós passamos juntos desde que a Brigada SOS foi criada por ninguém menos que o semi-Deus diante de mim, eu não sabia muito sobre Haruhi, a não ser de seu amor por todas as coisas que fossem paranormais. O fato de saber onde ela morava foi uma das últimas coisas que eu tinha considerado saber a seu respeito, e muito menos se ela caminhava o mesmo percurso que eu.

Como eu disse, ambos tínhamos que ir para a escola e não havia muito que fazer, a não ser continuar andando juntos.

Quer dizer, não estávamos andando de mãos dadas, nem nada. Havia uma distância respeitosa entre nós. Estávamos próximos o suficiente para sermos educados, e longe o suficiente para que o outro pudesse acelerar ou desacelerar se fosse necessário.

Honestamente, não acho que tenha pensando muito sobre nisso no momento. Simplesmente aconteceu dessa forma.


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2.

E aconteceu de novo no dia seguinte.

Não menos surpreendente que isso, foi que eu corri até ela. E ainda descobri que tinha esquecido o nosso casual encontro do dia anterior, por isso estava perplexo por vê-la. Olhamos um para o outro novamente, contemplando a bizarrice da situação. Foi quando comecei a me perguntar onde Haruhi morava e porque nós nunca tínhamos nos cruzado antes.

Ela foi a primeira a dar de costas e continuar andando. Pisquei, e a segui. Não havia muita escolha. Eu tinha que ir por esse caminho também.

O que mais eu poderia fazer?

 
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3.

E continuou acontecendo todo o dia.

Acabou se tornando uma rotina nós nos encontramos no meio do caminho e andarmos juntos até a escola. De alguma forma o nosso horário sempre coincidia, então poderia afirmar que isso tinha alguma influência de Haruhi. Tentei sair um pouco adiantado ou atrasado a cada dia, mas isso não funcionou. Não importava se fossem três, quatro, talvez oito minutos, ela sempre estava lá ao mesmo tempo em que eu.

Se eu não tivesse sido informado das habilidades únicas de Haruhi pelos outros membros do clube, isso teria sido assustador. Mas pelo contrário, isso era consideravelmente normal se tratando de Haruhi.


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4.

Embaraçoso foi ter de lidar com o Taniguchi.

A fim de me livrar do doloroso pensamento que ele poderia realmente ter um cérebro e/ou um padrão de pensamento, vou acreditar que Kunikida o ajudou, do que acreditar que um dia Taniguchi tinha chegado a uma conclusão sozinho e de sua própria maneira. Em outras palavras, Kunikida poderia ter falado sobre isso com Taniguchi, e conseguido fazer a mente dele pensar. E com isso, Taniguchi teria se declarado Sherlock Holmes e Kunikida como Dr. Watson. Não, isso provavelmente está errado. É mais provável ele tenha ouvido uma das meninas em sala de aula falando sobre isso.

Mas de qualquer forma Taniguchi é muito idiota para descobrir qualquer tipo de coisa por conta própria, devido ao seu foco principal em apenas uma coisa: um rosto bonito.

Eles me encurralaram antes que eu pudesse dar de costas e sair dali.  

”Você não anda mais com a gente, Kyon” disse Taniguchi, pressionado as mãos contra a mesa e inclinando-se para mim. Como se não houvesse nenhum segredo entre nós.

Não havia muito a dizer sobre isso. Então dei de ombros e respondi:

"Acho que só não saio no mesmo horário que você."

"Não", ele concordou, sorrindo. "Você sai no mesmo horário que a Suzumiya."
 
Um desses momentos em que você, literalmente congela aconteceu, como quando você é pego com a mão na botija. Olhei para ele, internamente, em pânico. Embora a sua revelação tenha inundando a minha cabeça a ponto de me deixar sem sentido, eu neguei para tentar me livrar da conversa.

"O quê? Não, eu não", ele me olhou, não acreditando no que eu dizia. "Talvez nós dois caminhamos na mesma direção e ao mesmo tempo, porque temos que ir para o mesmo lugar. Mas nós não andamos juntos".

"Aww, vamos lá, Kyon", disse Taniguchi arreliado. "Não é nada para se envergonhar. Você gasta todo o seu tempo com a Suzumiya. Graças a esse clube que você ajudou a criar..."  

"Fui forçado a isso", argumentei.  

"Não me admira que você tenha crescido com isso. Não há nada para se envergonhar. Você pode nos dizer se está a fim dela. Mesmo que ela seja meio doida, ela é bem bonita também!"

Atônito, eu parei e me virei para encará-los, apenas para o meu olhar cair sobre Haruhi, que estava atrás de nós. Suas mãos estavam com os punhos cerrados, descansando nas curvas de seus quadris, e seus olhos demonstravam seu mau-humor.

Taniguchi e Kunikida devem ter visto em engolir em seco – será que foi mesmo possível? - Porque se viraram e congelaram ao vê-la.

"Oh, olhe" murmurou Taniguchi, levantando as mãos, enquanto tomava distância. "Lá está ela. Nós vamos deixar vocês dois a sós..."

Eles se afastaram e foram embora, correndo pelo corredor sem olhar para trás. Suspirei. Covardes.

"O que eles estavam falando?", questionou Haruhi. Seus braços cruzados atrás da cabeça enquanto ela andava para ficar ao meu lado. Seus olhos pousaram nos meus. Tive a sensação de que ela estava procurando por algo vital.

"N-nada", eu gaguejei. "Eles são idiotas. Estavam assumindo coisas que eles não sabem nada a respeito."

"Mmm", ela cantarolou, seus lábios contraídos. "Que seja. Vamos lá".

Como de costume, nada de mais aconteceu na sala do clube. É difícil chamá-lo de um clube, quando ficamos esperando que algo surpreendente aconteça - é o tipo mais parecido com uma reunião de insanos.

Asahina-san servia chá com sua roupa de empregada, Koizumi jogava um baralho de cartas consigo mesmo e Nagato lia um livro qualquer, que havia lido a semana toda em silêncio no seu canto. Eu estava distraído, por isso passei meu tempo clicando em ícones na tela do computador, a fim de fazer parecer que eu estava ocupado enquanto coletava meus pensamentos.
 
Haruhi sentou com as pernas cruzadas, mexendo-as no ritmo de uma música em sua cabeça. Ela olhou para mim de vez em quando, mas não disse nada.


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5.

Na manhã seguinte, depois que a reunião do clube transcorreu sem problemas, eu escorreguei e disse um "oi" para Haruhi, quando a encontrei no caminho.

Não sei porquê. Ele saiu do nada. Eu não tinha sequer a intenção de dizer isso.

"... Oi", ela respondeu, os olhos focalizados a sua frente.

E então caminhamos para a escola. Não juntos, mas na mesma direção. Puramente por acaso.

Maldição, Taniguchi.

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