Lentamente abri os olhos, pronta para fechá-los rapidamente ao mais breve indicio de que ele estivesse acordado, mas Ichigo estava dormindo profundamente. Sua respiração calma e cadenciada o entregava.

Observei seu semblante relaxado, Ichigo dormia despreocupado agora, nada em seu rosto mostrava a dor e o sofrimento pelo qual passara na ultima luta contra o Aizen taichou, ou mesmo sua preocupação em saber quando chegaria seu limite, a ameaça iminente da perda de seus poderes agora esquecida, sublimada pelo sono.

Rin-rin descansava displicente em seu peito. Eu sabia que ela tinha sentimentos por ele, mas é difícil ter ciúmes de uma boneca de pano, naquele momento eu gostaria de estar no lugar dela.

Com movimentos lentos, sentei-me observando algum movimento alheio. Nova e Cloud estavam um apoiado no outro, uma pétala de flor de cerejeira pousou delicadamente na pequena mão de pelúcia de Nova, ele não se mexeu. Kon com toda a sua energia também havia apagado, largado sem cerimonia próximo a cabeça de Ichigo, por mais que ele negasse eu sabia que ele o tinha em alta conta.

Olhei a cesta de piquenique intocada. Viemos cedo ao parque no feriado, eu insistira em fazer um piquenique no parque e observar as cerejeiras desabrocharem, era início de primavera e todo o chão estava coberto de pétalas cor de rosa.

Minha vontade era de vir sozinha com o Ichigo, mas não conseguira pensar em nenhuma maneira de chama-lo sem que parecesse um encontro. Rin-rin se mexeu inquieta em seu sono, assustada fechei meus olhos com força.

***

O dia amanhecera ensolarado, um belo dia para um feriado, silenciosamente sai do armário que virara minha cama temporariamente, com cuidado para não acordar Kon e Ichigo que dormiam. Na escrivaninha peguei meu bloco de desenhos, passara a noite inteira criando coragem para fazer isso e fiz um pacto, se a manhã fosse ensolarada eu convidaria ele para um passeio.

Senti meu rosto ficar vermelho quando ele acordou e foi direto para o banheiro sem me dar atenção, já sabia que não adiantava perguntar o que eu estava fazendo, ele somente saberia na hora que eu quisesse.

Quando retornou já estava vestido e sentando-se na cama para ler um livro, deixou-me trabalhar em paz. Ficamos um bom tempo nesse silencio conspiratório, eu não precisava de conversas, somente em estar com ele já me deixava feliz.

Ouvi Yuzu, sua irmã mais nova, chama-lo do primeiro andar para tomar o café da manhã. Ele saiu dizendo que me traria algo quando terminassem, uma vez que eu estava vivendo em sua casa clandestinamente. Era um pouco incomodo, mas eu não me importava. Terminei minha carta codificada, que dizia:

“MePe enpeconpotrepe nopo parpaquepe, vapamospo fapazerpe umpu pipiquepe-nipiquepe epi verpe aspa ceperepejeiperaspa! Trapagapa opo konpon epi ospo ouputrospo! Vapamospo nospo dipiverpetirpi topodospo junputospo!”

P.S.: A letra é P.

Eu sabia que ele conseguiria decifrar rápido a mensagem, por isso antes que Ichigo voltasse eu coloquei o papel em cima de sua cama e pegando a sesta de pique-nique que preparara cuidadosamente de madrugada, fui para o parque.

Não demorou muito para ele aparecer, rodeado de bonecos. Tive vontade rir. Ele estava muito fofo e não passou despercebido para mim que Ichigo chamava a atenção das garotas, mas ele não era nem um pouco ciente desse fato. Disso eu gostei.

Ele brigou comigo por não ter deixado uma nota mais clara e riu dos meus desenhos de coelho caprichosamente rabiscados em cada espaço livre da folha.

Fomos para um lado mais deserto do parque e não demorou para que Kon implicasse com a Rin-rin que então progressivamente evoluiu para um jogo. Não me lembro como tudo começou, em uma hora estávamos tentando salvar Kon das patas assassinas da Rin-rin e no segundo seguinte estávamos envolvidos em uma perigosa perseguição em que Eu e Nova tomamos partido da Rin-rin e Cloud e Ichigo estavam defendendo o Kon.

Corremos tanto uns atrás dos outros que eu não me lembrava da última vez que me divertira tanto. Quando finalmente Rin-rin e Kon desistiram do jogo (O últimos que ainda jogavam, o resto de nós lutava com afinco para respirar debaixo de uma frondosa cerejeira) é que decidimos ir almoçar o conteúdo da cesta, mas estávamos tão cansados que continuamos ali, deitados.

A brisa leve, o calor agradável do sol, a grama fria e o aroma suave das flores de cerejeira foi o suficiente para fazer com nós seis dormíssemos.

Não sei por quanto tempo eu dormi, mas quando acordei vi que dormira bem ao lado de Ichigo. Apesar de dormirmos no mesmo quarto, nunca me sentira mais próxima dele que agora, deitada ao seu lado, vendo sua face adormecida completamente relaxada.

Levantei-me devagar, apoiando-me com as mãos e aproximei meu rosto do dele. Só queria sentir o seu cheiro, seu hálito. Só queria estar mais perto dele. Não percebi quando inconscientemente eu descera minha cabeça e o beijara.

Me afastei surpresa comigo mesma a princípio e depois aterrorizada ao ver aqueles olhos cor de mel olharem fixamente para mim. Ele estava acordado!

— Não valeu. –Ichigo disse, seu rosto estava sério e parecia estar um tanto irritado. –Eu ainda estava meio adormecido.

Levantou-se rapidamente e sem que eu conseguisse prever ele me beijou também.

Era um sonho? Era real? Eu não sabia e naquele momento não importava.

Eu o amava e nós estávamos nos beijando e isso era tudo o que eu queria saber.

FIM