Oceano escrita por Mateu Jordan


Capítulo 19
Coração de ferro




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Enquanto corro para a casa, os trovões retumbam em meus ouvidos como explosões fortes de sentimentos. Não consigo parar de chorar. Não sei se queria realmente abandonar tudo de uma vez sem saber se algum dia eu reveria todos os sereianos e Oceano novamente, ou se isso seria apenas uma espécie de sonho, e que Riba era um psicopata com asas. Porém, meu irmão precisava de mim tanto quanto eu precisava continuar correndo e respirando.

Sei que não devia estar pensando em Riba, mas penso tanto nele como estou pensando em Logan. Estou preocupada com o rumo de cada um, e que emoções eles vão me fazer sentir.

Entro na rua onde o hotel em que estamos hospedando fica, mas ele fica bem no final do quarteirão, e vou me molhar e pensar muito mais ainda.

Sei também que em muito pouco tempo, Riba já havia roubado meu coração e o levado as nuvens, e que eu precisava dele muito mais do que só para ser um amigo qualquer. Eu precisava dele e ele sabia disso.

Mesmo com todo esse pouco tempo, eu vi nele uma pessoa que poderia me fazer feliz depois de todos esses anos de prisão no meu falso medo, e que ainda podia me mostrar quem eu era de verdade, pois em todo esse tempo nunca me apaixonei ou quis alguém como me apaixonei e quis Riba. Como estou apaixonada e como quero-o.

Riba tem um jeito que me faz sentir-me única e desejada, como se eu fosse uma garota de vidro e ele não quisesse me quebrar nunca. Mas ele não faz isso do jeito clichê de um romance, mas faz do jeito que eu poderia curtir o momento com ele, sem me preocupar se teria uma final feliz ou não.

Tento segurar mais as lágrimas, mas o fato de eu ter que ir embora de tudo e de Riba, tão de repente, faz com que eu derrube pelo chão pedaços do meu coração que eu preenchi aqui. Não queria que terminasse assim, nunca.

Tiro os pensamentos da cabeça e as lágrimas do rosto, assim que vejo o portão do hotel. Deixo ir minhas tristezas e dores, assim como a chuva vai, embora.

Abro o portão e sinto meu coração bater ainda mais forte, de preocupação e ansiedade. Logan agora é meu único pensamento, como minha família foi a única coisa que me fez abandonar o Oceano.

Quando fecho o portão e estou correndo em direção ao nosso apartamento, vejo nosso carro com o porta-malas aberto, mas mesmo assim não paro de correr.

Quando vejo duas pequenas pernas atrás do carro e de frente com o porta-malas, sinto minha cabeça formar um grande acento de interrogação. Por que uma criança mexeria no nosso carro?

Meus pés batem forte no chão quando minha cabeça gira com tudo isso. A criança percebeu minha presença com o meu barulho e antes de mais perguntas surgirem na minha cabeça, as pernas começam a andar e sair de trás do carro.

Perco a ansiedade, perco a preocupação, perco o folego.

Ganho uma dúvida.

O menino para em minha frente e sorri, como se a chuva não o atingisse. Era Logan.

*****

– Você está bem? – Digo pegando-o pelo braço. Estou com medo também. Ele parece tão bem, e minha mãe havia dito que ele estava tão mal. – Você está bem?

– Estou, Leo – Ele diz me abraçando e eu solto seu braço. Não quero machuca-lo. – Mamãe disse que eu estava desmaiado, mas eu não me lembro disso. Me lembro de ter dormido ontem à noite com dor, mas acordei faz um tempinho e não me lembro de nada disso.

Reflito sobre a resposta. Minha mãe não iria me assustar a toa. E Logan só era uma criança, deve ter batido a cabeça por cair.

– Vamos entrar – Digo para ele. Vejo que ele estava colocando malas no carro e eu sinto um nó na garganta tão grande que eu não consigo engolir e minha boca fica amarga. – Onde está o papai?

– Ele não está bem – Logan disse – Depois que eu acordei ele parecia de outro mundo, ele tá meio viajado.

– Ele deve ter ficado em choque depois que viu você desmaiado, ele ama-o muito. – Digo, entrando em casa.

– Não desmaiei, Leona – Ele insiste e olho-o bem nos olhos. Ele não demonstra fraqueza ou graça. – Mamãe está louca igual o papai.

Entro e vejo a casa cheia de malas espalhadas pelo corredor que liga a sala na porta para a saída do apartamento. Papai está sentado no sofá tão ereto que sinto uma dor na coluna por vê-lo assim.

– Pai? – Chamo-o passando por Logan e sentando ao lado dele – Qual o problema, pai?

– Você chegou, Leo! – Ele pareceu sair do torpor e do mundo em que parecia estar ao me ver e me ouvir. Ele me abraçou rapidamente e começou a levar as malas do corredor para o carro. Observo-o sair do apartamento cheio de malas e Logan me lança um olhar.

– Eu disse que ele parecia viajado – Ele fala, depois disso, pega uma mala e segue o rastro do meu pai.

*****

Depois disso, minha mãe vem e me abraça como meu pai fez e fala a mesma coisa que ele falou: “você chegou, Leo!”. Fico desconfiada que estão me escondendo algo, mas logo depois que fomos colocar as malas no carro, a pressão do meu pai caiu tanto que ele desmaiou rapidamente, e depois acordou chorando, então eu esqueci meus pensamentos desconfiados. Ele também disse que estava cansado e que estava passando mal. Minha mãe não sugeriu nada, mas eu queria leva-o a um hospital.

Ele negou, é claro. Meu pai nunca gostou de ir em médicos. E então, minha mãe foi dirigindo, e eu no banco de trás, observando Los Angeles pela última vez, e dizendo um adeus silencioso e triste. Não quero ir.

Não perguntei para minha mãe porque Logan parecia bem e porque ela estava preocupadíssima com ele e com meu pai. Os dois não pareciam estar terminalmente ruins, mas não quero que ela desconfie que eu não estou feliz com sua ligação. Como disse, vou observa-la melhor.

*****

Passamos por Venice Beach primeiro, depois por Santa Monica, e quando vejo aqueles mares enormes, meu coração de desfaz como areia seca, como uma areia que nunca viu água e que fica tão longe de uma quanto o chão fica longe do mar.

Mexo nos meus colares que ganhei no dia do meu aniversário. A onda tão real quanto a que eu estou vento e as asas tão leves quanto as nuvens. Eu estou tão triste que se eu chorar, vou ter que criar um novo oceano no planeta. Um oceano de lágrimas.

Depois que saímos de Los Angeles, a estrada na minha frente parece ser tão longa que estou quase enlouquecendo só nesses poucos minutos em que estou dentro do carro.

Quero gritar para que voltem a Los Angeles e que me deem mais alguns dias para pensar no que irei fazer. Preciso de pouca pressão agora, quero pensar em paz. Mas como o céu uma hora atrás, eu derrubo a primeira lágrima da torturável viagem de volta a minha casa que irei ter que me adaptar de novo. Me adaptar a viver de novo sem me sentir em casa, mesmo tendo uma família por perto. Nunca temos tudo o que queremos.

Bleachers aparece no nosso rádio e eu gosto de ouvi-los. As melodias e canções são perfeitas para mim. Ainda choro silenciosamente, mas não deixo ninguém ver minhas lágrimas. Ainda quero parecer ter um coração de ferro, mesmo que ele já esteja tão danificado quanto um brinquedo quebrado.

Eu mesmo quebrei-o. Mas estou feliz por quebra-lo uma vez.

*****

Chegamos em casa quando o dia está amanhecendo. Durante a viagem noturna, todos pareceram dormir e eu e minha mãe conversamos um pouco.

Ela perguntou se eu gostei de Los Angeles, eu disse que sim. Ela perguntou se eu fiquei triste por ir embora mais cedo, eu que disse sim. E ela perguntou se eu gostaria de voltar lá um dia, e eu também disse que sim. E ela perguntou se eu gostaria de ter entrado no mar, eu disse que não.

Não quero entrar lá. Quero ficar.

Ninguém tirou nada do carro quando chegamos em casa, e nem se importaram em levar qualquer outra coisa que estava lá dentro. Apenas entramos e eu fui em direção ao meu quarto. Deitei na cama e fitei a parede ainda escura na minha frente.

Como no hotel, eu também via sombras dançando agora aqui em casa, mas diferente de lá, essas sombras tinham asas e caudas.


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