A Orquestra escrita por Winston


Capítulo 18
Dia desinteressante




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As apresentações acabaram mais rápido do que Maria esperava, e antes que pudesse se dar conta de, já não tinha que ensaiar todos os dias a fio. A verdade era que tinha feito todos aqueles dias passarem bem rápido, evitando sair de casa sozinha ou até mesmo sair do local das apresentações sem alguém do seu lado. Tinha ficado um pouco neurótica depois do acontecido, que levara uma noite inteira para ser amenizado em sua cabeça, e mesmo assim ainda ficava tensa quando alguém a chamava de repente no meio da rua. Não havia contado o que tinha acontecido para Gabriel, sabia que ele era capaz de criar o teletransporte para ir atrás de Marcus e dar um jeito na doideira daquele garoto, e não queria o amigo preocupado com ela mais do que ele já estava por estar sozinha em outro país.

O fato era que só tinha saído do quarto para comer naquele dia, após a última apresentação. Não é que quisesse fazer alguma coisa, ou que não quisesse, estava com aquela sensação de que sabe que se ficar em casa vai ficar entediada, mas se sair vai querer voltar pra casa. Rolou na cama de um lado para o outro, abraçando o travesseiro, ou melhor, o esmagando, enquanto resmungava coisas sem sentido. Parou deitada com os braços abertos ao lado do corpo e os olhos presos no teto, com o travesseiro pendendo de uma de suas mãos.

– Tem nada pra fazer. – resmungou, mesmo que soubesse que se quisesse fazer alguma coisa era só sair daquele quarto.

Resmungou mais e se arrastou até onde tinha deixado o controle da televisão na última vez que a tinha desligado naquela manhã. Havia perdido as contas de quantas vezes tinha ligado, passado por todos os canais não encontrando nada que a interessasse, e desligado outra vez soltando mais resmungos. Tudo bem que parecia mais dramática que o normal, mas era que também tinha um pouco de receio de sair do hotel desacompanhada. Seus poucos três amigos estavam preocupados com as próprias coisas, vendo os pais, amigos ou aproveitando os momentos de folga que tinham antes de voltar a uma rotina maluca de ensaios.

– Mil e um canais e nada pra ver. – reclamava ao passar os canais, abraçando o travesseiro, agora sentada na cama.

Mordeu o lábio inferior enquanto pensava em algo, olhando pela janela aberta que deixava entrar um vento frio que amenizava o calor de um quarto fechado. Moveu os olhos preguiçosamente até o notebook ao lado da cama, estalando a língua considerando se o ligava ou não para falar com Gabriel, nem que não fosse por vídeo. Teria que contar para ele sobre tudo uma hora ou outra, afinal tinha corrido de explicações com a desculpa de estar muito ocupada com a orquestra. Mas agora ele sabia que ela estaria atoa por alguns dias, se não se falassem logo o garoto perceberia que tinha algo errado.

Um grito vindo da televisão a tirou de seus devaneios, fazendo-a tremer o corpo todo ao jogar o controle longe pelo susto. Não deveria ter deixado o volume tão alto bem num filme que nem sabia que era de terror, tinha parecido legal ao mostrar alguns adolescentes nada a ver felizes na piscina. Devia ter se dado conta.

– Daí me perguntam porque fico vendo Horton o tempo todo, razões óbvias. – falava tanto consigo mesma quando estava sozinha que sempre começava a pensar se não seria bom adotar um animalzinho.

Mudou de canal, colocando em um que passava um desenho colorido, abaixando o volume e se esticando para pegar o computador. Esperou pacientemente a que ligasse, atrasando o máximo que podia a conversa que teria com o melhor amigo, quase querendo bater nele por sempre estar online assim que atendeu a chamada pouco depois dela começar a ligar.

– Achei que tinha esquecido dos pobres outra vez. – Gabriel, do outro lado da tela, limpava debaixo das unhas cheias de tinta enquanto falava.

– Claro que não, só esperava ser uma hora boa aí.

– Aham, aham. Mas então, qual a novidade da vez? – ele tirou os olhos das próprias mãos e sorriu para a imagem de Maria na tela.

A garota começou a contar de todas as apresentações, como eram exatamente como ela tinha imaginado e sonhado desde que tinha começado a tocar o violino. Mal sabia que o motivo do sorriso de Gabriel não sumir era o brilho que ela tinha nos olhos enquanto contava de cada sensação e de como aplaudiam sempre que acabavam alguma canção. A conversa foi para o lado que Maria tentava evitar quando Gabriel perguntou se as cartas haviam parado.

– Pararam sim. – respondeu ela, seca e torcendo para que ele não perguntasse mais, mas conhecia Gabriel o suficiente para saber que o faria.

– E por que? – franziu as sobrancelhas, claro que teria reparado a expressão estranha no rosto da amiga.

– Bem, é porque aconteceu uma coisa aí, mas você tem que prometer não dar um treco quando eu contar. – “meu treco já foi o suficiente” Terminou de falar em pensamento, mas o aviso só fez com que o garoto ficasse ainda mais preocupado.

Não adiantou muita coisa, Gabriel quase construiu mesmo uma máquina de teletransporte ao ficar sabendo do que Marcus havia feito, mas sua reação fora tão engraçada aos olhos de Maria que não conseguiu conter a risada. Isso, claro, acabou deixando-o ainda mais nervoso e indignado com toda a situação. Acabou por fazê-la prometer que não iria sair mais sozinha, coisa que já estava fazendo, e que daria notícias se algo assim acontecesse outra vez. Gabriel fervia de raiva e preocupação.

No fim, terminou a ligação antes do que desejava, porque o melhor amigo tinha mais coisas para fazer na vida, como trabalhar e pintar. Enquanto ela continuaria ali no quarto, lendo a mesma revista outra vez, procurando algum programa interessante na televisão e olhando para o céu azul desinteressadamente. Não mudaria esse seu estado até ter certeza de que estava calma suficiente para sair cantarolando pelo parque atrás do gato ingrato ou até que Alba aparecesse na porta de seu quarto a perguntando se não iriam mais ao cinema. Por enquanto, porém, ficaria ali curtindo o tédio e reclamando do mesmo.


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