Silver Snow ESPECIAL DE NATAL DO TAP vol.2 escrita por Matheus Henrique Martins
Depois de ficar alguns minutos olhando em silêncio para a placa sem graça de BEM-VINDO A VALLYWOOD, sinto a raiva deixar meu corpo e me viro para procurar por Felipe. Apesar de tudo ele ainda esta em uma missão comigo, e nunca se pode abandonar alguém em uma missão.
É uma das coisas que sempre aprendi.
Demoro um pouco para encontra-lo, mas enfim o acho sentado na frente do rio, com uma expressão cabisbaixa. Vejo que a espada esta pousada ao seu lado e não fico surpreso com isso. Ele é muito fiel a ela.
Tento andar discretamente em sua direção, mas ele tomba a cabeça de lado e suspira.
– Se ao menos quer me afogar no lago faça isso com menos suspense – ele solta em uma voz sem graça.
Sorrio por dentro e continuo caminhando. Sento-me ao seu lado no chão e noto pela primeira vez, ao olhar sua expressão, que ele é mais novo que eu. Talvez um ou dois anos mais novo. Nem parece.
– Olha, eu sinto muito – começo. – Eu não queria dizer aquelas coisas.
Ele me olha de lado.
– Queria sim – murmura. – Eu sei que queria.
Suspiro.
– Claro que você sabe. É um sabe tudo, consegue saber até das coisas não sabíveis da face da terra.
Ele franze o cenho para minha frase sem sentido e sorrio de volta sem dar muitas explicações. Uma curva aparece no canto de seu lábio.
– Quer saber, tudo bem – ele olha para o rio. – Você não disse nenhuma mentira. Eu sou um novato metido a besta.
Bato seu joelho no meu.
– Não, não é – falo solenemente.
– Sou sim – ele insiste. – Solto comentários que ninguém quer saber ou que ninguém perguntou. Me intrometo nas coisas e acabo estragando toda a situação – ele funga. – Eu sou uma piada.
– Você não é uma piada – eu nego com a cabeça. – E não me venha com essa de que estraga uma situação toda.
– É a verdade! Me fala uma coisa que eu fiz que foi boa até agora com essa atitude minha.
Dou de ombros.
– Nós encontramos uma pousada – solto e ele me lança uma cara de desdém. – Dormimos em camas muito boas e tinha uma TV – minha voz fica fraca quando digo a palavra “dormimos”. Se ele percebeu isso, não sei dizer como.
– Grande utilidade – ele rebate.
– E quando brigamos com a Bruxa pela primeira vez – eu o lembro. – Você soltou a Dessa, espantou a Bruxa e ainda me defendeu.
– Não completamente – ele me olha atentamente. – Você ficou ferido depois.
Concordo com ele, mas uma memória diferente enche minha mente. De repente sinto sua mão tocar minha barriga e meu corpo esquenta com essa lembrança.
– É – eu pigarreio para falar normalmente. – E depois você limpou minha ferida. Tá vendo só? Você foi útil duas vezes em uma só noite. Eu poderia estar sangrando até a morte agora.
Ele revira os olhos para minha hipérbole.
– Mas ainda sou um inteligente irritante.
– Tem razão, você é – eu provoco e ele me olha de volta.
Ele me soca no ombro e eu o chuto na perna. Ele reclama e me empurra. Eu soco sua barriga e ele me agarra pelos ombros. Seguro seu pescoço e o jogo no chão, ficando por cima dele. Rimos o tempo inteiro, fazendo eco por todo o lugar.
De repente ele me joga no chão com tudo e fica por cima, me encarando de cima. Sinto suas pernas entrelaçadas nas minhas e seu rosto esta bem próximo ao meu.
Ficamos em silencio, nos encarando enquanto nossas respirações vão desacelerando. Seus olhos castanhos miram os meus e sinto meu coração martelar.
Por que estou tão nervoso? Por que ele esta tão perto? Por que estou sentindo vontade de erguer minha mão e tocar seu rosto? Por que eu...?
Ele se solta de mim e levanta em um átimo. Sinto todo o meu corpo formigar no mesmo instante.
Felipe me olha de cima cautelosamente e pega sua espada do chão. Me sento na grama e o encaro, sem saber ao certo o que dizer.
E então ele ri, acabando com toda a tensão. Sorrio também, mas acho que não chega aos olhos.
– Você luta bem – ele diz. – Mas sabe usar uma espada? – ele levanta a própria como sugestão.
Balanço a cabeça, ainda não conseguindo dizer nada. O que foi toda aquela aproximação? E por que eu gostei tanto daquilo? Por que quero joga-lo de novo no chão e rolar na grama com ele?
– Então acho que posso te ensinar – ele pisca para mim.
Eu perco o ar e faço que sim com a cabeça.
– Claro.
Ele me joga a espada e eu a pego com habilidade. É pesada e esta quente onde as mãos de Felipe estavam. Enquanto examino a lamina banhada em bronze imagino todas às vezes em que ele a pegou ou a guardou dentro da calça.
– Fernando – ele me chama a atenção. – Só tem como aprender a usa-la se você estiver em pé.
Eu entendo o que ele quer dizer e me livro da sensação enquanto me levanto. Seja lá o que deixou meu sangue a mil alguns segundos atrás, some quando ergo a espada.
Felipe balança a cabeça para mim, meio que com desaprovação.
– Esta segurando errado – ele diz em um tom mecânico e me pergunto quantas pessoas ele deve ter ensinado. – Tem que ser com as duas mãos.
Movo a mão esquerda para o meio da lamina e a direita para pegar o cabo. Ele me olha com desaprovação de novo e finjo corta o ar na frente dele.
– Idiota – ele ri e dá dois passos na minha direção. – Deixa eu te mostrar como é.
Ele dá a volta por mim e para bem atrás, o corpo próximo do meu. Prendo a respiração enquanto ele toca sua mão com a minha e depois pega a outra. Junta as duas na ponta do cabo e balança a espada na minha frente.
– É assim que se segura a espada – ele instrui, a boca perto do meu ouvido.
Concordo em silencio e ele se afasta, ficando de frente para mim de novo. Seu olhar é totalmente inocente enquanto começo a investir contra ele. Nem parece ciente de absolutamente nada do que aconteceu.
Mas eu não consigo deixar de notar que o volume em minha calça esta cheio. E fico constrangido por isso.
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