– É... É uma bela fotógrafa - Quando terminou a frase, Cobra recebeu vários delicados tapas da bailarina.

Esperaram por alguns instantes, até que a fotógrafa foi falar com eles.

– Oi! Vocês são brasileiros, certo? - Ela perguntou, em português.

– Sim. Você também? - Perguntou Jade, estranhando.

– Pois é! Eu sou de Minas e vocês do Rio, não é? - Eles afirmaram. - Isso facilita muito. Meu nome é Carla. Você deve ser o Ricardo, né? - Disse ela, estendendo a mão. - Muito prazer.

– O prazer é tod...

– Eu sou a Jade! - Se intrometeu a bailarina, separando as mãos dos dois e cumprimentando a Carla. - Namorada do Ricardo.

– Ótimo! Assim ele fica mais a vontade! - Ela sorriu.

– É! Eu já tô super a vontade! - Comentou Cobra, sorrindo também. Na verdade, a única pessoa que não estava sorrindo era a Jade.

– Então, vamos começar?

– É pra já! - Prontificou-se Cobra, empolgado.

– Ali está a primeira roupa que a gente separou. Vista ela e nós já começamos. - Carla retirou-se e Cobra foi na direção das roupas, sendo seguido pela Jade.

– Cobra, escuta aqui: se você ficar se assanhando pra essa fotógrafa trabalhada no silicone, eu juro que não boto mais os pés naquele apartamento. - Cobra riu. - Tô com cara de quem tá contando piada, Cobra?

– Não, imagina... Eu só percebi uma coisa agora... Bem irônica.

– O que?

– Eu não sou o único ciumento nessa relação. - Jade revirou os olhos.

– Não é ciúmes. É que eu tenho orgulho! Eu não vou ficar me humilhando, assistindo você dar moral pra essa tal de Carla! - Concluiu, com desdém.

– Eu só vou sorrir, fazer cara de mau, exibir meus músculos... Esse tipo de coisa. Não foi isso que você disse? - Provocou Cobra.

– É, mas não precisa se exibir muito, vagabundo... Não por nada, é que fica meio gay... - Disfarçou a bailarina.

Já com a bermuda e a camiseta vestidas, ele foi ao encontro da Carla.

– Não precisa ficar tímido! Aja como se estivesse apenas eu e você nessa sala. - Aconselhou a fotógrafa, iniciando os cliques.

– Não diz isso, garota... - Provocou Cobra, fazendo Jade sentir vontade de voar no seu pescoço.

Sentada em um canto, a bailarina assistia a tudo em silêncio, controlando-se. Até que ela ouviu:

– Ótimo! Agora vamos fazer uma seção sem camisa! - Cobra prontamente atendeu ao pedido da fotógrafa, tirando a camiseta. Alguns cliques depois, Carla parou e se aproximou de Cobra, apertando seus bíceps. - Eu não sei... Você tá meio travado... Eu quero uma coisa mais... selvagem!

– Ô queridinha! Isso aqui não é pra anúncio de zoológico, sabia? - Comentou Jade, estalando os dedos e fazendo com que Cobra se afastasse da garota.

Carla tirou outras fotos e logo deu o ensaio por encerrado. Eles se despediram e foram para o apartamento.

No caminho, Cobra tentou puxar assunto:

– Então... O que você achou do ensaio?

– A pergunta certa é o que você achou do ensaio. - Revidou Jade. - E aí?

– Ah... Eu acho que ficou legal. A Carla parecia bem segura do que fazia.

– Eu não sei... Eu vi uma foto na câmera dela e parecia que tinha ficado bem mais ou menos... Eu acho que ela não encontrou o teu melhor ângulo. - Comentou Jade, deixando escapar uma pontinha do seu ciúmes.

Cobra gargalhou.

– O que foi? - Perguntou a bailarina, irritada.

– Você só tá dizendo isso porque ficou com ciúmes.

– Já disse que não é ciúmes, Cobra! Eu só achei ela meio fraca. Os teus patrocinadores deveriam ter encontrado uma fotógrafa mais talentosa. - Disse ela, cruzando os braços.

– Aham... Agora limpa aqui ó... - Passou o dedo no canto da boca. - Tá escorrendo o veneno.

– Nossa, Cobra! Como você tá engraçado! - Ela forçou uma risada. - Aproveita e limpa também... Tá escorrendo a baba por aquela siliconada...

– Não é por ela... - Ela fitou o rosto do moreno. - É que eu tenho um certo fraco por bailarinas. - Ela sorriu e beijou o lutador, dando fim aquela discussão desnecessária.

***

As semanas passaram depressa, deixando para trás as cenas de ciúmes bobo. Um dia antes do seu aniversário, Jade estava preocupada: Cobra não tinha dado nenhum mínimo sinal que lembrava do evento.

Claro que ele lembrava. Alguns dias antes tinha falado com o pessoal do Rio e estava organizando uma homenagem para a bailarina, porém ele queria que fosse surpresa, por isso estava se fazendo de esquecido.

No dia do aniversário, Cobra saiu antes que Jade acordasse. A dançarina ainda cruzou com a Karina em casa, mas a lutadora, sabendo da homenagem, também não demonstrou alguma lembrança.

Jade foi para a Companhia se sentindo péssima. Uma mensagem com apenas um "parabéns". Era só isso que ela queria do vagabundo. Recebeu uma ligação do Edgard lhe parabenizando e ficou um pouquinho melhor depois disso, mas sua falta de concentração era visível.

Dimitre passou alguns passos difíceis na coreografia e Jade não os conseguia pegar por nada. Ensaiaram no palco de teatro, até beirar a exaustão e a cabeça da bailarina já fervilhava.

– Jade, nós ainda temos três meses até a apresentação. Se você não está conseguindo acompanhar, ainda dá tempo de trocarmos de bailarina. Não tem problema, virão outros espetáculos e eu tenho certeza que você vai conseguir destaque, porque você tem muito talento, garota. Talvez você só não esteja pronta ainda. Talvez a gente tenha se precipitado com você. - Despejou Dimitre, depois de uma série de tentativas frustradas. Era só o que faltava!

– Não, Dimitre! Por favor, me dá mais uma chance! Eu consigo! - Desesperou-se Jade. Já tinha chegado tão longe, não podia simplesmente abandonar tudo agora.

– Tudo bem... - Concordou Dimitre, desacreditando naquilo. - Vamos de novo!

Ensaiaram mais uma, duas, três vezes. Nada. A morena não conseguia realizar os movimentos na tal pegada aérea que faltava. Vendo o que estava para acontecer, John interveio:

– Dimitre, releve dessa vez. Talvez a Jade só esteja em um dia ruim hoje. - O coreógrafo não parecia convencido. - E também... Eu não sei se em três meses eu consigo criar a intimidade que eu tenho com a Jade com outra bailarina.

– Você sabe que, quando você diz isso, pode estar entregando a sua cabeça junto, não sabe? - Perguntou Dimitre.

– Sei. - Respondeu, convicto. - Mas nem por isso, esse fato deixa de ser verdade.

– Tá bem! - Dimitre desistiu de tentar argumentar. - Você tem até a semana que vem, Jade. Se você não conseguir até lá, embora eu goste muito de você, nós seremos obrigados a trocar de bailarina. - Jade não sabia se sentia-se aliviada ou pressionada. - Ensaio terminado por hoje!

Nesse momento, Cobra chegou. Novamente, ninguém o viu e ele sentou-se na última fileira de cadeiras do auditório do teatro, onde ele continuaria sem ser visto. Dimitre saiu e Jade sentou-se no chão do palco, puxando alguns fios de cabelo e atraindo a atenção do John. Ele se sentou ao seu lado.

– Problemas?

– Muitos. - Respondeu, tristonha.

– Quer conversar?

– Ah John! Hoje é meu aniversário e...

– E a gente tem que comemorar! - Interrompeu o bailarino, alegre.

– Não é bem assim... Parece que ninguém se lembrou! Nem o Cob... Digo, Ricardo. Eu recebi hoje só um telefonema. E ainda tem esse maldito passo que eu não consigo pegar por nada neste mundo...

– Ainda assim, nós temos que comemorar! - Ele pensou por alguns instantes e pareceu ter uma ideia. - Me concede a honra de uma dança?

– Como assim? O Dimitre já desligou tudo...

– Deixa eu ver o seu celular. - Depois de um tempinho analisando as músicas da garota, ele encontrou a que queria. - She will be loved? Música propícia.

Ele colocou-a para tocar. Como Jade não se mexeu, ele começou a dançar sozinho.

Beauty queen of only eighteen
She had some trouble with herself
He was always there to help her
She always belonged to someone else

I drove for miles and miles
And wound up at your door
I've had you so many times but somehow
I want more

Não era uma coreografia séria. Era apenas uma série de palhaçadas com um único objetivo: fazer a Jade sorrir. E ele estava se esforçando. Chegou um certo ponto que Jade não se conteve e soltou uma gargalhada. John ficou mais animado e continuou dançando ensandecidamente, arrancando mais risos da garota. Pela primeira vez no dia, Jade ficou realmente feliz.

I don't mind spending everyday
Out on your corner in the pouring rain
Look for the girl with the broken smile
Ask her if she wants to stay awhile
And she will be loved
She will be loved

Tap on my window knock on my door
I want to make you feel beautiful
I know I tend to get so insecure
It doesn't matter anymore

Depois de muito insistir, John conseguiu fazer com que Jade dançasse com ele. Eles não faziam nada romântico ou algo do tipo, eles apenas faziam passos aleatórios da coreografia que Dimitre havia passado. E riam. Eles riam muito. Eles realmente gargalhavam. Aquilo parecia engraçado ao extremo e os bailarinos realmente se divertiam.

It's not always rainbows and butterflies
It's compromise that moves us along, yeah
My heart is full and my door's always open
You can come anytime you want

I don't mind spending everyday
Out on your corner in the pouring rain
Look for the girl with the broken smile
Ask her if she wants to stay awhile
And she will be loved
And she will be loved
And she will be loved
And she will be loved

Cobra observava tudo, em silêncio. Sua cabeça, no entanto, borbulhava. Ela vai ser amada? Ela já é amada, idiota!. Porém, ao se dar conta de como Jade parecia feliz, Cobra pensou que talvez a sua homenagem não fosse tão boa assim e ficou triste com isso. Mesmo assim, não interrompeu. Ele ainda não era capaz de destruir com a felicidade dela.

I know where you hide
Alone in your car
Know all of the things that make you who you are
I know that goodbye means nothing at all
Comes back and begs me to catch her every time she falls
Tap on my window knock on my door
I want to make you feel beautiful

I don't mind spending everyday
Out on your corner in the pouring rain
Look for the girl with the broken smile
Ask her if she wants to stay awhile
And she will be loved
And she will be loved
And she will be loved
And she will be loved

– Jade, você conseguiu! - Exclamou John, de repente, parando com a brincadeira

– O que? - Perguntou Jade, ainda com um sorriso no rosto.

– Você conseguiu fazer o passo! Jade, você conseguiu! - John também possuía um sorriso gigante no rosto. Quando pensou no que tinha feito, Jade paralisou. Eu consegui! – Você só tava nervosa! Agora, aqui, se divertindo, tudo ficou mais fácil! Jade, você pode fazer o que quiser, mas antes precisa se divertir!

Jade se lançou em um abraço com o garoto.

– Muito obrigada, John! Muito obrigada mesmo!

Please don't try so hard to say goodbye
Please don't try so hard to say goodbye
I don't mind spending everyday
Out on your corner in the pouring rain
Try so hard to say goodbye

Cobra não se aguentou. Levantou-se e foi andando em direção ao palco. Chegou lá e eles ainda estavam abraçados. Tentando controlar a raiva na sua voz, Cobra falou:

– Interrompo alguma coisa?

– Cobra? - Jade surpreendeu-se ao enxergar o garoto ali. Ainda emocionada, ela começou: - A gente só tava...

– Comemorando o seu aniversário?

– Você se lembra? - Surpreendeu-se ainda mais a garota.

– Claro. Eu queria fazer uma surpresa, mas eu acho que você entendeu tudo errado. - Ele parecia triste.

– Cobra, você realmente se lembrou? - Jade ainda queria acreditar.

– Eu costumo vir te buscar, Jade? - Aquilo respondeu a sua pergunta e a bailarina correu para os braços do vagabundo. John viu que estava sobrando e foi saindo de cena.

Quando o casal chegou no apartamento, Cobra ainda estava um pouco irritado.

– Aquele cara continua dando em cima de você, Jade! Será que eu vo...

– Ai Cobra, hoje não! Não vamo brigar, por favor! - Ela envolveu o pescoço do lutador e depositou vários selinhos na boca do mesmo. - Nossa, Cobra! De uns tempos pra cá você ficou tão forte!

– Imagina! - Cobra ficou um pouco tenso, mas desconversou: - É, você tem razão, não vamo brigar. Hoje é o seu dia, minha dama! Eu só vou tomar uma ducha, já que eu acabei de sair do treino, e a gente sai pra jantar! Espera um minuto! - Disse, jogando a mochila displicentemente sobre o sofá.

– Hum! Com direito a jantarzinho fora! - Brincou Jade, se sentando no sofá.

Após alguns instantes em silêncio, Jade percebeu um frasco caindo por um pedaço do fecho aberto da mochila. Ela pegou para guardá-lo e viu que dentro dele havia vários comprimidos.

– Não sabia que o Cobra tomava remédio... - Resmungou Jade. Observando mais atentamente o frasco, a bailarina notou que não tinha identificação no mesmo.

E ela começou a ligar os acontecimentos. O Cobra não conseguiria ganhar tantos músculos em tão pouco tempo se não tivesse uma ajuda ilícita. Jade perdeu a noção de quantos minutos ficou ali, encarando o frasco, em estado de choque. Ele não pode tá fazendo isso com ele mesmo!

Cobra voltou do banho e encontrou Jade com os anabolizantes na mão. Antes que ele se explicasse, a bailarina perguntou, revoltada:

– O que é isso? Você tá usando doping, Cobra?