Will

Meus olhos estavam se fechando contra minha vontade e eu ainda me sentia como se uma cobra venenosa estivesse picando minha nuca repetidamente, mas consegui obrigar minhas pálpebras a se abrirem para enxergar o lugar em que estava.

Me surpreendi e fiquei ofendido ao perceber que ainda estava no local em que Sadie havia me... 'nocauteado' -coisa que ainda não tinha aceitado. Como Sadie havia deixado de me apoiar em combate para defender um forasteiro estúpido?! Eu continuava incrédulo.

Não vi eles à minha volta, mas reconheci seus cheiros em meio à leve brisa que soprava, e Jack estava com eles. Idiotas. Se eles não me apoiavam, eu conhecia alguém que com certeza me apoiaria.

Me esforcei (e muito) para levantar, mas tinha a sensação de que minha coluna estava sendo acertada com uma serra elétrica. Depois de vários minutos agonizantes, consegui me pôr de pé.

Caminhei, ignorando a dor quase insuportável, e consegui adentrar entre as árvores.

Procurei pelo cheiro dela. Fazia alguns dias que não a encontrava, mas me recordava de seu doce cheiro. Alguns segundos bastaram para eu encontrar sua trilha, e caminhei despreocupadamente na direção do aroma.

A encontrei embaixo de uma árvore, lambendo suas patas dianteiras. Consegui chegar à três metros antes que a loba branca finalmente reparasse em minha presença. Ela se levantou num pulo ágil.

—O-Ol-Olá.

Por te-la apreciado poucas vezes, ainda não tinha me acostumado à sua encantadora voz. Mas sorri naturalmente.

—Olá.

Ela parecia intrigada, como se estivesse se perguntando o motivo de eu estar ali, mas a curiosidade repentina rapidamente sumiu de seu rosto. Ela começou a se virar, indicando que iria embora. Algo que eu não queria que fizesse.

—Se não se importar, eu vou embor... -uma grande preocupação em sua expressão interrompeu sua fala. Só então me lembrei de meus graves ferimentos. Ela só os percebera agora. Ela se aproximou ligeiramente de mim para me examinar, de forma que sua timidez pareceu nunca existir.

Enquanto ela olhava o alto de meu pescoço, pude ver detalhes que não tive a oportunidade de perceber antes: como seus lindos olhos, que eram cinzentos como ferro. E seu pelo, tão branco que a tornava difícil de distinguir entre a pouca neve que havia caído enquanto o inverno novamente se iniciava. Ela seria uma ótima caçadora durante essa época do ano. Por último, percebi que ela usava uma espécie de colar, não muito visível entre a pelagem densa.
Emfim. Ela virou a cabeça para me encarar.

—O que aconteceu? -me esforcei para não corar ao ver a preocupação evidente em seu rosto, mas não acho que tenha funcionado.

Algo me dizia que não deveria mencionar Sadie a ela. Pensei em uma resposta.

—Anh... foi.... um urso! É! Foi um urso-pardo.

Ela pareceu acreditar.

—Tem certeza de que está bem?

—Sim, sim.... eu... posso me cuidar sozinho...

—Ok... estou indo...

Ela se afastou -o que me aborreceu- e começou a penetrar as árvores.

—Hey!

Ela se virou.

—Você ainda não disse seu nome!

Ela voltou para perto de mim e abriu um pequeno sorriso.

—Me chamo Melody

"Nome lindo." Pensei.

—Sou Will!

Ela estava para dizer mais alguma coisa quando ouvimos um uivo. Melody se assustou e foi embora disparando entre as árvores.

Eu reconheci aquele uivo, e não podia ser coisa boa. Aquele era o uivo de Sadie.

O uivo dizia milhões de coisas diferentes, mas entendi como "Eu sei muito bem que você saiu seu estúpido. Nós -inclusive Jack, é claro- vamos caçar. Sem você. Lide com isso!"

Rosnei de frustração e tomei o caminho de volta ao lugar onde estávamos abrigados antes, sabendo que o encontraria vazio.