–O que tem de errado com essa gente? - sibilou com desdém.

Era uma manhã de domingo em plena primavera. O clima estava fresco e a cinzenta Londres parecia mais colorida do que de costume. As pessoas nas ruas andavam de mãos dadas e sorrindo umas para as outras de maneira carinhosa.

–É dia dos namorados, Sherlock - respondeu o loiro. - As pessoas estão... felizes.

–Me parece um motivo bem idiota pra se andar por ai sorrindo como malucos.

–Muitos considerariam sua atitude ranzinza como idiota - retrucou.

Sherlock o olhou com os olhos claros de maneira séria, como se estivesse pensando no que o loiro acabara de dizer.

–Deveríamos ter ficado em casa - o moreno o ignorou. - Toda essa "felicidade" estúpida está me impedindo de pensar.

John suspirou de maneira irritada, mas decidiu não retrucar - não fora ele quem decidira sair de casa para o centro de Londres em busca de mais informações para o caso, no final das contas - Não entendia como o moreno podia ser tão frio e distante. Como ele não parecia ter sentimentos.

Olhou para todas aquelas pessoas e se imaginou no meio delas. Permitiu-se imaginar alheio de todas as outras coisas que faziam parte da sua vida. Do perigo quase constante que era passar uma vida com o mais alto. Dos arqui-inimigos. Dos tiros na parede e dos criminosos. Da sombra da guerra quase o consumindo e de toda a dor que já sentira. Permitira-se imaginar no meio de toda aquela gente quase reluzindo de felicidade. Entediante, pensou o loiro com um sorriso nos lábios muito finos.

Olhou o moreno que caminhava de forma dramática pela multidão, evitando, o máximo que podia, tocar em alguém. John sorriu ante aquela misantropia e percebeu que não queria outra vida se não aquela. Podia não estar enquadrado no grupo de pessoas que sorria atoa iluminando o caminho por onde passava, mas tinha sua pequena felicidade. Ela podia ser meio torta e baseada em detalhes duvidosos - caçar criminosos não deveria ser divertido, deveria? -, mas ele a tinha. Mesmo que tivessem os momentos em que a vontade de esganar o mais alto ultrapassava os limites recomendados.

De repente Sherlock parou, fazendo John bater o rosto em suas costas.

–O que deu em você...?

Sherlock virou para fitá-lo, olhando-o de maneira nervosa, quase constrangida.

–Bem... Feliz dia dos namorados, John - houve um curto momento de silencio onde os dois apenas se olharam. - ... Eu disse que essa "felicidade" estava me impedindo de pensar direito!

E virou-se de maneira um tanto abrupta, voltando a andar a passos rápidos, como se houvesse se arrependido do que havia dito.

John demorou mais alguns poucos segundos parado, enquanto Sherlock se distanciava, a mente lutando pra assimilar o que o moreno havia dito. Sherlock realmente acabara de lhe desejar um feliz dia dos namorados? Não podia estar ficando surdo, podia?

Imaginou o quanto de "força" que o dia dos namorados tinha sobre as pessoas. Como ele conseguia contagiar tudo a sua volta, sabia que qualquer pessoa mais sensível se deixava levar pelo dia e por todas aquelas pessoas - até ele mesmo não estava pensando em coisas idiotas? -, mas Sherlock Holmes?

Talvez o moreno não fosse tão frio assim. Sabia que ele não era. Sabia que Sherlock só tinha uma visão diferente do mundo que os cercavam.

Correu através das pessoas até alcançá-lo mais uma vez. Sherlock estava com uma cara emburrada e John sorriu pra ele, mesmo que o moreno não pudesse ver.

–Feliz dia dos namorados, Sherlock - disse.

Engraçado como ele, de repente, passara a se sentir como uma daquelas pessoas na multidão, só que muito melhor.