Hinata não ficou surpreso ao encontrar o lotado. Afinal, dali a poucos minutos, aconteceria a apresentação do grupo mais famoso de todo o Japão naquele momento: as Girls Dead Monster. Bem, todo o seu sucesso era deveras merecido; não tinha como ele e nem ninguém negar isso.

Era até engraçado se lembrar que há alguns anos, elas eram apenas um clube de música qualquer da escola. Ninguém acreditava que iria passar daquilo — a não ser as próprias garotas do grupo, claro —, e até ele chegou a duvidar que elas teriam alguma chance. E o motivo não era falta de talento, mas pelo fato do mercado musical estar saturado do pop vindo de grupos de adolescentes.

Ele ainda se lembrava com perfeição, das tardes em que ficava no clube de beisebol, treinando arremessos com Yuzuru — já que os outros sempre ficavam enrolando fazendo outras coisas, em vez de realmente treinarem —, enquanto ele reclamava sobre a nota “mediana” em algum teste e que isso poderia impedi-lo de entrar na faculdade de Medicina. E quando não era isso, reclamava por Kanade estar ocupada demais com o Conselho Estudantil para dar atenção a ele. Do campo dava para escutar as batucadas da bateria de Irie, e das notas eletrizantes da guitarra de Hisako. E também... Da voz desafinada de Yui.

Aaaaaaah, quem diria, não era?

Parou de pensar nisso e seguiu para o seu lugar, que ficava na área VIP. Ele costumava gostar de ficar no meio da multidão quando era mais novo, mas depois que envelhecera e se entregara aos negócios da família (e desistira de vez do sonho de ser jogador de beisebol), sentia-se mais cansado do que nunca, e dispensava atividades que o cansariam demais. Foi por isso que comprou um ingresso que garantiria seu lugar na primeira fileira do concerto, e que não estaria amontoado de pessoas.

Hinata olhou as horas no relógio de pulso, apenas para conferir quanto tempo ainda faltava. Só cinco minutos. Só mais cinco minutos e poderia vê-la... Por que esse curto tempo parecia ser a eternidade? Tentou não se atentar ao ponteiro do relógio que contava os segundos, isso só servia para deixá-lo ainda mais nervoso.

Ansioso, começou a cantarolar uma música em sua mente, assim se distrairia um pouco. Funcionou. Porque as luzes se apagaram, anunciando o início do tão esperado concerto. As vozes inundaram todo o local, porém, Hinata não estava prestando atenção em nenhuma delas; o que realmente chamou sua atenção foi a figura feminina, pequena e aparentemente tão frágil, mas com a mesma energia da qual ele se lembrava,

Yui.

Sua Yui.

Ela pulava e corria pelo palco, animando as pessoas que estavam ali, esbanjando sua alegria contagiante. A voz que outrora fora tão desafinada, conseguia alcançar as notas com perfeição, sem desafiar uma vez sequer. E nos seus olhos claros havia aquele brilho de uma pessoa que não poderia estar mais feliz naquele momento. O cabelo rosa estava solto — diferente das típicas maria-chiquinhas que usava — e caia até o fim das costas.

Hinata estava feliz, porque ela estava feliz. Pelo menos algum deles tinha conseguido alcançar o que queria. E isso era o suficiente para ele.

As músicas foram passando, e a explosão de excitação do público era mais do que palpável. Todos estavam muito empolgados, e não era para menos. As garotas sabiam exatamente como animar seus fãs. De repente, tudo ficou escuro, e segundos depois a luz voltou, focando em um único ponto: Yui.

Ela segurava o microfone e já aparentava cansaço pelos longos minutos que ficou cantando. Mas isso não a impediu de abrir um deslumbrante sorriso. E foi com esse mesmo sorriso de nostalgia, que ela começou a dizer:

— Essa música que cantarei agora, tem um significado muito especial. Já faz um tempo que não a canto... — A voz embargou um pouco, mas logo se recuperou. — E decidi que faria isso hoje, e estou dedicando para alguém muito, muito importante na minha vida.

O Hideki esperou com mais expectativa do que o normal, ainda que não soubesse o motivo. Engoliu a saliva que começara a se acumular, com dificuldade. Os olhos fixos no palco, sem piscar uma vez sequer.

Sempre que nos víamos tudo que fizemos foi brigar.
Mas aquilo eram também lembranças maravilhosas

Ele arregalou os olhos ao som da primeira nota. Conhecia essa música tão bem, parecia que havia uma bola de tênis entalada em sua garganta. Não acreditava que Yui estava cantando aquilo... Para ele. Os olhos dela estavam fechados, e a melodia suave preenchia o vazio que tinha se instalado em seu coração nos anos em que ficara fora, em que tinha sido forçado a ficar longe da garota que gostava.

O vazio que tinha se instaurado ali, por ter sido forçado a abandoná-la.

E agora ela estava ali, parecendo muito mais forte e linda do que jamais estivera.

Eu vou por mim mesmo, mesmo que isso pareça doloroso,
Eu vou sempre continuar o sonho que eu tive com você.
Estar com você era tão maravilhoso, não havia mais ninguém.
Mas quando eu acordei de manhã, você não estava lá.

Yui abriu os olhos e procurou na multidão algo que sabia que não encontraria. Mas em todos os shows e concertos fazia o mesmo: passava o olhar pela multidão, à procura da única pessoa que gostaria que realmente estivesse ali. Sem deixar de cantar, repetiu o mesmo ritual.

E estancou. Ficou paralisada, e sem voz. A canção tinha chegado ao solo, e agradeceu por isso, porque não teria forças para continuar cantando. A respiração ficou presa em seus pulmões, e as lágrimas vieram aos seus olhos grandes com rapidez. Largou o microfone no chão, sem conseguir acreditar.

Seria mais uma peça que sua mente estava pregando?

Isso seria cruel demais.

Sem nenhum tipo de cuidado, correu para descer do palco. Alguns seguranças tentaram pará-la, mas Yui foi muito mais rápida e se livrou deles com facilidade. Hinata a observava vindo na sua direção, incrédulo, sem conseguir acreditar que ela realmente tinha o visto.

Todavia, isso logo passou.

Não demorou mais do que alguns segundos para que ele corresse de encontro a ela, o coração, antes pesado, ficando leve, à medida que se aproximava. O sorriso foi inevitável; e quando os braços dela serpentearam seu pescoço em um abraço apertado — que foi retribuído com igual intensidade —, as lágrimas de felicidade também foram inevitáveis.

Ignoraram todo o alvoroço em sua volta. Existia apenas os dois naquele momento.

— Idiota — Yui chorou, apertando-o tão forte, apenas por temer que ele fosse desaparecer a qualquer instante. Tinha muitas perguntas, desejava respostas, tantas... Só que a única coisa que conseguiu dizer foi: — Por que demorou tanto?

— Desculpe, desculpe — repetiu. Tão atípico dele se desculpar com ela. Precisava contar-lhe tantas coisas... Falar sobre o tempo em que estiveram separados. Sobre como ele sempre estivera a assistindo, mesmo de longe. Apenas para garantir que estava bem e realizando o sonho da sua vida. — Mas eu prometi, lembra?

— É, você prometeu. E está aqui agora.

— Estou. — Separou-se dela, segurando o rosto bonito entre as duas mãos. — E não vou a lugar nenhum. Nunca mais.

E ela riu. E era o som mais bonito que ele tinha escutado.

O tempo mudou, uma vez que subia e descia.
Eu não consigo lembrar o que aconteceu mais, mas,
Se eu tentar fechar meus olhos, eu consigo ouvir o riso de alguém.
De alguma forma, esse é agora o meu tesouro mais precioso.

“Yui, eu estou indo embora agora. As coisas não estão sendo do jeito que eu planejava, mas... Eu prometo... Prometo que sempre serei seu fã número um, não importa o que aconteça. Alcance seu sonho, e eu estarei lá, te ouvindo e torcendo por você.”